Breathe (2am)
“Duas da manhã e ela me liga, por que ainda estou acordada? Pode me ajudar a solucionar, meu último erro? Eu não amo ele”.
A voz de Jenna soou sussurrada e chorosa na chamada. Tateei em minha cama com o celular na orelha, sonolenta, como se quisesse ver as horas em algum relógio de cabeceira que não existia.
— ? — Ela chamou mais uma vez.
Passei minutos em silêncio absorvendo o que escutei.
— Aconteceu alguma coisa grave? — emiti um pigarro após minha pergunta preocupada, começando a sair do meu estágio de sono.
— Eu descobri… Eu… — Jenna chorava ainda mais, como se sufocasse — Eu errei com ele, !
O silêncio que fiz era motivado por um desentendimento sobre o quê minha irmã dizia.
— Eu não amo o . Eu errei com ele, errei com você, errei com o Alberto! Eu fiz tudo errado! Eu sou uma vadia desalmada, !
Jenna disse que não amava o . Jenna disse que não amava o ? (…) Minha cabeça paralisou como se o tempo tivesse congelado e todo o meu quarto, iluminado por uma luz fraca do abajur que eu acendi há pouco, parecia aos meus olhos, um borrão de escuridão.
— ?! — Jenna me chamou de novo — , por favor não me odeie agora! Eu estou me culpando muito e…
—
Jenna? O que faz acordada, amor? — A voz do ecoou abafada do outro lado da chamada.
Então, eu desligo a ligação. Desligo o celular em seguida. Era melhor desligar do que jogá-lo na parede quando tocasse de novo, afinal, havia trocado aquela porcaria há três meses.
Quem em sã consciência rouba o namorado da irmã para depois dizer que não o ama? Vadia, louca, mimada! Que babaca era a Jenna! Como ela pôde?
Depois daquela bomba que tirou o meu sono, eu caminhei até a sacada do meu apartamento, peguei o maço de cigarros que ficava na mesinha da sala, sentei-me na cadeira de balanço da pequena varandinha e fumei quase uns dez malditos cigarros, com a brisa da noite, fresquinha, batendo em meu rosto. E com a vizinha do 702 gritando no prédio ao lado:
“Vai comer a vagabunda da sua ex, Paollo!”.
Eu não sabia que merda federal o tal Paollo havia feito, mas com certeza, era tão grave ou igual ao que a Jenna me fizera aquela noite. Uma vagabunda. Minha irmã era uma vagabunda!
•–•–♦–•–•
“O inverno não foi minha melhor estação. Sim, nós passamos pelas portas, eles julgando com os olhos como se tivessem algum direito de criticar. Hipócritas, vocês todos estão aqui pelo exato mesmo motivo.”
Jamais esqueceria o dia em que e eu fomos pegos em flagrante na festa de aniversário da Carminha, minha prima. O e eu namoramos escondido por cinco anos. Cinco longos, lindos e prazerosos anos em que não precisamos nos preocupar com ninguém dizendo que nós não éramos bons suficientes um para o outro. A família dele me achando uma “emergente da classe média de pouco brio e elegância” e a minha família o achando um “playboy que não sabia o que era trabalho”. No meio da rincha entre as duas famílias, que na verdade não se conheciam muito bem, apenas se evitavam por serem de mundos diferentes, nós nos apaixonamos.
Tudo começou quando mamãe ganhou na loteria. Foi uma loucura total o dia em que cheguei da faculdade e vi Jenna, mamãe e papai gritando em casa como se tivéssemos ganhado na mega sena. E de certo modo ganhamos, não na sena, mas noutra dessas bandeiras da loteria brasileira. A mamãe jogava os exatos mesmos números que a vovó jogou a vida inteira, e quem iria imaginar que ela ganharia um milhão de reais desse jeito?
Ficamos milionários da noite para o dia, e tal como ficamos, o nosso dinheiro vinha aumentando graças aos investimentos que a mamãe fazia. Minha mãe não era economista, mas sempre foi estudiosa e tudo o que se metia a aprender, ela aprendia. Quando aquela dinheirama recaiu sobre nossa família, rapidamente ela deu um jeito de aprender mais sobre bolsa de valores, ações, investimentos em tesouro, e mais uma porrada de coisas que eu odeio saber.
Então, nos mudamos para a zona sul carioca, adquirindo um apartamento no Leblon… Apartamento… Eu nem sei como chamar na verdade, porque aquilo é quase dois do meu modesto apartamento aqui na Barra da Tijuca. Enfim, lá se foram mamãe e papai comprar a porra de um apartamentão em um condomínio no Leblon, e pagar uma taxa mensal exorbitante só porque uma novela do Manoel Carlos foi gravada em nosso quarteirão.
Jenna adorou aquilo tudo, lógico. Já eu não sentia muita diferença. Essa coisa de status nunca fez a minha cabeça. Eu gosto é de me sentir bem, fazer as coisas que amo, estar com quem me diverte… Coisas comuns. Mas foi quando nos mudamos para esse bairro “Global” que eu conheci o . Ele era nosso vizinho tal como sua família, mas quase não víamos os pais dele.
ficava mais tempo sozinho no apartamento, e por isso eu não fazia ideia de onde estava me metendo quando, depois de muitos encontros pelos corredores e elevadores, depois de muita cerveja gelada partilhada no bar da esquina e depois de muitas risadas e conversas interessantes entre nós dois, ele me convidou a conhecer o seu apartamento. Eu fui conhecer mais do que o apartamento e nunca mais parei de fugir para a casa dele vez ou outra. Até o dia que a Jenna pegou nós dois no maior amasso no elevador.
No fundo, a Jenna sempre quis tudo o que era meu. E quando ela bateu os olhos no , não foi diferente.
