Quarto Capítulo:
A chuva não tinha parado, e o vento cortava como facas enquanto caminhava apressada em direção ao metrô. Eu a segui, sem me importar com os olhares curiosos ou com os pés encharcados que escorregavam na calçada molhada.
— , espera! — gritei, minha voz abafada pelo barulho dos carros e da tempestade.
Ela não diminuiu o passo, mas o ombro dela ficou tenso, como se cada palavra minha fosse um peso a mais que ela não queria carregar.
— Não há mais nada para dizer, — ela disparou por cima do ombro, sem sequer me olhar.
— Não é verdade! — Acelerei o passo, tentando alcançá-la. — Por favor, me deixa explicar!
— Explicar o quê, exatamente? — Ela parou de repente, me obrigando a quase tropeçar para evitar esbarrar nela. se virou, os olhos brilhando, mas não de lágrimas. Era raiva. — Explicar como você destruiu tudo o que construímos? Ou como você sempre me fazia dizer coisas que eu não queria? Coisas que me machucavam?
Engoli em seco, mas não consegui responder. Ela aproveitou o silêncio para continuar:
— Você sempre teve esse poder sobre mim, sabia? Me fazia acreditar em promessas que nunca seriam cumpridas. Me fazia dizer que estava tudo bem quando não estava. E eu… eu deixava.
— , eu sei que errei, — comecei, minha voz mais baixa. — Mas eu nunca quis que fosse assim. Eu só…
— Você só o quê? — Ela deu um passo à frente, os olhos fixos nos meus. — Sempre soube que eu te amava o suficiente para tentar consertar o que você quebrava. Sempre soube que eu ficaria, não importa o quanto você me empurrasse para longe.
Ela passou a mão pelos cabelos molhados, respirando fundo como se tentasse manter o controle.
— Eu fiz de tudo por você, — ela continuou, o tom agora mais calmo, mas ainda afiado. — Eu tentei tanto nos manter inteiros, mesmo quando parecia que você fazia questão de nos despedaçar. Mas sabe o que eu percebi?
Eu não queria ouvir. Não queria que ela dissesse, mas sabia que precisava.
— Eu não posso continuar remendando algo que você não se importa em quebrar.
— Isso não é verdade! — exclamei, a voz mais alta do que eu pretendia. — Eu me importo. Sempre me importei!
Ela riu, mas foi um som frio, vazio.
— Se você realmente se importasse, não teríamos chegado a esse ponto.
Ela começou a se virar, mas estendi a mão, segurando seu braço.
— Eu posso mudar, . — Minha voz tremeu. — Me dá uma chance. Eu posso consertar isso.
Ela se desvencilhou do meu toque, os olhos brilhando com algo que parecia ser mais dor do que raiva agora.
— Você sempre acha que pode consertar as coisas quando está prestes a me perder, — ela murmurou. — Mas eu não posso mais viver esperando por algo que nunca vai acontecer.
Ela deu mais um passo para trás, afastando-se.
— Você pode fazer o que quiser, — ela disse, a voz quase se perdendo no barulho da chuva. — Pode criar um mundo com seus sonhos quebrados, pode até tentar consertar os seus erros, mas eu não vou voltar.
E com isso, ela se virou e desapareceu entre as pessoas que entravam no metrô. Eu fiquei ali, parado, com a chuva escorrendo pelo rosto e a sensação esmagadora de que, pela primeira vez, ela realmente tinha ido embora.
⚠️⚠️⚠️
“Calling all day, tryna make things right
Just to fuck it all up when I see you tonight
Since you told me, hit the road
I’ve been running on empty
If anything I know, it’s how to ruin a happy ending”
Quinto Capítulo:
O dia começou com o som irritante da chuva batendo na janela, mas o que realmente me incomodava era o silêncio. O tipo de silêncio que deixava quando decidia que não me daria mais atenção.
Eu liguei para ela. E liguei de novo. O telefone chamou até cair na caixa postal. Então tentei outra vez. E outra.
Nada.
Era como se cada ligação sem resposta fosse uma nova confirmação do que eu já sabia, mas ainda não queria aceitar: ela estava me ignorando, e eu provavelmente merecia isso.
No trabalho, eu estava ali de corpo, mas minha mente permanecia presa a . Meus colegas faziam perguntas, e eu respondia com um aceno de cabeça ou um murmúrio qualquer. Nada que exigisse muito raciocínio.
Entre uma tarefa e outra, eu checava o telefone, esperando alguma notificação. Um “
oi”, uma mensagem, qualquer coisa. Mas o silêncio seguia me esmagando.
Tentei concentrar-me, mas até as coisas mais simples pareciam insuportavelmente complicadas. Papeis se acumulavam na minha mesa, e eu apenas empurrava de um lado para o outro, sem resolver nada. A cada pausa, o telefone voltava à minha mão, mas a tela continuava vazia.
Quando finalmente voltei para casa, o cansaço me abateu. Meu corpo parecia pesado, mas minha mente ainda estava inquieta, repleta de cenas dela que eu não conseguia apagar. Joguei-me na cama, os pensamentos me perseguindo até o sono.
E foi lá que ela me encontrou de novo.
No sonho, ela estava rindo. O som suave e familiar, como música. Nós estávamos juntos, mas era uma lembrança distorcida, um amontoado de momentos felizes que agora pareciam tão distantes. Ela estava perto, mas eu não conseguia alcançá-la, como se algo invisível nos mantivesse separados.
Acordei com o peito apertado e o quarto mergulhado em penumbra. O relógio marcava pouco depois das nove da noite.
Levantei-me, indo direto para o chuveiro. A água quente escorria pelo meu corpo, mas não fazia nada para aliviar o peso na minha mente. Saí ainda molhado, prendendo a toalha ao redor da cintura, e me joguei no sofá, o celular já na mão.
