Capítulo 13 • CORTE DO REI – LA FUGA
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— Todas prontas? — Jule, a cabaretier, entra no quarto do Capitão - cedido temporariamente para que as mulheres se arrumassem. Ela anda da porta até o outro lado do quarto infestado por roupas chamativas e maquiagem.
Jule para de frente para a lateral da cama, onde Serena, Jack e uma terceira garota estavam sentadas. Elas foram as escolhidas para o plano de resgate. Taehyung decidiu que o melhor era que apenas poucas tripulantes participassem, pois, desta forma, as chances de as coisas saírem do controle e darem erradas, eram menores.
As três estavam muito bem arrumadas e bem parecidas com as dançarinas do Hanna’s Cabaret, por isso, se seguissem à risca todas as instruções dadas, elas facilmente passariam despercebidas.
Duas batidas na porta do quarto fazem com que Sofi afaste o pincel de pena dourada do rosto de Serena, que ainda resmungava de dor nas orelhas que tiveram de ser furadas para que brincos bonitos ocupassem os pequenos furos, uma vez que as joias eram itens marcantes das dançarinas do cabaré.
— Está na hora. Acabamos de ancorar. — Inez avisa do lado de fora.
— Sairemos em um minuto. — Jule responde, assim, fazendo Inez se afastar da porta e sumir pelo corredor.
Jule apoia as mãos na cintura e sorri para as três ainda sentadas.
— Hora do show, meninas.
Gritos e risadas animadas vindas das dançarinas preenchem o quarto do Capitão.
Com a ansiedade e o nervosismo corroendo a boca do estômago, as três se levantam. Serena e Jack bambeiam em cima dos saltos das quais não estavam tão acostumadas ainda, apesar de terem praticado nos últimos dias.
As dançarinas riem e engancham seus braços nos delas, ajudando-as a andarem melhor e, desta forma, todas começam a sair do quarto, deixando a bagunça de roupas e maquiagem para trás. Elas entram no pequeno corredor mal iluminado e vão em direção à porta no final dele, e quando Jule a abre, logo a claridade do convés as ilumina conforme elas atravessam.
O Capitão já estava esperando no convés, perto da borda do navio, acompanhado por seu contramestre, Namjoon, e Inez. Os piratas e a tripulação, espalhados pelo convés, observam com atenções as mulheres que pareciam desfilar sobre o chão de madeira do navio. Empolgadas e com sorrisos ardilosos - ao menos, as dançarinas - elas se aproximam de Taehyung, que tinha toda sua atenção voltada especialmente para uma das tripulantes.
— Estamos prontas para partir. — Jule, na frente de todas, diz para Taehyung, que, por esse segundo, desvia seu olhar e a encara.
— Ótima. Vocês já sabem o que fazer. Nós estaremos esperando aqui no porto, venham direto para cá e tudo estará feito. — Ele fala e Jule assente.
Todos ficam em silêncio por alguns segundos, e os olhos de Namjoon não sabiam para onde fitar, e apesar do momento ser importante, ele se sentia no paraíso ao ver tantas mulheres bonitas juntas.
Taehyung volta a encarar a tripulante que lhe chamou atenção, e ela, sem pestanejar, o encara de volta.
Seus olhos espiam por debaixo da capa preta com capuz e longas mangas largas, assim observando com muita atenção cada detalhe do vestido em tom de azul-turquesa que cintilava grudado ao corpo de Serena. Brilho e pedras bonitas - e reluzentes - enfeitavam o espartilho bem apertado, marcando sua cintura como se fosse uma ampulheta, de modo que seus seios se espremessem contra o topo, saltando levemente para fora do espartilho, perigosa e tentadoramente. O saiote longo era colado no seu quadril estreito e nas pernas esguias, descendo como se fosse uma cauda de sereia, chegando até os pés cobertos por saltos tão finos que facilmente poderiam ser usados como armas, caso fosse necessário.
Bonitos brincos de pérolas adornavam suas orelhas recém furadas, harmonizando graciosamente ao tom de azul-oceano dos seus olhos e com a maquiagem marcante feita por Sofi. Mesmo que não desse para ver, as pulseiras e os anéis brancos escondidos debaixo da capa eram tão brilhantes quanto o colar - também - de pérolas em seu pescoço.
Os cabelos continuaram intactos, sendo os únicos intocados pelas mulheres do cabaré, pois, segundo elas, a texturização nos longos fios loiros dava a impressão de alguém que saiu do mar e deixou os cabelos secarem naturalmente em uma aparência, ao mesmo tempo, selvagem e deslumbrante. E isso combinava com perfeição a todo o resto, desta forma, fazendo jus ao nome de Serena nessa missão de resgate: Sirena del Atlantis.
