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História NÃO RECOMENDADA PARA MENORES ou PESSOAS SENSÍVEIS.

Esta história pode conter descrições (explícitas) de sexo, violência; palavras de baixo calão, linguagem imprópria. PODE CONTER GATILHOS

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Starfall

Escrita porSoldada
Revisada por Lelen




CAPÍTULO 01 • SMELLS OF WINTER AND BLOOD

Tempo estimado de leitura: 45 minutos

NYX • OUTRO LADO.

  O grande salão abria-se à sua frente de maneira ordenada e com ângulos precisos.
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  Paredes altas de mármore escuro como a noite se estendiam pelo salão de forma quase infinita. Se ele inclinasse sua cabeça para trás, sabia que não conseguiria ver onde estava o teto; tinha a estranha sensação de que estava envolto pelos céus, pela noite e as estrelas que pontilhavam os horizontes todos os dias. Mesmo o chão parecia um espelho refletindo-os, levemente embaçados, com a fina camada de água estagnada, estranhamente mais cálida do que deveria. Ao centro de tudo, havia apenas uma mesa de pedra, lisa e polida, cinzenta, carregando tomos e antigos escritos, além de um globo de metal vazado com pequenas esferas girando umas ao redor das outras. Inúmeras esferas que pareciam se projetar infinitamente, dependendo da forma que se observava-as, como dois espelhos colocados diante de si mesmos.
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  O barulho de seus passos era abafado pela água estagnada, esta, por sua vez, adentrava pelas costuras de suas botas escuras de combate, e umedecia seus pés; os ferimentos recentes que ele havia adquirido apenas pelo despeito de sentir alguma coisa, mesmo que fosse somente dor, deveriam ter latejado com o toque da água, mas tampouco o fizera, amortecidos para aquela realidade. A capa escura que o envolvia, pesava um pouco mais com as pontas umedecidas sendo arrastadas atrás de si. Por instinto, ele ajeitou, mais uma vez, as luvas que envolviam suas mãos. O material pesado e espesso, feito sob medida por um dos mais confiáveis ajudantes de Thesan, da Corte Crepuscular, o impedia de destruir acidentalmente qualquer coisa que o tocasse, mas havia tornado-se um refúgio, quase uma necessidade impulsiva enraizada em seu subconsciente, verificá-la, mesmo dentro de um sonho, se ainda estava presa. Se porventura não tivesse se permitido distrair e condenado mais alguém…
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  Aproximou-se a passos vagarosos em direção do globo, estreitando os olhos. Sabia que nada naquele lugar era de fato o que parecia ser. Sabia que eram ilusões e peripécias daqueles que se auto intitulavam como Tylwyth Tegs; monstros daquele mundo, seres zombeteiros e sombrios que se escondiam por entre as sombras e dentro da escuridão, que se deleitavam com peripécias cruéis e distorções, que viviam por acordos distorcidos e palavras repletas de subterfúgios e lacunas. Se ele e seu povo eram faes, os Tylwyth Tegs, certamente, eram seus ancestrais — ou seus futuros. Era o que esperava do Outro Lado. Eram a contraparte da Mãe, ou até mesmo algo parecido com a Mãe. Monstros, todos eles, mas não menos poderosos do que aquele que carregava o nome de seu líder.
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  Arwan. O guardião do Outro Lado, o líder da Caçada Selvagem, o monstro que agora o encarava com curiosidade.
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  Havia o conhecido duas semanas após o incidente no Poço, surpreendeu-se ao deparar-se com a criatura. Era perceptível que não pertencia nem a um, nem a outro mundo, era algo preso entre as linhas de vida e morte, transitava-as como se não passasse de uma pequena travessia, um mero caminhar de um lado para o outro, e ficara confuso quando se deparou com Nyx. Na época, um mero menino de 8 anos, Nyx não havia compreendido tal comportamento, na verdade, até ofendido poderia dizer que havia ficado, mas conforme foi crescendo, e seu tempo entre aquelas duas realidades tornou-se um hábito e não mais uma novidade, percebeu que a surpresa de Arwan se dava simplesmente porque não era quem ele esperava encontrar. Mais um dos amargos lembretes de que deveria ter sido aquela maldita garota a estar presa ali, e não ele.
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  Ela, traiçoeira como os seus, que havia escapado e desaparecido sem rastros, que ali deveria ter se condenado, não ele. Aquele era o destino dela, não dele; como a distorção poderia ter-se feito com tamanha facilidade ao imputar tal punição nele e deixá-la livre? Como aquilo poderia ser justo?
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  Encontrá-la havia se tornado, ainda que por um breve período efêmero de tempo, sua obsessão pessoal. Havia feito de tudo para a localizar e a fazer pagar pelo que tinha feito com ele; por tê-lo condenado. Eventualmente havia acabado por desistir. Como poderia encontrar alguém que parecia ter desaparecido completamente? Alguém que havia se tornado algum tipo de fantasma, obscurecido em seus passos, apenas uma memória vã ao fundo de sua mente? Então ele conheceu Lyra, a neta de Thanatos. Uma vez descrita como uma criatura vil, sem compaixão e cruel como todos na Corte dos Pesadelos, ela não havia sido cruel com ele. Doce e gentil, e realmente atraente, tudo o que ele não havia se permitido acreditar por uma mentira vil contada por um monstro há muito tempo. Provou-se que era isso que a garota havia sido, uma mentira. Não havia apenas aquecido sua cama, mas seu coração, sua alma, se é que ainda possuía uma, mas Nyx jamais poderia ter alguém de fato em sua vida, poderia? Não quando era um vassalo, um servo daquele tipo de monstro.
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  Era uma figura sombria, geralmente obscurecida pelas sombras que se projetavam naquele reino; criavam ângulos afiados em seu rosto com traços finos e elegantes. Ainda assim, deslumbrante de uma maneira que Nyx jamais seria capaz de descrever com exatidão. Uma beleza tão profunda que o fazia repudiar por instinto. Todos eles eram deslumbrantes, belos como chamas, e tão mortais quanto. Os seus também era igualmente bonitos, Nyx sabia disso, mas havia uma diferença entre os seus e aquelas… coisas. Não havia perigo dentro de si, não havia perigo dentro dos seus. Aquelas criaturas? Eram uma mistura traiçoeira de beleza e letalidade que colocaria até o mais inexperiente guerreiro em guarda. Tinha os cabelos grisalhos, cuidadosamente alinhados, revelando algumas mechas escuras que pareciam oscilar às vezes, um fio ou outro, alterava-se para cintilar como fios de luzes. Como se a energia que existia dentro dele tivesse uma pequena ponta encapsulada naquele fio, movendo-se para cima e para baixo, livremente. Seus traços angulosos e austeros revelavam olhos prateados intensos, como lâminas afiadas, tão claro que às vezes Nyx questionava se não era apenas um truque de luz para ocultar a energia que existia ali. Lábios finos e maçãs do rosto altas e angulosas, unidas com uma mandíbula afiada e quadrada, terminavam a composição de uma figura intimidadora.