Foi aí que vi.
Uma notificação nas redes sociais. Uma amiga dela havia postado stories: , com um sorriso que me doeu mais do que qualquer insulto que ela pudesse me lançar. Ela estava no bar. A localização marcada.
Meu coração disparou.
Eu sabia que era uma má ideia. Sabia que, se eu aparecesse, provavelmente estragaria tudo mais uma vez. Mas a ideia de ficar parado, de não fazer nada enquanto ela estava tão perto, era insuportável.
Levantei-me rapidamente, trocando de roupa com mãos trêmulas. Não sabia exatamente o que ia dizer ou fazer, mas naquele momento, só uma coisa importava: eu precisava vê-la.
Peguei as chaves e saí porta afora, com a imagem dela ainda fresca na minha mente e uma determinação que beirava o desespero.
O bar estava lotado, um caos de vozes, música alta e luzes piscando. Mesmo assim, meus olhos encontraram facilmente. Ela estava no balcão, rindo de algo que o cara ao lado dela dizia. Ele estava inclinado para mais perto do que eu conseguia suportar, como se estivesse à vontade demais.
A cena fez meu sangue ferver, mas ao mesmo tempo, um medo frio percorreu meu corpo. E se eu realmente a tivesse perdido?
Não pensei duas vezes antes de atravessar o espaço entre nós.
— . — Chamei-a com firmeza, minha voz cortando o som ambiente.
Ela levantou os olhos para mim, surpresa por um momento, mas logo sua expressão se fechou.
— O que você está fazendo aqui? — perguntou, a voz baixa, mas carregada de irritação.
O cara ao lado dela olhou de mim para ela, desconfiado.
— Quem é ele? — Ele perguntou, claramente desconfortável.
Antes que pudesse responder, eu disparei:
— Eu sou o cara que está tentando consertar as coisas. Podemos conversar?
Ela suspirou, parecendo cansada.
— Isso não é hora, nem lugar, — respondeu, voltando sua atenção para o homem. — Desculpa, mas acho que minha noite acabou.
— Tem certeza? — Ele insistiu, parecendo querer se certificar.
— Tenho, — ela disse, claramente tentando encerrar a conversa.
O rapaz deu de ombros, claramente desconfortável com a tensão no ar, e saiu sem dizer mais nada. Assim que ele desapareceu na multidão, levantou-se, pegou sua bolsa e saiu em direção à porta.
Eu a segui, incapaz de simplesmente deixá-la ir.
— , espera. — Minha voz soava quase desesperada, e eu sabia disso.
Ela parou no meio da calçada, virando-se para mim com os olhos faiscando.
— O que você quer de mim ? — perguntou, cruzando os braços.
— Quero uma chance, só uma. Quero explicar tudo, consertar o que eu estraguei. — As palavras saíram apressadas, quase tropeçando umas nas outras.
— Você já teve chances demais. — Ela balançou a cabeça. — Eu cansei de esperar, de ouvir promessas que nunca se concretizam.
— Eu sei, — murmurei, dando um passo à frente. — Sei que estraguei tudo, mas, , eu não consigo desistir de você.
Ela ficou em silêncio por um momento, os olhos avaliando meu rosto. Algo no jeito como me olhava parecia menos frio, mas ainda havia uma barreira ali, difícil de atravessar.
— Por que agora? — perguntou, sua voz mais suave, mas ainda carregada de mágoa.
Eu não tinha uma resposta perfeita, então fui honesto:
— Porque só agora eu percebi o quanto você significa para mim.
Ela abriu a boca para responder, mas as palavras não vieram. Antes que pudesse se afastar de novo, eu dei mais um passo à frente, reduzindo a distância entre nós.
— Por favor, só me diz que ainda sente alguma coisa, — pedi, minha voz quase quebrando.
Por um instante, parecia que ela ia embora. Mas então, como se algo dentro dela cedesse, ela me puxou pela gola da camisa e me beijou.
Foi intenso, desesperado, carregado de todas as emoções que nós dois vínhamos acumulando. Por um momento, nada mais importava além do toque dos seus lábios nos meus.
Quando ela finalmente se afastou, respirávamos ofegantes.
— Isso não muda nada, — ela disse, mas sua voz estava fraca, quase um sussurro.
— Talvez não, — respondi, segurando seu rosto entre minhas mãos. — Mas ainda assim, você me beijou.
Ela balançou a cabeça, parecendo frustrada consigo mesma.
— Você me tira do sério, — murmurou antes de se virar e começar a andar.
Eu a deixei ir, desta vez sem tentar segui-la. Fiquei ali parado, a sensação do beijo ainda ardendo nos meus lábios, enquanto o som dos seus passos se perdia na distância.
⚠️⚠️⚠️
“And I remember when you still needed me
Don’t know how I let it go so easily
Now, I’m the cloud to your sunny days
Reason you run away
Don’t know how I keep making the same mistakes
Maybe I never deserved you anyway”
Sexto Capítulo:
Era Natal, e eu sabia o quanto amava essa época do ano. Sabia também que, se pudesse, ela fugiria de tudo que a lembrasse de mim. E, como já era previsível, ela havia ido para a casa dos pais, na mesma cidade onde os meus também viviam.
Era óbvio que lá estava eu, sentado na sala da casa dos meus pais, cercado pelas mesmas decorações natalinas que eu via desde criança. A árvore de Natal, cheia de luzes piscantes e enfeites antigos, não conseguia me distrair do verdadeiro motivo da minha presença ali: .
Eu não estava ali apenas para passar o feriado com a minha família. Estava esperando a oportunidade de vê-la, nem que fosse de longe. Como se esperasse um milagre de Natal, algo que, sinceramente, eu não merecia.