Taehyung havia dado esse apelido para Serena e, nesse momento, ele percebeu que nunca foi algo tão oportuno. Ela parecia ainda mais bonita do que todas as sereias que ele já havia encontrado em seus anos de navegação, e era por esse motivo que ele a encarava de forma descarada, sem se importar, demorando um pouco mais seu olhar em pontos específicos do corpo de Serena, como seios e quadril.
Capitão Hanna podia ser um maldito vagabundo do mar, mas ele sabia apreciar uma bela mulher quando a encontrava.
Serena definitivamente notou o olhar sem-vergonha dele, mas isso não seria o suficiente para fazê-la se sentir envergonhada, pois ela pensava que os homens eram todos iguais, ainda mais quando se tratava de um pirata tão cretino igual Taehyung. Por isso, Serena apenas deu um passo para frente, se afastando das demais mulheres e ficando próximo a ele, quase fazendo seus seios esmagados dentro do espartilho tocarem o tronco do pirata.
— Espero por mim, Capitão — Sua língua se enrola propositalmente, fazendo a última palavra soar como provocação. — Irei resgatar Jungkook e garantir minha liberdade para bem longe de você — Ela fala firme e convicta, movimentando seus lábios pintados fortemente de rubro. E Taehyung não tarda a sorrir de um jeito tão canalha, que fez algumas das mulheres por perto suspirarem.
Após os demais sentirem a tensão entre o Capitão Hanna e Serena, Inez conduz as mulheres para a rampa já abaixada. E, sem dizer mais uma palavra sequer, todas começam a sair do navio, enquanto, em seu quarto, Dana rezava para todos os deuses dos mares para que protegessem suas meninas.
Jule dá uma última olhada para o navio e acena com a cabeça para Taehyung. Depois disso, ela toma a frente e guia o caminho até que todas saíssem do porto escondido e entrassem na região movimentada da corte do rei.
Por onde passavam, todos olhavam. As mulheres e os mais velhos julgavam a aparência e as roupas das dançarinas, e os homens, apesar de tentarem parecer descentes, pensavam todo tipo de fantasia pervertida.
E foi desse jeito, ignorando os olhares e cochichos, que elas chegaram em frente ao castelo murado e fortemente protegido por guardas.
Jule se aproximou de um dos homens de pé que segurava uma lança e pediu para ver o grandioso comodoro do rei. O guarda a encarou por alguns segundos, a enxergando como inferior, mas, sabendo da fama e reputação que sua casa de shows tinha, ele acabou se virando e entrando no castelo. Então, não demorou até que ele retornasse com um homem impecavelmente fardado, que andava com toda sua confiança, apesar de ainda ter uma perna machucada se recuperando.
— Senhora Laurent, soube que gostaria de falar comigo. A que devo a honra de sua adorável presença? — Hoseok pergunta assim que para diante a cabaretier, que sorri gentilmente para ele.
— Ora, sem formalidades. O senhor já frequentou muitos de nossos shows, comodoro — A mulher coloca as mãos na cintura e tenta soar amigável.
— Isso quando a senhora não está em Suli, aquela cidadezinha muito visitada por piratas — Ainda em sua postura alinhada, o comodoro estreita os olhos para a mulher que era bem mais baixa que ele.
Jule suspira falsamente.
— O senhor sabe que o cabaré é um negócio de família, e eu não posso e nem irei desrespeitar os desejos de minhas ancestrais.
— E por isso vai continuar escondendo os piratas em sua casa de shows — Uma risada irônica escapa pelo nariz do comodoro.
Jule levanta as sobrancelhas.
— Ora, se estão pagando pelos meus shows, então trato bem todos os meus clientes. Não se trata de esconder piratas no cabaré, e sim, de não deixar que vocês acabem com o meu estabelecimento, brigando até a morte e arruinando a reputação do meu ganha-pão — Fitando o comodoro, Jule aponta para trás onde todas às dançarinas permaneceram paradas, apenas assistindo a cena de longe.
O olhar de Hoseok cai sobre as belas mulheres, as quais ele já conhecia a grande maioria. E apesar de se deslumbrar com a beleza extraordinária de Serena, cuja ele se lembra vagamente de já ter visto algo similar no mar, o que, de fato, lhe chamou a atenção, foi a jovem de cabelos curtos e pretos, com uma delicada franjinha reta sobre a testa. Jack logo nota a intensidade das íris do comodoro sobre ela, e isso a deixa desconfortável e sem saber como se portar. Parecia que agora até mesmo sua respiração ficou suspeita.
— Bem, eu estava de passagem por esses lados e decidi ancorar aqui na corte, pois pensei que o senhor gostaria de conhecer as minhas novas dançarinas. Até mesmo estava disposta a oferecer um show de graça para mostrar o apreço que tenho por um cliente de longa data. Mas se o comodoro ainda está tão incomodado por eu ter clientes piratas também, então pegarei minhas meninas e irei embora — Jule se curva educadamente e se vira. As três tripulantes disfarçadas a encaram com nervosismo, pensando que tudo havia dado errado.
