Esta história pertence ao Projeto Adote Uma Songfic
Natashia Kitamura
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Temporada #005
Ideia #002

Sweet Child O’ Mine
Guns N’ Roses

Capa por Kelly O.

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Aquela Criança

  GUARAREMA, 2001.

  - Você não vai querer subir aí.
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  Foi assim que a conheci. Eu já estava com um pé apoiado em um alto relevo do tronco da árvore de carambola e o outro pronto para contornar um galho grosso o suficiente para suportar meu peso. Se não fosse pelas roupas e a falta de pelos no corpo, eu achava que poderia ser facilmente confundido por um macaco. Daqueles que pegam a comida e somem em uma fração de segundo. Sempre fui bom em furtar comida.
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  Olhei para trás e a vi em um macacão jeans com uma camiseta com mangas bufantes por baixo. Era a moda da época, ser feminina demais. Seus cabelos eram longos e finos, deixando suas tranças – duas delas – parecerem quase 2 pedaços de corda marrom. Nos pés, botas de borracha vermelhas, sujas da terra que mexeu ao plantar umas florzinhas aqui e ali.
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  Ela usava um chapéu de palha que era do tamanho ideal para seu rosto pequeno. Conseguia proteger bem o rosto do sol do início de janeiro, ápice do verão. Além disso, em uma das mãos carregava um pequeno balde da mesma cor de suas botas. Lá dentro havia um par de luvas e ferramentas para as flores.
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  Desisti de pegar as carambolas. Não seria legal ser dedurado logo após ter saído de um castigo que durou dois dias inteiros. Sem meus amigos, tudo o que pude fazer foi ler alguns gibis e estrear o caderno de colorir que a minha tia havia me dado de natal. Do ano retrasado.
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  - E por que não? – encarei a garota, que pude logo perceber que não era tão alta assim, pois o topo de sua cabeça batia abaixo do meu ombro, e eu não era, nem de longe, o mais alto da minha turma. – Você acha que não consigo pegar umas simples carambolas? Tenho 13 anos e sou tão forte quanto o José, da oitava série.
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  A garota ficou me encarando, amuada, como se tentasse desvendar o que eu queria dizer, me comparando com o garoto mais forte do ginásio.
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  - O que eu quis dizer, é que se você subir, terá problema com as abelhinhas. – ela apontou para um ponto próximo de onde eu estava prestes a subir.
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  Olhei na direção que seu dedo indicava e pude ver uma colmeia grande, mas não tão grande, só que com várias abelhas rodeando, algumas, inclusive, vindo até mim para me mostrar que quem mandava na árvore de carambola era elas.
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  - Ah. – foi o que consegui responder. – E-eu consigo enfrentar elas! – olhei de volta para a garota, que ergueu os ombros e me deu as costas, voltando seu caminho. – Eu só não irei mexer com elas, porque você pode se machucar!
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  A garota parou e virou sua cabeça, as duas tranças balançando como cordas soltas.
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  - Por que eu me machucaria? Não subi na árvore.
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  - E você acha que as abelhas saberiam disso? – coloquei minhas mãos na cintura. – Meu pai disse uma vez que elas não sabem, hum, disti… disti… elas não sabem que você não gosta de carambolas!
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  - Mas eu gosto! – ela gritou, por estar um pouco afastada de mim. Como se eu fosse surdo, oras! – Elas têm formato de estrela e são gostosas!
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  - Bem, então é mais uma razão para elas te picarem. – ergui os ombros e os soltei. – É por isso que não vou subir lá. Eu poderia dar uma lição nelas, se quisesse.
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  - Não poderia, não. As picadas de abelha doem muito. Eu já tomei muito. Demorou dias para sarar. Nem o beijo da vovó conseguiu parar a dor.
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  - Isso é porque você é uma menina. – sorri. – Meninas são frágeis. Eu sou mais forte! – ergui os braços, mostrando como eram longos e fortes. – Meu pai disse que cresci mais rápido do que o Samuel, meu irmão mais velho. Não vai demorar muito para eu alcança-lo.
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  - A vovó disse que meninas são fortes também. – ela ergueu o braço livre, mas ele não chegava nem perto do comprimento ou “fortura” do meu braço. Humpf. – É por isso que eu posso ir sozinha para a escola e para a minha hortinha.
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  - Mas tem medo de abelhaaas. – cantarolei.
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  - Porque as picadas delas doem! – a garota bateu um pé no chão e pareceu ainda mais brava quando gargalhei. – Se você acha que não dói, então vai lá, pega uma carambola.
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  Olhei para trás, vendo cerca de vinte ou trinta abelhas em volta da colmeia. Engoli seco. O Tódi, cachorro do Samuel, levou uma picada de abelha uma vez. Ele chorou muito.
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  - E-eu já disse que não vou. Não posso levar a culpa se você se machucar com elas… ai! – movi minha mão rápido ao sentir uma dor aguda em minha mão. – AI!
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  Então era assim que uma dor de picada de abelha era. Uma mistura de tapa do papai, chute do Samuel e beliscão da mamãe todos juntos.
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  A garota me puxou pela mão até uma casa branca, bem ao lado da sorveteria da cidade. Lá, ela logo gritou pela avó:
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  - Vovó! VOVÓ! – não se importou de eu estar quase sem ar, tamanha dor que sentia, quero dizer, já estava para não sentir mais a mão que levou a picada. Meus olhos não desgrudavam da área onde a abelha havia deixado seu ferrão. – Veja! Uma abelha o picou! – ouvi a garota gritar e soltar minha mão, usando a mesma para apontar para o local machucado.
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  - Santo Deus! – a voz de uma senhora ecoou. – Vamos cuidar disso logo, venha, menino!
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  Ela me colocou em um banquinho e sumiu em seguida, retornando com um kit de primeiros socorros, uma lupa e uma pinça.
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  Com tranquilidade, ela começou a me perguntar quem eu era e quem eram os meus pais. Sem perceber, havia lhe contado metade da minha história e esquecido do machucado que havia em minha mão.
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  - Pronto. – ela disse, prendendo a gaze com um esparadrapo. – Sua mãe saberá o que fazer mais tarde. Se ela tem uma farmácia, então poderá cuidar melhor de você do que essa velha. Você é um garoto valente. Não chorou nem um pouco.
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  - Chorou sim. – a garota disse ao meu lado. Ela havia permanecido calada o tempo inteiro, prestando bastante atenção no que a avó fazia. – Quando estávamos vindo, ele chorou sim.
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  - Não chorei, não! – gritei, tentando encobrir a verdade dela com a altura de minha voz.
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  A senhora soltou uma risadinha e deu dois tapinhas em minhas costas.
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  - Minha Lorena gosta de constranger as pessoas de vez em quando. Mas isso não a faz uma menina ruim. – e fez um carinho no rosto da menina. – Que tal um sorvete? Vocês podem se sentar ali e trarei um para os dois. Que sabor querem?
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  - Morango! – a garota gritou, animada.
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  - Eu gosto de chocolate. – disse, vendo a avó sorrir e fazer sinal para que fossemos nos sentar.
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  Eu e a garota ficamos calados nos encarando. Eu não sabia o que dizer, havia realmente chorado no caminho para cá, mas tinha vergonha de pedir que ela mantivesse em segredo. Se Samuel soubesse que uma simples abelha me fez chorar, ele zombaria de mim até eu completar 15 anos. E eu havia acabado de fazer 13.
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  - Tá tudo bem, eu não vou contar pra ninguém. – Lorena disse. – Você não chorou tanto assim.
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  - Eu não chorei nada. – meu orgulho me fez dizer.
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  Ela ergueu os ombros mais uma vez.
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  - Se você diz…
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  Observei a menina balançar as pernas e cantarolar alguma coisa.
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  No dia seguinte, quando cheguei na escola, fui surpreendido por uma história de que a havia salvo de ser picada por abelhas. Foi aí que conheci Lorena, da turma B e minha primeira melhor amiga.
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  SÃO PAULO, 2017.