Enquanto meu pai ria alto com algum filme antigo que sempre passava nessa época e minha mãe arrumava mais pratos na mesa, eu olhava pela janela. Meu coração apertava com a ideia de que ela estava tão perto e, ao mesmo tempo, completamente fora do meu alcance.
Na minha cabeça, eu ensaiava todas as possibilidades. Talvez ela fosse à missa da meia-noite, como fazia todos os anos. Talvez eu a visse caminhando pela praça, como era seu hábito. Cada pequeno “talvez” se agarrava a mim como uma desculpa para não desistir.
— Você está distraído — comentou minha mãe, sentando-se ao meu lado no sofá.
— Só pensando, mãe. — Tentei sorrir, mas sei que não convenci.
Ela suspirou e passou a mão pelo meu cabelo, um gesto que sempre fazia quando eu era criança e algo me incomodava.
— Se está pensando nela, por que não faz alguma coisa? — perguntou suavemente, como se lesse meus pensamentos.
— E se ela não quiser me ver? — Minha voz saiu baixa, quase inaudível.
Minha mãe apenas sorriu, aquele sorriso típico de quem acredita em milagres.
— Às vezes, o Natal traz respostas que a gente nem espera.
E assim, fiquei ali, esperando… esperando que, de alguma forma, fosse uma dessas respostas. Que o destino nos cruzasse novamente, nem que fosse só para me dar a chance de vê-la, mesmo que à distância.
Meus pensamentos foram interrompidos por batidas na porta. O som ecoou pela sala, me trazendo de volta à realidade.
— , abre a porta, querido? — pediu minha mãe, já se levantando para buscar algo na cozinha.
Levantei-me lentamente, passando as mãos nos cabelos para tentar parecer menos abatido. Caminhei até a porta, ainda meio perdido em meus próprios pensamentos, e a abri.
Para minha surpresa, quem estava ali era ninguém menos que a mãe de .
— Senhora Caruso? — Minha voz saiu hesitante, quase um sussurro.
— ! — Ela sorriu educadamente, mas havia algo de constrangido no seu olhar. — Sua mãe está? Preciso falar com ela sobre… um detalhe do jantar na igreja.
Eu engoli em seco, tentando esconder o nervosismo.
— Claro, claro… Entre, por favor. — Dei espaço para que ela passasse, sentindo meu rosto esquentar.
Ela entrou com a mesma elegância discreta de sempre, os olhos percorrendo rapidamente a sala como se estivesse avaliando cada detalhe. Eu fechei a porta atrás dela, tentando recuperar algum senso de normalidade.
— Só um instante, vou chamar minha mãe. — Apontei para o sofá. — Pode se sentar, se quiser.
— Obrigada, querido. — Ela assentiu, mas não se sentou, preferindo ficar de pé ao lado da árvore de Natal, observando os enfeites como se tentasse preencher o silêncio.
Caminhei rápido até a cozinha, encontrando minha mãe ainda organizando pratos.
— Mãe, é a senhora Caruso. Ela quer falar com você.
Minha mãe ergueu as sobrancelhas, surpresa.
— Oh, sobre o jantar, claro. — Limpou as mãos no avental e me lançou um olhar curioso. — Você parece nervoso, . Está tudo bem?
— Sim, só… só vai lá falar com ela. — Fiz um gesto para que ela fosse, desviando o olhar.
Ela riu baixinho, claramente percebendo o meu desconforto, mas foi até a sala sem dizer mais nada.
Enquanto elas conversavam, fiquei parado na cozinha, a cabeça girando. Tê-la ali, a mãe de , tão perto, trazia uma onda de lembranças e emoções que eu estava tentando evitar. Era como se o universo estivesse conspirando para me lembrar de que ainda fazia parte de mim, mesmo que ela não quisesse.
Fiquei encostado na parede da cozinha, ouvindo o murmúrio das vozes vindas da sala enquanto minha mãe conversava com a senhora Caruso. Minhas mãos estavam enterradas nos bolsos, e meu olhar perdido no chão.
Era óbvio que estaria no jantar da igreja. Essa tradição era importante para ela e sua família, algo que ela sempre fazia questão de manter, mesmo nos momentos mais difíceis. Eu sabia disso melhor do que ninguém.
Mas a pergunta que me consumia era: eu deveria ir?
Por um lado, minha presença poderia ser um desastre. Eu já havia causado estragos suficientes, não queria transformar o Natal dela em mais um motivo de desconforto. Ela merecia paz, merecia um momento com a família sem que eu estivesse lá para lembrar tudo o que deu errado entre nós.
Por outro lado, era como se uma parte de mim acreditasse que essa poderia ser a minha chance de… eu nem sabia bem o quê. Reparar algo? Me redimir? Era ridículo pensar que algumas palavras e um sorriso no meio de uma noite festiva poderiam consertar meses de erros e mágoas.
Passei as mãos pelo rosto, frustrado.
Eu não sabia o que fazer. Não queria ser egoísta, aparecer lá e arriscar estragar a noite dela só porque eu sentia falta dela. Mas, ao mesmo tempo, o pensamento de não vê-la, de deixar essa oportunidade escapar, fazia meu peito apertar de uma forma insuportável.
— ? — A voz da minha mãe me trouxe de volta.
Levantei a cabeça e a vi me olhando com aquele misto de curiosidade e preocupação que só mães conseguem.
— O que foi? — perguntei, tentando soar casual, mas a expressão dela dizia que eu não estava enganando ninguém.
— A senhora Caruso me perguntou se você vai ao jantar na igreja esta noite. — Ela inclinou a cabeça, avaliando minha reação.