— Espere — O comodoro diz, alto e apressado, fazendo Jule sorrir para as dançarinas, sabendo desde o início que isso daria certo. Em seus lugares, as três tripulantes suspiram - discretamente - aliviadas.
Desfazendo o sorriso e assumindo uma falsa expressão de confusão, Jule se vira para o comodoro.
— Perdoe minha grosseria.
— Tudo bem. Sei como o senhor pode se sentir em relação aos piratas — Jule soa compreensível, apesar de apenas aceitar clientes como o comodoro, para lhes arrancar todo o dinheiro e manter os piratas informados todas as vezes que as dançarinas extraíam das bocas bêbadas da guarda do rei, segredos e missões. Jule nunca se esqueceria de quem matou sua avó, por isso, ela sempre tentou arrancar tudo que podia desse tipo, na qualidade de uma vingança.
Hoseok olha mais uma vez para Jack, antes de se voltar para Jule.
— Seria de imenso prazer aceitar a companhia das senhoritas essa noite. Pela tarde, eu e meus homens estaremos ocupados, mas se aceitarem uma estadia nos luxuosos aposentos do castelo, converso com o meu rei e sei que ele será bondoso o bastante para acomodá-las durante esse tempo. E à noite, poderemos todos nos reunir com um ótimo vinho e música boa — Mesmo que falasse com a mulher baixa e robusta, seus olhos, vez ou outra, iam até a jovem de cabelos curtos que se agarrava a Serena por estar mais que nervosa.
— Proposta tentadora. Mas acho que seria melhor ficarmos longe do castelo até a noite, o senhor não tem noção de como nos olham nesse lugar, é de dar arrepios. Também gostaria de pedir que nos encontremos nos fundos do castelo, naquele lugarzinho sem guardas, ao menos lá nos sentiremos menos intimidadas e não nos verão entrando.
— Por que liga tanto para o modo que os moradores da corte a encaram? Apenas ignore — Hoseok parecia um pouco irritado com isso.
— Para o senhor é fácil falar dessa maneira, é o comodoro do rei e tem muito respeito, diferente de nós. As pessoas, principalmente as mulheres, nos enxergam como promíscuas e indecentes, e sei que muitas delas se matariam apenas para porem os pés nesse castelo. Por isso, acho que é melhor evitar brigas, elas já nos odeiam o suficiente, não quero dar motivos para que tentem arranjar confusão com as minhas meninas. Meu trabalho é proteger e cuidar muito bem delas — Jule sorri amigavelmente. — O senhor não precisa se preocupar, nós ficaremos em algum lugar barato pela tarde e de noite nos encontraremos nos fundos do castelo.
Apesar de querer que elas ficassem no castelo, Hoseok entende o que Jule diz, por isso, acaba por concordar.
— Me deixe pagar pela estadia de vocês então — Sem esperar por uma resposta da cabaretier, Hoseok se vira para um dos guardas perto do muro do castelo e o manda buscar dois sacos com moedas de ouro em seu quarto.
— Ah! O senhor é sempre tão gentil conosco — Jule junta as mãos como se rezasse e se curva de novo.
— Isso é para mostrar que a senhora e suas dançarinas são tão respeitosas e decentes como qualquer outra mulher da corte — Ele sorri cortês e olha mais uma vez para Jack.
Na realidade, sempre foi mais fácil conseguir todo tipo de regalia quando se trabalha em um cabaré. Por ter uma vida mais liberal e menos regida por homens, as dançarinas eram companhias muito mais interessantes e perspicazes para se passar o tempo conversando sobre todo o tipo de coisa, desde como conquistar alguém, até em como manusear uma arma. Além de que, a desenvoltura e as roupas provocativas ajudavam muito, pois, para um homem, meio centímetro de pele aparecendo já era o suficiente para entregar até o último centavo de suas economias.
Quando o guarda trouxe os dois sacos com moedas de ouro, Hoseok as entregou para Jule, que agradeceu antes de se despedir, fazendo, assim, o comodoro olhar uma última vez para Jack, se permitindo sorrir. E apesar de estar nervosa, Jack sorri de volta para ele, desta maneira, seguindo com perfeição o plano.
***
Ficar no castelo aumentaria os riscos de que fossem descobertas caso alguém escutasse algo, e, de toda forma, seria muito melhor se aprontar em um lugar longe o bastante para mantê-las em segurança. E foi por isso que Jule escolheu uma pequena pousada barata com apenas um quarto, já que dessa forma sobrariam mais moedas de ouro e elas poderiam ser divididas entre as dançarinas.