  - Doutor. A paciente das 11h já está aguardando.
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  - Já irei chama-la, obrigado. – disse, sereno, enquanto terminava de preencher o formulário do último paciente que havia saído há apenas alguns minutos da sala.
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  Terminei de digitar o diagnóstico – gripe, comum nessa época do ano – e passei para o próximo formulário, do paciente das 11h.
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  O som do aviso de nova mensagem do celular soou, e a notificação logo surgiu na tela do meu computador.
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  Não se esqueça do jantar hoje à noite. Você não pode faltar de novo, Caio! Às 20h.
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  - Ah… – solto um gemido e faço uma careta. – Merda… – olho em meu relógio apenas por força do hábito, já que tinha plena noção do horário. Abro minha agenda eletrônica no computador mesmo e confiro os afazeres do dia.
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  Posto de saúde ‘X’.
  Ótimo. E eu havia aceito fazer o plantão de sexta-feira na única sexta-feira que tinha programação.
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  Eu não podia simplesmente não ir. O governo fez um bom trabalho em divulgar a necessidade da vacina contra a poliomielite, e agora milhares de pais vêm até o posto de saúde em busca da medicação. O plantão havia sido decidido desde o começo do ano e eu, como pediatra, não poderia me dar por ausente.
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  - Vai ser uma correria danada. – murmurei.
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  Eu já havia faltado em quatro encontros da turma de Guararema. Meus pais haviam dito que não era comum alunos que estudaram juntos no colegial, se reunirem para “relembrar os velhos tempos”. O primeiro encontro aconteceu cinco anos depois de nossa formatura, quando duas garotas se encontraram e decidiram reunir toda a sala para um churrasco. As duas garotas não encontraram dificuldade nenhuma de nos achar e enviar o convite. Eu, obviamente, não pude ir. A data coincidiu com o dia mais intenso do internato, portanto, acabei passando.
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  Os três encontros seguintes ocorreram devido ao “sucesso” da reunião do grupo. Eduardo, meu melhor amigo de infância, disse que a galera se deu muito bem, mesmo depois de tanto tempo, então não foi difícil combinar um novo encontro. Além disso, um grupo no Whatsapp foi criado e, apesar de eu não conseguir acompanhar grande parte da conversa deles – que se iniciaram nos encontros –, pude relembrar alguns momentos de nossa infância juntos.
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  Só que agora, depois de 12 anos desde a formatura do colegial, eu ainda não havia comparecido em nenhum encontro, e o grupo acabou exigindo a minha presença – o único que não foi em absolutamente nenhum dos encontros, mesmo tendo visto cada um deles, seja para tratar de um filho doente, um recém-nascido ou passar alguma indicação médica de urgência.
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  - Jane, pode pedir para a paciente das onze entrar. Poderia também, por favor, pedir para minha empregada separar um terno completo e gravata, e pedir para alguém trazer para o escritório? Preciso que ele esteja no meu carro antes de eu ir para o posto de saúde.
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  - Sem problemas, farei isso agora. O senhor vai querer almoçar em sua sala?
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  - Não posso, preciso estar no posto à uma e ainda tenho três pacientes para atender. A das dez ainda não chegou?
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  - Ela disse que chega em dez minutos.
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  Suspirei. Ótimo dia para a paciente mais pontual de todas atrasar.
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  - Tudo bem. Obrigado.
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  Digitei a tempo uma mensagem para Eduardo, confirmando que não faltaria dessa vez. O grupo topou em fazer a confraternização em um restaurante aqui em São Paulo. Apesar de uma parte da turma morar aqui, mais da metade continuou em Guararema ou as cidades próximas, o que facilitava que o encontro fosse por lá. Ninguém disse, mas Eduardo deixou escapar que eles podem ter topado, por minha causa.
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  Por sorte, dos três atendimentos, somente um demorou mais do que meia hora para acabar. A mãe de primeira viagem queria garantir que seu bebê teria todo o suporte quando nascesse e eu havia garantido que não sairia do hospital, caso o recém-nascido apresentasse qualquer anormalidade, por mínima que fosse. Tudo o que as mães precisam, principalmente quando estão tendo seus primeiros filhos ou filhas, é sentir segurança por parte do médico. Sou ótimo nisso. E ótimo também em cumprir com minha palavra.
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  - A paciente de segunda, das nove da manhã, perguntou se não poderia vir hoje. A encaminhei para o posto, tudo bem, doutor? – a Jane disse rapidamente ao me ver saindo da sala.
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  - Raquel e Orlandinho? – tentei resgatar de minha memória, meus horários de segunda.
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  - Isso. Ela disse que a febre dele ainda não abaixou.
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  Suspirei. Raquel havia vindo no primeiro horário dessa manhã e eu avisei que poderia levar um dia, pelo menos, para a febre da criança sumir por completo.
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  - Tudo bem, ficarei atento no posto. Tente remarcar, se possível, os horários de segunda. Gostaria de ter o dia livre.
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  - Segunda é dia da senhora Pires. Hermínia Pires.
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  Merda.
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  Hermínia era uma mãe excepcional. Ela já estava em sua quinta criança e ainda cismava em trazê-las todo mês para um check-up total. Agora, grávida do sexto bebê, acredita sentir ainda mais necessidade de minha ajuda. Chegou, inclusive, a querer me contratar como médico particular das cinco – agora seis – crianças, o que eu obviamente recusei.
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  O problema de ser pediatra não é a agenda lotada e os afazeres em postos de saúdes e hospitais. É o simples fato de ter de lidar com as mães. Não importa se você é formado e especializado em pediatria. Você jamais saberá mais do que as mães. O fato de eu ser um homem torna tudo ainda mais difícil. Para algumas delas, falta-me tato ou empatia para compreender o papel da mãe na vida do filho. Tudo porque sugeri uma pomada ou um tratamento diferente das que elas estavam acostumadas. Além disso, o fato de ser médico não significa que você possa se cansar. Para algumas mães, médicos não dormem. Ou se dormem, é bem pouco, o que significa que não há problema ligar para o celular dele às duas ou três da manhã. Mesmo quando ele está de férias.
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  - Invente uma desculpa. – digo, coçando a nuca. – Informe que receberei um novo equipamento na segunda, e gostaria que os filhos dela tenham acesso a ele na terça.
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  - Mas nós não teremos um novo equipamento para mostrar para ela na terça. – Jane ergueu a sobrancelha. O que mais gosto em minha secretaria, além dela passar um sentimento maternal às mães das crianças que vêm aqui, é que ela, como grande parte das mulheres, pensam muito além do presente. Em um piscar de olhos, ela problematizou minha solução cinco vezes mais, me obrigando a criar argumentos para todas elas com a única desculpa de:
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  - Sou eu que terei de aguentar os resmungos dela no telefone e aqui na sala de espera.
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  O que era muito justo.
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~*~