Para encurtar a conversa, a gente namorava escondido, com a Jenna sempre nos acobertando e passando a frequentar nossos rolês e círculos de amigos em comum, que eram basicamente ”a galerinha
high Society do ” — como Jenna dizia — e a minha “galerinha pobretona da faculdade”. Jenna também dizia. Todos apelidos dela.
E nosso namoro escondido ia muito bem, muito obrigada, até que a Jenna se aproximou dos pais do . Fazer pose de moça de classe alta era fácil para ela, e claro, cativou a Marília, mãe do , em um piscar de olhos.
Como a Marília e o Daniel Dantas, pais do , aceitaram o convite do aniversário da Carminha e foram parar lá, eu nunca entendi. Mas foi naquela maldita festa que Marília e Ivone – Ivone é minha mãe – flagraram o e eu nos pegando no banheiro do salão de festas do condomínio completamente bêbados e fora de nós, diga-se de passagem. Naquela noite, o falou para todo mundo que ia casar comigo, e eu, chafurdada na cachaça comemorava, ria e gritava “aceito, aceito”, como se aquilo fosse se tornar verdade.
Entre o momento que a mamãe me arrastou pelo braço por todo o salão até em casa e Marília arrastou o , eu não sei o que aconteceu exatamente porque não me lembro.
O que aconteceu depois é que o terminou comigo no dia seguinte. Foi extremamente contundente, dizendo que era o melhor para os dois e que por um tempo deveríamos nos evitar até conseguirmos nos encarar apenas como amigos. E para isso, ele foi embora. Ficou seis meses fora do país e eu tentando me recuperar da maior ilusão amorosa da minha vida. Superei? Nunca. Mas fingi. Eu fingi, porque eu não saio por baixo, não! Quando ele retornou, sorrindo e me cumprimentando como se nada tivesse acontecido, eu é que não ia demonstrar fraqueza!
O queria manter a amizade, e eu aceitei, mesmo com meu coração esburacado como as ruas do subúrbio carioca. Então, achei que começar a sair com outros caras era o remédio pra esquecer o . E não deu certo como eu imaginei, mas foi uma boa distração. O Caíque, da galerinha fodida da faculdade (e esse título perdurou mesmo depois que todos nos formamos) foi uma ótima companhia por muito tempo. Na verdade, por até um mês atrás. Foi o Caíque que afugentou o . No dia que meu ex nos encontrou na praia perto de casa, nos beijando e conversando enquanto tomávamos sol, eu vi nos olhos do que ele também vinha fingindo todo aquele tempo.
Então por que não ficamos juntos? Porque a Jenna apareceu grávida do dois meses depois que ele voltou. E adivinha só? Marília, que era totalmente contra a ideia de eu me relacionar com seu herdeiro de ouro, apesar de não gostar da forma como as coisas aconteceram, muito menos não mais simpatizava tanto com a cara da Jenna desde a festa da Carminha (porque ali ela descobriu que a raiz da nossa família é pobre). Apesar de todas essas coisas, ela apoiou os dois. Porque agora havia uma criança meio pobre e muito rica entre as famílias.
E a mamãe só investindo em ações e multiplicando fortuna… O papai já tinha se tornado amigo do Daniel, pai do , e estava mais entendido e posudo de rico do que nunca esteve. Chegou-se ao ponto da indiferença, sabe? Onde filhas adultas e suas picuinhas de irmãs já não importam para os pais.
Em suma, meus pais e irmã ascenderam de corpo e alma ao status elitista emergentes e tiveram o apoio da família Dantas para ensiná-los como se comportar, afinal, e Jenna se casariam. Já eu, desde o dia que aquele anúncio foi feito, me mudei para a Barra da Tijuca.
Foi em um jantar na casa dos Dantas, preparado para contar a todos nós que Jenna estava grávida do e que eles se casariam, que eu caí na real: precisava ir embora. Nunca me senti muito confortável por ali. Não por minha família, porque, sinceramente, meus pais eram ótimos e minha irmã, na minha cabeça, sempre foi uma caçula imatura. Não era como se eu me sentisse deslocada deles, mas era o bairro… O ambiente… A atmosfera do lugar e cada lembrança do amor juvenil que eu experimentei com o por ali. Então foi naquele jantar que a minha ficha caiu.
O me encarava com uma culpa enorme nos olhos, mas um sorriso falso no rosto de quem sabia que fazia o certo em assumir a Jenna. Eu nem jantei naquele dia. Pedi licença a todos dizendo que precisava sair com o Caíque e, portanto, não poderia ficar. Peguei minhas coisas e enfiei numa mala quando subi para o nosso apartamento sozinha, telefonei ao meu até então “ainda não namorado”, e Caíque me buscou tão rápido quanto o
Flash.
Não lidei com Jenna por semanas, não lidei com mamãe por semanas e o papai já nem se importava. Ele nunca se meteu nas brigas de Jenna e eu. Ah! Eu também não lidei com o , por semanas, meses… Na verdade, ele quis conversar, se explicar, se desculpar, mas eu não quis ouvir. Desejei boa sorte quando nos esbarramos a última vez no elevador e eu carregava o resto das minhas mudanças da casa dos meus pais. E nunca mais direcionei qualquer palavra para o que não fosse como meu cunhado que, claro, eu não ficava exibindo neste posto por aí. Nossa interação era algo como “vai ter aquela reunião de família que não posso evitar”.
O Caíque sempre soube de tudo porque quando foi me buscar, eu tive que contar para ele o que houve e a razão por eu chorar como uma bezerra desmamada o trajeto todo do Leblon até a Barra. O Caíque sempre foi um puta companheiro! Eu saí da casa dos meus pais para o apartamento dele. Iniciamos um namoro oficialmente, moramos juntos por cinco meses e depois eu saí da casa dele para o meu apartamento próprio quando notei que Caíque estava pensando em oficializar mais uma coisa. Ele pensou em casamento e eu fui sincera: não quero. Nunca pretendi, na verdade.