Eu travei. Meu primeiro instinto foi dizer “não”. Mas as palavras ficaram presas na garganta.
— Eu não sei, mãe… — murmurei, desviando o olhar.
Ela se aproximou, pousando a mão no meu ombro.
— Você precisa decidir o que quer, . Mas, seja qual for sua escolha, faça por você e por ela. Não por culpa, nem por medo.
Assenti, embora não tivesse certeza de que isso ajudava. Meu coração estava em guerra, dividido entre a necessidade desesperada de vê-la e o desejo genuíno de não causar mais dor.
“Talvez eu fique por aqui mesmo,” pensei. Mas, no fundo, sabia que essa decisão não seria tão simples de manter.
Minha mãe voltou para a sala, mas logo retornou com a senhora Caruso ao lado. Eu me endireitei, tentando parecer menos perdido, mas ela me lançou um olhar gentil, como se percebesse que algo me incomodava.
— , querido — começou ela, com aquele tom amável e educado que sempre usava. — Eu mencionei o jantar da igreja para sua mãe e… sei que você provavelmente já ouviu falar dele.
Assenti, tentando manter a expressão neutra, embora meu coração estivesse acelerado.
— Seu nome estará na lista, caso decida aparecer. — Ela sorriu ligeiramente. — Não quero pressionar, só achei que seria bom saber.
Minha garganta secou. Eu estava prestes a balbuciar alguma desculpa quando ela continuou:
— E, se isso te ajudar a se sentir mais confortável… não estará lá.
O impacto das palavras foi imediato. Eu ergui os olhos, surpreso.
— Ela não vai? — perguntei, sem conseguir esconder o misto de alívio e desapontamento.
— Não, querido. — A senhora Caruso suspirou, como se escolhesse bem as palavras. — Ela não estava se sentindo muito bem hoje, então preferiu ficar em casa para descansar.
Fiquei em silêncio, digerindo aquela informação. Por um lado, a ausência de significava que eu poderia comparecer sem causar desconforto a ela. Mas, por outro, tirava toda a razão de eu sequer cogitar ir.
— Pense com calma, . — Ela colocou a mão no meu braço por um instante, oferecendo um sorriso compreensivo. — Natal é uma época de recomeços, não de culpas.
Ela se despediu pouco depois, deixando-me sozinho com minha mãe, que me olhava de soslaio enquanto arrumava a mesa.
— E então? — perguntou ela casualmente, embora sua curiosidade fosse óbvia.
Eu apenas dei de ombros, ainda processando tudo.
— Não sei, mãe… ainda não sei.
Mas agora, saber que não estaria lá tornava a decisão ainda mais difícil. Se eu fosse, estaria indo por mim ou por algo que já não fazia mais sentido? E será que ela realmente estava indisposta ou estava apenas com medo que eu aparecesse por lá?
⚠️⚠️⚠️
“I can make you mad, I can make you scream
I can make you cry, I can make you leave
I can make you hate me for everything
But I can’t make you come back to me”
Sétimo Capítulo:
Acordei com o som de passos apressados vindo do andar de baixo. Pisquei algumas vezes, tentando ajustar meus olhos à luz do quarto, enquanto um peso invisível ainda parecia me prender à cama. Eu tinha dormido mais do que pretendia, mas isso não mudou em nada o cansaço que sentia.
Levantei-me devagar e desci as escadas, onde encontrei meus pais na sala, se arrumando para o jantar na igreja. Minha mãe ajeitava o casaco enquanto meu pai buscava algo nos bolsos. Eles pareciam animados, como sempre ficavam nesta época do ano.
— Ah, , você acordou — minha mãe disse ao me notar. — Ainda dá tempo de se arrumar e ir com a gente.
— Não, mãe. — Balancei a cabeça, cruzando os braços. — Eu não vou.
Ela parou o que estava fazendo e me olhou daquele jeito típico dela, como se soubesse exatamente o que se passava na minha cabeça, mesmo que eu tentasse esconder.
— Tudo bem. — Ela se aproximou, acariciando meu rosto com a mão quente. — Até meia-noite estaremos de volta. Não quero que você passe o Natal sozinho.
Suspirei, desviando o olhar.
— Eu vou ficar bem, mãe. Sabe que eu nunca liguei para o Natal.
Ela sorriu, mas havia uma tristeza nos olhos dela que me fez sentir ainda pior.
— Eu sei que o Natal nunca foi sua data favorita… mas também sei que não é só isso. — Sua mão permaneceu no meu rosto, a voz baixa, quase como um segredo. — Não precisa dizer nada, . Sei que você não está bem por causa da .
Aquela frase me atingiu mais forte do que eu esperava. Eu abri a boca para responder, mas acabei apenas murmurando:
— Obrigado, mãe. Mas não precisa se preocupar.
Ela assentiu, dando um tapinha leve no meu ombro antes de voltar para o pai.
Alguns minutos depois, os acompanhei até a porta. Ficaram mais um tempo me incentivando a pensar melhor e ir à igreja, mas insisti que não iria. Eles partiram com um último sorriso, e eu fiquei parado na entrada, sentindo o vento frio bater no rosto.
Olhei para a rua coberta de neve e pensei que talvez uma caminhada fosse o que eu precisava. A decoração natalina iluminava as casas ao redor, enchendo o ar de uma alegria que eu não sentia.
Dei alguns passos para fora, mas antes que pudesse ir longe, ouvi vozes familiares. Virei-me a tempo de ver os pais da saindo da casa ao lado, vestidos com casacos pesados e prontos para o jantar.
E então, lá estava ela.
estava na porta, encostada no batente como se mal tivesse forças para ficar de pé. Ela parecia abatida, com o rosto pálido e o olhar cansado, mas ainda assim… ela era ela. Meu coração disparou como se fosse a primeira vez que a via.
