Coletâneas de Amor – vol 02
Faixa 1. Pra Falar de Amor
“Eu vou falar besteira baixinho no ouvido. Te dar mais mil razões pra não me escutar. Já, já são onze e vinte e eu já ‘tô saindo. Mas não vou ser feliz se eu não te levar…”
Ouvir
2010
— João! João! Pra onde você está me levando, droga?
Flávia era arrastada pelo melhor amigo pelo punho, e não entendia exatamente onde ele queria chegar com aquela história de “você precisa ver uma coisa”.
O garoto continuava a arrastando, embora rápido, com todo o cuidado do mundo para não machucá-la. A amiga não quis acreditar quando ele contou a ela que o rapaz que ela gostava, havia mentido para ela.
— Eu espero que você não esteja mais uma vez tentando flagrar o Marcos em alguma das suas invenções imaginativas! – ela falou categórica.
No mesmo momento João parou de andar, e ajeitou os óculos em seu rosto e apoiou as mãos na cintura. Bufou pesaroso e encarou o chão.
— Sabe o que me mata de raiva, Flávia? Você escolher acreditar naquele bosta do Marcos, e não em mim, que te conheço desde que éramos do fundamental!
— João, você tem que entender que o Marcos mudou! Ele não é mais aquele adolescente do primeiro ano que pegava todas as meninas do colégio com o mesmo papinho, tá? – Flávia gesticulava nervosa enquanto o amigo a encarava com pena.
— Não mesmo, porque todas elas aprenderam a lição. Agora ele é um moleque imaturo do terceiro ano, que logo vai entrar numa faculdade e aprender novos truques com as universitárias.
— Você é digno de pena, sabia?
— Ah! Eu? Eu você tem certeza? – João cruzou os braços debochado encarando a amiga.
— Só porque você não tem ninguém que te ame, como eu amo o Marcos.
Aquela foi à gota d’água. Ele não precisava ouvir aquilo, logo dela. João ergueu as mãos em defesa, e deu as costas para Flávia.
— Aonde você vai agora?
Ela perguntou sabendo que havia pegado pesado com o amigo.
— O mal-amado aqui vai embora. Se quiser saber o que eu ia te mostrar, segue em frente. Mas segue rápido.
— João, espera… João… João!
Ele não esperou. Flávia furiosa decidiu sair dali, mas no fundo, ela tinha medo. João era seu melhor amigo e com certeza ele queria o bem dela. Contudo cogitar que o garoto por quem ela era apaixonada não era quem ela pensava, soava muito triste. Então, ela decidiu não acreditar naquilo e seguiu em frente só para poder provar para o João, mais uma vez, que ele estava errado.
Caminhou pela rua estreita, que mais era um beco de atalho e ao virar a esquina viu o carro do pai de Marcos. O garoto tinha o hábito de pegar o carro do pai para andar pela cidade. Flávia se escondeu um pouco atrás da parede do beco e ficou observando.
As lágrimas turvavam sua visão, mas não o suficiente para ela não enxergar os fatos. Marcos beijava calorosamente uma garota no banco de trás do carro.
Explosiva e impetuosa era a Flávia. Ela limpou as lágrimas de modo grosseiro, e procurou no chão ao seu redor qualquer pedaço de tijolo, pedra ou projétil. Encontrou um pedaço de entulho, um tijolo quebrado mais precisamente. Com toda vontade pegou-o, caminhou até a frente do carro e jogou com toda força no para-brisa. Marcos, sem camisa, de dentro do carro olhou para trás assustado e deparou-se com a expressão cruel de Flávia.
Antes que pudesse vestir sua roupa e ir atrás dela, Flávia já saia da rua e percebendo João escorado no paredão da rua de onde vieram de braços cruzados e cabeça baixa. Ela olhou para ele, chorosa e arrependida, mas ambos eram orgulhosos demais para fingir que não se havia trocado ofensas minutos antes.
— Vamos. – ele disse.
— Eu vou sozinha.
— Larga de ser estúpida, Flávia! – ele bronqueou segurando a mão dela: — Eu te trouxe até aqui e eu vou te acompanhar de volta.
Ela não disse nada, apenas subiu na bicicleta do amigo e deixou as lágrimas caírem enquanto ele pedalava até a casa dela de volta. Quando chegou à rua da casa dela, Flávia nem mesmo quis que João a acompanhasse até seu portão. Ela simplesmente desceu sem trocar nenhuma palavra com ele, nem um obrigado, nem um pedido de desculpas. Desceu chorando, irritada e caminhou pisando fundo até sua casa, entre olhares furiosos que lançava ao João boquiaberto.
O garoto não conseguiu acreditar que ela realmente iria culpá-lo por ter feito com que ela descobrisse a verdade. Girou seu boné para trás, como fazia quando estava de cabeça quente, ajeitou os óculos de grau e pedalou puto da vida com a amiga.
