Noivado de Conveniência

Escrita porRay Dias
Editada por Natashia Kitamura

Capítulo 2 • O namoro que cresceu sozinho

Tempo estimado de leitura: 28 minutos

Um mês depois do almoço das famílias, Miguel e Sofia descobriram que a mentira deles tinha se transformado em algo muito maior. A princípio, parecia inofensivo: um teatrinho para satisfazer os pais, que com o tempo perderia força. Mas, pelo contrário, cada semana trazia uma nova situação que os enredava ainda mais na trama que eles mesmos criaram.
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  Helena, por exemplo, havia adotado uma nova mania: preparar marmitas duplas. Não era raro Miguel receber entregas da mãe e encontrar um bilhete preso em forma de coração: “Essa é para você e para a Sofia. Não se esqueçam de comer juntos, isso fortalece a relação.” . Ele suspirava, mas claro que não tinha coragem de jogar fora. Ligava para Sofia e avisava:
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  — Temos jantar patrocinado pela minha mãe de novo.
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  — Ela mandou lasanha ou frango grelhado dessa vez? — Sofia respondia já acostumada.
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  — Lasanha. Com molho branco.
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  — Ótimo, porque você sabe que eu não cozinho nada que preste.
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  E lá iam Sofia ou Miguel invadirem o apartamento um do outro para comerem juntos, as marmitas da dona Helena.
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  Enquanto isso, Vera não ficava para trás em sua campanha pessoal de “promover o casal”. A cada visita, ela insistia para que Sofia e Miguel tirassem fotos juntos: no sofá, na varanda, até ao lado do cachorro de estimação da família. “Preciso mostrar para as minhas amigas como vocês são lindos juntos!”, dizia, ajeitando o cabelo da filha e pedindo para Miguel “abraçar mais forte, como namorado de verdade”. O álbum de fotos do celular de Vera já tinha tantas poses ensaiadas que poderia virar um book de noivado.
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  Roberto, por sua vez, havia estabelecido uma regra implícita: nenhum churrasco acontecia sem a presença da “nora”. Se Miguel aparecia sozinho, o pai o recebia com um olhar de reprovação.
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  — E a Sofia? — perguntava como quem cobrava uma falha grave.
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  — Pai, ela tinha coisa para fazer…
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  — Coisa mais importante do que ver a família do namorado? — Roberto retrucava, teatral, como se Miguel tivesse desonrado o sobrenome.
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  No fim, Sofia aparecia meia hora depois, chamada às pressas por uma mensagem de Miguel que sempre começava com um: “Me salva, por favor.”
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  Mas nada se comparava ao susto que Sofia levou no trabalho. Um belo dia, um enorme buquê de flores chegou à sua mesa, com direito a bilhete escrito: “Para minha namorada, com carinho — Miguel.”. O problema é que o cartão estava na caligrafia inconfundível de Helena. Sofia quase engasgou com o café enquanto as colegas de escritório a rodeavam em êxtase.
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  — Menina, ele é perfeito! — disse uma.
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  — Namorem assim para sempre, por favor! — pediu outra.
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  Quando ligou para Miguel, ela estava entre indignada e rindo tanto que mal conseguia falar:
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  — Adivinha quem mandou flores para mim em seu nome?
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  — Não…
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  — Sua mãe, Miguel! SUA. MÃE.
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  Do outro lado, ele gemeu:
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  — Eu não acredito... pelo menos eram flores bonitas?
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  — Eram. Mas vou jogar o cartão na sua testa na próxima vez que a gente se ver.
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  No meio de tudo isso, Miguel e Sofia trocavam mensagens quase diárias tentando lidar com a bola de neve que haviam criado.
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  — “A gente precisa contar a verdade logo.”
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  — “Sim, mas vamos esperar passar o churrasco do domingo.”
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  — “Tá, mas depois tem o aniversário da tia da sua mãe...”
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  — “Ok, então depois disso.”
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  E assim, a cada semana, o plano de encerrar a farsa era adiado, substituído por um novo motivo para continuar. Quando perceberam, já tinham virado oficialmente o casal favorito das duas famílias, com direito a torcida organizada e tudo.
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N O I V A D O • D E • C O N V E N I Ê N C I A