Ficamos juntos por três anos. O mesmo tempo que levou para a filha de uma égua da Jenna me ligar dizendo com toda a hipocrisia do universo que não amava o . O mesmo tempo completado até mês passado, quando Caíque pediu para terminar. Era coisa do Luquinhas, eu tenho certeza! Luquinhas é meu sobrinho, o filho da Jenna com o , e que mês passado no aniversário dele, perguntou ao Caíque e eu, quando nós teríamos um bebê. Na frente de todo mundo gerando aquela pressão e situação
adorável. Tinha que ser filho da Jenna…
Depois daquilo, o Caíque realmente ficou
abublé das ideias. Queria conversar sobre nosso futuro, mas eu continuei dizendo que não queria me casar. E foi aí que ele terminou. E não bastasse eu ainda estar sofrendo, porque sim, eu ainda o amo, agora me vem a Jenna na noite passada dizer aquela barbaridade…
•–•–♦–•–•
“Porque você não pode sair dos trilhos, somos como carros num cabo. E a vida é como uma ampulheta colada na mesa. Ninguém consegue achar o botão de voltar, garota! Então coloque a mão na sua consciência, e respire, apenas respire, respire, apenas respire.”
Jenna e eu nunca fomos inimigas, apesar de sermos implicantes e termos as nossas brigas de irmãs. Depois do que aconteceu entre ela e o , levou um tempo, um ano precisamente, para eu voltar a falar com ela como antes. Ela até queria que eu fosse a madrinha do Luquinhas, mas pera lá, eu não posso ser só a tia? Neguei, lógico. Que ideia… Eu amo o Luquinhas, cuido, cuidaria e cuidarei dele qualquer que seja a circunstância, mas daí aceitar aquele pedido dela na época em que o menino nasceu e eu ainda estava sofrendo… Era demais para a minha cabeça! Graças a Deus, mamãe deu um tapa na cabeça da Jenna, colocando o juízo no lugar. Então eu era só a tia do Lucas, irmã da Jenna e ainda assim, apesar da vagabundagem dela, amiga.
Mesmo querendo evitar todas as chamadas dela nos dias seguintes, eu não evitei por tantos. Me recuperei mentalmente e fui até o apartamento dela, no mesmo prédio da nossa família, no Leblon. Quando eu cheguei lá, estavam mamãe, papai, Daniel, Marília e o reunidos na sala, com expressões nada felizes.
— A senhorita chegou. — A governanta falou entrando na sala comigo, e só então a atenção de todos se voltou para mim.
— Cadê o Luquinhas? — perguntei sentindo sua ausência diante da atmosfera pesada do lugar.
— Com a babá passeando na praia. Não é ambiente para uma criança. — me respondeu encarando-me doloroso.
— Bem, e qual o motivo de estarem todos aqui? Eu só vim ver a Jenna, não esperava que…
— Sua irmã tem outro homem! — Marília interrompeu-me encarando-me como se eu tivesse culpa.
— Isso não é verdade, Marília, ela ainda não nos contou o que houve! — Mamãe defendeu.
— Ela confessou ao que é essa a razão para esse teatro todo! — Marília rebateu.
Enquanto mamãe e a sogra má discutiam, eu me lembrei de Jenna no telefone comigo, duas noites antes, dizendo que errou com o Alberto. Alberto… Alberto… — eu observava a tudo calada tentando puxar o nome na memória — Alberto…! O Beto! O ex-namorado dela antes de nós ficarmos milionários.
— Jenna, a gente pode conversar lá no seu quarto? — falei ignorando todo o resto.
Minha irmã assentiu e nós duas seguimos sob os olhares hipócritas de todo mundo. Assim que entrei fechando a porta, Jenna se jogou na cama de casal dela, chorando como a excelente mimada que era.
— Eu sou uma vagabunda, não é, !? — ela chorava abafada no travesseiro, imatura e arrependida.
— É, você é. — falei cruzando os braços e me escorando na sua penteadeira chique. — Mas de que adianta o atestado de vadiagem agora?
— , você me perdoa? — Jenna pediu se levantando de sopetão com o rosto todo borrado de rímel — Eu me meti na história de vocês e… E… E olha só que capeta que eu fui!
— Jenna! — chamei firme — Não vamos voltar a falar desse passado, por favor! Eu quero saber o que aconteceu! Você não ia admitir que o lance com o foi um capricho seu, assim, do nada! O que houve? Reencontrou o Beto, não é?
— , o Beto vai casar! — Jenna falou desesperada indo até a própria bolsa e me estendendo o convite que tinha escondido. — Encontrei ele outro dia no salão de uma amiga nossa… Ele me convidou, mas… Como ele pôde, ? Ele disse que nunca esqueceu a nossa história! Por que me dizer isso, se foi ele quem terminou comigo e por que me torturar com esse convite?!
Jenna chorava compulsivamente e eu suspirei interpretando a situação como ela realmente era.
— Então ele quis dizer que está se casando, mas ainda ama você. É por isso que você admitiu seu erro?
— Ora, Jenna… — ela me olhava desentendida — Não acabou. Por que ele diria a você que não te esqueceu e te entregaria o convite de casamento, se não fosse uma última, discreta e até desesperada, manobra de esperança? Você já falou para ele o que ainda sente?
— Não. Eu só descobri que ainda o amo noites atrás.
— Então você precisa tomar uma atitude. Seja para contar a ele, ou fingir que nada aconteceu e tentar consertar as coisas ali na sala.
Jenna refletiu uns momentos e de repente, rompeu nosso silêncio com um erguer do corpo em ato de coragem.
— Leva o Luquinhas para sua casa e fica com ele essa semana para mim?
— Levo, claro. Mas o que você vai fazer?
Jenna começou a arrumar uma bolsa com as coisas dela e me pediu ajuda. Depois fomos ao quarto do Lucas e ela arrumou as malinhas do filho para passar uma semana na minha casa.