No dia seguinte, Tati estava na casa da garota ouvindo sua história e a aconselhando. Tati sabia que João só queria proteger Flávia e tentava a convencer disso. Mas, a menina estava sofrendo absurdamente. Marcos foi o seu amor platônico de infância, crush de adolescência, e agora que estavam no fim do Ensino Médio, ela finalmente havia conquistado o rapaz. Ou achou que tinha o conquistado. Ele era não só o seu primeiro amor, como foi o primeiro para quem ela se entregou. A garota sentia-se burra demais por ter cedido a ele da forma como cedeu, e o viu fazer igual com outra garota um dia atrás.
— Você não pode culpar o João, cara! Ele estava certo, afinal. – Tati defendia-o.
— Posso sim! Eu vou culpar o João por tudo de errado que me aconteceu!
— Deixa de ser infantil? O João se preocupou com você! Ele só queria te alertar! Ele cuida de você… Como sempre, aliás.
— Pega essa porra de amor encubado que tem por ele, Tatiana, e vai lá, vai à casa dele esfregar na cara do João!
— Nossa como você é escrota quando as coisas não saem do seu jeito, não é mesmo? – a amiga levantou-se brava e antes de fechar a porta do quarto da garota concluiu: — Quem me dera ter um cara como o João na minha! E sabe… Eu devia mesmo ir até lá, provar pra ele que ao contrário do que você disse, ele não é nada mal-amado.
As duas levaram menos tempo para voltarem a se falar do que Flávia e João. Mas, depois de um tempo sóbria por seu chifre, arrependida pela maneira como tratou o amigo, e claro… Extremamente curiosa pelo fato de João ainda não ter ido procurar ela, como sempre fazia quando os dois brigavam, Flávia foi até ele.
Andou calma com as mãos no bolso, e olhos ao chão pela calçada da casa dele até que pudesse vê-lo. Ela parou em frente ao portão gradeado e ficou pensando em como iria começar a falar com ele. O garoto estava sem camisa, com seu boné virado para trás, os óculos de grau na ponta do nariz, lendo compenetrado mais um de seus HQ’s colecionáveis. Era um geek e aquilo nunca iria mudar. Tocou a campainha e ouviu a mãe dele gritar para ele atender. Quando ele olhou em direção ao portão e viu Flávia mordendo o lábio, com o rabo entre as pernas, demorou-se para sair de sua rede e ir até ela.
Flávia percebeu pelo modo como ele pegou a camiseta para vestir, que João estava sem a menor paciência para ela. Observou o amigo vestir a blusa caminhando até ela, e pela primeira vez, notou como João estava mais forte desde a última vez que ela se deparou com aquele abdômen. A mãe dele gritou perguntando quem era e ao abrir o portão ele respondeu:
— É pra mim!
Encostou-se ao portão e ficaram os dois observando um ao outro.
— Achei que diria que não era ninguém.
— Eu não sou babaca como você.
— Você não precisa começar ofendendo, eu sei que estou errada!
— O que você quer, Flávia?
— Eu posso entrar pra gente conversar?
Ele deu passagem a ela, meio a contragosto por ser tão coração mole. Os dois entraram e subiram para o quarto dele, mas antes a mãe de João cumprimentou a garota que era a amiga favorita de seu filho.
Logo que entrou no quarto dele, Flávia se jogou preguiçosa na cama dele.
— Eu nunca me canso da sua cama! – falou rolando no colchão apertando um travesseiro dele.
— Anda, desembucha. O que você quer?
A postura fria de João – a qual Flávia não sabia quão difícil estava sendo para ele, manter – fez com que a garota se arrumasse sentando à cama e encarando as mãos, envergonhada.
— Desculpa.
— Só isso?
— Argh João! Me ajuda, né! Não é sempre que eu faço isso com você.
— Você nunca foi a primeira a se desculpar, Flávia.
Ele afirmou puxando a cadeira de rodinhas de sua mesa de computador e sentando frente a ela.
— Exatamente, então… Pega leve.
— Desculpa pelo quê? Por não acreditar em mim, ou me ofender?
— Por tudo. Eu fui uma idiota. Você não é mal-amado, nunca foi. Eu amo você, a Tati ama você… – ela falou revirando os olhos, cansada pelo sentimento escondido da outra amiga — E acredito que tenham muitas outras garotas embora você fique fazendo esse jogo de santinho.
— Eu já sabia disso tudo. Não me abalou você ter dito aquilo. Eu sabia que você só queria me ofender por eu te mostrar a verdade.
— É… Desculpa por isso também, digo, por não acreditar e te acusar… Mas o Marcos…
— É um babaca, e você gosta de babacas.
— João, para… Por favor, me escuta.
Ele assentiu de braços cruzados e ela continuou.
— Eu fiquei com medo de te dar ouvidos por várias questões, mas as duas principais eram constatar que Marcos de fato, me traía como você dizia, ou que você tinha se apaixonado por mim, e por isso falou aquelas coisas. E no final, você estava certo.
— Você também estava. – ele tomou a coragem de muitos anos enclausurada: — Eu sou apaixonado por você.
— O quê?