  No plantão, nada diferente. Mães perguntando se é normal filho não querer comer na hora certa, se faz mal alimentá-los com determinados alimentos, se já está na hora de tirar a chupeta e quantas vezes mais terá de trazê-los para vacinar. Milhares de perguntas cujas respostas eu já tinha na ponta de minha língua.
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  - Essa foi a última, doutor. – a enfermeira disse.
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  Olhei em meu relógio. 19h. Eu iria atrasar.
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  - Acha que conseguimos terminar de verificar em meia hora?
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  - Eu acho bastante difícil. – a mulher arregalou os olhos e olhou para a quantidade de fichas que nós tínhamos para conferir. Precisávamos realizar uma verificação para o controle das vacinas. Levaria cerca de uma hora. – Por sorte, deixei tudo organizado por tipos de atendimento, então economizaremos um tempo. Talvez terminemos em 40 minutos?
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  - Ótimo. – sorri. – Você pode começar? Preciso fazer um telefonema.
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  - Claro.
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  Saí da sala e fui até a área externa do posto, onde o sinal poderia pegar melhor. De lá, liguei para Eduardo, que pelo jeito estava pronto para receber uma notícia ruim.
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  - Você disse que não faltaria.
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  - E não vou. – respondi. – Mas pode ser que eu me atrase um pouco.
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  - Um pouco, alguns minutos, ou um pouco, chegará no final da festa?
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  - Um pouco, talvez uma hora. – olhei em meu relógio. – Acabaram de fechar o posto e preciso fazer o relatório final. A enfermeira ajudou com a organização, mas preciso rubricar várias coisas e cadastrar para que o médico de amanhã não espalhe que sou um profissional ruim.
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  - Você pode ser qualquer coisa, Caio, menos um profissional ruim. – Eduardo riu. – Tudo bem, uma hora é suportável e até que bate com o horário da Lorena. Você irá busca-la, não é?
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  - Quê? – parei meu olhar, que até então corria de um lado para o outro, observando a movimentação da rua. – Buscar Lorena?
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  - Cara, você não viu a mensagem da Julia? Ela pediu faz umas cinco horas!
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  - Que mensagem? Vocês falam tanto no grupo que—
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  - Sem essa. Ela disse que mandou uma mensagem em privado para você.
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  Tirei o celular do ouvido e procurei pelo nome de Julia, que realmente estava perdido entre os nomes das mães que me enviavam perguntas sobre sintomas dos filhos, grupos da família, faculdade e residência.
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  - Merda. – murmurei.
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  - Pelo jeito, você não viu a mensagem.
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  - Minha falta de resposta não pôde ser lida como “não irei busca-la”?
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  - Estamos falando da Julia. A probabilidade dela ter te mandado uma mensagem para perguntar se você não poderia buscar Lorena é menor do que a quantidade de alunos por vaga nos cursos de medicina. – Eduardo riu. – Não, meu caro, se ela te mandou mensagem, é porque já estava definido que você buscaria a Lori.
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  Fiquei calado, pasmo com a conclusão de Eduardo. Eu sabia que o pessoal de nossa turma não havia mudado muito desde a época da escola, mas jamais imaginaria que a mandona da Julia continuava tão mandona quanto era antes. Quero dizer, ninguém nunca se atreveu a desobedece-la, quando, em nossa preparação para unir dinheiro para a viagem de formatura da oitava série, Bruno a contrariou, dizendo que não participaria da venda dos doces porque não ia para a viagem. Por causa dele, ou de sua falta de atividade, nossas únicas opções de viagem foram um hotel fazenda próximo de Guararema ou alguns dias em Aparecida do Norte. Ninguém ficou feliz. E Julia se tornou a líder do grupo inteiro.
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  - Eu não falo com ela há anos! – digo, me referindo à Lorena.
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  - Ah, então o problema não é receber ordem da chefona, mas reencontrar a Lorena.
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  Fechei meus olhos. Eu havia mantido a compostura até agora, mesmo tendo encarado dezenas de pais preocupados que seus filhos fossem ficar paralisados – ainda que tenhamos explicado centenas de vezes que a vacina era somente uma precaução. Eduardo, quando inspirado, conseguia ser ainda mais irritante do que Samuel, meu irmão mais velho.
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  - Você sabe que as coisas não terminaram bem da última vez que nos vimos.
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  - Se eu não sei bem? Caio, metade da minha persistência em te levar para esse encontro, é para que eu possa parar de ouvir sobre você e Lorena!
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  - O quê?
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  - Todo mundo ainda se pergunta o porquê de vocês dois terem se separado após a morte da vó Leila. – ele suspirou. – Já faz dez anos. Vocês precisam se falar.
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  - Não é como se estivéssemos nos evitando.
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  - Não?
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  Não respondi.
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  A verdade era que sim, parte do motivo pela qual eu não compareci às reuniões anteriores, foi porque imaginava que Lorena pudesse estar lá.
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  Quando terminamos o colégio, parte da nossa turma se mudou para São Paulo por conta da faculdade ou do cursinho, enquanto a outra parte se dividia entre mudar para algumas cidades fora de Guararema ou ficar em Guararema. Eu, Eduardo, Bruno e Caíque dividimos um apartamento no bairro da Liberdade, enquanto Lorena ficou em Guararema, estudando em uma faculdade na cidade de Mogi das Cruzes, bem ao lado da nossa cidade.
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  Apesar da distância e do meu regresso à Guararema ficar cada vez mais raro acontecer, eu e Lorena continuávamos conversando via internet. No entanto, no segundo ano, quando eu estava cursando o segundo ano da faculdade de medicina, me vi comparecendo a festas do curso e também aos plantões que haviam nas férias, além de estudar para conseguir monitoria, que faria bem para minha grande quando eu tentasse fazer minha residência no melhor hospital de São Paulo. Toda essa agenda fez com que eu desse menos e menos atenção à Lorena. Eu ignorava suas mensagens e e-mails, suas ligações e até suas visitas, quando ela vinha ver as amigas da nossa turma.
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  Foi quando, no meio do segundo ano, Eduardo abriu a porta de nosso quarto e disse:
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  - A vó Leila morreu.
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  Ninguém esperava. Quero dizer, ela era velha, claro, mas tão forte que estávamos todos crentes que duraria até os cem anos. Ou pelo menos noventa. Mas não. O excesso de medicamentos durante toda a vida lhe causou problemas com sua medula, que parou gradativamente de produzir os glóbulos brancos e vermelhos, até que ela enfim perdeu a batalha contra o câncer.
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  Foi a primeira vez que faltei em uma aula. O dia seguinte não era tão importante, mas isso não significava um bom motivo para faltar. Contudo, estar com Lorena naquele momento sim.
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  O que eu não esperava, era que Lorena estivesse lívida de raiva por eu não ter estado ao lado dela no último ano.
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  - Você sabe quantas vezes tentei falar com você? Tentei te ver? Que tipo de amigo você é, afinal? – ela gritava com toda força que seus pulmões conseguiam suportar. – Sabe quantas vezes vovó perguntou de você? Quantas vezes a ouvi me pedir que trouxesse você para que ela pudesse vê-lo uma última vez?
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  Recebi vários socos naquele dia. Socos de Lorena, de suas palavras, da dor que havia em seus olhos e em suas lágrimas.
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  - Eu espero que você salve muitas vidas, Caio. Milhares, para que compense a sua falta na vida da vovó quando ela mais precisou. De que adianta ser médico, se desde o início você não pode salvar vidas? – ela disse, antes de me deixar plantado do lado de fora de sua casa, ainda no mesmo lugar, ao lado da sorveteria que agora era sua responsabilidade.
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  As palavras de Lorena haviam sido duras, mas impensadas, eu sabia. Ela jamais diria tudo aquilo, se não estivesse tão magoada quanto se encontrava. Eu nunca cheguei a culpa-la por ter me odiado. A vida em São Paulo era algo fantasticamente novo e eu queria aproveitá-la ao máximo. Jamais pensaria que deixaria meus amigos para trás. Que trocaria a vida tranquila e repleta de amizades de Guararema, para a competição acirrada que havia no mundo da medicina em São Paulo.
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  - Escuta – comecei a falar. –, será que você…
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  - Desculpe, cara, dessa vez vou ficar te devendo. – Eduardo disse. – Estou chegando de Jundiaí agora e ainda vou passar na casa da Julia. Ela ofereceu meu carro de carona para a Luana e a Moraes.
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  Julia, Luana e Moraes (chamada pelo sobrenome porque seu nome também era Julia) eram as melhores amigas de Lorena. Julia e Luana moravam em São Paulo, mas desde o primeiro encontro, têm passado mais tempo juntas do que na época da escola. Já Moraes nunca perdeu contato com Luana, o que as tornou o trio parada dura. Julia, a chefona, é namorada de Eduardo, uma combinação um tanto surpreendente, já que na época de escola, Julia estava no grupo das meninas populares e Eduardo apesar de ser sociável, não dava a mínima para ela.
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  Suspirei e encarei o relógio.
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  - Será que você pode pedir para Julia avisar a Lorena que eu vou me atrasar?
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  - Bem, isso eu posso fazer por você.
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  - Obrigado.
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  - Não agradeça, desconte alguns reais daquilo que eu estou te devendo.
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  Soltei uma risada. Eu jamais cobraria Eduardo pelo dinheiro que eu dei para ele. Havia sido um presente meu para ele quando comprou seu primeiro apartamento. Ele estava decidido a pedir Julia em casamento no final desse ano, então desde o ano passado tem se dedicado em colocar sua vida em ordem, a começar por uma casa própria, ou melhor, um apartamento próprio. O único obstáculo, era que o valor da parcela de entrada era maior do que ele era capaz de pagar, o que me fez dar o dinheiro para ele, ao invés de vê-lo pedir um empréstimo ao banco.
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  Enquanto eu estava nos primeiros anos de medicina, Eduardo arcou com as minhas despesas, porque meus pais não conseguiam pagar o suficiente para eu viver em São Paulo – Samuel havia engravidado uma menina e eles tinham de ajuda-lo a ter responsabilidade pela criança – e eu, com o horário integral do curso, não podia ficar pegando transporte de São Paulo até Guararema e vice-versa todos os dias. Até então, ele nunca havia cobrado todo aquele valor. Decidi, então, quitar minhas dívidas com seus devidos juros, pagando a entrada do apartamento que ele havia escolhido para sua futura vida conjugal.
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  - Você nunca me deveu nada, seu mané. – ri e o ouvi rir de volta. – Vejo você daqui a pouco.
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~*~