Saímos pelo corredor e uma torrente de vozes confusas e julgadoras caíram sobre nós, mas Jenna ignorou a todos. Foi diretamente até o e disse:
— Preciso organizar algumas coisas dentro de mim, e você também. Até porque eu não fui a única a vomitar arrependimentos, não é? — Ela falou e olhou em minha direção, e eu desviei os olhos, então ouvi minha irmã continuar: — A vai ficar com o Luquinhas na casa dela essa semana. A gente precisa tirar ele desse ambiente no momento…
— Tudo bem. — disse apenas, olhando pra mim de novo.
Jenna foi até mamãe e papai, e disse que mandaria notícias logo, pediu que ficassem com o Luquinhas se ela não voltasse em uma semana, ou se eu não pudesse ficar com ele. Marília protestava sua elegante prepotência e julgo, mas a épica frase de mamãe caiu como uma luva:
— Pelo amor de Deus, cale essa sua boca arrogante, Marília! Estamos no meio de uma crise! Nossos filhos estão em crise! Não é possível que você só olhe para o seu próprio cu!
E a nada elegante, a linda raiz baixesca da pobreza presente em nossa família, como diria Marília, calou a dondoca.
Jenna saiu e eu a acompanhei, telefonou para a babá e nos encontramos com eles na orla da praia. Ela beijou o filho e disse que viajaria, mas voltava logo. Meu sobrinho não tinha idade suficiente para entender nada, mas adorou saber que eu havia ido buscá-lo para passear na minha casa. Depois que Jenna voltou para o seu próprio carro, eu subi com Luquinhas e a babá. Peguei as coisas dele, levei ao meu carro e retornei ao prédio, para me despedir dos meus pais e descer com meu sobrinho. Mamãe me perguntou se eu estava bem, e como fingida de forte que eu era, apenas mordi uma fatia de bolo da sua cozinha e afirmei. Em seguida, voltei ao apartamento da minha irmã e depois do menino ficar um pouco com o pai, fui para minha casa com ele.
— Obedeça direitinho a sua tia… — falou com o filho, da porta do seu apartamento, ainda em transe por conta do ocorrido e olhando pra mim, ele agradeceu: — Obrigado, , por ficar com ele e por estar aqui.
— Não tem que agradecer. É o meu sobrinho e a minha irmã. Lógico que eu viria. — desconversei pegando a criança no colo — Vamos pra nossa aventura, super Lucas?
— Vamos, titia ! — ele gritou animado.
Dei as costas e segui com meu sobrinho. E enquanto o elevador descia, eu mentalizava as mesmas palavras que eu disse para Jenna quando ela arrumava as malas:
“Respira garota, respira!”
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“Em maio, ele fez 21 anos na base de Fort Bliss. Nesse dia, sentou-se com uma garrafa na mão, ele não está sóbrio talvez desde outubro do ano passado. Aqui na cidade você pode perceber que ele esteve triste por um tempo, mas, meu Deus, é tão bonito quando aquele garoto sorri! Quero abraçá-lo, talvez eu só cante sobre isso”.
Depois de dez dias que Luquinhas estava comigo, mamãe pediu que o levasse para casa. Jenna ainda não havia voltado ou dado notícias que pudessem verdadeiramente nos informar sobre seus passos. E quando cheguei no apartamento dos meus pais, Lucas foi recepcionado com alegria pelos avós, João e Ivone, e pela babá que ali o esperava. Ele me abraçou fortemente, agradeceu a nossa divertida estadia juntos e acompanhou a babá para sua casa no andar abaixo do nosso. Luquinhas era uma criança de três anos de idade apenas, mas muito educado e comunicativo dentro da sua linguagem infantil.
— Jenna não deu notícias? — perguntei à mamãe me sentando no sofá ao lado do papai, que me abraçou logo que ficamos apenas nós.
— Sua irmã enlouqueceu! — papai resmungou — Eu gostaria de entender o que aconteceu!
— Você sabe de alguma coisa, não é? — Ivone me encarava com a sua altivez de mãe quando queria me fazer confessar algo. Por isso, eu apenas suspirei antes de responder:
— Ela reencontrou o Beto por acaso e ele a convidou para o casamento dele. Mas, se vocês se lembram dele como eu, o Beto era persistente e fez questão de dizê-la que não se esqueceu da história dos dois. Foi aí que a Jenna descobriu que não ama o . E eu a aconselhei a ser franca com os próprios sentimentos, então ela foi contar para o Alberto que ainda o ama. É tudo o que sei.
Papai suspirou pesaroso e trocou olhares culpados com mamãe.
— Era você quem deveria ter se casado com o … — João, meu pai, disse pegando em minha mão: — É nítido que ele agiu por pressão da família quando se envolveu com a Jenna.
— Isso não importa mais, papai.
— É, não importa! Logo a se casa com o Caíque. Não vamos bagunçar mais ainda essa família…
Encarei minha mãe com olhos esbugalhados só então me dando conta de que não havia informado a eles do fim do relacionamento há um mês.
— Ahn… Mãe, pai… Eu não contei antes porque ainda estava digerindo um pouco as coisas, mas… Há um mês o Caíque e eu terminamos.
— O quê?! — mamãe se alarmou indignada. Ela adorava o Caíque.
— Como assim, o que houve ? — Papai mais brando e menos surpreso do que ela, perguntou.
— Ele queria casar e ter filhos, e eu não. Não tinha como arrastar mais tempo, não é?
Os dois silenciaram e de novo trocaram olhares antes de minha mãe me perguntar com uma curiosidade comedida:
— Por que você não quer casar e ter filhos?
— Gosto da vida que eu e Caíque tínhamos, livre e sem muitas preocupações futuras.
— Então só não quer casar e ter filhos com ele?