Flávia piscou algumas vezes e jogou o corpo no colchão. João continuava sério e imóvel observando ela.
— Eu sabia que a gente não deveria ter transado aquelas vezes… – ela afirmou.
— Foi muito antes disso, Fla. Eu sempre amei você na verdade, e quando entramos naquela de amizade colorida, eu achei que ia dar certo de verdade, mas aí o Marcos te notou e você sempre foi idiota por ele.
— E agora, João?
— E agora? Nada. Eu sempre fui seu amigo, sempre te protegi, e sempre irei. Não quero migalhas só porque você sabe que eu te amo agora. Eu sei que você não sente nada, e estou disposto a esquecer de você. Não é por falta de tentativas. Eu tentei, eu lutei, eu te mostrei isso… E sinceramente, Flávia, você sabia disso.
— Nossa… Uau! Você nem fraquejou.
— Flávia. Você não gosta de mim, mas tem quem goste. E eu acho que depois do que aconteceu entre nós, a maneira como você escolheu acreditar no Marcos deixou claro para mim que não importa o tempo que nós nos conheçamos, você sempre vai escolher o lado que te toca mais. E esse lado não é o meu, então…
— Você está saindo com alguém?
— Ainda não.
— Por que “ainda”? – ela perguntou fazendo aspas com a mão.
— Você já pediu suas desculpas?
— João, sério… Não quero perder você.
— Eu te desculpo, com a condição de que a gente não se meta mais nos relacionamentos um do outro.
— Tá… – ela respondeu contrariada, apenas para não levar o momento de fazer as pazes em outras discussões sem nexo.
Ele puxou a menina para um abraço e ela retribuiu. Mas, a conversa foi totalmente ao contrário do que Flávia esperava. Na verdade, ela saiu da casa dele muito assustada e confusa com a postura dele.
2014
Flávia se recuperou depois de terminar o colégio. Ela e João continuavam amigos de infância e vizinhança, mas não estudavam mais juntos. Então, entre as saídas de faculdade, Flávia recém-caloura em 2012, se jogou em vários relacionamentos casuais. Prometendo-se nunca mais deixar alguém partir seu coração. Coitadinha, tão imatura. Já João, que também curtia sua faculdade e curso, começou a namorar Tati.
A amiga de Flávia teve coragem para dar em cima dele, primeiramente como quem nada queria. Ele queria esquecer Flávia, e a distância imposta pelos estudos ajudou, embora os dois se vissem vez ou outra na vizinhança, na casa um do outro, e em passeios combinados. Tati teve coragem para contar depois de um tempo que já era a fim dele muito antes. João lembrou-se de desconfiar daquilo, e de ter a melhor amiga confirmando a retórica, tempo atrás. E de pouco em pouco um do outro, os dois foram se amarrando mais e mais.
Foi no aniversário de Flávia, depois de dois anos de faculdade, que ela percebeu o quanto João lhe fazia falta. O quanto ela queria ter o amigo mais perto, e o quanto a amizade deles não mudou nem um pouco. E a amizade não ter mudado, de repente fê-la notar uma frustração que não deveria existir.
— Puta merda, a essa altura do campeonato, Flávia? – ela falou para si, enquanto pegava uma bebida na cozinha de sua casa.
— Hm… Que merda você fez agora hein, garota? – João surgiu atrás dela e perguntou.
— Quem disse que eu fiz merda?
— Eu te conheço, não mete essa. – ele puxou a bebida dela para si, obrigando-a a pegar outra.
— Eu me apaixonei por quem não devia.
— Sério? Depois de todo esse tempo se apaixonou de novo?
— Sei lá, João… Acho que eu já era apaixonada… Mas, sei lá… Eu acabei de notar isso e na verdade eu acho até que quero vomitar.
Ele deu uma gargalhada sonora e divertida.
— Lute por ele. Mesmo que vocês não fiquem juntos, no fim vale a pena lutar e tentar. ‘Cê sabe né?
A pergunta nostálgica dele levou as memórias de Flávia a, todas as vezes que ele fizera questão de mostrar para ela, o quanto ela era importante para ele. E Flávia quis realmente chorar como não fazia há muito tempo.
— E… Você…? – ela perguntou titubeante.
— Eu o quê?
— Você… – pensou um pouco e decidiu mudar o assunto: — Como você está e o que vai fazer ano que vem…?
— Europa! – ele disse sorrindo largo.
— Como?
— Consegui o intercâmbio, a Tati também, a gente vai juntos! Não é o máximo!? Eu sempre te disse que era meu sonho, lembra?
— Lembro… – a cabeça dela começou a rodar e a visão embaçar: — Eu… Eu não ‘tô muito bem…
— O que foi?! Fla? O que foi?
João preocupado como sempre, largou a bebida e foi acudir a amiga que de repente estava pálida. Quando Tati e outra amiga de Flávia surgiram na cozinha, a garota pediu para Carol a acompanhar até a varanda.
— Amiga, tem certeza que não precisa de mim? – Tati perguntou tão preocupada quanto.