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  — Bem? — Arwan disse com um tom de voz baixo, gutural, que reverberou pelo espaço como uma onda de ecos. Nyx tencionou sua mandíbula, por instinto, lançando um breve olhar ao redor do escritório, tentando se certificar de que não havia acabado de cair em uma das inúmeras armadilhas que aquelas criaturas costumavam fazer, antes de voltar sua atenção para o mais velho. Puxou deliberadamente o capuz que cobria sua cabeça, passando as mãos enluvadas por entre as mechas escuras desalinhadas, tentando organizá-las rapidamente, antes de se aproximar um pouco mais.
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  Ter uma audiência com Arwan era sempre como jogar uma moeda no ar, havia apenas dois desfechos, um positivo ou um negativo, mas entre aquela fração de segundos que a moeda havia pairado pelo ar, girando, abria-se um leque de inúmeras probabilidades e resultados.
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  — O que você quer, filho de Archeron? — Apertou Arwan parecendo impaciente. Nyx tensionou com mais força sua mandíbula, estreitando os olhos, mas ainda assim não respondeu, os olhos moveram-se brevemente acompanhando o movimento da criatura, cauteloso, tentando encontrar as palavras necessárias, as palavras certas para lidar com ele.
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  — O que o faz pensar que desejo algo, senhor? — Nyx respondeu por fim, tentando reproduzir ao máximo que podia a voz aveludada e convidativa que seu pai costumava usar nas reuniões entre as Cortes. Não era assim tão simples, uma vez que eram exímios mentirosos, Arwan podia ver a mentira e falsa cortesia como um vidro em Nyx. Portanto, concentrou-se ao máximo em tudo o que poderia ser positivo, naquela parte de sua mente que havia se convencido de que as coisas eram como eram, e que não havia nada a ser feito, na parte de sua mente que havia aceitado aquela injustiça, mesmo que o restante lhe implorasse para lutar, para encontrar uma maneira de fugir dali. — Não posso simplesmente saudá-lo?
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  Arwan parou de caminhar, oscilando de um lado para o outro por um momento, antes de um sorriso afiado surgir por entre seus lábios finos. Era uma visão que costumava impressionar, e, ao mesmo tempo, aterrorizar. Era raro vê-lo sorrir, portanto, conseguir o feito era o suficientemente digno de nota e parabenização pelos outros Caçadores; nunca era algo bom tê-lo sorrindo.
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  — Claro que pode — Arwan murmurou, parando à frente de sua mesa, os olhos prateados desviaram-se do rosto de Nyx para focalizar nos papeis que se espalhavam sobre a pedra lisa e moldada a seu desejo. Dedos longos, ossudos e obscurecidos da mesma forma que os de Nyx repousaram sobre o material, puxando um ou outro papel ao lê-lo com desinteresse. — Mas você nunca vem me visitar se não para pedir por algo, filho de Archeron. Não posso evitar de contemplar o que deseja agora? Mais tempo? Roupas novas? Acesso a algum segredo? Sabe o preço para isso, não tem por que fingirmos que isso é algo que jamais será.
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  Nyx sentiu uma pequena pontada em seu orgulho com o comentário, mas não disse nada. Os olhos fixaram-se brevemente na mesa à sua frente, nas folhas, unindo as sobrancelhas. Encantamentos, em sua maioria, todos escritos em uma língua antiga e arcaica que apenas tia Amren e seu pai conheciam com profundidade, uma língua que Nyx havia se obrigado a aprender. Uniu as sobrancelhas, observando pequenas pontuações desconexas: algo sobre uma prisão dentro de um lago, algo sobre um deles, um deus da morte, ainda aprisionado à beira de um lado tentando libertar-se e então, para sua completa surpresa, algo sobre a Corte Invernal. Os olhos azuis de Nyx voltaram a fixar-se no rosto de Arwan, analisando-o por um longo tempo, antes de arriscar-se a dizer algo.
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  — A próxima incursão será na Corte Invernal? — perguntou, direto, e arrependeu-se no mesmo segundo. Se havia algo que Nyx havia aprendido muito cedo desde que havia caído naquele contrato traiçoeiro era que ele não deveria questionar as motivações ou os interesses de Arwan para fazer o que desejava.
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  Os olhos de Arwan se estreitaram, analisando-o por um tempo com igual intensidade, observando os mínimos detalhes, inquisidor, antes de voltar a mexer nos papeis espalhados por sua mesa.
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  — A sua tarefa é apenas seguir as ordens do meu arauto, filho de Archeron — retorquiu Arwan, sua voz era afiada, mais um golpe no ego de Nyx, mas soava desinteressada ao invés de irritadiça. Essa era a pior parte de Arwan, o desinteresse. Se Nyx pudesse engajá-lo em alguma coisa, por menor que fosse, se pudesse despertar ao menos seu interesse ainda que mínimo por alguns breves segundos, então, talvez, apenas talvez, ele pudesse encontrar as respostas necessárias para livrar-se daquele acordo e daquelas criaturas. Mas Arwan era tão velho quanto a própria morte, e tão desinteressado quanto um deus diante de sua criação. — O que o faz pensar que tem direito a ter acesso aos meus planos e ao que deixo de fazer?