  Limpei minha garganta e olhei no espelho do retrovisor mais uma vez. A gravata estava impecável e os óculos de grau estavam bem posicionados em meu rosto. Eu não queria parecer um desleixado depois de dez anos sem ver Lorena.
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  Havia mandado uma mensagem para ela há dez minutos informando que eu estava na frente da saída do metrô. Ela havia vindo de Guararema para São Paulo, mas devido a um pequeno problema na sorveteria, só conseguiu chegar na cidade às oito e meia. O metrô mais perto do meu apartamento e consultório era um tanto distante da estação da Luz, de onde ela chegou. Apesar de eu estar longe da minha casa e do meu trabalho por conta do posto de saúde, não mencionei nada a ninguém e continuei com a responsabilidade de pegar Lorena na estação.
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  Eu batucava os dedos na direção, quando a vi saindo do metro com uma mochila nas costas. Abri a boca, pasmo com o fato de ter conseguido identifica-la, já que ela não era mais a garota de 19 anos que vi na última vez, durante o velório da vó Leila.
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  Dei uma buzinada, chamando sua atenção. Vi seus olhos pararem em mim e o suspiro que ela deu antes de iniciar sua caminhada até meu carro.
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  - Pode deixar sua mochila no banco de trás. – disse, abaixando a janela do lado passageiro.
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  - Tudo bem. – ela disse, abrindo a porta de trás e jogando a enorme mochila adentro. Em seguida, seguiu para o banco do passageiro. – Obrigada por ter me esperado.
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  - Está tudo bem, moro aqui do lado. E trabalho também. – sorri, dando partida no carro.
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  Ficamos calados. O que eu deveria dizer? Como anda? O que tem feito? Talvez… Você está bonita?
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  - Nossa… – a voz dela soou. – Você ainda tem isso?
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  Olhei para onde sua mão estava. Era um boneco de pano do tamanho de um dedo. Eu e ela havíamos feito ele como pedido para que o tempo ficasse bom logo, já que eu tinha um ligeiro pavor de trovoadas.
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  - Tem feito um bom trabalho, na maior parte do tempo.
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  Ouvi sua risada.
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  - Eu nunca esperaria que aquela tempestade fosse parar. Acreditei fortemente que havíamos criado um monstro quando os trovões pararam.
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  Eu também. O motivo pela qual nós criamos esse boneco, foi porque estávamos em época de chuva e, em Guararema, a época de chuva costumava ser mais uma época de temporais, repletos de trovoadas e árvores sendo derrubadas. Até o telhado da igreja uma vez sofreu as consequências. Após a criação do boneco, nunca mais tivemos tempestades fortes, o que me fez acreditar que bonecos do tempo realmente são mágicos.
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  - Que legal que você o transformou em um chaveiro. – ela continuou encarando o boneco pendurado no retrovisor do carro.
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  - Você ainda tem o seu? – perguntei, mais na esperança de saber se ela mantinha algo que lembrava a mim com ela.
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  - Sinto muito, o Beto o comeu já alguns anos.
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  Beto era seu cachorro. Ele também já havia falecido, de acordo com Eduardo, que ouviu de Julia, que ficou sabendo por Moraes, que manteve contato com Lorena durante todos esses anos, pelo fato das duas terem continuado em Guararema.
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  - Bem. Espero que ele tenha aproveitado, então. Sempre me perguntei se o boneco não daria um bom mordedor. Você sabe, como o que os bebês usam na época que nascem os dentes.
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  - Ah, tenho certeza que sim. Ficou uma semana inteira com o boneco entre os dentes. Até que virou fiapo e ele perdeu o interesse. – ela sorriu. – Eu vi seus pais ontem. Meu tio caiu de novo, tive que passar na farmácia.
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  - Bom saber que eles continuam indo para a farmácia.
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  - Bem pouco – ela disse. –, vejo seu irmão e Milena sempre. Acho legal como os dois se deram bem depois da turbulência que foi o início da relação. Quantos anos o Luizinho tem? Dez?
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  - Onze. – disse. – Não pense que sou um bom tio, ele só não me deixa esquecer. – suspiro.
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  - Ele não deixa ninguém esquecer. – ela disse, em meio à um sorriso.
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  Não pude pensar em maneiras de estender nossa conversa, pois chegamos logo em seguida ao restaurante reservado por Julia.
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  Foi uma ótima coisa eu ter conseguido vir à reunião. Eu sabia que iria me divertir, pois fiz parte da maioria das aventuras que todos mencionavam; além disso, ninguém parecia se importar em repetir as histórias que contaram nas reuniões passadas, só porque eu estava ali.
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  Aqueles que haviam rixas quando eram crianças, agora conversavam descontraidamente, como se nunca tivessem se estranhado antes. Alguns, inclusive, compareceram com os filhos, outros, com as namoradas e alguns, noivos(as).
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  Olhei para Lorena, que se divertia com uma turma da sala A, relembrando uma história que eu certamente não fiz parte, pois ouvi uma delas falar sobre “festa do pijama”, e me perguntei se ela possuía alguém em Guararema. Apesar de não ser uma cidade grande, Mogi das Cruzes era ali do lado e havia muitas pessoas, principalmente por causa das duas universidades que a cidade abrigava.
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  Peguei minha taça de vinho e passei a observá-la com mais atenção, agora que a turma começava a se dispersar ou ir embora por conta das crianças. Mais alguns trabalhos aqui e ali, eu não precisava me preocupar em algum dia ter de correr atrás de pacientes.
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  Os cabelos de Lorena acredito jamais terem deixados de ser da maneira que estavam. Compridos e brilhantes. Quero dizer, talvez estejam mais grossos ou volumosos, mas nada diferente de quando éramos mais novos e a vó Leila se divertia fazendo suas tranças.
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  Lembro-me de quando o dia das mães e dos pais chegavam, Lorena fingia não se importar em ter de fazer as lembranças para sua avó e tio, no lugar de sua mãe ou seu pai. Ambos faleceram quando Lori era muito nova, quase bebê. Eles estavam voltando de uma viagem que fizeram para comemorar cinco anos de casados, mas um caminhão acabou pegando eles. A estrada até Guararema não era segura – e apesar de ter sido reformada, continua não sendo – e com frequência carros batiam, rodopiavam e deslizavam. Houve até um que acabou caindo de um barranco.