— Tudo bem, eu… Eu precisava mesmo falar umas coisas com a Carol. A gente se vê já, já.
Carolina sabia que não tinha nada a ser dito, apenas acompanhou Flávia e a deixou respirar mais calma.
— Porra, como eu sou burra, Carol. – ela afirmou quando estavam a sós e a amiga riu concordando.
Assim como João aconselhou, Flávia tentou. João estava a um dia de embarcar no avião e foi pego de surpresa com a amiga o esperando em seu quarto.
— Fla? O que houve?
— Eu te amo
. — Ah… Eu também te amo, mas o que acon…
— Não, João! – ela falou alto e forte interrompendo-o: — Eu realmente descobri que amo você! Eu… Não vai embora, por favor. Fica comigo! Eu vou… Eu vou fazer todo o possível para recuperar o tempo perdido.
João encarou Flávia com um semblante triste e sentou em sua cama, segurando sua toalha de rosto na mão. Pegou a mão dela puxando-a para sentar ao seu lado.
— Sabe quantas vezes esperei te ouvir dizer isso?
Ela começou a chorar e ele continuou cuidadoso:
— Fla… Eu não posso largar o intercâmbio agora… E, e nem a Tati.
— Você gosta dela, eu sei… Mas eu precisava tentar.
— Eu gosto. – João falou pesaroso por saber que seria mentira dizer que amava à Tatiana: — Mas, não é isso. Eu não posso agora, depois de tanto tempo recomeçar tudo, sabe?
— Eu sei. Eu te perdi.
— Não. Você só me perde se você quiser. Eu não vou permitir que outro continente, afaste mais nós dois. Eu vou continuar te perturbando lá da Europa, é só que… Esse nosso momento já passou…
— Eu sei.
— Puta que pariu, que merda. – ele falou rindo triste.
— É, merda mesmo. Logo agora.
— Ei… Era de mim que você falou aquele dia na cozinha da sua casa?
Flávia concordou silencioso.
— Porra, Fla! Logo agora?
— Eu sei, eu sei… Eu sou uma babaca, você sempre esteve certo quanto a isso.
Os dois riram, e Flávia se levantou chorando e limpando o rosto. João se levantou com ela e a abraçou apertado, protetor.
— Ei, promete que vai ser feliz quando eu não estiver aqui?
— Eu prometo tentar.
— Eu ‘tô falando sério, Fla. Não quero voltar e não te ver realizada.
— João… Quando você voltar… Se você estiver sozinho, me procura?
— Eu vou te procurar estando ou não sozinho, garota. Que papo é esse?
— Eu não estou falando disso.
— Flávia. Eu acho que já deu, de você evitar quebrar a cara de novo, sabe? Vive a sua vida, cara, como você merece! – ele segurou o rosto dela obrigando-a a encará-lo: — Para com essa porra de não se envolver com ninguém e se liberta do passado! E se isso que você sente por mim agora, te atrapalhar… Se liberte de mim também.
— Caralho, que péssima hora pra descobrir que eu te amo… – ela falou rindo apoiando a cabeça no peito dele.
Despediram-se, e a vida os separou, guardando em seus segredos profundos aqueles sentimentos.
Faixa 2. Nem o Mar
“A paixão percorre por todo o meu sangue. Pulsa em minhas veias e incendeia minha alma. Acelera todas as funções do meu corpo. Você partiu e me deixou a ver navios. Claro que chorei quando entrei no mar”.
Ouvir
2016
A noite estava quente e por isso, Flávia decidiu mergulhar no mar antes de retornar à casa de Bianca e Lucas. Os amigos de longa data haviam se casado, e se mudado para uma cidade litorânea. Flávia e os demais amigos da época de escola estavam ali para visitá-los, num encontro de turma já combinado desde o início daquele ano.
Ela estava muito ansiosa desde que chegara, pois, sabia que João e Tati estariam na viagem. Flávia aguardava com medo, o reencontro com o amigo – até mais do que com Tati – que não via desde que há anos o disse amá-lo. Para atrasar aquele encontro, ela foi dar uma volta na orla da praia logo que Caio entrou à cozinha de sua casa dizendo: “— João tá chegando, galera!”.
Caminhou até a água do mar, escura pela noite, e com cuidado mergulhou no raso. Ao sentir que a correnteza estava forte, saiu, de costas para a praia e de frente para o mar. Não pôde evitar a lágrima lhe escorrendo o rosto, ao relembrar a última vez que viu o amigo. Até escutar a voz dele.
Como se fosse coisa da sua cabeça, ela não acreditava que era ele a passar correndo atrás de uma mulher metros distante, ao seu lado. Eles riam divertidos, e gritavam como crianças. Em câmera lenta, seu coração assistiu João beijando outra mulher dentro do mar, mergulhando com ela e erguendo-se risonhos. O embargo em sua garganta reverberou os sentimentos mais antigos de seu coração. Então Flávia virou-se para voltar para a casa, e Peter estava logo atrás dela, assustando-a.