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  Nyx engoliu em seco, tentando conter a frustração e a raiva que acalentou suas veias, que as incendiou por uma fração de segundos, antes de obrigar-se a desviar os olhos do semblante quase divertido da criatura. Ainda estava tentando compreender onde colocar aquela emoção, ainda estava tentando compreender como entendê-la e onde colocá-la. Não era ruim, mas igualmente não era boa, apenas desconfortável. Havia um desejo de agradá-lo que havia nascido por pura esperança infantil e desabrochado em algo mais perigoso, fácil de enganar-se. Quase afeto… um desejo de receber a aprovação daquela criatura milenar que o observava com desinteresse, e, ao mesmo tempo, curiosidade. Analisava suas reações com cuidado, e parecia saber exatamente o que se passava em sua mente, mesmo que esta criatura não pudesse ler sua mente. Um olhar de simpatia atravessou o semblante da criatura, um olhar que Nyx julgou que deveria existir nos olhos de seu pai, e todavia, encontrava-o no rosto daquele ser estranho e distante, naquele Tylwyth Teg que conhecia apenas os prazeres oferecidos da crueldade, do sangue e da escuridão; naquele ser vil, e não nos olhos de seu pai.
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  Nyx havia perdido muito mais do que apenas sua liberdade na noite que caiu naquele poço. Na noite em que conheceu aquela maldita garota.
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  — Arrogância, talvez — Nyx respondeu por fim, com um suspiro pesado. Não ergueu seu olhar, pelo contrário, permitiu-se encarar o globo vazado, onde os globos menores cuidadosamente pintados giravam ao redor de si. Astronomia nunca havia sido seu forte, Nyx havia desenvolvido uma apreciação maior a livros sobre combate, sobre estratégia e história, havia tornado-se um excelente guerreiro illyriano com a ajuda de tio Azriel, era Aurora quem tinha afinidade com aquele tipo de coisa. Era Aurora a sonhadora que olhava para os céus, e os admirava, especialmente durante a Queda das Estrelas. Nyx apenas os observava sob os céus, durante aquele dia em específico, acompanhado pelo povo de Arwan. — Peço desculpas, não foi minha intenção ofendê-lo.
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  Arwan soltou um riso baixo, seco e desprovido de emoções, mas não era exatamente ameaçador, era apenas… superficial de certa forma. Sentiu Arwan se mover pela sua direita como uma sombra, o cheiro pungente era silvestre, uma mistura difusa de terra molhada, frutas e algo mais profundo, dentro da floresta, algo que lembrava a sangue, e a morte, metálico.
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  — Os seus sempre se portaram com tanta pompa e etiquetas, querem provar-se civilizados, sempre me fizeram contemplar se existe a necessidade de afirmar algo, sequer o são? — Arwan comentou a ninguém em particular, e Nyx trincou os dentes. Seu impulso era discordar, defender-se, mas havia convivido tempo o suficiente naquele lugar para saber que era feito apenas com o propósito de conseguir uma reação, e naquele mundo, reações poderiam ser algo perigoso a exibir. — É o que nos liga, sabia? Os seus e os meus, a selvageria, a perversidade dentro de si — pausou por um momento, atraindo os olhos azuis de Nyx para seu semblante austero e distante, fazendo-o unir as sobrancelhas, consciente demais da proximidade que Arwan estava de si. — Tudo o que pedi a você foi apenas um dia, Nyx Archeron. — A mandíbula de Nyx se trincou com mais força, um pequeno músculo saltando, acentuando os ângulos de seu rosto. — Não pode oferecer-me nem mesmo isso?
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  Engoliu em seco.
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  — Foi ousadia minha considerar pedir algo ao senhor — Nyx obrigou-se a responder, o mais polido e educado que conseguia, seus olhos azuis queimando de frustração e raiva, desviaram-se para a mesa à sua frente, tentando obrigar-se a relaxar na presença de Arwan para não atrair a atenção errada, e falhando miseravelmente.
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  A mão, ossuda e com unhas mais longas do que a de um guerreiro mortal deveriam ter, repousando sobre o ombro esquerdo de Nyx. Era estranho, uma criatura como ele, quase um espectro, ter um aperto tão reconfortante, tão seguro. As pontas das unhas enroscaram-se nas tramas da capa de Nyx, rasgando-a brevemente, quando Arwan ofereceu um aperto compreensivo, quase paternal.
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  — Não se preocupe em se desculpar, garoto — Arwan disse com um tom de voz mais gentil do que Nyx estava acostumado a ouvir. Observou com uma ponta de irritação que uma criatura como aquela, um monstro que se ocultava por entre as sombras e parecia preso entre duas realidades completamente distintas, era capaz de demonstrar uma gentileza e compreensão que nem mesmo seu pai parecia ter. Não depois do Poço. — Tive um, como você, há muito, muito tempo — Arwan murmurou com desinteresse antes de soltar o ombro de Nyx e indicar com a cabeça para que o seguisse. Os passos eram abafados pela água que envolvia o chão, mas o cheiro de incenso e comida fresca foi o que convenceu Nyx a segui-lo. Conhecia aquela regra, jamais comer da comida de um estranho ou de alguém que não se confia, havia pequenos truques e feitiços que poderiam prender alguém ali, sua mãe o alertara dos antigos costumes humanos. Mesmo que não fosse esperado que alguém como Nyx o tomasse, não lhe doeria ao menos manter tal coisa ao fundo de sua mente quando se deparava com um lugar desconhecido. — Curioso quanto, pedia por tudo. Foi tomado de mim, de certa forma, antes que pudesse oferecer um pedaço de pão ou uma história de dormir. Suponho que seja assim que seus pais se sintam com relação a você? É por isso que deseja o dia da Queda das Estrelas, para comparecer ao evento deles?
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  Nyx não respondeu. Estava surpreso demais com a quantidade de informações que Arwan poderia saber mesmo estando naquele limbo esquisito e silencioso. Um tremor envolveu seu corpo, deslizando por sua espinha como pequenas ondas de choque gélidas. Obrigou-se a manter sua expressão firme, distante, impenetrável, mas algo em seus olhos deveria ter escapado, porque Arwan havia soltado um riso baixo, seco, entretido. Este era o perigo de ter a atenção de uma criatura como Arwan voltada para si: a certeza de que seria nada mais do que um brinquedo em suas mãos, e a iminente desgraça que o acompanharia. Nenhum deles, os Tylwyth Tegs eram conhecidos por devolver seus brinquedos vivos no mínimo.
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  — Se mandar Lyall e os outros, certamente encontrariam sua… criança perdida. — Nyx contornou a situação, fingindo que não possuía interesse no assunto, ao voltar sua atenção brevemente para o semblante distante da entidade ancestral à sua esquerda, antes de focar na curva que o corredor fazia ao inclinar-se para baixo da terra, como um dos túneis da Corte do Pesadelos, mas com mais vinhas e terra do que pedra esculpida.