A noite já havia chegado, não demorou, elas ancoraram quase no fim da tarde. Então aproveitaram as poucas horas para repassar todo o plano e garantir que as pistolas trazidas do cabaré estivessem muito bem escondidas debaixo dos saiotes dos vestidos deslumbrantes.
Quando deixaram a pousada, apenas homens estavam nas ruas, pois as mulheres precisavam se recolher cedo e cuidar da comida para quando seus maridos chegassem em casa depois de um dia de trabalho. De qualquer forma, também não eram muitos os que zanzavam pelas ruas da corte, mas, mesmo assim, os presentes ainda olhavam pervertidos e assobiavam para as dançarinas.
Como combinado, Jule vai até os fundos do castelo, o lugar onde a guarda do rei costumava se reunir quando queria beber até cair, ou quando queria levar garotas jovens e desesperadas por uma vida de riquezas, assim, traindo suas esposas que ficavam em casa cuidando dos filhos.
Este local não foi escolhido por acaso, Jule sabia que além de não ter a segurança dos guardas principais, ainda era perto da prisão do castelo, então, tudo se tornaria muito mais fácil.
Agarrada ao braço de Serena, Jack estava quase tremendo de nervosismo, pois para ela foi incumbida a missão de distrair o comodoro, já que a maioria das dançarinas percebera os olhares dele para a jovem de cabelos curtos. Todas sabiam que Hoseok seria o mais difícil, por isso, se ele tivesse um grande interesse em alguém a ponto de abaixar sua guarda, as chances de a missão ser um sucesso eram ainda maiores.
— Lembre-se, você não estará sozinha e pode pedir ajudar se sentir que ele está passando dos limites, ok? Se acalme agora e não deixe que percebam nada — Serena diz para Jack, que assente e respira fundo.
— E você, tome cuidado quando estiver na prisão, por favor — Jack encara Serena, apesar de saber que sua mais nova amiga não era do tipo cuidadosa.
— Estejam prontas — Jule olha para todas sobre seu ombro, antes de parar em frente à pequena porta velha de madeira com alguns feixes de luz escapando pelas frestas.
Jule ajeita as próprias roupas e bate na porta, que demora algum tempo até ser aberta por Hoseok, que apesar de ainda estar usando sua farda, havia se livrado do casaco.
— Pensei que não viriam — Hoseok sorri abertamente, mostrando que já havia bebido um pouco.
— O atraso é um charme — Jule sorri para ele, que ri.
Hoseok vai para o lado e dá espaço para que a cabaretier e as dançarinas entrem.
— Homens, nossas convidadas chegaram! Tratem todas muito bem! — Hoseok avisa todos os que estavam do lado de dentro, sentados pelos sofás de veludo, jogando cartas ou de pé nos cantos, bebendo.
Assim que Serena e Jack passam pela porta, Hoseok segura a mão de Jack.
— Espero um segundo, por favor — As duas param perto da porta que foi fechada. — Será que eu poderia ser agraciado com a sua companhia essa noite, senhorita? — Ele sorri de forma galante para Jack e, embora o comodoro realmente fosse um homem bonito, a garota escolhida por ele se sentiu extremamente nervosa.
Ela encara sua amiga, que sorri exageradamente.
— Acho que estou sobrando aqui — Serena se solta de Jack. — Aproveitem a noite. — Ela lança uma piscadela para os dois e Hoseok quase ri de animação, acenando educadamente com a cabeça.
Serena se afasta, indo atrás de Frida - a terceira tripulante. Jack acompanha com o olhar sua amiga indo embora e quando Serena já está camuflada no meio de todos, Jack se vira para o comodoro sorridente.
— Vamos? — Ele diz de forma amistosa e a oferece o braço.
Jack respira fundo sutilmente e retribui o sorriso de Hoseok antes de segurar em seu braço. E, desta forma, eles vão até um dos sofás vazios.
— Estava te procurando — Serena coloca as mãos sobre os ombros de Frida quando a encontra perto de uma mesa onde alguns soldados jogavam cartas apostando dinheiro.
— Estou observando esses belos cavaleiros — Frida sorri para Serena.
— Quem vencer fica com a belezura aqui. O que acham? — Um dos homens ao redor da mesa, diz.
Frida arqueia as sobrancelhas e o encara.
— Está me apostando, soldado? Não sou uma das suas moedas de ouro — Ela responde, embora usasse todo o charme em sua voz.
O homem não se acanha.
— É apenas para incentivá-los, já que sua presença aqui nos distrai — Ele sopra um beijo no ar.
— Quer que eu saia então? — Frida cruza os braços e todos os demais ao redor da mesa gritam “não”.
— Não faça isso, você será meu amuleto da sorte — O soldado fala e Frida ri.