— Pet?
— Amor, por que não disse que viria à praia? – ele perguntou com o seu sotaque americano carregado.
— Ah… Eu já estava voltando.
— Não… – ele riu abraçando-a e arrastando-a para dentro da água, com muita sedução e carinho: — Vamos, eu também estou com calor.
Flávia ainda desconcertada disfarçou como aprendera a fazer naqueles últimos anos, e deixou-se ser guiada por Peter. Entrou na água com ele em beijos e carinhos, e foi vez de João que subia de mãos dadas com sua noiva, de vê-la. Olhou cauteloso com olhos estreitos na direção do casal, e não se enganou. Jamais deixaria de reconhecer Flávia. Quando chegou à casa de Lucas, foi recebido com alegria e saudade dos amigos.
— Pô, Jão! Você não estava chegando? Que demora, irmão!
— Está todo molhado! – Bianca falou estranhando ao se aproximar para abraçá-lo.
— Ei, Bia! – ele abraçou-a mesmo assim: — Eu fui dar um mergulho antes de vir!
— E quem é essa? – Lucas perguntou ao abraçá-lo.
— Essa é a Marcele, minha noiva.
Os outros amigos sorriram para ela, abraçaram-na e discretamente se entreolharam surpresos. João havia dito que viria com a noiva, mas ninguém imaginou que não seria a Tati. Aliás, a amiga ainda não havia chegado por isso todos ficaram um pouco surpresos.
— Cadê a Flávia?! – Manoel desceu as escadas da casa dos amigos perguntando para Bianca ao vê-la parada ali perto: — Eu fui perguntar a ela se o Peter tem aparelho de barbear, e não achei nenhum dos dois!
Manoel não percebeu que João havia chegado, pois se deparou com Marcele, a noiva desconhecida na frente de Bianca.
— Ela foi à praia.
E com a resposta João abaixou a cabeça, pensativo. Era de fato ela que ele havia visto. E o cara ao seu lado deveria ser o tal Peter, de quem Manoel falava. João aproximou-se do amigo o surpreendendo, e apresentando sua noiva a ele. E quando eles decidiam se iam jantar fora ou em casa, Flávia e Peter surgiram sorrindo e conversando alegres com Tati.
— Olha quem eu encontrei perdida lá fora! – Fla falou levando a amiga para a cozinha.
Deparou-se com João do outro lado da bancada, e todos os amigos reunidos ali foram abraçar Tati.
— Er… Vamos subir e nos trocar.
Ela disse alto para que todos escutassem, disfarçando o olhar de João, e saiu arrastando Peter pelas mãos ao seu quarto. Peter foi tomar banho antes de Flávia sob muitos protestos, já que ele queria que ela fosse antes. Mas a namorada inventou uma desculpa de que precisava ainda escolher uma roupa e por isso, como a casa estava cheia era melhor que ele fosse rápido. E assim ela ficou trancada ali até que seu namorado saísse do banho. Ela foi a próxima e quando acabou, Peter já havia descido de encontro aos amigos dela, e ela, esbarrou-se com Marcele que tentava abrir a porta para o banho.
— Ah! Me desculpe! – a garota falou simpática e envergonhada.
— Tudo bem… – sorriu Flávia para ela — Eu já acabei.
— Prazer! Eu sou a Marcele. – ela sorria estendendo a sua mão para Flávia.
— Prazer, Flávia.
Sem demoras, ela saiu deixando a acompanhante de João entrar ao banho. E antes de entrar em seu aposento, João surgiu no corredor. Eles se encararam e se aproximaram.
— Nem parece que a gente se fala pelo telefone com tanta frequência. – ele falou ao puxá-la num abraço amigo.
— Eu acho que foi o susto de te ver depois de tanto tempo. – ela respondeu.
— É… Eu também não esperava… Quero dizer… Não esperava te ver acompanhada. Fico feliz que seguiu ao meu conselho.
— Não, não segui não.
— Peter… O cara lá embaixo que é super engraçado por sinal…
— É meu namorado sim. Bem diferente de noivo, não é?
— O quê? Você sabe a história.
— Bem, na verdade eu só sei que você terminou com a Tati, e a garota das fotos era sua nova namorada. Noiva foi um pouco de baque quando a Bia me contou.
— Eles não sabiam da Tati também, achei que você teria contado.
— Eu? Com que direito eu ia falar da sua vida?
— Entendo… A Marcele é legal, Flávia.
— Eu não disse que não era.
— Então por que está com aquele tom de repreensão?
— Impressão sua João. Eu não tenho nada a dizer ou pensar dos seus relacionamentos, só desejo que você seja feliz.
— Amor! – Peter gritou do fim do corredor sorrindo e se aproximando.
João se despediu dela com um beijo no rosto, e tocou o ombro, amigavelmente de Peter, e saiu para seu quarto. Peter e Flávia entraram juntos e o namorado queria saber se ela ia jantar com os amigos em casa, ou se preferia sair. Ele estava louco para conhecer mais da cidade. E ela só queria não encarar João.