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  Seu estômago se contraiu, e Nyx fechou os olhos por um momento, tentando afastar de sua mente a memória, ainda vívida, de sua mente. Sua garganta se apertou, de repente, parecendo sensível demais até mesmo para engolir sua saliva e suas mãos, mesmo envoltas pelas luvas, pareceram estar congelando. Obrigou-se a continuar andando, mantendo os olhos fixos no chão, obrigou-se a não pensar em como a escuridão estava os engolindo, ou como o ar parecia começar a ficar levemente rarefeito ao seu redor, como as correntes de ar tendia a ser mais frias abaixo da terra do que em sua superfície, especialmente durante a primavera e o tempo estava úmido. Obrigou-se a focar no barulho suave da sola de suas botas de combate, e não na maneira com que seu coração martelava, intensa e irregular, contra seu peito, fazendo-o doer. Não fazia ideia de que poderia se sentir daquela forma, mas uma das consequências da queda, e da maldição que carregava, era a sensação inescapável de vertigem que o sufocava na maioria das vezes quando se aproximava de algum lugar fechado ou escuro.
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  — Aprecio seu interesse, Nyx Archeron, mas não é falta de conhecimento que me impede de localizar e trazer minha criança de volta para casa — informou Arwan calmamente, até mesmo de forma mais fria do que usava com Nyx por vezes. — Sei onde está, o que está fazendo, mas como deve ter percebido, tudo o que vive aqui e existe aqui, precisa de consentimento para o fazer. Ninguém chega em minhas terras contra sua vontade, e isso inclui você.
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  Nyx trincou os dentes com força, sem conter um sorriso irônico, sarcástico com o comentário. Era ridículo a ideia de que havia livre arbítrio ali, Nyx não queria ter aceito aquele acordo, e, todavia, lá estava ele, sem ter para onde ir ou fugir. Ele estava fadado àquele destino, a um destino que não lhe pertencia, puramente porque estava no lugar errado, na hora errada, acompanhado da pessoa errada. Não haveria como alterar tal fato, era o que era. A distorção nas palavras de Arwan era um claro demonstrativo da natureza dos Tylwyth Tegs… manipuladores, fariam você acreditar que a escolha havia sido sua, e não deles. Uma maneira de afagar seus egos, talvez, ou, então, apenas uma maneira de acalentar o peso da culpa. Nyx considerou as palavras do mais velho por um longo tempo, seus olhos, tempestuosos, fixaram-se no reflexo distorcido que a água que envolvia o mármore escuro reproduzia.
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  De certa forma, quando olhando daquela maneira, os dois eram até mesmo parecidos. Veja ele era a cópia escarrada e cuspida de seu pai, Feyre sempre pareceu orgulhosa disso embora a cor de sua pele e os olhos fossem mais próximos dos da mãe. Mesmo Nyx precisava admitir que era uma cópia de seu pai, não apenas pela aparência, mas pelo temperamento teimoso e a tendência em usar políticas a seu favor. Ocultava o que precisava ser ocultado para manter a segurança, e fazia o que precisava ser feito para manter o equilíbrio e aqueles dois mundos separados. E se tivesse sido egoísta ao escolher Lyra como sua parceira, então poderiam culpá-lo? Quando a história de como Rhysand havia “roubado” sua mãe de Tamlin ainda era lembrada? Nyx não compreendia ao certo a extensão dos problemas que Feyre havia passado na Corte Primaveril, apenas sabia o que os pais haviam contado: Feyre não estava bem, Tamlin não era uma boa pessoa, Rhysand a salvou, o que contam sobre Rhysand tê-la roubado era mentira, Feyre já iria abandoná-lo semanas antes, Rhysand foi apenas o cataclisma da situação.
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  Mas se Nyx havia aprendido algo, ao menos, com sua queda no Poço era que os traidores não sentiam culpa. Justificavam suas ações por desculpas esfarrapadas, racionalidades efêmeras e sem fundamento, apenas para fazerem-se menos culpados do que de fato eram. Se aquela maldita garota tivesse se sentido no mínimo um pouco culpada por ter deixado-o para trás, não teria ela voltado? Não teria tentado consertar as coisas? Os traidores não se culpavam, nem seus pais o faziam. Culpavam a vítima porque era mais fácil acalentar seus egos.
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  Manteve seu olhar fixo no final do corredor estreito que o guiava. Quando este abriu-se novamente, em uma entrada concavada no chão, adornada por raízes que se enroscavam formando um portal que cheirava a floresta, percebeu que ao centro de tudo havia uma mesa elegante, coberta por tecidos finos feitos de teia de aranha, tão delicados quanto papel, e tão maleável quanto seda, brancos como a neve sobre a mesa de mogno esculpida como vinhas. Acima deste, havia um verdadeiro banquete, característico daquele povo tão familiar e tão estrangeiro quanto. Carnes, em sua maioria, cruas repousavam sobre travessas feitas de ouro ou cobre, que lembravam o trabalho delicado de uma folha, taças alongadas de um vidro fino fundidas com os mais variados tipos de cristais exóticos, se espalhavam com água e mesmo um vinho escuro, adocicado e atrativo. Flores das mais variadas formas e cores eram servidas com caldas de açúcar ou algo salgado. Mesmo larvas e insetos permaneceram expostos sobre uma tigela de vidro, revirando-se e até mesmo desabando na mesa, arrastando para longe de onde ocorreria sua morte. O cheiro variado era rico e terrivelmente familiar, o fez lembrar de casa, das festas de aniversário, das celebrações e até mesmo dos convites para visitar outras Cortes em assuntos formais quando seu pai lhe permitia acompanhar.
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  Era um truque, uma ilusão, uma falsa gentileza que o prenderia mais ainda ali.
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  — Não pode simplesmente convencê-lo a vir? É o pai, não é? Filhos obedecem a seus pais, independentemente do que lhe digam. — A amargura em sua voz havia soado mais afiada do que desejava, exposto mais do que desejava, mas Arwan não pareceu se importar. Indicou com o queixo na direção da cadeira ao lado da dele, em uma oferta silenciosa de apaziguamento. Nyx não disse nada, apenas se sentou ao lado em silêncio, alçando uma das flores silvestres cristalizadas em açúcar, esmagando-a, distraído, transformando-a em pó.