Nossos olhos se encontraram por um instante que pareceu uma eternidade. Ela não sorriu, não falou nada. Apenas me olhou, e eu não consegui decifrar o que aquele olhar significava.
Antes que eu pudesse reagir, os pais dela chamaram por ela. se virou lentamente, o rosto ainda pálido e os olhos baixos, como se estivesse em outro mundo. Notei que ela não vestia o mesmo casaco pesado que os pais, apenas um moletom confortável e meias grossas, o que deixava claro que ela não iria com eles.
Ela trocou algumas palavras rápidas com os dois, provavelmente algo sobre ficar em casa para descansar. Eles assentiram, preocupados, mas não insistiram. Depois de um abraço breve nos pais, deu meia-volta e começou a caminhar de volta para a entrada de casa.
Meu coração disparou, e por um instante pensei em chamá-la, mas as palavras morreram antes de alcançarem minha garganta. Ela não olhou para trás, não hesitou nem por um segundo. Simplesmente entrou e fechou a porta.
Fiquei parado na calçada, o ar frio queimando meus pulmões, enquanto tentava processar o que acabara de acontecer. Ela estava ali, tão perto, mas ao mesmo tempo tão inalcançável. Por mais que eu tentasse me convencer de que era melhor assim, de que ela merecia o espaço e o tempo que precisava, tudo em mim gritava para cruzar aquela distância e bater na porta dela.
Mas eu não fiz nada. Apenas fiquei ali, assistindo à casa silenciosa, enquanto o vazio dentro de mim parecia crescer ainda mais. Por mais que eu tentasse negar, era impossível fugir da verdade:
eu ainda a queria. Mais do que tudo. E talvez nunca tivesse parado de querer.
Fiquei mais alguns minutos ali fora, mesmo com o frio cortante. Olhei ao redor, observando as luzes piscando nas casas vizinhas e os flocos de neve caindo suavemente. O silêncio era quase reconfortante, como se o mundo tivesse parado por um instante.
Abaixei-me, peguei um punhado de neve e a moldei entre as mãos, sentindo o frio atravessar os dedos. Sem pensar muito, comecei a juntar mais neve, empilhando-a até formar uma base.
Eu não fazia um boneco de neve desde criança. Era algo bobo, mas no momento parecia melhor do que ficar preso aos próprios pensamentos. Fiz o corpo, a cabeça e até improvisava detalhes quando a porta atrás de mim se abriu de repente.
Ouvi o som familiar de passos leves na madeira da varanda. Antes que pudesse me virar, a voz dela cortou o silêncio:
— Vai passar o Natal sozinho, ?
Meu corpo travou por um segundo ao ouvir meu nome sair da boca dela. Virei-me devagar, e lá estava ela, encostada no batente da porta, com os braços cruzados e uma expressão cansada, mas curiosa.
Ela parecia mais frágil de perto, o rosto ainda pálido, mas os olhos estavam fixos em mim, esperando uma resposta. Eu não sabia o que dizer. As palavras se embolaram na minha mente enquanto eu tentava pensar em algo que não soasse tão ridículo quanto brincar com neve sozinho na frente da casa dela.
— Eu… — comecei, soltando o ar de forma pesada. — Acho que não tenho muitas opções este ano.
Ela arqueou uma sobrancelha, como se ponderasse minha resposta.
— Não é muito divertido, sabe. Ficar sozinho.
— Também não é muito divertido ser evitado o tempo todo — retruquei antes de conseguir me segurar.
O silêncio que se seguiu foi pesado. Ela suspirou, olhando para o boneco de neve inacabado, antes de voltar os olhos para mim.
— Talvez você tenha razão. — A voz dela era baixa, mas firme. — Mas algumas coisas precisam de tempo.
Eu assenti, mesmo que as palavras dela me deixassem com um nó no peito. Não sabia o que ela queria dizer exatamente, mas só o fato de termos trocado algumas palavras já parecia um pequeno milagre de Natal.
Ela não esperou pela minha resposta. Depois de dizer o que tinha para dizer, voltou para dentro, fechando a porta atrás de si. Fiquei ali parado por um instante, olhando para onde ela estava, tentando decifrar o que realmente queria dizer com aquilo.
Suspirei e voltei minha atenção para o boneco de neve. Talvez terminar o que eu havia começado me ajudasse a organizar os pensamentos. Ajustei a cabeça do boneco, alisei a superfície da neve e improvisei os olhos com duas pedras que encontrei no chão.
O tempo passou devagar, cada movimento meu acompanhado por uma onda de frustração. As palavras dela ecoavam na minha cabeça, e eu me perguntava se deveria ter dito algo mais. Mas o quê? Toda vez que tentava me aproximar, parecia só piorar as coisas.
Estava tão perdido nesses pensamentos que quase não percebi quando a porta se abriu novamente. O som repentino me fez olhar para cima, e lá estava ela de novo, mas dessa vez com uma expressão completamente diferente.
— Você é sempre assim tão burro ou só está se superando hoje? — ela disparou, os braços cruzados e os olhos brilhando de irritação.
Fiquei boquiaberto, incapaz de formular uma resposta.
— Como assim? — perguntei, confuso, enquanto ela descia os poucos degraus da varanda, parando a alguns passos de mim.
— Eu saio aqui fora, falo com você, dou a deixa perfeita para que você faça alguma coisa… qualquer coisa! E você simplesmente volta a brincar com a neve, como se nada tivesse acontecido! — A voz dela subiu um pouco, mas ainda assim soava rouca, como se o esforço para falar a estivesse desgastando ainda mais. — Sério, , é tão difícil assim perceber quando alguém precisa de ajuda?