Por fim, todos foram jantar fora. E ao retornar para casa, João e Flávia não conversaram mais a sós. Pelo menos até a madrugada, onde se encontraram por acaso na cozinha.
“Bem me quer, mal me quer, se me quer, não me quer. Será que essa história sempre acaba assim? Se eu pudesse te falar que nem o mar pôde levar, o que você deixou em mim. O que você deixou em mim, por onde eu ande, aonde eu vá, eu vou te levar.”
— Insônia? – João perguntou entrando devagar à cozinha ao notar, surpreso, a presença de Flávia ali.
— Não, é só… O calor.
— A gente nem se falou direito hoje… – ele pegou um copo d’água e sentou-se perto dela — Senti muito a sua falta, Fla.
— Eu também sinto a sua.
Os dois se olharam e mantiveram o silêncio por um tempo, contemplando o rosto que há tanto tempo não viam tão perto.
— E então… Qual a sua versão para o término com a Tati?
— Você já sabe a história. Eu já havia te contado.
— É, mas você mentiu. Não disse estar noivo, e por isso eu fiquei extremamente confusa. Você me contou que terminou com a Tati, e de repente me falam que você viria com a sua noiva… Todo mundo achou que era ela!
— Por que eu não posso terminar com a Tati e começar um noivado? – ele perguntou divertido.
— Porque como você termina um namoro de tantos anos com a nossa amiga de infância para se casar com… – a voz de Flávia falhou — Alguém que você acabou de conhecer?
— Por que acha que eu acabei de conhecer a Marcela?
— Eu não acho. A Tati me contou tudo… Eu sei que essa Marcela era sua amiga desde a chegada ao intercâmbio. Mas, mesmo assim… Era a Tati, João. A garota que sempre gostou de você.
— Você me parece mais incomodada do que ela.
— Como você pôde, João, além de tudo isso, fazer a Tati passar esse constrangimento de encarar a sua noiva no meio dos seus amigos de infância, alguém que…
A respiração de Flávia estava descompassada, e ela apertou os olhos suspirando como alguém que estava totalmente perdida no meio de seus falhos argumentos.
— Fla… – João a chamou pacientemente — Ainda estamos falando da minha relação com a Tati mesmo?
— Eu só… – ela olhou para ele segurando as lágrimas: — Eu só não achei que você fosse terminar com a Tati um dia.
— E isso te incomoda tanto por quê?
— Ah João, sério? Para né, por favor…
Os dois estavam em silêncio e João apesar de confuso sentia que estava ferindo sua amiga, que ele tanto amou e amava. Quando um pequeno resmungo de choro de Flávia se fez ouvir, ele encarou-a e tentou se aproximar, mas a mulher virou o último gole de água e colocou o copo na pia. De costas para ele, Flávia limpou as poucas lágrimas e virou-se falando antes de deixar a cozinha:
— Eu me declarei para você tarde demais, e aceitei que havia perdido você para a Tati, e sinceramente… Eu estava até feliz, porque ela sempre amou você. Mas, nunca imaginei que se um dia você desistisse dela, eu não seria a primeira pessoa que você levaria os sentimentos em consideração.
Ela mordeu os lábios e passou à frente dele para sair, mas João segurou seu pulso a impedindo.
— Você está dizendo que ainda me ama?
— É claro que eu te amo. Você é o João. Mas, nada disso importa mais.
— Fla… – ele levantou-se para se aproximar mais dela, mas Flávia soltou-se de sua mão e subiu as escadas sem falar mais nada.
Os dias daquele reencontro de amigos seguiram sem novas discussões do passado entre João e Flávia. Ele estava arrependido e queria saber como consertar as coisas. Ela estava arrependida de ter falado tudo aquilo e evitou João sozinho de novo.
No fim, eles agiram como os melhores amigos que eram, entre olhares e climas tensos que surgiam em público, ambos apagando aquelas sensações. Flávia se concentrou em se entregar um pouco mais ao Peter. João se concentrou em sua noiva Marcela e em fazê-la sentir-se bem entre os amigos dele.
Quando todos iriam se ver de novo, ninguém ali sabia. João e Marcela retornariam à Europa, e Flávia continuaria no Brasil com Peter.
Faixa 3. Cafuné
“No meu colo, eu te coloco pra que a alma aflita perceba que a vida é mais bonita. Quando seus olhos fechadinhos, cafuné.”
Ouvir
2018.
Peter propôs à Flávia, meses atrás, que eles fossem passar alguns anos nos Estados Unidos com ele e sua família. Aquilo a assustava. Um passo daquele, seria se entregar mais e mais ao Peter. Flávia já estava namorando Peter há três anos, mas sentia medo, como se fosse a primeira vez.
O choro silencioso de Flávia cortava devagar a sua face rubra de frio. Peter estava deitado em seu colo adormecido, e os dois emboladinhos num cobertor, num balanço da varanda da casa dela. Uma, duas, três gotinhas de lágrimas, pingaram no rosto do namorado sem que ela notasse.