E aproveitando o momento, um dos homens, o que segurava cinco cartas, passa seu braço ao redor do quadril de Serena, que o encara.
— É melhor tirar sua mão daí se quiser ficar sem ela — Serena diz e o homem afasta seu braço e ergue sua mão em sinal de rendimento.
— Não estamos aqui para nos divertir? — Ele pergunta para ela, enquanto prende um cigarro entre seus lábios finos.
— Me deixe ficar bêbada primeiro — Serena estreita seus olhos, mas sorri esperta.
— Então, não seja por isso — Ele pega uma das garrafas postas na mesa e entrega para Serena, que aceita de bom grado e dá um longo gole no vinho real, fazendo todos os soldados ao redor da mesa sorrirem, animados.
— Você é a garota mais bonita que eu já vi em toda a minha vida, e olha que eu já vi muitas garotas bonitas — Um outro soldado fala. — Ela não lembra as sereias? — Enquanto aponta para Serena, ele encara seus colegas de jogo.
— Qual seu nome, boneca? — O soldado que tentou agarrar Serena pelos quadris, pergunta.
Serena sorri fechado, de forma completamente astuta.
— Essa noite, Sirena del Atlantis.
— Está vendo, não estou tão bêbado assim. Essa belezura é bonita como uma sereia.
Serena ri e Frida a acompanha.
— Chega de cantadas baratas e joguem, queremos ver se vocês são bons — Serena bate uma palma, animando e fazendo com que os soldados comecem uma nova partida.
Quando os homens se distraem nas cartas, elas espiam ao redor, se certificando que as dançarinas estavam ocupando todos os demais soldados.
Na direção oposta, perto dos sofás, Hoseok e Jack se isolavam de todos. Ele estava sentado a três palmos de distância dela e tinha o braço escorado no topo do sofá.
O comodoro não tentou beijá-la ou tocá-la, pelo contrário, foi um perfeito cavaleiro em todos os aspetos e isso fez Jack se sentir mais tranquila. Ele perguntou sobre sua família e como ela acabou no cabaré. E após responder as perguntas do comodoro, ele contou a Jack um pouco de sua vida também, e embora ela soubesse que estava em uma missão de resgate, Jack não pôde deixar de achar a companhia dele agradável, especialmente porque podia encarar seu rosto bonito e sorriso alegre - efeito do vinho real.
— Vamos, Sam, você já perdeu três rodadas, estamos atrás deles — Serena aperta os ombros do soldado que tinha uma expressão frustrada enquanto fumava seu oitavo cigarro.
— Desista, Sirena. Nós iremos ganhar, não é bonitão? — Frida provoca, rindo. Ela estava agarrada ao pescoço daquele soldado que tentou apostá-la.
— Pode apostar — Ele sorri vitorioso, antes de lançar sua carta ao centro da mesa, fazendo os outros soldados resmungarem derrotados.
— Jogue essa — Serena diz perto do ouvido de Sam, tocando o topo de um valete de paus. O soldado a encara sobre um dos ombros. — Confie em mim. — Serena fala firme e ele assenta, lançando a carta que ela escolheu e, em segundos, a feição vitoriosa do outro soldado, some.
Serena se afasta de Sam e salta animada, comemorando com gritos empolgados.
Com os braços fortes, Sam rodeia três sacos com moedas de ouro e os puxa para perto.
— Boneca, como você sabia que era a carta certa? — Completamente extasiado, Sam olha para Serena.
— Meus pais têm uma loja de rum. Eu costumava passar muito tempo com os bêbados e eles me ensinaram muitas coisas — Serena responde e se aproxima dele, o abraçando pelo pescoço como Frida fez com o outro soldado. Sam, apesar de ser um homem de quase dois metros, com muitos músculos e tatuagens estranhas feitas nas índias, fica vermelho nas bochechas.
Frida ri baixo e encara Serena de forma significativa, avisando que agora que elas já conquistaram a confiança dos soldados, e as dançarinas já distraíram os outros, era hora do resgate.
— Tem um banheiro por aqui? — Serena pergunta quando os soldados começavam mais uma partida.
— Atrás daquela cortina você encontrará um homem feio e baixinho, peça que ele te leve ao banheiro, mas, se ele tentar algo, o acerte na cabeça com isso — Sem olhar para Serena, Sam entrega para ela outra garrafa de vinho.
— Obrigada.
— Não demore muito, você se tornou o meu amuleto da sorte.
— Pode deixar — Ela toca sua careca com o fundo da garrafa e ri.
— Vou com você — Frida fala sorrindo, e se afasta do seu soldado, que resmunga algo do qual ela não presta atenção.