Silêncio. De todas as partes. E um olhar de expectativa dos dois para comigo.
— Eu amo o Caíque, mamãe. Mas não temos os mesmos planos, apenas isso. — E antes que ela se delongasse mais e mais com perguntas eu já fui me levantando do sofá e me despedindo: — Agora eu tenho que ir. Tenho compromisso de trabalho e só passei mesmo pra deixar o Luquinhas.
— … — papai se levantou pegando minha mão, sério e preocupado ao contar: — O não está bem desde o dia que a Jenna saiu, e pode ter certeza que não é por causa da sua irmã.
— Ele… — mamãe imitou o gesto do papai ao me olhar e segurar minha mão, enquanto contava: — Está realmente confuso. Todos os dias passa as tardes na orla, bêbado. Capaz de você encontrá-lo sentado lá no forte agora.
— Marília e Daniel não surtaram? — perguntei estranhando a informação, já que claramente era típico dos pais dele evitar aquele tipo de constrangimento com o nome da família.
— Os Dantas viajaram logo depois do escândalo e eu duvido que saibam o estado em que o filho está. — Mamãe contou em tom de julgamento.
— Eu conversei com o , falei que ligaria pro Daniel e o pai dele com certeza daria um jeito de adiar os negócios que os fizeram viajar quando soubessem… — papai explicava e eu interrompi concluindo:
— Mas o não aceita demonstrar fraqueza para os pais. Ele jamais faria isso se os Dantas estivessem por perto.
— Exato, você o conhece bem. — Papai falou — disse que para eles seria um prato cheio de jogar na cara dele o envolvimento errôneo com a nossa família desde o princípio… Ele disse que prefere evitar esse conflito por agora.
— Evitar enfrentar o preconceito dos pais é algo que ele fez desde o começo. — Mamãe de novo alfinetou, mas suspirou arrependida ao reconhecer: — Embora eu confesso que nós também não apoiamos vocês dois quando soubemos, mas sabe filha… A gente só sabia que o mundo dos dois era diferente demais e iria colidir…
— Não tem desculpa, Ivone. Se nós tivéssemos passado segurança pra , ela nunca teria escondido que namorava o playboy filho dos vizinhos intragáveis, e a festa da Carminha teria sido diferente. A infelicidade de Jenna e é um pouco nossa culpa.
A confissão dos meus pais me abalou um pouco, e eu não consegui dizer muita coisa. Apenas retirei deles uma culpa que eu não acreditava que os pertencia:
— Não foram vocês que terminaram o nosso namoro e o fizeram se envolver com a Jenna, não se culpem. — declarei e respirei profundamente, soltando a mão dos meus pais e perguntando de braços cruzados, na defensiva por tudo o que ouvia: — E vocês me dizem dessa situação dele por quê? Esperam que eu vá até ele, por acaso?
— Não esperamos nada. Só achei que deveria saber, filha. — papai encerrou o assunto.
Abracei aos dois e assenti silenciosa. Em seguida, me despedi acenando da porta da sala e saí do prédio. Entrei no meu carro e fui dirigindo para casa, mas realmente, avistei sentado sozinho, vislumbrando o mar e o pôr-do-sol. Ele erguia um garrafão de alguma bebida virando-a no gargalo. Eu deveria ter dirigido e fingido que não vi, mas como poderia? Estacionei e caminhei até ele, me aproximando devagar.
— , você deveria estar em casa pra receber o Luquinhas. — falei sentando-me ao lado dele.
Meu cunhado e ex-amor, assim que escutou minha voz, virou o rosto em minha direção, sorrindo largo, radiante e com os olhos inundados de um brilho arrependido.
— Por que está fazendo isso? — perguntei encarando-o com compaixão — Meus pais disseram que está sendo um hábito frequente se embebedar na orla.
— Eu só… Me aproveitei que você estava cuidando do Lucas e que meus pais viajaram por uma temporada para ficar na fossa… — suspirou e perguntou sobre o filho: — Ele está bem?
— Uhum. Deixei com a babá no seu apartamento. Provavelmente já tomou banho e está esperando o papai. Ele não parou de dizer que estava com saudade de você e da Jenna nem um minuto.
— Ele conseguiu dormir de novo? — perguntou preocupado.
— Sim, desde que fiz o que você falou, ele não teve mais problemas para dormir sem vocês… Mas e agora, ? Você tem que ir pra casa.
— Por que ela separou nós dois se não me amava, ?
A pergunta dele, repentina, me caiu como uma bigorna. Como um elefante que invade a sua sala e você não tem como guardar no armário.
— Ela não nos separou… Você quem terminou comigo sem motivo, viajou e quando voltou já não éramos mais um casal. Eu só não entendi porque se envolveu com a minha irmã, .
— … — largou a garrafa ajeitando a postura de seu corpo pra me olhar diretamente, aflito, e explicou: — Ela nunca te contou?
— Que eu terminei com você porque no dia seguinte do aniversário da Carminha, eu descobri que havia dormido com a Jenna.
— Aquele fim de festa que nossas mães nos tiraram do salão. Eu não sei mais o que houve quando cheguei em casa, a gente estava muito bêbado, mas acordei e sua irmã estava dormindo comigo. Teoricamente, eu transei com ela bêbado e não lembro de nada. Mas não achei certo mentir pra você, então eu queria te contar e terminar tudo. Só que não tive coragem. Quando encarei seus olhos no outro dia, eu não conseguia simplesmente dizer que transei com a sua irmã! Por isso eu só… terminei e fugi.
Eu não consegui dizer muito. Era um choque saber que o foi tão covarde e até mesmo burro. Era típico da Jenna fingir um cenário daquele, porque não era a primeira vez que ela fazia aquele tipo de pegadinha comigo. Mas omitir por todo o tempo… Os dois sabiam que eu sofri tanto com aquilo!