— Eu fiz alguma coisa errada? – ele perguntou com o sotaque menos carregado após aqueles quatro anos morando no Brasil.
— Amor?! – ela perguntou assustada limpando o rosto.
Peter se levantou lento do colo da namorada, enrolou-se melhor nas cobertas, e encarou a face da mulher. A ponta do nariz dela tão vermelha como o próprio nariz da rena natalina, denunciava o choro contido. Ele limpou o vestígio de lágrimas dos olhos dela e a puxou para um abraço, onde Flávia não conteve seu choro.
— O que houve?
— Eu estou com medo, Pet.
— Medo?
— Medo de ir embora com você.
— Você não precisa aceitar ir comigo, amor.
— E tenho medo de não indo também, te perder.
— Se você quiser, nós ficamos aqui. Eu não vou terminar com você por causa disso, Fla. Não é como se eu não gostasse do Brasil, eu só…
— Queria me apresentar o seu mundo de perto. – ela interrompeu a fala dele e continuou: — Eu não fui tão sincera com você todo este tempo, Peter. Eu não sei se eu estou pronta para assumir um compromisso de vida com você, e…
O silêncio de Flávia o fez entender que ele estava certo, aquele tempo todo: havia um fantasma no coração de Flávia que a impedia de dar passos à frente.
— Eu sei que tem um cara que mora aí dentro, e que você não conseguiu arrancar apesar de nossos três anos juntos.
— Não é isso, Pet…
— Fla…– ele a interrompeu segurando o seu rosto com as duas mãos: — Eu sei que tem alguém por quem você mantém alguma esperança. E eu não quero saber quem ele é, ou o que aconteceu entre vocês, mas eu quero que você saiba que eu não estou te pressionando. Se você quiser ficar comigo por mais dois, cinco, dez anos ao meu lado, até ter certeza se há futuro pra nós, eu não me importo. Porque eu realmente só quero ficar ao seu lado, sendo para você o Sol que aquece dia após dia, um pouquinho mais do seu coração.
— Peter, eu não mereço o seu sentimento, é sério. Eu estou me frustrando por algo que nunca aconteceu ou vai acontecer, e eu… Eu não consigo dar um passo à frente, mas também não consigo te soltar. Se isso é egoísmo ou não, eu não sei, eu só quero com todas as minhas forças te amar mais do que amo, e mais do que já amei um dia.
— Então se acalme. Vamos no seu tempo. Não me manda ir embora por medo do que possa se tornar um futuro entre nós dois, por favor.
— Não é justo te prender assim, Pet… Não é certo.
— Você não está me prendendo sua boba. Eu sei que aquela porta está aberta para eu ir quando quiser, mas eu não quero. Eu quero ficar aqui, e te mostrar que a gente não tem que correr vida afora. Nós só temos que viver um dia depois do outro.
Flávia entendia o que Peter dizia, mas sentia-se culpada por não ser capaz de dizer a ele que qualquer aventura ao lado dele, ela toparia. Embora, no fundo ela sabia que toparia. Sentia-se culpada por desejar amar a ideia de cada plano de futuro que ele quisesse fazer, mas que justamente por seu medo, ela sabia que ele não fazia.
O convite de morar nos Estados Unidos com a família dele era uma aventura despretensiosa na cabeça de Peter, mas para Flávia era algo maior do que qualquer outro já tinha a oferecido um dia. Ela queria aceitar Peter, e todos os seus planos, mas ela queria ter certeza que nenhum outro iria oferecê-la o mesmo que ele.
Flávia era medrosa, e era inconstante demais até para enxergar o que já estava sólido em sua vida a ponto de não se abalar por mais nada.
Ela deitou-se no colo dele, assim como ele estava antes, e recebeu o afago carinhoso do cafuné de seu namorado. Aquele cafuné que sempre a fazia sentir-se no lugar certo, apesar de todos os seus medos.
Faixa 4. Quando Bate Aquela Saudade
“Olha bem mulher, eu vou te ser sincero. Quero te ver de branco, quero te ver no altar. Não tem medo não, eu sei vai dar errado. A gente fica longe, e volta a namorar depois.”
Ouvir
2020.
As risadas gostosas de Flávia ecoavam pela casa enquanto Peter corria atrás dela numa brincadeira infantil, que os dois ora ou outra faziam, de fugir das massas de bolo batidas em conjunto e pingadas em suas faces um pelo outro.
O telefone de Flávia tocou e numa pausa forçada, Peter sentou-se ao braço do sofá lambendo a colher de massa e os dedos. Ela pegou o aparelho e atendeu olhando para o namorado, sem dar-se conta de, por quem era feita a chamada.
— Alô!
— Flá? Tudo bem? É o Jão!
— João? – ela perguntou confusa deixando o sorriso que dava ao namorado esmorecer.