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  Lorena nunca chegou a conhecer, de fato, os pais. Durante nosso crescimento, aprendi que alguns dias eram difíceis, enquanto a maioria eram fáceis. Não dá para se sentir falta do que nunca teve, mas dá para se sentir solitário vendo os outros terem algo que você nunca terá.
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  Sorri e desviei meu olhar para outro lugar. Outra conversa. Assim com Lorena, todos os outros amigos presentes eram uma novidade para mim, com a exceção de Eduardo e Julia, quem mantenho um forte contato até hoje.
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  No entanto, durante todo o jantar até a hora em que decidimos que era o momento para irmos embora, me peguei olhando para Lorena. Cada vez que me desprendia das conversas em que estava envolvido por causa dela, me via relembrando de alguma cena de nosso passado. Momentos felizes, divertidos, bons de serem relembrados.
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  - Caio, será que posso falar contigo? – Eduardo me puxou para um canto, enquanto as garotas continuavam suas conversas. – Houve um problema.
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  - Com o quê? O trabalho? – olhei para ele, preocupado, mas logo o vi negar com a cabeça.
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  - Não me mate, mas preciso que você faça um favor.
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  - Um favor?
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  - Para Julia.
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  - Julia?!
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  - Shhh! – ele levou o dedo indicador à boca, fazendo com que eu me calasse. – Ela calculou mal. Achou que Lorena poderia dormir no apê dela, mas esqueceu que está colocando ele em ordem; diga-se, pintando-o; e o local está praticamente inabitado. Ela ficará lá em casa, mas…
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  - Vocês não se veem há duas semanas. – disse, lembrando de todo o muxoxo que eu ouvi de Eduardo. – E as garotas?
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  - Julia falou com elas mais cedo. Luana se mudou para a casa do namorado e Moraes pernoitará lá. Mas só tem um quarto, então Moraes já terá de dormir no sofá. – ele olhou no relógio. – Lorena disse que ficaria na rodoviária esperando o próximo ônibus para Mogi.
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  - O quê? De jeito nenhum! – falei, um pouco mais exaltado do que deveria estar.
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  - Logo, aí está o favor à Julia. E eu… – ele riu, sem graça.
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  - Tudo bem, por mim não tem problema. Tenho quarto para ela. Para Moraes também, se ela preferir dormir em uma cama.
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  - Falarei com a Ju agora. – Eduardo meu deu um forte abraço. – Às vezes eu acho que nossa amizade é mais conveniente para mim.
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  - Eu tenho meus momentos também, Du. – sorri. – Ninguém quer ter amizade com um cara que nunca tem tempo para nada.
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  - Ainda acho que você deveria se mudar para o mesmo prédio que eu.
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  - E ter que ver você todos os dias? Ou pior. Ver a Julia? – ergui uma sobrancelha. – Não, obrigado.
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  Eduardo riu e me deu um tapa de leve no braço, se afastando para contar às mulheres sobre minha oferta. Voltei a uma conversa com Bruno e sua esposa, que haviam acabado de ter o primeiro filho. Eles não estavam muito satisfeitos com o pediatra deles, porque o homem estava para se aposentar, então já não estava tão esforçado quanto antes, mas não havia outro com um preço razoável para atende-los. Logo, decidi fazer um pro bono para os dois e combinei que veria o pequeno Hiago no dia seguinte, apenas para garantir que estava tudo certo e pedir por alguns exames.
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  - Então. – Julia surgiu no meio de nossa conversa. – O desaparecido se tornou o salvador das donzelas.
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  Olhei para Julia, que sorriu para mim. Encarei Bruno e sua esposa, que compreenderam ainda menos que eu sobre o que ela falava.
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  - Achei que você tivesse sua própria mulher, Caio. – ela continuou.
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  - Até onde eu sei, estou solteiro.
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  - Ainda? – Bruno abriu a boca. – Se você quiser, Bri tem algumas amigas do curso…
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  - Estou por opção, mas obrigado, Bruno. – sorri para ele, que apenas fez uma careta de quem não aprovava a situação. – Não há muito tempo para namoradas no início da carreira.
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  - Nunca teve tempo para nada, você quer dizer. – Julia ergueu uma sobrancelha. – Namoradas é apenas uma delas.
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  - Ju… – Eduardo chegou e sorriu sem graça para mim, que com meu olhar perguntei o que diabos estava acontecendo.
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  - De qualquer maneira, obrigada por acolher as meninas na sua mansão. Veja se não se aproveita delas, me ouviu?
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  - Desculpe, acho que está na hora de irmos.
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  - Eu também acho. – Moraes olhou feio para Julia, que apenas ergueu os ombros em meio a uma expressão alterada do álcool e deixou ser levada por Eduardo, que disse que me ligaria no dia seguinte para beberem algo. – Escuta, apesar da embriaguez da Julia, obrigada de verdade por nos oferecer seu apartamento. – ela me encarou. – Eu realmente não queria dormir no sofá. E nem Lori na rodoviária. Não é, Lori?
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  - O quê? – ela me encarou. – Ah, sim. Obrigada.
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  - Não tem de quê. – respondi. – Nós podemos ir ou vocês querem ficar mais um pouco?
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  - Podemos ir, claro! – Moraes se sobressaltou. – Você se importa de passarmos no apê da Lu? Deixei minhas coisas lá.
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  - Não, só preciso do endereço.
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  - Ai que ótimo, obrigada, Caio.
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  Moraes foi falando durante todo o percurso até a casa do namorado de Luana e então de volta para meu apartamento. Lorena manteve-se calada, comentando algo aqui ou ali quando eu ou Moraes a colocávamos no assunto. Ela decidiu ir no banco de trás, alheia ao meu campo de visão.
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  - Fiquem à vontade.
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  - Você se importa se eu fumar?