Como na noite em que ouvi a ligação dela dizendo que não o amava, eu perdi meus sentidos razoavelmente. Apenas me levantei da areia e dei as costas ao .
— ! Espera! — ele se levantou também e veio até mim, segurando meu punho, com sua voz desesperada para que eu o ouvisse.
— Não, . Chega. Vai para sua casa e cuida do seu filho. Não tenta se explicar, eu não quero ouvir.
Soltei meu punho da mão dele e segui para longe do meu primeiro amor. Sentei diante do meu volante e chorei. Chorei, chorei, chorei, antes de dar partida, lembrando da sombra do sorriso dele. Tão lindo sorriso, que me feria cada vez mais.
•–•–♦–•–•
“Há uma luz no final de cada túnel. Você grita porque está tão longe aí dentro, como se nunca fosse sair. Esses erros que você cometeu, vai cometê-los de novo se continuar persistindo.”
— , por favor, me dá uma chance de me redimir.
Eu não conseguia acreditar que o estava na porta da minha casa de novo. Desde o dia em que o deixei na orla da praia, ele tentava contato comigo à distância, mas eu não havia aceitado vê-lo pessoalmente ainda.
— , eu disse que não queria te ver!
— ? ? — A voz de Jenna atrás dele, parada no corredor nos encarando confusa, nos tirou a atenção um do outro. — Que bom que estão aqui, assim posso falar uma vez só com os dois.
— Jenna?! Quando você chegou e por que não mandou notícias, sua maluca? — perguntei cruzando os braços e passando por que ainda estava parado na minha porta.
— Espero que não tenha voltado achando que nada vai mudar, Jenna… — emitiu baixo.
— Eu não quero continuar casada com você . Vamos ajeitar as coisas, sim?
Os dois se olharam e mantiveram breve silêncio, e eu só queria me transmutar com a parede para não presenciar a tristeza que era aquela cena. Não era uma tristeza de um casal amoroso que termina. Era uma tristeza de um casal que estava morto desde o início, de duas pessoas que esboçavam o sentimento de pena, e acima de tudo, uma revoltante tristeza de quem se sentia injustiçada. Me mantive calada absorvendo os olhares um para o outro, que eram tão claros em suas mensagens. Eram olhares de arrependimento e perdão mútuo.
— Podemos entrar, ? — Jenna me perguntou e eu só acenei.
Mudos, os três nos colocamos sentados ao sofá da minha sala. E sem muita cerimônia ou demora, a Jenna quem começou a falar:
— Quando o Beto terminou comigo, eu achei que o universo me odiava por esfregar na minha cara o amor de vocês dois. As coisas aconteceram meio na época em que descobri o namoro de vocês. Eu estaria mentindo se não dissesse que às vezes sentia inveja da , mas no começo realmente não quis me meter entre vocês dois. Só que, com o tempo… Eu comecei a me sentir injustiçada, invejosa… O jeito que o te amava, … — Ela me olhou ao dizer aquilo: — Era tão eterno quanto o jeito que o Beto me fazia sentir. Eu queria ser amada daquele jeito de novo, mas foi o Beto quem me dispensou porque, depois que a nossa vida mudou, ele dizia que os nossos mundos eram muito diferentes e que era melhor parar antes que eu mudasse demais ao ponto de magoá-lo. O Beto nunca sentiu muita firmeza em mim e nos meus sentimentos. E pudera… O jeito como eu aceitei o fim, sem relutar, orgulhosa que só… Ele não estava errado, não é?
— Você conseguiu encontrar e falar com ele? — perguntei realmente preocupada.
— Sim… — Jenna sorriu radiante — Ele quer tentar de novo…
Eu não sabia se deveria sorrir ou me sentir mal. Lá estava a Jenna sendo o motivo do fim de outra relação.
— Minha nossa, você tirou outro cara de uma mulher que o amava… — não consegui me conter e vi os olhos dela e de se direcionarem assustados até mim. Sacudi a cabeça e abanei o ar, fechando os olhos ao me desculpar: — Desculpa! Não quis ofender eu só pensei alto…
— Você está certa. Ela realmente fez isso de novo… — declarou — Só que é claro que ela não fez sozinha.
Jenna o encarou com certa gratidão pela compreensão aparente. Então foi a vez de começar seu discurso.
— A Jenna foi uma filha da puta com nós dois, . Eu não tiro essa culpa dela. — falava olhando para minha irmã — Dormir comigo bêbado na festa da Carminha foi um jogo sujo. No entanto, depois que eu voltei pra casa aquela noite que eu aceitei seu convite pra sair, e nós dois bebemos muito ao ponto de eu te levar pra cama como uma aventura sem importância, foi um erro mútuo.
— Não diga que o Lucas foi um erro. — o interrompi, sentindo a raiva fazer nó na minha garganta e então me encarou finalmente.
— Ele não é um erro. Ele é resultado de uma escolha errada de nós dois, mas não me arrependo de ter o Lucas como meu filho. Aconteceu e eu sou apaixonado por ele e serei sempre o melhor pai possível para ele, .
— Acho bom que seja! Porque isso é o que te resta, você não pode apagar ou culpar seu filho.
— Não estou buscando culpados, ! — admitiu em tom desesperado para mim — Eu estou assumindo que foi um erro meu terminar com você sem contar o que tinha acontecido, que a razão de ir embora era porque não conseguia olhar para você sem sentir culpa pelo que fiz com a Jenna! E foi erro meu não lutar pelo seu amor quando voltei e vi o Caíque no meu lugar na sua vida! Foi erro meu, sim! A Jenna errou feio conosco, mas eu não sou uma vítima, assim como o tal do Alberto não é uma vítima dela agora! Se ele largou a noiva, ele fez isso porque quis, assim como eu desisti de lutar por você como um babaca faria, só porque você sorria em paz com aquele cara do seu lado.
