Namjoon não sabia que horas eram.

  Todos os seus dias eram monocromáticos, indiferentes e não havia mais lágrimas para chorar apesar do ciclo de violência continuar dia após dia. Ter se acostumado com a dor não era o que queria, mas, a essa altura, não tinha muito para onde ir, já que a vontade de viver ia escapando de suas mãos e ele não conseguia ver uma saída daquele labirinto triste e doloroso. Quando mais novo, tentava correr em busca de uma salvação, contudo, conforme foi envelhecendo, suas pernas se cansavam com mais rapidez, e ele percebeu que durante todo esse tempo estava apenas correndo em círculos, preso em um cenário que não queria estar. Apesar das marcas terem sumido e a repetição do ciclo ter diminuído bem lentamente, ele sabia que não estava livre daquela realidade que o acompanhava há anos, e quanto mais se trancava no seu quarto para evitar sofrer, menos vontade o rapaz possuía de encarar o nascer do sol, e cada vez mais a vontade de morrer ia tomando conta de cada parte do seu corpo exausto.

  Até que, quando chegou o dia em que deixaria tudo ir, as cortinas do seu quarto foram abertas, e ele pôde sentir o calor do sol em sua pele, o fazendo cair em lágrimas. Demorou um tempo para os seus olhos se acostumarem com a claridade, e ao tentar se levantar, sentiu os seus joelhos colidirem com o chão frio, e por mais que quisesse levantar, o peso do seu passado o prendia naquele lugar, o obrigando a reviver todo o sofrimento como se nunca fosse possível cortar aquela linha que o puxava de volta para o inferno que passou durante quase todo esse tempo.

  Namjoon queria — e muito — conseguir ficar de pé e abrir a sua janela. Queria poder sentir a brisa bater contra seu rosto e escutar a cantoria dos pássaros. Queria voltar a fazer o que gostava e a encontrar as pessoas que amava sem sentir que era um peso em suas vidas. Queria se sentir completamente bem. Queria poder sair correndo pelas ruas da cidade sem rumo, apenas aproveitando o ar fresco e a paisagem.

  Namjoon, pela primeira vez em meses, queria se sentir vivo.

  — Assim está melhor, não acha? Com as janelas abertas, o ar circula bem melhor e você ainda pode assistir o mundo lá fora. É maravilhoso, né? — A silhueta sorriu ao se virar para ele, o olhando com um olhar carinhoso. O sorriso era tão quentinho que fez o rapaz chorar mais ainda. — Achei que eu perderia o meu melhor amigo por um momento, sabia? Nunca é tarde pra pedir ajuda, Joon.

  Namjoon se permitiu chorar copiosamente como se fosse uma criança que acabou de ralar o joelho ao andar de bicicleta pela primeira vez. Mais do que nunca, lá no fundo, ele queria que alguém segurasse a sua mão e dissesse que tudo ficaria bem no final e assoprasse os seus machucados para que parassem de arder. Ele queria que toda aquela dor fosse embora, e ao ter o seu corpo envolvido em um abraço tão quente quanto os raios solares que invadiam seu quarto pela janela, o rapaz sentiu todo o peso que o impossibilitava de levantar sumir aos poucos, e depois de muito tempo, Namjoon conseguia respirar livremente, e a leveza tomou conta de todo o seu corpo, o que o fez chorar mais uma vez.

  — Quando eu estava prestes a ir embora, você me abraçou e disse que eu não precisava lidar com tudo sozinha. Você fez de tudo para que eu pudesse sorrir, até compor músicas para me ajudar a dormir. — A garota segurou o rosto do rapaz com delicadeza, fazendo um carinho com o seu polegar em suas bochechas molhadas. — Você desfez a corda dos meus pulsos e definitivamente bagunçou um pouco a minha cabeça — ela riu —, mas você me fez ter forças para encarar o amanhã, e não tem um dia que eu não seja grata pela sua existência. Eu estava à beira da morte quando você apareceu na hora exata e nem um segundo atrasado, fazendo com que eu esquecesse de toda a minha dor e finalmente me sentisse bem. A única coisa “boa” por ter passado por essa merda que passei foi que eu tive a chance de te conhecer, e desde então você nunca largou a minha mão, mesmo nos momentos em que ficamos mais afastados. Então, espero que o meu amor continue chegando até você, e que de alguma forma ele te ajude a encarar a vida com mais leveza. Ah, fica tranquilo que eu não vou te largar, sabe, sou tóxica e...