Frida engancha seu braço no de Serena, e assim, elas caminham para longe da mesa de apostas, passando pelos outros soldados e pelas dançarinas que, com olhares discretos, as observam, entendendo que o momento do resgate estava se aproximando. Serena busca Jack com os olhos, a vendo com comodoro, e ambos conversavam entre sorrisos, alheios demais a tudo.
— Ela realmente está indo bem em distrai-lo — Serena comenta baixo e Frida assente.
Quando chegam perto de uma longa cortina vinho com detalhes dourados, Serena a afasta para o lado e as duas passam para uma virada escura que dava em um corredor.
Ao verem um homem baixo de prontidão, perto de uma escada ainda mais escura, as duas trocam olhares atentos.
— Ei, bonitão, o que faz aqui sozinho? — Frida pergunta alto, revelando sua presença, enquanto Serena se esconde na virada antes de corredor, esperando seu momento. — A festa é do outro lado. — Ela se aproxima do soldado com passos sedutores, mexendo bastante seus quadris marcados pelo vestido.
O soldado encara descaradamente seu corpo.
— Preciso vigiar os prisioneiros. Logo alguém virá me substituir e eu poderei aproveitar também — O soldado responde, embora não tivesse certeza que algum dos seus colegas sairia da farra para substituí-lo em um trabalho.
— Já entendi tudo. Eles ficam com a parte boa e te colocam para trabalhar — Frida encosta o dedo indicador nos lábios em uma expressão de quem havia acabado de deduzir algo grandioso. — Isso não é legal. Você está aqui sozinho. — Ela toca o rosto do homem que era um pouco mais baixo que ela.
O soldado se arrepia e se sente nervoso. Ele queria tanto estar aproveitando.
— Estava pensando aqui com os meus botões... — Ela arrasta sua mão para baixo, passando pelo pescoço do soldado e indo até o ombro. Lentamente ela anda para o lado, fazendo o soldado se virar de costas para onde Serena estava escondida, como se fizesse apenas charme. — o que acha de fazermos uma festinha aqui no corredor? — Ela sorri de forma maliciosa e o soldado quase revira os olhos.
Na ponta dos pés, Serena sai de seu esconderijo e começa a se aproximar dos dois. Discretamente sobre os ombros do soldado, Frida olha para sua companheira.
— Não precisa perguntar duas vezes — O homem logo envolve seus braços ao redor da cintura de Fria, a trazendo para perto, mas, antes mesmo que tenha a oportunidade de beijá-la, Serena para atrás do soldado e o acerta na cabeça com a garrafa de vinho, fazendo o líquido escuro saltar para fora dos cacos de vidro quebrados.
Os braços do soldado ficam moles e ele larga Frida antes de cair desacordado.
— Me desculpe, mas foi Sam quem mandou — Serena diz para o corpo estatelado no chão, enquanto se abaixa e procura em sua farda qualquer molho de chaves, que ela encontra enganchado no cinto do homem.
Frida faz uma careta de desgosto e passa as mãos pelo vestido como se tentasse se livrar dos vestígios do soldado.
— Vamos, antes que ele acorde — Serena logo caminha em direção às escadas e Frida a segue.
Os saltos que usavam, ecoavam toda vez que elas pisavam em um degrau. Ambas se apoiaram nas paredes para não caírem, devido à falta de luz, e Serena agradeceu por seu machucado estar melhor e não doer mais.
Tropeçando no último degrau, Serena pisa no chão da prisão fria e iluminada por tochas.
Enquanto esteve na pousada infestada por ratos e baratas, com as dançarinas, Serena pensou muitas vezes sobre como todos poderiam fugir após libertarem os piratas; definitivamente ela não gostaria de participar de um tiroteio ou perseguição até o porto. Logo, foi que então um plano lhe surgiu, mas, para isso, ela precisaria de mais prisioneiros e a prisão de um rei sempre está cheia. Portanto, quando Serena passou em frente as primeiras celas e viu os homens de roupas esfarrapadas e peles sujas, ela sorriu satisfeita.
Os prisioneiros se aproximaram das grades e observaram com curiosidades as duas jovens que olhavam para todos os cantos em busca de algo.
E foi apenas nas últimas celas, as mais escuras e úmidas, que elas finalmente encontraram o motivo que as colocou em tamanha confusão.
— Serena? — Com os olhos arregalados e uma expressão desacreditada, Jungkook, que estava sentado, se levanta e se aproxima das grades enferrujadas, as segurando. — O que está fazendo aqui?
Seus cabelos estavam cobertos por suor e grudavam em sua testa. Suas roupas estavam imundas demais até para um pirata, e seu rosto tinha alguns hematomas, assim como seus pulsos e tornozelos avermelhados.
— Te resgatando — Ela sorri para ele, que franze o cenho.
— O Capitão te obrigou, não foi? — Sua expressão fica séria, liberando o ressentimento.