— Gente… — Jenna interferiu ao perceber que eu ficava vermelha de raiva. — Pelo amor de Deus, me deixem terminar porque no fim das contas eu fui a maior culpada sim!
— Não, Jenna! Ele está certo de assumir os erros dele também! Ele não foi forçado a te engravidar!
— O Lucas é filho do Beto.
E a voz de Jenna, mais alta que a minha, nos quebrou por inteiro. O silêncio era ensurdecedor, o choque já nem fazia mais parte das minhas ações. Pelo contrário, depois de tantas reviravoltas, eu fiquei mais ágil. Mais sagaz ao ponto de me levantar e me colocar em pé diante do , que estava parado em pé ao lado de Jenna, de repente. Claro que ele não faria nada com ela, mas eu agi por instinto.
— Calma, ? — Ele começou a chorar se sentindo revoltado — A sua irmã é mesmo uma vagabunda invejosa que acabou com a minha vida! Como você pôde mentir sobre isso, Jenna!?
— O Beto tinha me dispensado, mas tivemos uma recaída na mesma época que nós dois dormimos juntos, eu não tinha certeza! Eu não menti, eu realmente achei que o Lucas era seu filho, !
Jenna estava de pé chorando desesperada tentando explicar.
— , vamos ouvir a versão dela, se acalma. Senta, por favor.
Eu pedi e ele me encarou aflito. Sentou-se com as mãos segurando a cabeça, apoiado em seu joelhos, desnorteado. Jenna chorava em pé, descabelando-se de tanto que passava ao mãos nos cabelos curtos.
— Eu não tinha certeza que ele era filho do Beto, só desconfiava. Mas isso veio com o tempo… Na época que eu descobri estar grávida só passou pela minha mente que era você o pai, até o Luquinhas fazer dois anos eu não pensava que ele era filho da única noite de recaída entre eu e o Beto…
— O que te fez desconfiar, Jenna? — perguntei curiosa e letárgica.
— Além da aparência do Lucas que foi me fazendo lembrar mais o rosto do Beto, ele tem uma pintinha que nasceu quando fez dois anos e poucos meses… É parecida com a do pai… Então, eu comecei a ficar inquieta com a hipótese, mas não sabia onde encontrar ou de que maneira me aproximar do Beto pra dizer tudo… Até… Até agora.
— Você contou pro Beto? — Perguntei ansiosa.
— Contei. E eu tinha levado uma escova de cabelo do Lucas na mala, eu… Eu fiz um DNA. E ele é mesmo filho do Beto…
se levantou colérico. Ele andava de um lado para o outro, chocado, abismado, revoltado, choroso…
— Eu nunca vou te perdoar por isso, Jenna! — gritou — Você deveria ter me dito tudo muito antes! Você acabou comigo duas vezes! Me tirou a mulher que eu amava, me fez sentir culpa, me fez me sentir um lixo de homem e agora me tirou o maior amor da minha vida, que é o meu filho! Como você pode ser tão destrutiva por ser tão infeliz, Jenna!?
— … — Ela tentava falar, mas o choro embargava mais ainda a voz — Eu não espero mesmo que me perdoe, mas, por favor, não vamos nos ferir ainda mais… Eu só quero acabar com toda essa história que está me dilacerando por dentro! Eu me culpo por ter feito você sofrer, mas nada é pior do que me sentir uma bruxa com a minha irmã… Eu posso conviver sem o seu perdão, mas por favor, pela , me ajude a reparar o meu erro!
Eu nunca vi a Jenna chorar daquele jeito tão sincero. Comecei a achar que não era nem para eu estar ali.
— Vocês dois tem muito a conversar e…
— A gente se divorcia. — me interrompeu — Eu vou te pedir um tempo só pra eu entender como eu vou me comportar sobre o Lucas… É claro que o tal Beto vai assumir, não é?
— Ele quer assumir o filho e… A gente quer casar e viver outra história.
— Que ótimo pra você então! — ironizou o — Mas vamos ser cautelosos pelo Luquinhas. Ele não pode passar por um trauma. Eu não vou deixar você ser tão tóxica com ele como tem sido com todos a quem você diz que ama!
Nós três estávamos emudecidos de novo, sem saber o que falar, fazer ou como agir.
— … Me perdoa… — Jenna pediu de novo, rompendo o silêncio — Sei que já falei isso várias vezes desde aquela noite, mas… Eu vou continuar pedindo perdão a você pelo resto da minha vida!
— Para onde você vai? — perguntei mudando o assunto.
— Vou ficar no apê do papai e da mamãe, se eles não me expulsarem de casa, claro.
— Certo… — suspirei — Mas, se precisar, eu tô aqui. Pode vir aqui pra casa.
— Você merecia uma irmã melhor… — Jenna chorava sentindo ainda mais culpa por eu estender minha mão a ela.
— Melhor vocês irem. Precisam lidar com muita coisa agora. E tenham cuidado com o Lucas, por favor. — falei aos dois indicando a eles o caminho da porta.
— , não tenho como dizer quando, mas… Depois que eu ajeitar essa merda toda… Será que eu posso vir aqui pra gente conversar? — me perguntou e eu apenas assenti.
Os dois saíram pela porta, estranhos um ao lado do outro. Jenna me abraçou pedindo perdão e desejando que ainda tivesse como reparar o que ela estragou entre e eu, mas eu nem tinha mente pra pensar no assunto naquela hora.
Um mês depois…
e Jenna oficializaram o divórcio. Eles ainda estavam lidando com cautela e ajuda terapêutica infantil sobre a transição não só da separação como da paternidade com o Lucas. Meu sobrinho sairia daquela sem traumas, se tudo fosse feito da forma certa. Papai e mamãe foram pouco compreensivos com Jenna pela primeira vez desde que me lembro, mas não a negaram acolhida. Minha irmã estava planejando, assim que a psicóloga de Luquinhas desse seu aval, se mudar para outra casa e viver com o Alberto, que já havia lhe pedido em casamento. E eu ainda não havia conversado com o , mas tive tempo suficiente pra pensar se eu queria ou não dar uma chance nova a nós dois, caso ele quisesse. E por incrível que pareça ou não, o Caíque foi quem me mostrou a melhor opção de novo.