Foi como se um balde de água fria tivesse sido jogado em mim. Eu me senti estúpido, completamente cego para algo tão óbvio. Ela estava doente, sozinha em casa, e eu, idiota como sempre, achava que deveria manter distância em vez de fazer algo por ela.
— , eu… — comecei, mas as palavras falharam.
Ela balançou a cabeça, exasperada, mas sua expressão suavizou ligeiramente.
— Entra logo, antes que pegue um resfriado também — disse, virando-se de volta para a porta sem esperar minha resposta.
Fiquei ali por um momento, sentindo o peso do meu erro, antes de finalmente tomar uma decisão. Peguei o cachecol que estava no pescoço do boneco de neve e o enrolei no meu próprio, seguindo-a para dentro da casa.
Assim que entrei na casa dela, fui imediatamente envolvido por uma onda de nostalgia. Tudo parecia estar exatamente como eu lembrava, como se o tempo tivesse parado ali dentro.
A sala ainda tinha aquele sofá antigo, com o estofado floral que já tinha visto dias melhores, mas que sempre dizia ser o mais confortável do mundo. As paredes estavam decoradas com os mesmos porta-retratos de sempre: fotos da infância dela, dos pais em viagens e até um retrato em grupo tirado em um Natal de anos atrás, com ela usando um suéter vermelho ridiculamente exagerado.
O cheiro também era o mesmo — uma mistura reconfortante de canela, pinho e algo doce, como biscoitos recém-assados. Era como se a casa tivesse uma alma própria, carregada de memórias e momentos que eu não conseguia evitar revisitar mentalmente.
Havia pequenos detalhes que me arrancaram um sorriso involuntário, como a árvore de Natal no canto, decorada com os mesmos enfeites caseiros que dizia nunca trocar porque tinham “história”. O boneco de neve feito de meias ainda estava sobre o aparador, com um cachecol improvisado que ela mesma havia tricotado quando era adolescente.
Tudo ali parecia imutável, exceto talvez por mim. Eu me sentia um estranho agora, como se não pertencesse mais àquele espaço que um dia me acolheu tão naturalmente.
me observava discretamente do outro lado da sala, e eu sabia que ela estava avaliando cada um dos meus movimentos, tentando entender o que se passava pela minha cabeça.
— Acho que nada aqui muda, não é? — comentei, mais para mim mesmo do que para ela, minha voz baixa, quase reverente.
Ela deu de ombros, mas havia um pequeno sorriso em seus lábios, cansado, mas genuíno.
— Algumas coisas não precisam mudar.
Eu concordei silenciosamente, sentindo um aperto no peito. Era verdade. Algumas coisas não precisavam mudar, mas outras… outras precisavam desesperadamente. E eu me perguntava se já não era tarde demais para isso.
pigarreou levemente, chamando minha atenção enquanto eu ainda observava os detalhes da sala, perdido em pensamentos. Quando olhei para ela, ela estava encostada na moldura da porta da cozinha, os braços cruzados, mas o olhar um pouco mais suave do que antes.
— … — começou, usando o apelido como se testasse sua familiaridade comigo depois de tanto tempo. — Você sabe cozinhar, ou ainda sobrevive à base de comida pronta?
Dei um sorriso discreto, entendendo que era uma tentativa de quebrar a tensão entre nós.
— Digamos que eu evoluí. Acho que consigo ir além do macarrão instantâneo agora.
Ela balançou a cabeça, soltando um suspiro quase divertido, mas logo ficou séria novamente.
— Estou exausta, e, para ser sincera, não tenho energia para preparar algo decente para o Natal… mas pensei que talvez… — Ela hesitou por um momento, como se ponderasse se deveria ou não continuar. — Talvez a gente possa improvisar algo simples. Só para nós dois.
Eu pisquei, surpreso. Não esperava que ela quisesse passar mais tempo comigo, ainda mais assim, tão… íntimo. Mas havia algo em sua expressão que me fez perceber que ela estava tão solitária quanto eu.
— Claro, — respondi, tentando soar mais confiante do que realmente me sentia. — Só me diga o que tem na geladeira, e eu dou um jeito.
Ela riu baixinho, mas era um riso abafado, quase imperceptível, como se até mesmo isso a cansasse.
— Não espero milagres, só algo que não me faça arrepender depois.
— Sem pressão, então, — brinquei, seguindo-a até a cozinha.
Quando entramos, o ambiente estava tão acolhedor quanto o resto da casa, mesmo com a simplicidade. Eu abri a geladeira enquanto ela se apoiava no balcão, observando silenciosamente.
— Certo, temos ovos, queijo, um pouco de presunto e… — fiz uma pausa dramática, segurando um pote de creme de leite. — Acho que podemos fazer uma omelete digna de Natal.
Ela arqueou uma sobrancelha, como se desafiasse minha proposta.
— Digna de Natal? Parece mais um café da manhã tardio.
— Depende do toque especial que a gente der, — retruquei, pegando os ingredientes e colocando-os sobre o balcão.
me observava com um misto de curiosidade e ceticismo enquanto eu começava a organizar tudo. Talvez esse momento, por mais simples que fosse, pudesse ser o começo de algo novo. Um pequeno passo para reparar os estragos que eu havia causado.
Enquanto eu separava os ingredientes, permaneceu apoiada no balcão, me observando em silêncio. O ambiente estava tranquilo, apenas o som baixo do vento lá fora e o estalido suave de um relógio antigo na parede preenchiam o espaço.
— Você parece bem confortável na cozinha — ela comentou, a voz baixa, mas com um tom que carregava um leve toque de provocação.
— Você ficaria surpresa, — respondi com um sorriso de canto, enquanto quebrava os ovos em uma tigela. — Eu aprendi a me virar, sabia?