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  — Se acaso seu pai o convocasse agora, iria até ele? — Nyx apenas assentiu com um suspiro pesado, observando a coloração levemente avermelhada da flor manchar as pontas de suas luvas. — Você o conhece, criança Archeron, talvez seja por isso que a necessidade de lealdade se faça presente. Você o ama. — Arwan suspirou pesado, deixando-se recostar contra sua cadeira. Alçou uma taça de vidro com vinho escuro e pungente, mas não a tomou, apenas a observou com uma expressão distante, quase pesarosa. — A minha não. Nem me conhece, nem me ama. Sou apenas um fantasma, um prisioneiro em um domo de vidro espelhado, capaz de observar a tudo, mas sem jamais tocar. É por isso que escolhi você, Nyx. É por isso que sabia que viria, eventualmente, ser útil a mim.
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  Nyx congelou no lugar. Não se atreveu a olhar de volta para Arwan, mas podia sentir os olhos prateados fixos em seu rosto, analisando minuciosamente até mesmo a mínima reação, sua respiração se tornou mais lenta, tentando controlá-la mordeu o interior de suas bochechas com força, os dentes fincaram-se na carne, sentindo o gosto metálico não demorar muito para tingir sua língua, e escorrer por sua garganta. Sua expressão, treinada para permanecer neutra, permaneceu distante.
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  — Você me escolheu? — Ecoou Nyx, tentando compreender o que aquelas palavras poderiam significar: Arwan era o líder dos Tylwyth Tegs, era seu Rei de certa forma, suas palavras poderiam ser dúbias e apresentava-se com amplo espaço de interpretação. Ele poderia estar falando daquele maldito dia no Poço, quando a garotinha o havia deixado para trás, e o condenado àquela existência miserável, quando ela desapareceu a sua frente como se fosse apenas poeira, sabe-se lá para onde quer que tenha ido. Como poderia apenas estar falando do lugar em que Nyx estava sentado, na cadeira que usava ao lado de Arwan. Com um Tylwyth Teg nunca havia certeza.
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  — Passado, presente e futuro, neste lugar, é uma coisa só, criança — Arwan explicou calmamente, repousando sua taça de vinho ao lado de seu prato, e então gesticulou para o salão grande e imponente, feito de raízes, trepadeiras, e troncos ancestrais de árvores exóticas. Ao em vez de um lustre feito de diamantes, o lustre era composto por flores fantásticas, cintilando com um brilho azulado, como se possuíssem luz própria, pulsando suavemente com magia. Seu pólen espiralava pelo ar, cintilando em dourado como ouro puro, carregando o aroma primaveril. — O tempo acontece em paralelo, junto. Está aceitando o acordo, ao mesmo tempo que vejo a razão pela qual o encontrei. Irá trazer minha criança de volta, em breve, mas para isso, preciso que fique longe da Corte Invernal. Preciso que encontre um dos meus irmãos, também aprisionado.
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  Nyx uniu as sobrancelhas absorvendo as palavras de Arwan.
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  — Quem? — Foi só o que conseguiu dizer, em uma voz fina e irregular. Deixou seus braços repousarem sobre seu colo, sentindo sua pulsação aumentar e a sensação de ter gelo correndo por suas veias se tornar quase sufocante.
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  — Koschei. — Nyx engoliu em seco, tensionando sua mandíbula e voltando seu olhar na direção de Arwan. — Pergunte aos seus pais, eles o conhecem. Preciso que o encontre, que o prepare para o que está por vir. — Arwan inclinou-se para frente, sustentando o olhar de Nyx, parecendo buscar quaisquer traços de desconfiança ou resistência no olhar do jovem. — Quero que diga a ele que na próxima Queda das Estrelas, ele será livre mais uma vez. E você, Nyx Archeron, será o responsável por libertá-lo.
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•••

NYX • MONTANHAS ILLYRIANAS

  Voltar a si o fez sentir como se tivesse acabado de romper uma barreira invisível de água. Seus pulmões inflaram com o ar que lhe invadiu o peito, queimando por suas narinas e garganta, obrigando-o a tossir enquanto afogava-se com a própria saliva. Debateu-se contra o chão, sentindo os braços o manterem preso contra o chão, grunhindo baixo e ofegante. Havia despertado de um pesadelo, mas a sensação de que parte de si ainda estava lá era gritante, quase o sufocava. Fazia sua cabeça girar e seu estômago revirar. Fechou os olhos embaçados outra vez, soltando um chiado por entre os dentes, e quando abriu os olhos outra vez, deparou-se com o rosto de Emhyr a poucos centímetros de distância do seu, parecendo alerta e preocupado ao mesmo tempo. Olhos castanhos claros quase dourados cintilando em uma emergência silenciosa. Nyx piscou algumas vezes, tentando afastar as lágrimas que embaçavam seus olhos e então ele encarou o melhor amigo com uma ponta de ceticismo.
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  — Se você planeja me beijar, me avisa dessa vez — Nyx retorquiu, usando de seu sarcasmo e ironia para desviar a atenção do melhor amigo da tempestade que se formava por trás de seus olhos azuis. É claro que Emhyr não comprou suas palavras. O illyriano endireitou-se, ainda sentado sobre o peito de Nyx, ainda com a faca abaixo de sua garganta. Nyx abriu um sorriso torto, preguiçoso. — Oh, que isso, Ems? Eu achei que a gente tinha algo! Eu já ia contar para os nossos pais sobre a gente!
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  Emhyr cuspiu, apenas pelo gesto rebelde antes de se levantar de cima de Nyx e estender-lhe a mão. Nyx hesitou por um segundo, verificando se estava com as luvas no lugar e que não havia nenhum corte ali que pudesse acidentalmente o fazer tocar na pele de seu melhor amigo — mesmo a ideia de acidentalmente machucá-lo era o suficiente para fazer seu estômago se contrair e revirar —, antes de aceitar a mão estendida. Os dedos de Nyx se enroscaram com o antebraço forte e suado de Emhyr, sentindo a maneira com que os músculos do melhor amigo se tensionaram abaixo de seu aperto. Não era algo que Nyx poderia dizer que o culpava por fazer, na verdade, até compreendia a tensão e o medo de tocar em sua pele ainda que acidentalmente, mas não deixava de ser um golpe cruel e baixo para si mesmo. Nem seu melhor amigo confiava nele o suficiente — com razão.