A campainha do meu apartamento soou e Caíque foi atender a porta, como sempre fazia. Mas daquela vez nem foi por hábito, mas porque eu terminava de coar café e não poderia mesmo atender.
— Quem é que sobe sem ser anunciado? Deve ser um dos seus pais, não é? — Ele falou ao se direcionar até a porta.
— Meus pais me avisariam se viessem… — respondi para ele, só então me dando conta de que fora papai, mamãe, que poderiam subir direto, só havia um nome, que recentemente eu havia liberado com o porteiro.
— Pois não? — Caíque falou ao abrir a porta e eu mal podia ouvir o diálogo entre as pessoas, mesmo meu apartamento conceito aberto.
Larguei o café, com o peito palpitando de ansiedade porque se mamãe e papai não avisaram que viriam e eu ainda não escutara o grito alegre da mamãe ao ver Caíque, só poderia ser uma pessoa na minha porta… Me aproximei da sala, reconhecendo o tom de voz rouco dele:
— Desculpe, eu poderia falar com a ?
— ! É o ! — Caíque gritou e saiu de perto da porta voltando pra dentro.
Eu estava paralisada ainda desde que ouvi a voz dele. Meu ex-namorado pegou então a caixa que estava no sofá da sala e se aproximou beijando meu rosto e dizendo:
— Deixa o café para outro dia. Boa sorte, .
Assenti muda. Caíque saiu pela porta apenas dizendo para o “entra lá”, mas ele não entrou. Ouvi o som do elevador se fechando e descendo, mas não escutei passos do para dentro de casa. Então, respirei fundo e com coragem fui até a porta. Ele estava parado de costas para mim, encarando o elevador, silencioso.
— Você vai desistir de novo e ir embora? — perguntei com o sentimento de medo em meu peito.
se virou de sopetão, assustado, meio pego de surpresa com a situação. Pigarreou e coçou a nuca apontando o elevador atrás de si.
— Ele… — começou a falar e parou, depois continuou dizendo de uma só vez: — Vocês voltaram?
Meneei a cabeça em negativa, soltando um sorriso fraco e encarando meus pés.
— Não. Ele só chegou de viagem e veio buscar algumas coisas que ainda estavam aqui. Mas… Como soube que ele e eu não estamos mais juntos?
— Seus pais me contaram tempo atrás… — deu alguns passos à frente se aproximando da porta — Você o ama?
— Não quero me meter na história de ninguém.
— Você não acha que esse foi o seu erro antes? Se tivesse se metido quando nos viu na praia juntos, talvez a gente teria vivido outra história, não é?
— Então você não amava ele naquela época?
— Entra. — falei ao notar que a conversa se delongava e dei espaço de passagem a ele na porta — Acabei de fazer café.
— Você deixou de me amar algum dia, ?
Mas o ignorou meu convite, apenas mantendo as mãos no bolso da casa e me encarando tão desesperado quanto a aguardava a resposta daquela pergunta.
E bastou eu falar aquela verdade para ele entrar sem tirar os olhos dos meus. tirou minha mão da maçaneta da minha porta e fechou-a assim que entrou. Olhou ao redor o ambiente que meses antes foi o cenário de tantas descobertas e aspirou o cheiro de café recém coado que habia no ar.
Perguntei nervosamente, observando-o em expectativa de que ele dissesse o que veio fazer. Ou melhor, que tipo de conversa queria finalmente ter.
— Me aceita de volta? — Ele perguntou de volta, ainda com uma mão no bolso da calça.
— Então eu troco o café por um beijo.
Entre a minha coragem de dizer o que eu queria, jogando por terra todo e qualquer preconceito, dúvida ou medo por tudo o que havia ocorrido em nosso passado, e a coragem de em pedir um beijo, tão sublime e magnéticos foram os segundos que levaram-nos a nos aproximar calmamente um do outro. A mão que estava na maçaneta da porta veio para o meu rosto, e a que estava no bolso para minha cintura. E meu corpo, todo paralisado e rígido de ansiedade, respondeu sem nenhuma hesitação que o aceitava de volta, demonstrando tudo aquilo quando se derreteu em seus braços. me beijou com toda a saudade que sentíamos daquele ato, com todo o afeto que tínhamos um pelo outro e com toda a maturidade que só uma história de amor interrompida aprende a ter, quando é chegado o seu momento de respirar de novo.
Fim
Nota de autora: Espero que vocês tenham gostado da história e comentem. Mesmo se não gostarem, receber seu feedback é importante pra mim. Muito obrigada a quem leu até aqui! ♥
Como eu te disse no seu privado, a sua escrita poética sempre me encanta! Não falha nunca! A história me prendeu do começo ao fim, me despertou inúmeros sentimentos e o enredo é de tirar o fôlego! E claro que isso só podia sair da sua cabecinha incrível! Te admiro tanto 🫶🏻 obrigada por sempre criar personagens felinas fodas! É isso Ray!
Ai amiga, eu fico me sentindo muito realizada quando vocês dizem que eu tenho “uma escrita poética” ♥ E que bom que ela não falha hahahaha Eu venho numa onda de escrever histórias coreanas há muito tempo que até sentia falta das minhas narrativas mais brasileiras (porque NCDF também já estou há muito tempo mergulhada, e tals) então elas me soam um pouco de respiro e identidade. Já te falei no pvt também o quanto eu fiquei preocupada com esse enredo né, mas conhecer sua opinião me deu um renovo e um orgulho próprio! Obrigada por isso, Tiza! ♥ Eu quem agradeço SEMPRE! ♥