— Sei que não estou a tanto tempo no navio, mas você já deve me conhecer o suficiente para saber que eu não estaria aqui se não fosse algo do meu interesse — Serena cruza os braços, fazendo o molho de chaves em sua mão chacoalhar, atraindo a atenção não só de Jungkook, mas dos prisioneiros que conseguiam a enxergar de onde ela estava.
A expressão dura de Jungkook, não suaviza.
— O que ele te ofereceu? — O pirata quase enfia seu rosto entre as grades.
— Se não está feliz em me ver, eu liberto os outros piratas e te deixo aí. Então você pode sentar e esperar o seu admirável Capitão mexer o traseiro e vir te resgatar — Serena se vira para Frida e lhe entrega o molho de chaves, pedindo para ela abrir as celas.
Serena caminha até o centro do corredor iluminado por tochas, se tornando o centro de toda a atenção.
— Você vai nos libertar também? — Um dos prisioneiros pergunta.
— Eu vou fazer uma proposta antes — Serena responde e começa a andar pelo corredor, batendo em toda cela onde havia um prisioneiro dormindo, e quando todos estão acordados, ela volta para o centro do corredor. — Nesse momento, lá em cima, há uma pequena festinha entre os soldados e algumas amigas minhas. Se vocês aceitarem nos ajudar, então libertaremos todos.
— O quê? — Frida para de abrir uma das celas e encara Serena.
— E o que é? Diga! — Outro prisioneiro fala de forma rápida, desesperado por sua liberdade.
— A maioria dos soldados estão bêbados agora, então não será tão difícil — Serena comenta um pouco mais baixo. — Queremos que vocês criem um tumulto lá em cima, assim, será mais fácil para que todos saiam.
— Mas eles não estão armados? Nós não temos nada aqui.
— Não se preocupe, minhas amigas estão cuidando disso. Como eu falei, a maioria dos soldados estão tão bêbados que nem perceberam que suas armas foram roubadas, mas, de qualquer jeito, mesmo que soltemos vocês, todos terão que passar por onde eles estão agora.
— Eu aceito — Um dos prisioneiros responde, sem pestanejar. — Estou louco de ódio para acertar as contas com aquele comodoro de meia tigela.
Era exatamente esse tipo de reação que Serena precisava.
— Os que não concordarem, continuarão presos aqui. Se decidam agora, não temos muito tempo até que deem falta de nós duas — Serena cruza os braços de novo, e os piratas libertos se aproximam dela, com Frida, incluindo Jungkook que ainda estava surpreso com tudo.
Sem escolhas e com a possibilidade de conseguirem a liberdade outra vez, os prisioneiros aceitam, e assim, acabam sendo soltos. Frida entrega sua pistola escondida no vestido para um deles, dizendo que havia um soldado desmaiado no corredor e que eles podiam roubar a arma dele também.
Serena vai para perto de Jungkook, se abaixa e enfia a mão debaixo do saiote do vestido, e puxa a pistola escondida dentro de uma meia.
— Você sabe usar isso melhor que eu — Ela estende a pistola para Jungkook, que encara a arma por alguns segundos, antes de pegá-la, assentindo firmemente.
O pirata de roupas sujas vai para frente de todos.
— Hora do acerto de contas, meus camaradas de cela — A expressão de Jungkook era afiada, despertando o sentimento de confiança em todos os outros prisioneiros.
Todos juntos, eles vão até à escada da prisão e, ao passarem no corredor, a arma do soldado - ainda desmaiado - é roubada, posterior a ele ser jogado e preso em uma das celas.
Quando param atrás da cortina vinho com detalhes dourados, escutando as risadas altas e música do outro lado, todos se entreolham para em seguida iniciarem uma grande rebelião ao atravessarem a cortina, como se fosse um motim em um navio.
Os soldados bêbados se levantam de imediato e as dançarinas gritam falsamente assustadas. Rapidamente o caos se instaura, enquanto os prisioneiros iam para cima dos soldados que se espantavam ao não acharem suas armas presas nas suas fardas. No meio do tumulto, as dançarinas entregam as armas para os prisioneiros livres e correm para fora do lugar, ainda gritando.
Serena passa por todos atrás de Jack, e quando a acha ainda sentada no mesmo lugar, ela corre em direção à sua amiga, pegando-a pela mão e puxando-a para longe assim que vê Hoseok sacar sua pistola e começar a disparar em direção a alguns prisioneiros.
Jack estava em choque e atordoada demais, então apenas deixou Serena a arrastar para fora.
— Pronto, elas estão aqui! Agora vamos dar o fora! — Jule fala assim que Serena e Jack aparecem. Todas as dançarinas e piratas soltos já estavam do lado de fora do castelo.