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  — Tsc, para de falar merda, cara, até parece que eu vou querer beijar a mesma boca que chupa a boceta da Lyra — retorquiu Emhyr com um tom até mesmo divertido, lançando um olhar fingidamente exasperado para Nyx, mas, no fundo, podia ouvir a conotação por trás daquelas palavras. Emhyr realmente detestava Lyra, realmente tinha nojo de Lyra.
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  — Oi, olha como fala dela, cara — advertiu Nyx com um tom de voz cauteloso. Não queria brigar com Emhyr, especialmente não com a única pessoa que ainda se dava ao trabalho de ficar perto dele sem que o fizesse sentir alguma coisa tóxica e monstruosa, mas ainda assim, não iria aceitar que ele falasse daquela forma de Lyra. Se não pelos seus próprios sentimentos, pelo respeito em geral.
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  — Foi só uma piada, Nyx, não precisa bancar o cavaleiro solitário…
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  — Não soou como uma piada, Ems.
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  Emhyr suspirou frustrado, jogando as mãos para o ar, caminhando em direção ao banco de madeira do lado de fora do ringue, e Nyx saltou com elegância acompanhando-o com passos mais vagarosos e cautelosos. O vento gélido era um alívio para sua pele suada, mesmo que fizesse o tecido de sua blusa, agora suja pelo treinamento constante com Emhyr, grudasse nos músculos de seu corpo como uma segunda pele, desconfortável. Nyx levou a mão direita em direção ao seu pescoço, desfazendo o nó ali, e abrindo a gola de sua blusa, antes de massagear o local.
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  — Olha, desculpa, eu não quis ofender nem você nem Lyra — admitiu Emhyr com um grunhido baixo, deixando-se sentar no banco de madeira, ouvindo aparte o ruído que o objeto fez sob o peso do homem, e então alçou a garrafa de água, terminando-a em três goles, antes de arremessá-la na direção de Nyx. Nyx soltou um riso baixo, quase discreto demais para perceber, desviando do objeto, antes de lançar um olhar fingidamente irritado para Emhyr. — É tudo isso, sabe, cara? Quer dizer, sei que nunca tive chance com a sua prima, e sei que ela merece bem melhor do que eu, convenhamos, mas o principezinho congelado da Invernal? É sério?
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  Nyx cruzou os braços por sobre seu peito, unindo as sobrancelhas, e suspirando pesado. Naquele aspecto, sentia pena de Emhyr. Emhyr era uma criatura de poder, nascida e forjada para guerra, era exatamente o filho que tio Cassian desejaria ter tido se tia Nestha não tivesse parido três meninas com suas personalidades e opiniões fortes; veja, não era que Cassian não amasse as filhas, mas temia muito mais por elas do que o faria se fosse um menino. Para crianças illyrianas a mudança era longa e o risco alto, especialmente quando você era uma garota. Sua esposa poderia ser uma Valquíria, e suas filhas, ao menos duas delas, poderiam ser guerreiras ávidas e elegantes, mas isso não alterava o fato de que muitos, especialmente da Corte dos Pesadelos, as veriam como ameaça. Emhyr havia praticamente sido adotado por tio Cassian quando tinha 13 anos. Virou um membro contínuo, e era normalmente o responsável por proteger e ficar de olho nas mais novas, mas Aurora? Bem, Aurora fazia o que queria quando queria com quem queria. Entendia que Emhyr havia se apaixonado por sua prima — mesmo que não conseguisse entender o porquê, Aurora cutucava o nariz quando era pequena e então o culpava por o fazer, e a pior parte era que todo mundo acreditava, como que aquilo iria ser atraente para alguém? —, mas entendia igualmente que a lealdade de Emhyr era muito maior e muito mais profunda com tio Cassian para sequer ousar tentar algo com Rorie. E agora ela estava noiva do herdeiro da Corte Invernal…
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  — Ah, não sei, cara, dizem que ele é bem atraente, cabelo branco igual neve, e maneiras encantadoras, o cara tem carisma, parece, talvez seja a dela — Nyx provocou com um sorriso divertido, tentando animar, em vão, o humor de Emhyr. Emhyr lançou um olhar exasperado, nem um pouco feliz. Nyx ofereceu ao melhor amigo um sorriso amarelo, passando as mãos pelos cabelos suados, tentando afastá-los de suas têmporas e maçãs do rosto. — Sinceramente, eu prefiro você.
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  Emhyr ignorou o comentário de Nyx, apoiando os dois cotovelos sobre seus joelhos dobrados e encarando as mãos calejadas pelo treinamento.
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  — Precisava ser alguém tão diferente de… de mim…? — sussurrou Emhyr baixinho, e Nyx exalou lentamente, caminhando em direção ao banco que Emhyr estava sentado, e se sentou ao seu lado, deixando suas costas repousarem contra o tronco da árvore torta, apoiando a parte de trás de sua cabeça contra a superfície áspera e torta, fechando os olhos por um momento e apenas aproveitando o silêncio e calmaria que envolviam o acampamento illyriano à noite.
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  Poucos eram os guerreiros que ficavam até tarde para treinar, a maioria ou tentaria escapar das barracas para ir ao centro da cidade e conseguir a sorte com alguma garçonete atraente de um pub, ou estariam em suas camas, batendo uma, para variar. Talvez Nyx estivesse seguindo os passos de seu nome, e sua apreciação à noite começasse a se tornar patológica. Quando abriu os olhos outra vez, seus olhos azuis se fixaram no manto escuro que cobria os céus, as estrelas marcantes e vívidas cintilando pelo horizonte o fazendo lembrar-se, mesmo a contragosto, de olhos verdes intensos, arregalados, e um rostinho assustado. Odiou-se por não conseguir olhar as estrelas e pensar em outra coisa, qualquer coisa, mesmo Lyra seria uma boa escolha; só conseguia pensar na menina.
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  Questionar-se o que diabos teria acontecido com ela, para onde havia ido, e se um dia ele conseguiria encontrá-la outra vez. Se um dia conseguisse fazê-la pagar pelo que havia feito com ele, por tê-lo condenado. A mãe sabia o quanto ele desejava o fazer. Feyre dizia que o melhor a ser feito era enterrar o passado e perdoar-se para seguir em frente em paz; não era um trabalho fácil, na verdade, pesava mais do que recompensava, mas era libertador. Nyx não conseguia acreditar na mãe, não conseguia acreditar em suas palavras, porque não era assim tão simples. A menina havia destruído sua vida inteira, e Nyx não sabia sequer o nome dela.