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  - Você se importa de fumar na sacada? – perguntei, abrindo a porta balcão para área que, apesar de externa, era coberta e muito bem mobiliada, graças à designer de interiores que paguei para deixar minha casa habitável para os meus pais.
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  - Uau. – ela disse. – De jeito nenhum. Eu posso até dormir aqui, se quiser.
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  Dei uma risada e deixei tudo preparado da maneira mais confortável possível.
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  - Não preciso dizer que você pode pegar o que quiser.
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  - Até os vinhos?
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  - Inclusive os vinhos. – suspirei. – Não tenho hábito de beber sozinho e tirando Eduardo e minha família, vocês são as primeiras convidadas a me visitar.
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  - Caraca. E da onde surge tanto vinho?
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  - Presente de clientes, a maioria. Eles acham que médicos curtem se embebedar.
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  - E não curtem? – ela riu.
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  - Esse aqui pelo menos, não. – ri também. – Eu vou entrar, preciso de um banho.
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  - Claro, você está trabalhando desde manhã. – ela se levantou. – Boa noite, Caio.
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  - Boa noite, Moraes. – sorri, começando a fechar a porta balcão para deixa-la encostada, quando sou chamado novamente, de modo que pausei meu movimento com a porta.
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  - Você que hoje é… – ela apontou para dentro, onde Lorena estava tomando um banho.
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  - O quê?
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  - Hoje faz onze anos. – ela somente disse, o que foi suficiente para mim compreender.
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  Olhei no relógio que ainda mantinha em meu pulso para ver que já havíamos passado da meia-noite há um tempo. 18 de setembro foi exatamente o dia quando a vó Leila perdeu para o câncer.
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  - Apesar de não parecer, ela ainda sente muito a perda da vó Leila. – Moraes sussurrou.
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  Assenti, crente que ela tinha razão. Não havia mais o que falar, então deixei minha mão terminar o trabalho de fechar a porta balcão e segui a caminho do meu quarto. Quando cheguei à porta, olhei para a porta do quarto ao lado do meu, onde Lorena estava acomodada. Vi que a luz estava acesa, mas não havia sinal do chuveiro estar ligado.
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  Resolvi encarar o peso que minha consciência fazia desde a morta da vó Leila e caminhei até a porta do quarto de Lorena, batendo levemente três vezes.
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  Não demorou muito para ela abrir. Quase tomei um susto, pois Lorena usava os cabelos presos em duas tranças, assim como o dia em que a conheci.
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  - Aconteceu algo? – ela perguntou.
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  - Não, é… – tentei falar, mas as palavras simplesmente se perderam no meio do caminho. Fiquei encarando ela, com aquelas tranças, e pude enxergar a menina no macacão jeans, as botas vermelhas e o chapéu de palha, cuja sombra cobria o rosto inteiro.
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  Apesar de Lorena estar mais de 15 anos mais velha, era como se nada tivesse mudado. Eu continuava mais alto e rígido. Ela continuava com o mesmo olhar calmo e a postura despreocupada.
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  - Sei que está cansada – comecei a falar. –; acabei batendo sem pensar.
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  - Precisa me dizer algo? – ela me encarou, seus olhos esperando tudo e ao mesmo tempo nada.
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  Me perdi pensando em quantas vezes quis que Lorena dissesse, através de seu olhar, o que queria que eu fizesse. Quando eu cometia algum erro com ela ou quando eu estava prestes a fazer algo que achava ser melhor se tivesse sua aprovação. De uma maneira ou de outra, eu sempre precisei do apoio de Lorena, e foi exatamente por isso que decidi me tornar pediatra. É muito mais fácil ser um dos apoios fundamentais de crianças e da família no geral.
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  - Há muito eu preciso te dizer algo. – disse. – Para ser sincero, eu preciso dizer muito. – engoli seco, vendo que ela não moveu um fio de sua sobrancelha para me mostrar uma reação. Seus olhos mantiveram-se atentos em mim. Limpei a garganta. – Acima de todas as coisas que preciso te dizer, está uma que… bem. Me desculpe. – pausei, pensando em como tornar meu pedido de desculpas mais real e sincero. – Depois que paramos de nos falar, tive tempo suficiente para rever todas as minhas atitudes. Não fui justo com você. Não fui, nem de perto, o amigo que talvez você achava que eu fosse.
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  - Caio…
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  - Foi o fascínio. – entrei no quarto dela quando vi uma brecha e sentei-me na poltrona que havia em um lado do quarto. Lorena fechou a porta atrás de si e sentou-se na poltrona oposta. – Toda aquela vida aqui em São Paulo… o rumo à independência dos meus pais… a necessidade de ser alguém maior do que esperavam de mim… eu estava extasiado com tudo aquilo, Lorena. Foi por isso que me afastei.
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  - Eu não fazia parte desse novo mundo.
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  - O pior é que fazia. Você e Eduardo. – disse, com um meio sorriso. – As duas únicas pessoas que cuidaram de mim sem me fazer sentir um completo tolo. O problema era que você estava longe. Eduardo sempre esteve ao meu lado. Quero dizer, dividíamos um quarto, não dava para me afastar dele nem que quisesse. Além disso, ele pagava as minhas contas.
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  - Ele pagava? – ela arregalou os olhos. Assenti. – Achei que seus pais…
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  - Eles estavam com medo de estragar a vida do Samuel. Achavam que porque eu fazia medicina, teria um futuro mais garantido. E Samuel havia engravidado Milena. Os dois estavam perdidos. Meus pais acharam melhor ajuda-lo. Não tenho mágoa nenhuma. Eles apenas se esqueceram de que para eu ter um futuro promissor e garantido, era necessário que primeiro me formasse. – ri, sem graça. – Eduardo me ajudou. Inventou para o tio Jorge que o cursinho havia ficado mais caro. Com aquilo, conseguia pagar minha parte das contas.
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  - Por que não me contou?
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  - Você sabe como eu era. Todo machão. – ri, vendo um sorriso em seu rosto. – Você estava fazendo enfermagem, seguindo sua vida, mostrando do que era capaz. Eu queria fazer o mesmo. Se você soubesse que eu não tinha nem como pagar minhas contas… o fascínio se quebraria.