  Namjoon caiu na risada, trazendo a amiga para si e a abraçando apertado, percebendo que a essa altura, ela também chorava. Os dois continuaram assim por um bom tempo, e o rapaz se sentiu um bobo por ter esquecido da sua melhor amiga durante os meses em que a vida parecia ter desmoronado, mas tanto ele quanto ela tinham plena noção de que tem vezes em que não conseguimos enxergar além do que está na nossa frente.

  — Foi difícil te encontrar, sabia? — Suspirou pesadamente, visivelmente chateada. — Sabe quantos labirintos eu tive que concluir para te achar, sendo que eu sou péssima com direções?

  — Impressionante é você ter chegado até mim quando você nem consegue ir a pé para a praia sem se perder. — A garota se desvencilhou dele, mas logo Namjoon a puxou para si, sorrindo. — Obrigado por não ter desistido de mim e por ter me encontrado, Lily.

  — Como desistir do meu melhor amigo que mesmo nos seus piores dias fez de tudo para me ver sorrir? Você não sabe o alívio que senti ao te encontrar, eu achei que poderia ser tarde demais... mas agora você pode ficar tranquilo, vamos encontrar meios de te ajudar e você não precisa mais ter contato com quem te machucou. A partir de agora você é livre.

  — E quem te disse isso? — Arqueou uma sobrancelha.

  — Eu — disse como se fosse óbvio. — Estou decretando que a partir de hoje, você, Kim Namjoon, está livre de todo o sofrimento e daqueles que te fizeram mal. Se alguém tentar contato com você, é só me falar que eu lido com eles. — Lily segurou suas mãos com firmeza, o olhando fixamente. — Você tem uma vida linda pela frente, e espero que nunca duvide que merece as melhores coisas que esse mundo possa oferecer. Quando as coisas ficarem difíceis, saiba que eu estarei ao seu lado mesmo que eu esteja do outro lado do mundo, pronta para te lembrar o quão especial você é e para cortar a corda que te prende ao seu passado quantas vezes forem necessárias. Eu acredito na sua galáxia e para sempre estaremos juntos, Joon.

  — Eu não aguento mais chorar, Lily. — Kim respirou fundo com os olhos marejados, rindo ao se lembrar que ele falou a última frase para ela quando a encontrou na mesma situação que a sua. Foi a vez de ele segurar o rosto dela com carinho, e agora, o seu sorriso era tão acolhedor quanto o dela. — Obrigado por ter vindo até mim na hora exata e em todas as outras. Eu amo você por toda a eternidade.

  — Isso é muito tempo, viu? Já falei que sou tóxica, então não vai poder se arrepender de ter me dito isso.

  — Tão tóxica que não consegue fazer mal a uma mosca... — Kim caiu na gargalhada ao receber um tapa no braço.

  — Vamos sair daqui pra eu poder te mostrar o quão tóxica eu sou! Viu só? É uma ordem e você não pode contestar!

  — Tudo bem, tudo bem. Como desejar, senhorita.

  — Vamos, se nos apressarmos chegaremos a tempo do pôr do sol. Aposto que você ficará deslumbrado com o cenário, e nossos amigos estão nos esperando no final do labirinto.

  Não havia mais dúvidas de que Namjoon queria viver, e ser lembrado de que tinha pelo menos alguém que o amava e o esperaria não importava o tempo que fosse, o fazia querer sair daquele cenário o quanto antes, então, ele segurou a mão da amiga firmemente, e juntos eles encontraram a saída rapidamente, e a encontrariam quantas vezes fossem necessárias, sem soltar a mão um do outro.