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  — Ela não te amaria, Ems — Nyx quebrou o silêncio que havia se formado entre os dois melhores amigos. Emhyr engoliu em seco, deixando um riso embargado escapar de sua garganta. Nyx encarou o rosto do melhor amigo com um aperto no coração. Desejou poder puxá-lo para um abraço apertado, desejou poder consolá-lo com o toque que ansiava e dizer a ele que tudo ficaria bem, mas não poderia, não sem arriscar, mesmo em um momento de distração, feri-lo. Ele já havia ferido gente o suficiente para que não desejasse arriscar. Então apenas o encarou, saudosista pelo que jamais poderia oferecer, a ninguém, e, ao mesmo tempo, compreendendo aquele sentimento de rejeição que Emhyr sentia. — Não como você gostaria que ela o fizesse. Se Skad é tão diferente de você e é quem capturou a atenção dela, então significa que ela jamais o amaria da mesma forma que você se acabassem juntos. Não ter o afeto de Aurora é tão ruim assim? Eu sei que ela é bonita e charmosa e tudo mais que vocês parecem resmungar por aí, mas sinceramente, se você chutar uma árvore, cai cinco iguais a ela, é tão ruim que não seja Aurora?
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  Emhyr tensionou a mandíbula, lançando um olhar cansado para Nyx. Os dois homens se encararam com sinceridade e vulnerabilidade, o porto seguro um do outro.
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  — Não sei se é sobre Aurora, cara, talvez… — ele pausou por um momento, calculando suas palavras. Nyx não disse nada, não o apertou, nem lhe pediu para parar, apenas esperou que ele tomasse seu tempo, para que estivesse pronto e seguro para dizer o que quer que desejava. Sem julgamentos. Sem piadas. Apenas ouvindo-o. — Acho que começou com ela, mas, é mais do que isso, sabe? Quer dizer, por que eu nunca sou sequer uma opção? Você teve sorte, é filho das pessoas mais fodas que já andaram nessa merda de terra, mas eu? O que tenho a oferecer, hm? Posso ter o respeito do General, mas para qualquer um, sempre serei apenas um segundo pensamento, uma presença conveniente. É isso que frustra, sabe? Queria que alguém me escolhesse, Nyx, que alguém… sei lá, cara, me visse de verdade.
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  — Você é a primeira opção. Para mim — Nyx retorquiu unindo as sobrancelhas, encarando Emhyr com um pouco mais de intensidade do que deveria, incomodado com as palavras que o melhor amigo havia usado. Ficou surpreso por não ter percebido que ele se sentia daquela maneira antes. Há quanto tempo Emhyr carregava aquele fardo sozinho? E por que diabos nunca havia dito nada para Nyx?
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  Emhyr bufou, um sorriso torto começando a surgir por seu rosto, outrora rígido.
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  — Como se isso fosse algo positivo — murmurou Emhyr com uma risada rouca. Nyx bufou, empurrando-o com o ombro para o lado, antes de cruzar os braços sobre o peito, e encarar sem enxergar o ringue agora vazio. Parcialmente ali, parcialmente na mesa de Arwan, ouvindo suas palavras pulsando por seus ouvidos em um loop quase irritante. O que havia na Invernal que ele não poderia encontrar? — Você é o mesmo idiota que se envolveu com Lyra sabendo a merda que faria de tudo. Seu gosto pessoal é tão deplorável quanto suas habilidades de combate corpo a corpo. Quase me ofende saber que sou sua primeira opção.
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  Nyx estalou os lábios, lançando um olhar irritado para Emhyr.
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  — Que merda, o que todo mundo tem contra a Lyra? Só porque alguma merda inventou que ela não era uma boa pessoa, não a torna imediatamente uma criminosa! — Tentou defender, mas um olhar de Emhyr foi o suficiente para quebrar sua defesa e o fazer revirar os olhos, em rendição. — Ela é horrível, eu sei, porra, minha mãe me faz lembrar disso todos os dias, mas ela não é horrível comigo.
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  — E por que você acha isso? — Emhyr retorquiu sarcástico, e Nyx o encarou irritado.
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  — Não, não começa — avisou Nyx, colocando-se de pé, começando a ficar agitado. Não queria ter aquela discussão, não naquela noite, não com Emhyr, não quando estava tão cansado e com tantas coisas para pensar.
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  — Cara até você já deve ter percebido a intenção dela — Emhyr retorquiu preocupado, os olhos dourados fixos no semblante irritado de Nyx. Por um momento, Emhyr abriu os lábios para continuar sua acusação, mas então, pareceu enxergar algo no semblante tempestuoso de Nyx que o fez pausar. Emhyr deixou-se recostar contra o tronco de árvore, unindo as sobrancelhas, em descrenças. — Puta merda, você sabe, não sabe? As reais intenções dela? Que ela só está te usando não é? — Quando Nyx não respondeu, apenas encarou Emhyr em silêncio, o outro rapaz soltou um riso desprovido de humor, repleto de descrença. — Porra, Nyx… tem algo de errado contigo, cara, é sério, isso não é normal.
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  Nyx não respondeu, não havia como responder, era verdade e os dois sabiam. Nyx estava com Lyra porque era o que acreditava que merecia — uma mentirosa que o estava usando apenas para conseguir o trono da Corte Noturna para a familiar de Keir —, acreditava que não havia mais nada para si que não fosse aquilo, e ele havia tornado-se exímio em mentir para si mesmo, em criar histórias e justificativas que a tornavam mais doce e amável apesar de seus interesses naquele… o que quer que fosse que os dois tivessem.
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  Engoliu em seco, voltando seu olhar na direção da entrada do acampamento onde três figuras encapuzadas se aproximavam. Reconheceu tio Azriel de longe, ele estava sempre acompanhado por suas sombras, Nyx podia ouvi-las cochichar ao fundo de sua mente, agitando-se como gatinhos manhosos, desesperados por atenção quando ele estava perto. Ao centro estava tio Cassian com sua expressão incomodada, discutindo entre sussurro alguma coisa ao lado da jovem de cabelos escuros e cor parecida com a de tio Cassian, mas traços e postura elegantes como as de tia Nestha. Os cabelos trançados pendiam por seu ombro esquerdo, com uma joia que lembrava uma coroa elegante e delicada presa em sua testa com o que parecia ser um cristal delicado, roxo ao centro, cintilando elegantemente. Um presente, Nyx percebeu, do noivo dela. O vestido roxo escuro adornava sua silhueta, de forma elegante, acentuando o decote generoso e os seios avantajados. Carregava Ataraxia em suas costas, mais como um gesto simbólico, uma lembrança a todos de quem ela era e de onde ela vinha, do que qualquer outra coisa.