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  - Claro. Nada de independência.
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  - Isso. Mas não pensei que minha falta de valor sobre você fosse nos afetar tanto. Quero dizer, quando as pessoas estão aqui, você não pensa que irá perde-las até, de fato, elas não estarem mais aqui. E então era tarde demais.
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  Ficamos calados. Não pude olhar para Lorena. Ela me lembrava tudo agora. Nossa infância. Adolescência. A vó Leila.
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  - Eu o vi uma vez, há alguns anos, no túmulo da vovó. – Lorena disse. – Tio Tupi disse que você sempre passa lá quando volta para Guararema.
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  - A vó Leila, assim como para todo mundo na cidade, também foi como uma mãe para mim. – abri um pequeno sorriso. – Parte de mim foi porque queria ver você, se desculpar, arranjar uma maneira de me redimir. Mas a maior parte foi porque eu queria que ela voltasse a viver para que eu pudesse fazer certo.
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  Arrisquei encarar Lorena, mas a cena foi pior do que eu imaginava. Seus olhos estavam vermelhos e as lágrimas caíam sem parar pelo rosto. Era a pequena Lori, mas com a aparência de uma Lori madura. Ainda assim, ela não parecia nada segura. Parecia… desamparada.
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  Foi por isso que sem pensar me levantei de minha poltrona e fui até ela apertá-la em um forte abraço.
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  - E-eu sinto falta dela… – ela chorou em minha camisa. – Todos os dias…
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  - Eu sei. – sussurrei, acariciando a cabeça dela.
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  - E-e de repente eu não tinha a vovó e-e nem você.
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  - Foi minha culpa, me desculpe. – fechei os olhos, tentado evitar imaginar o tamanho da dor que Lori sentiu naquela época. – A culpa foi toda minha, Lorena.
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  - Eu poderia ter me esforçado mais. Obrigado você me ouvir.
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   Respirei fundo e segurei em seus ombros, afastando-a de mim.
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  - Você não pode viver de “se’s”, Lorena. – encarei seus olhos, sério. – As coisas aconteceram daquela maneira. Passou. – limpei suas lágrimas. – E eu estou aqui agora. E mesmo que você não queira, eu continuarei aqui. E ficarei aqui para sempre.
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  - Aqui? – ela olhou para mim assustada.
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  - Com você, é claro. – me sentei no chão à sua frente. – E eu vou cuidar de você. Cuidar do seu tio, assim como cuidarei dos meus pais e do meu irmão. Do meu sobrinho e da minha cunhada. E de Eduardo. E até Julia, apesar de às vezes achar que nossos santos não se batem.
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  Lorena riu com meu último comentário.
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  - Julia é assim com todo mundo que ama.
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  - Então coitado do Du. – ergui os ombros, trazendo mais risadas ao ambiente.
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  Esperei que Lorena se acalmasse, para então me levantar e voltar a sentar em minha poltrona, depois de trazê-la mais para perto dela.
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  - Você não pode cuidar de todo mundo. – ela disse em meio à um sorriso. – Está aqui em São Paulo, e todos nós estamos em Guararema.
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  - Meus pais vão se mudar para cá. Mamãe quer mudar de ares e meu pai quer tentar deixar Samuel cuidar de tudo sozinho. Estamos planejando a mudança há meses. – suspirei. – Comprei um apartamento para os dois aqui nesse prédio. É melhor para mim. Eles já não estão mais jovens e a localização é ótima para os dois. Há muitas coisas para eles fazerem, como aulas de dança, artesanato e futebol para meia idade.
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  - É perfeito para eles. – ela sorriu.
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  - Você pode vir para cá terminar o curso de enfermagem. – disse.
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  Lorena arregalou os olhos.
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  - Não posso, tio Tupi… a sorveteria… era o sonho da vovó.
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  - Seu tio Tupi está muito bem encaminhado com a nova namorada, que eu saiba. – ergui uma sobrancelha. – Não foi o que Moraes disse mais cedo no jantar? – Lorena abriu a boca, mas não pode falar nada. – Se ele chegar a se casar, será um grande interesse para ele ter o próprio negócio. Além disso, tenho certeza que ele não se importará nem um pouco de deixar você viver a sua vida.
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  Vi Lori hesitar. Ela não sabia, mas todo mundo sabia que o tio Tupi havia tentado convencê-la, sem êxito, a seguir o sonho dela se tornar enfermeira.
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  - Vovó queria que eu cuidasse da sorveteria. – ela murmurou.
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  - Não. O sonho da vó Leila era que você não fosse igual a ela.
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  Lorena sabia o que eu queria dizer. A vó Leila foi, assim como Lorena tentou ser uma vez, uma enfermeira completa. Cursada. Foi na profissão que conheceu o avó de Lorena e por causa disso que acabou optando por ficar com o marido e ajuda-lo na sorveteria. No entanto, desde quando éramos pequenos, ela sempre disse que Lorena deveria ser o que quisesse.
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  A ouvi fungar o nariz e respirar fundo.
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  - Não sei se tenho idade para começar um curso de enfermagem.
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  - Está brincando? Eu ainda nem me decidi no que quero focar em meu pHd. – sorri. – Além disso, tudo o que você precisa fazer é estudar, entrar em um curso e se formar. Os estágios, indicações e trabalho, eu mesmo poderei cuidar disso para você.
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  - Você? – ela riu.
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  - Sim. Eu sou médico, lembra? E muito bom, por sinal.
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  - Vejo que seu ego continua o mesmo. – ela riu.
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  - Nah… – sorri para ela, vendo finalmente a alegria retornar, aos poucos, ao rosto que tanto passei observando durante a vida. – Você quem me faz voltar a ser aquela criança.
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  - Aquela criança?
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  - É. Você sabe. – ergui meus ombros. – Aquela criança que queria ser o seu herói.
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Fim