O olhar trocado entre ela e Peter foi de um homicídio culposo ao amor secreto à confissão sincera do crime. Peter ficou olhando-a, desde os trejeitos até o apertar nervoso dos lábios dela ao telefone. Havia encontrado. Era ele, era João o fantasma de Flávia. E era ele quem agora, fazia Peter estremecer de medo. Enquanto o passado estivesse distante, Peter não tinha o que temer, mas agora, o problema era que o passado sempre foi mais presente do que ele poderia imaginar. Era Peter quem agora estava extremamente apavorado.
— Entendo… Claro, claro que eu vou, João! Você já contou para todo mundo?… Ah, sim… Pode mandar sim, eu ainda moro no mesmo endereço… Sim, estou bem, e vocês?… Ah que ótimo! Peter manda um abraço. Sim… Quem sabe, não é? Então tá… Boa viagem! Até a vinda!
Flávia desligou a chamada e encarou suas mãos por um momento longo de silêncio. Aos pouquinhos e devagar foi se dando conta do ramo de sentimentos no seu peito, e o sorriso travesso foi surgindo em sua face. Peter que ainda a observava atento, bufou fundo, bufou sem medo de mostrar a contrariedade, e encarou o chão.
— Era o João. – ela falou se aproximando do namorado.
— É. Era o João. – ele assimilou como se afirmasse algo diferente dela.
— Ele está voltando para o Brasil com a Marcela.
— Hm…
— E… Eles vão casar.
Os olhos tristes e distantes de Peter aos poucos subiram para encarar o rosto de Flávia. Ela sorria tranquila, como se estivessem acabado de sair de um banho quente num dia frio. Havia algo que ele desconheceu ali. Peter, agora que sabia quem era a “esperança” de Flávia, quem era seu adversário, sentia um medo descomunal. Ele estava fora de seu conforto, fora de suas bases e seguranças.
— Ele já contou para todos os nossos amigos de infância e está enviando os convites. Vai enviar o nosso.
— Quando é o casamento?
— Ele não disse. E ele ficou feliz com o abraço que você mandou. – Flávia falou com tom brincalhão e provocante.
— Eu não mandei abraço nenhum.
— Mas ele ficou feliz. Ele perguntou se estávamos juntos e eu disse que sim, e ele ainda falou que podíamos nos casar também.
O rosto irritado de Peter por escutar a voz melodiosa de Flávia narrar a ligação de seu amor do passado não pôde evitar encará-la surpreso.
— O que você disse?
— Eu respondi… “Quem sabe, não é?”.
Ele não estava se referindo à resposta que ela havia dado. Ele na verdade estava confuso, mas ouvir aquele “quem sabe” fez seus olhos encherem de lágrimas que ele segurou.
— Está falando sério, Fla?
— Eu não sei, eu nunca fui pedida.
— Eu não podia pedir.
— Por quê? – o tom brincalhão dela era quase sádico.
— Porque você nunca me deu sinais de que estaria tudo bem.
— Eu assumo. Eu estou apaixonada por você faz é tempo, e eu disse que te amava menos do que queria, eu acho… Mas, a verdade é que eu tinha medo de fazer planos futuros com você e…
— O João voltar. – ele interrompeu duro, olhando os olhos dela.
— É não vou negar que um pouco disso. Mas, recentemente, do ano passado para cá, eu tinha mais medo de que esses planos se tornassem uma fantasia irreal.
— Irreal por quê? Olha o tempo que eu estou ao seu lado só esperando você me dizer que seu coração tem espaço para mim…
— Por isso mesmo… E se eu dissesse e você entrasse nele, e visse que não tem nada demais nesse coração a ponto de descobrir que esperou todo tempo por tão pouco?
— Definitivamente você não sabe o tamanho do meu amor, Fla.
Peter da irritação que sentia já não tinha mais traço algum, na verdade ele estava rindo. Um riso que se tornou risada, uma risada que se tornou gargalhada. E os dois ficaram rindo de si, e do triste fato que se João tivesse ligado antes falando algo daquele tipo para Flávia, tanto Peter quanto ela teriam se tocado que não havia fantasma algum há tempos. E que na verdade eles estavam só vivendo um dia após o outro há tanto tempo, sem darem-se conta, de que não havia mais um só dia em que os dois não fossem um.
— E agora? – Fla perguntou.
— Hm…
Peter pensou e pegou o telefone do bolso, abriu num aplicativo de música, digitou uma canção, e aos acordes primeiros deixou o aparelho entre eles. Flávia encarava o rosto do namorado, com quem morava junto há um ano na sua casa, reconhecendo aquela música. Aos poucos Peter aproximou-se dela, beijando seus lábios de forma calma e delicada. O beijo se transformou em abraço, o abraço que se apoderou do corpo dela no colo dele, e que ao som da voz cantarolada de Peter gerou uma confissão:
— Olha bem mulher, eu vou te ser sincero. Quero te ver de branco, quero te ver no altar…
Uma confissão que gerou uma dança divertida e romântica na sala, uma dança que foi envolvida pelo cheiro doce da baunilha invadindo a casa, e que por pouco não os fez esquecer o bolo que estava no forno.
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