— Ainda parece estranho te ver assim. — Ela puxou uma cadeira e se sentou, me observando enquanto eu batia os ovos. — A última vez que te vi cozinhando, você quase incendiou uma panela de pipoca.
— Um incidente isolado, — retruquei, rindo baixinho. — E você também não era exatamente a chef mais habilidosa.
— Ei, minhas panquecas eram ótimas! — Ela ergueu a voz, fingindo indignação, mas logo sorriu, e por um momento, senti que estávamos voltando àquela leveza que costumávamos ter.
Preparei a frigideira e comecei a cozinhar a omelete enquanto continuava a me observar, às vezes dando instruções desnecessárias, outras vezes rindo quando eu fazia algo de um jeito diferente do que ela estava acostumada.
— Preciso admitir, — ela disse finalmente, com um sorriso no rosto. — Não é tão ruim te ver assim.
— Assim como? — perguntei, virando a omelete com cuidado.
— Mais… calmo. Talvez mais maduro. — Ela hesitou, como se ponderasse se deveria ter dito aquilo. — Parece que você mudou.
Aquelas palavras me atingiram de forma inesperada. Pareciam carregadas de algo além do momento, algo que ela queria dizer, mas não dizia diretamente.
— Eu mudei, , — respondi, sem tirar os olhos da frigideira. — Ou pelo menos estou tentando.
Ela não respondeu de imediato, e o silêncio que se seguiu foi pesado, mas não desconfortável. Quando finalmente terminei, servi as omeletes em dois pratos e os coloquei sobre a mesa.
— Pronto. — Apontei para os pratos. — Pode não ser um banquete, mas espero que valha a pena.
Ela olhou para o prato, depois para mim, e balançou a cabeça com um sorriso suave.
— Só de não precisar me levantar da cadeira, já valeu.
Sentamos juntos à mesa, e enquanto comíamos, o clima parecia ainda mais leve. Por um breve instante, me permiti imaginar que talvez, só talvez, houvesse uma chance de reconstruir algo entre nós. Não agora, não tudo de uma vez, mas aos poucos, começando por momentos simples como aquele.
Quando terminei, olhei para ela, que ainda comia devagar. Seu rosto parecia menos abatido, mas havia algo em seu olhar que me deixou inquieto — uma mistura de exaustão e algo mais profundo, algo que eu não conseguia decifrar.
— , — comecei, hesitante. — Obrigado por me deixar fazer isso. Por estar aqui.
Ela parou, deixando o garfo sobre o prato, e me encarou por um momento antes de responder.
— Não torne isso maior do que é, . — Sua voz era gentil, mas firme. — Foi só uma refeição.
Assenti lentamente, engolindo em seco. Mesmo assim, não pude deixar de pensar que, para mim, aquilo significava muito mais.
Depois que terminamos de comer, sugeriu que nos sentássemos no sofá para “descansar um pouco”. Assenti, embora sentisse que a proximidade poderia trazer à tona tudo o que eu tinha reprimido até então.
O silêncio entre nós era palpável, quase desconfortável. Eu podia ouvir o som do relógio na parede e o barulho distante do vento lá fora. cruzou as pernas, olhando para frente, mas sem realmente focar em nada. Eu, por outro lado, não conseguia tirar os olhos dela.
— … — comecei, hesitando.
Ela virou o rosto para mim, arqueando as sobrancelhas, mas sem dizer nada. Tomei aquilo como um sinal para continuar.
— Eu sei que estraguei tudo entre nós. E sei que talvez seja tarde demais para tentar consertar qualquer coisa, mas… — Parei, respirando fundo. — Eu ainda te amo. Sempre amei.
Por um momento, o silêncio se estendeu entre nós como uma corda prestes a arrebentar. não disse nada, mas sua expressão mudou. Havia algo nos olhos dela, uma mistura de surpresa, dor e talvez… saudade. Antes que eu pudesse dizer mais alguma coisa, ela se aproximou lentamente.
E então aconteceu. O beijo não foi apressado, nem impulsivo. Foi lento, carregado de tudo o que tínhamos segurado por tanto tempo. Era como se, por um instante, o mundo tivesse parado, e nada mais existisse além de nós dois.
Quando nos separamos, ambos estávamos ofegantes. olhou para mim, e antes que eu pudesse decifrar sua expressão, ela se levantou de repente, como se tivesse sido atingida por uma onda de realidade.
— ? — Levantei-me também, preocupado.
— Por que você tinha que estragar tudo? — Ela gritou, a voz tremendo de raiva e dor. — Por que você simplesmente não pode me deixar em paz?
— Eu… — Comecei, mas antes que pudesse dizer mais alguma coisa, ela me empurrou com força, fazendo-me dar um passo para trás.
— Você sempre faz isso, ! Sempre! — Ela começou a desferir tapas contra meu peito, as palavras saindo em meio a soluços. — Por que agora? Por que justo agora, quando eu finalmente estava tentando seguir em frente?
Eu a segurei pelos pulsos, não com força, mas o suficiente para interromper seus movimentos.
— , por favor… — Minha voz saiu quase como um sussurro. — Eu não estou aqui para te machucar. Eu só…
Ela tentou se soltar, mas depois de alguns segundos, desistiu. Seus ombros caíram, e ela começou a chorar. Sem pensar, a puxei para um abraço. Ela resistiu no início, mas logo se entregou, escondendo o rosto contra meu peito.
— Eu não sei o que fazer com isso, … — Ela murmurou, a voz abafada pelas lágrimas. — Eu não sei mais como lidar com você, comigo… com tudo isso.
Eu a segurei com força, sentindo meu próprio coração apertado.