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Mari
Mari
2 anos atrás

Nat do céu, que história mais fofaaaa! Não queria que terminasse, eu juro! Foi uma leitura muito gostosinha, amei que você usou cidades regionais e que conhecemos, trouxe um tom intimista bem gostoso pra história. E esse principal coisa mais fofa da vida? A-mei, quero um pra mim já ahahahahahah aproveita, Lorena!!

Amei forte Aquela Criança <3 <3 <3 

Comentário originalmente postado em 15 de Maio de 2018

KellyO_
KellyO_
2 anos atrás

aaaaaaaaaaaaaaaah eu queria muito uma continuação!
queria, não. QUERO! Embora ela esteja ótima da forma que está <33333
Genteeeeee i loved!

Comentário originalmente postado em 16 de Maio de 2018

Ray Dias
9 meses atrás
  Observei a menina balançar as pernas e cantarolar alguma coisa." Read more »

EU JÁ AMO TANTO ESSES DOIS ♥

Ray Dias
9 meses atrás
  - O quê?" Read more »

NÃO ACREDITO! A Vovó da abelha? E eles se separaram por causa da morte da vovó? Ai mds! To ansiosa

Ray Dias
9 meses atrás
  - Você sabe quantas vezes tentei falar com você? Tentei te ver? Que tipo de amigo você é, afinal? –…" Read more »

EITA! Isso foi pesado. Eu me sentiria péssima realmente, e tô chateada com o Caio. Deixar de ver a Lorena, ok, mas a vovó Leila?

Ray Dias
9 meses atrás
  - Eu espero que você salve muitas vidas, Caio. Milhares, para que compense a sua falta na vida da vovó…" Read more »

Ei, isso foi um pouco demais Lorena, calma.

Ray Dias
9 meses atrás
  Lorena nunca chegou a conhecer, de fato, os pais. Durante nosso crescimento, aprendi que alguns dias eram difíceis, enquanto a…" Read more »

Uau, essa frase foi poética, linda! Eu anotei ♥

Ray Dias
9 meses atrás
  - Com você, é claro. – me sentei no chão à sua frente. – E eu vou cuidar de você.…" Read more »

Amigo, a Júlia te odeia, isso ficou nítido pelo álcool, e eu quero só ver a cara dela se souber que só tá casando pq você ajudou o Du.

Ray Dias
9 meses atrás
  - Aquela criança?" Read more »

Puta merda, essa frase final me quebrou tooodinhaaaaaaaaaaaaaa

Ray Dias
9 meses atrás

Natashia! PLMMDS ! Me diz que tem outra fanfic desses dois em um novo momento da vida deles, com ela estudando e morando com ele, e tudo o mais! Ai nossa, eu amei tanto essa história, do começo ao fim! Esse grupo de amigos tão legal, exceto a Júlia que me parece uma chata kkkkkkk E não posso deixar de dizer que também senti falta da vovó Leila! ♥


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