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  Nyx bufou suavemente, sentindo um quase sorriso surgir por seus lábios, entristecido. Ela estava tão bonita aquela noite, nem parecia a garotinha rechonchuda de mão pesada e irritante que o seguia pelos corredores, disputando corrida ou o culpando por absolutamente tudo. Era uma gracinha, naquela época, com dentes faltando e bochechas grandes como a de um pequeno esquilo, ainda tinha, mas agora em um rosto angular e elegante. Ela havia crescido tanto, era uma mulher agora, linda e decidida, com a mandíbula teimosa como a da mãe, e o olhar espertalhão do pai. Pela primeira vez em muito tempo, Nyx se permitiu sentir o desconforto da perda; ela não estava morrendo, sabia que a situação poderia ser sempre pior, mas ela estava indo embora de certa forma, mesmo que ainda vivesse na Corte Noturna — o que Nyx duvidava muito que fosse o caso — seria em uma outra casa, em um outro lugar, a sua maneira. Não teria mais gritos irritados por ele ter apagado a luz, ou tentativas falhas de acertá-lo com travesseiros ou sapatos por ter simplesmente invadido o quarto dela, desalinhado tudo, e saindo como se nada tivesse acontecido. Não haveria conversas em plena madrugada sobre a vida e o que desejavam para si mesmos, nem conselhos idiotas. Percebeu com surpresa que ela faria muita falta. Mais falta do que jamais havia imaginado que poderia sentir.
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  Os olhos azuis dele se voltaram para os de Emhyr, observando o semblante do melhor amigo suavizar, embora ainda houvesse a dor familiar da rejeição pela situação. Apertou os lábios, a memória vívida da voz de Arwan ainda presente em sua mente, fazendo-o sentir aquele desconforto sufocante, como se estivesse sendo vigiado, como se olhos estivessem acompanhando até mesmo os mínimos gestos e ações. Trincou os dentes com força, considerando a possibilidade. Sabia que o deus da morte o estaria assistindo, de onde quer que estivesse, mesmo que preso naquele limbo entre os dois lados da existência: vida e morte, ainda estaria analisando e acompanhando seus movimentos. Havia sido claro em suas palavras, queria que Nyx fosse atrás de Koschei, não da Corte Invernal, o que quer que estivesse na Corte Invernal pertencia a Lyall, o Arauto de Arwan, descobrir, não Nyx. Mas isso não significava que Nyx não poderia assistir…
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  Arwan havia lhe dito que não queria contar seus planos para a Corte Invernal, havia lhe dito para ficar longe da Corte, mas não da cidade. Nyx só precisava manter-se longe do castelo, e não precisaria de muito, havia sempre tavernas por lá com hidromel e outras comidas típicas que aquelas criaturas feitas de gelo costumavam apreciar. Vinho quente, sopas, e algo com enguias. Ele só precisava se manter longe da Corte de Kallias e Arwan não poderia acusá-lo de desrespeitar sua ordem. E Nyx descobriria, afinal, o que diabos havia ali que tinha conquistado tamanho interesse da criatura. Um mínimo sorriso começou a surgir por seus lábios; e ele poderia ajudar Emhyr ao menos com algo: chutar a canela do principezinho de gelo, e ter certeza que o coração do melhor amigo não se partiria ainda mais ao ver Aurora sorrir para outro como ele muito provavelmente sempre havia desejado que ela o fizesse consigo. Ou seja lá o que isso signifique — Nyx nunca havia tido problemas em conseguir o que queria, não entendia muito bem o que era a ideia de correr atrás de alguém.
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  — Troca comigo. — Nyx quebrou o silêncio subitamente, ciente do que estava fazendo, e das consequências que isso poderia lhe trazer, mas bem, quando dentro do fogo… Os olhos azuis cintilaram com uma mistura de algo traiçoeiro e intenso, profundo o suficiente para que Emhyr pudesse, com muita facilidade, ver as “engrenagens” da mente de Nyx girando.
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  Emhyr apertou os lábios, encarando-o desconfiado, mas Nyx parecia irredutível. Com um último olhar na direção de onde Tio Azriel e Aurora haviam saltado de seus cavalos, Nyx sustentou o olhar de Emhyr com intensidade, convindo as palavras silenciosas que ele não diria alto, não agora sob o alcance dos ouvidos de Aurora.
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  — Vai no meu lugar na missão com tio Cassian nas Montanhas, e eu vou no seu, com tio Azriel, para a Invernal. — Emhyr hesitou, um olhar tentativo fixando-se brevemente no semblante impaciente de Aurora, antes de focar no rosto do melhor amigo. Nyx estendeu sua mão na direção de Emhyr, reprimindo um sorriso satisfeito em seu rosto, quando o melhor amigo aceitou o gesto, colocando-se de pé novamente.
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  — É melhor você trazer para mim muita bebida — foi só o que Emhyr disse em concordância. Nyx traria a lua e as estrelas para Emhyr se ele conseguisse descobrir o que diabos Arwan, o líder da Caçada Selvagem, estava escondendo na Corte Invernal. E ele iria descobrir.
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  Nota da Autora: masculinidade frágil aqui não, nossos manos vivem o bromance deles com orgulho.




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Lelen

Gente, mas o que rola entre Rhys e Nyx? Quero entender melhor a relação deles.
Fiquei com dó do Emhyr e seu coração partido, MAS TENHO FÉ QUE VAI TER ALGUÉM PRA ESSE MENINO. Ele falando que queria ser a primeira escolha de alguém T_T dá vontade de falar EU TE ESCOLHO, EMHYR, VEMK!
Eu tô LOUCA pra ver quando a menininha – agora mulher, né – reaparecer na vida do Nyx o que esse menino vai fazer porque eu sinto que ela vai colocar a vida dele de cabeça pra baixo mais ainda.
E assim, Kallias, wannabe Jack Frost, foi meu segundo crush na saga. E ele mal apareceu KKKKKKKKKKKK
QUE VENHAM MAIS SEGREDOS E RESPOSTAS TAMBÉM. BORA SE AVENTURAR NA CORTE INVERNAAAAAAAAAAAAAL

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