Eles correm juntos, sempre olhando para trás para conferirem se não eram seguidos, e, por sorte, os prisioneiros estavam fazendo um ótimo trabalho, embora alguns aproveitassem da confusão para fugirem também.
Debaixo do céu estrelado e das ruas desertas e escuras, eles correram por toda corte do rei. Às vezes, Jack, Serena e Frida tropeçavam nos saltos, e Jack chegou até a cair e machucar o joelho, sendo carregada nas costas por um dos piratas. Por isso, antes mesmo de chegar no meio do caminho, Serena tirou os saltos e os deixou para trás, na rua, correndo descalça enquanto erguia o saiote do vestido.
Agora, a apenas poucos metros, alguns piratas estavam sobre os batentes do navio, vigiando o porto com lunetas, enquanto os outros piratas estavam a postos dentro do Vingança, preparados para qualquer coisa. Namjoon estava posicionado atrás do leme, com as mãos nas hastes de madeira. Taehyung estava no convés, com sua espada presa na cintura e uma pistola na mão. E os tripulantes foram mandados para os quartos, já que na última invasão, muitos deles morreram, porém, Dana insistiu e conseguiu ficar no convés também, preocupada demais com suas meninas.
— Eles voltaram! — Um dos piratas de pé no batente, grita, fazendo os outros dentro do Vingança se agitarem.
A rampa do navio foi abaixada a pouco tempo, então, os piratas e as dançarinas só precisaram subir.
— Obrigado por me resgatar. Não vou me esquecer disso — Jungkook surge do lado de Serena e fala enquanto eles correm rampa a cima.
Apesar de ser pega de surpresa, ela sorri para ele.
Quando todos entram no navio, os piratas gritam pela vitória, e sobem a rampa e a âncora.
— Zarpar navio! — Taehyung dá a ordem e Namjoon manuseia o leme, fazendo o Vingança se mexer e começar a se afastar do porto.
Os piratas resgatados foram recebidos com abraços e saudações estranhas.
Serena estava do lado de Jack, a segurando depois que ela foi posta no chão. Dana corre até elas e as abraça tão abruptamente que quase derruba as duas.
— Mamãezinha, você está apertando demais — Jack resmunga entre um sorriso e Dana interrompe o abraço.
— Você se machucou? — A mulher de cabelos vermelhos, pergunta, encarando o sangue que manchava a parte rasgada do vestido de Jack.
— Caí enquanto voltava para o navio. A culpa é desses saltos que não sei usar direito. — Jack ri, mas Dana ainda continua preocupada.
— Vamos cuidar desse machucado — Dana a pega como se ela fosse uma criança, apoiando o braço de Jack sobre seus ombros. — Serena, você vem conosco?
— Vou em um minuto — Serena responde e se joga sentada no convés, apoiando suas costas contra a parede de uma das bordas.
Dana assente e leva Jack até o alçapão do andar debaixo.
Serena queria mais que tudo ver Duque e relaxar, mas ela precisava de tempo para fazer seus pés descansarem, pois além de sujos, eles estavam doloridos pela corrida descalça nas ruas da corte.
Ela dobra as pernas e começa a massagear a sola dos pés, enquanto resmunga vez ou outro, mas isso não era escutado devido a toda empolgação no convés. E então, sem que Serena percebesse, alguém se senta do seu lado, a fazendo espiar debaixo dos cabelos loiros que cobriam seu rosto inclinado.
— Você fez como combinamos — Taehyung a fita.
— Eu disse que faria — Serena volta a prestar atenção nos pés doloridos.
— Mas eu não acreditei que faria — Ele sorri provocativo mesmo que ela não esteja o olhando. — Pelo jeito, você realmente quer se livrar de mim.
Serena solta seu pé e o encara.
— E você também não quer se livrar de mim? — Sua voz tinha uma pitada de sarcasmo.
— Você tem razão — Ele sorri de novo, ao mesmo tempo que o vento dos mares passa por eles, balançando os cabelos e a camisa aberta em dois botões do Capitão.
Os interrompendo, Jungkook se aproxima.
— Como nenhum de vocês levou um tiro? Estou surpreso — Taehyung comenta.
— Agradeça a Serena. Ela é mais astuta que um pirata — Jungkook olha para Serena e acaba sorrindo. E antes que ela o responda, um outro pirata surge e pega Jungkook pelo pescoço, o puxando para beber em comemoração à sua volta.
— Talvez não seja tão ruim ter você no navio — Taehyung comenta quando Jungkook é arrastado para longe deles.
Serena encara Taehyung por alguns segundos e se levanta, pronta para sair.
— Eu não sou tão fácil assim, Capitão. Primeiro você vai precisar se esforçar um pouco mais. — Serena sorri como um verdadeiro pirata e se afasta, indo até o alçapão, enquanto os olhos de Taehyung a acompanham com interesse.