— Eu também não sei, — confessei. — Mas quero tentar. Quero consertar o que estraguei, . Se você me deixar…
Ela não respondeu de imediato, mas o simples fato de não me empurrar de novo já parecia um pequeno milagre. Enquanto ficávamos ali, abraçados, percebi que talvez aquele fosse o primeiro passo. Mesmo que incerto, era um começo.
⚠️⚠️⚠️
“I can unmake all we were made to be
But I can’t make you come back to me”
Oitavo Capítulo:
Quando finalmente se afastou, limpou as lágrimas de forma apressada com as costas da mão. Seus olhos ainda estavam vermelhos, e havia uma vulnerabilidade que ela tentava, sem muito sucesso, esconder.
— Eu… preciso de um banho, — ela disse, a voz quase um sussurro. Sem me encarar, virou-se e caminhou em direção ao corredor que levava ao banheiro.
Fiquei parado, observando-a desaparecer pela porta, ouvindo o som da água começar a correr. E então, o silêncio voltou a preencher a sala.
Me sentei no sofá novamente, passando as mãos pelos cabelos e deixando escapar um suspiro pesado. Eu tinha achado que o beijo significava algo, que talvez fosse o começo de uma reconexão, mas agora… agora tudo parecia mais confuso do que nunca.
A casa estava quieta, mas minha mente era um caos. As palavras dela ecoavam, misturando-se às minhas próprias dúvidas e arrependimentos. “Por que você tinha que estragar tudo?” Eu não sabia como responder a isso. A verdade era que eu sempre estraguei tudo. Sempre me achava capaz de consertar o que quer que fosse, mas, com , parecia impossível.
Olhei ao redor. A decoração de Natal dela era simples, mas bonita, como ela. Havia pequenas luzes penduradas ao redor das janelas, piscando suavemente, e uma árvore pequena, decorada com cuidado. Ela sempre gostou de Natal, sempre colocou um pedaço dela em cada detalhe.
E eu, como sempre, me sentia deslocado nesse mundo que ela criava. Um mundo onde eu nunca soube se tinha um lugar.
Suspirei novamente, encostando a cabeça no encosto do sofá. Talvez ela estivesse certa. Talvez eu nunca devesse ter aparecido. Talvez eu nunca merecesse o amor que ela me deu, tão generoso, tão cheio de esperança.
Mas o que eu deveria fazer agora? Apenas ir embora? Apenas aceitar que eu tinha perdido ela para sempre?
Fechei os olhos, tentando ignorar a dor crescente no peito, mas era inútil. Eu sabia que, não importa o quanto tentasse, não poderia forçar a me aceitar de volta. Eu podia desmanchar tudo o que fomos, mas nunca seria capaz de refazer o que ela sentia por mim.
Enquanto o som da água continuava ao fundo, fiquei ali, sozinho com meus pensamentos e a certeza de que, pela primeira vez, eu não tinha ideia de como seguir em frente.
O som da TV preenchia a sala, mas eu não estava prestando atenção no que passava. Minhas mãos estavam cruzadas no colo, e o peso do silêncio, apenas quebrado pelas vozes distantes no aparelho, parecia me consumir.
Depois de algum tempo, ouvi passos suaves vindo do corredor. Virei a cabeça e a vi surgir, vestindo uma roupa quente, com os cabelos ainda úmidos do banho. Ela parecia tão frágil e, ao mesmo tempo, tão forte naquele instante, como se carregasse o peso de todo o passado entre nós nos ombros.
Antes que eu pudesse dizer algo, ela caminhou até o sofá e, sem cerimônia, se ajeitou ao meu lado, encostando-se no meu peito. A surpresa me deixou imóvel por um segundo, mas, instintivamente, envolvi-a com os braços, puxando-a para mais perto.
O cheiro fresco do sabonete misturado com o calor do corpo dela me trouxe uma paz inesperada, algo que eu não sentia há muito tempo. Por um momento, fechei os olhos, apenas sentindo a presença dela ali, tão próxima.
— Feliz Natal, , — ela murmurou, a voz baixa e tranquila.
Um pequeno sorriso escapou, apesar de tudo.
Ficamos em silêncio por alguns minutos, apenas aproveitando aquele momento que parecia roubado de uma realidade que não nos pertencia mais. Mas, como sempre, quebrou o silêncio, trazendo-me de volta ao chão.
— Não estamos voltando, ok? — ela disse, com um tom firme, mas sem mágoa. — É só o Natal amolecendo meu coração.
Aquelas palavras me atingiram, mas, ao mesmo tempo, havia algo reconfortante em sua honestidade. Apenas assenti, embora ela não pudesse ver.
Ela se acomodou ainda mais contra mim, e eu fechei os olhos, soltando um longo suspiro. Eu sabia que, quando a noite terminasse, tudo voltaria ao normal, como ela havia dito. Mas, por enquanto, eu me permitiria aproveitar aquele pequeno milagre de Natal.
E assim ficamos, em um silêncio confortável, enquanto o mundo lá fora seguia seu curso.
Fim
Eu amo tanto essa música apesar da história contada por ela HAHAHHA
Mas vou dizer a real, se fosse a eu real nessa história, poderia ser o meu Nunu pedindo perdão, chance, se ajoelhando, chorando e tal, eu não voltava e não seria coração de manteiga não porque eu guardo rancor por anos antes de esquecer o que aconteceu HAHAHAH
Ia ser “volta daqui uns anos que a gente vê”, mas vamos pensar aqui na ficção que tudo terminou relativamente bem HAHAHAHAHHA
Ai Lelen, eu pensei em dar outro fim para eles, mas a música deixa tão claro que não tem volta kkkkkkkkk dai esse foi o melhor que eu eu consegui… espero que tenha gostado mesmo assim <3