  Era uma tarde tranquila de domingo na casa dos avós de Miguel. O cheiro de bolo de fubá recém-saído do forno tomava conta da cozinha, enquanto o avô, Seu Anselmo, tentava ajeitar o rádio antigo que sempre chiava em qualquer estação. Dona Lúcia, a avó, bordava calmamente na sala, mas com as antenas sempre ligadas em cada palavra da conversa.
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  Helena e Roberto tinham passado “só para uma visita rápida”, mas bastou a primeira fatia de bolo e o primeiro gole de café para que o entusiasmo começasse a escapar.
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  — O Miguel anda tão diferente ultimamente, não acham? — comentou Helena, ajeitando a xícara com ar conspiratório.
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  — Diferente como? — Lúcia ergueu os olhos do bordado, farejando fofoca.
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  — Mais sorridente… menos rabugento. Tem até se preocupado em arrumar mais o cabelo e largado aqueles bonés de aventureiro! — acrescentou Roberto, rindo.
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  Anselmo franziu a testa, ainda mexendo no rádio.
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  — Esse menino nunca foi rabugento, só quieto. O que vocês estão insinuando?
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  Helena trocou um olhar cúmplice com o marido. Por alguns segundos, parecia que segurariam o segredo. Mas Roberto, que nunca soube guardar boas notícias por muito tempo, simplesmente explodiu:
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  — É que o Miguel está namorando e dessa vez é sério!
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  Lúcia largou a linha e a agulha como se tivesse levado um choque.
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  — Quando é que ele não namorou sério?!
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  — Não é isso, é que antes ele não durava mais de seis meses, mas dessa vez ele não tem motivos para evitar que o namoro dure muito.
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  — Como assim, Helena? — Seu Anselmo perguntou confuso.
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  — O Miguel evitava se apaixonar de verdade pelas namoradinhas de antes, mas essa de agora… É quem ele sempre quis. — Roberto explicou.
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  — E quem é a moça? — perguntou Anselmo, abandonando o rádio e endireitando-se na poltrona.
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  O olhar dele misturava curiosidade e uma pontinha de satisfação, como se tivesse esperado a vida toda por esse anúncio.
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  — Não me digam que é a… — Lúcia parou de falar largando os bordados, tal qual Anselmo, com a mesma expectativa.
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  Helena não resistiu e completou com uma piscadinha:
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  — Vocês conhecem bem... é a Sofia.
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  O silêncio que se seguiu durou apenas dois segundos. Depois, a explosão veio:
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  — EU SEMPRE SOUBE! — gritou Lúcia, batendo palmas como se tivesse acertado na loteria.
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  — Ora, ora, demoraram só catorze anos para perceber o óbvio — resmungou Anselmo, mas o sorriso orgulhoso denunciava sua alegria.
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  Roberto se divertia com a reação.
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  — Pois é, agora é oficial. Eles mesmos confirmaram.
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  — Oficial? — Lúcia levou a mão ao peito. — Então é coisa séria?
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  — Seríssima — Helena garantiu, sem sequer piscar.
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  A avó levantou-se de um pulo e correu até a estante, onde guardava uma caixa cheia de álbuns de família.
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  — Eu vou separar todas as fotos que tenho dos dois juntos, desde a faculdade. Vamos fazer um mural no sítio! Imagina, mostrar para todo mundo como o amor deles estava escrito desde o início? Eu sempre fotograva eles escondido quando iam com os amigos para o sítio!
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  Anselmo ria alto, batendo na mesa.
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  — Quero ver o Miguel escapar das piadinhas do churrasco agora. O neto acha que é esperto, mas comigo não tem disfarce.
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  Helena, percebendo a empolgação dos dois, tentou disfarçar o pânico que lhe atravessou por um segundo. Afinal, Miguel e Sofia ainda não sabiam que os avós estavam por dentro da história. Mas era tarde demais: Lúcia já fazia planos de almoço em família, churrasco, e até arriscou:
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  — Bem que a gente podia reunir todo mundo no sítio para comemorar... o namoro... ou quem sabe até planejar o próximo passo.
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  Helena e Roberto sorriram, cúmplices. O segredo estava fora da caixa, e agora não havia volta. Lúcia ainda vibrava como uma adolescente apaixonada. O bordado tinha sido esquecido no sofá, e agora ela abria o álbum de fotos com a pressa de quem sabia exatamente o que procurava.
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  — Olhem aqui, olhem aqui! — exclamou, mostrando uma foto de Miguel, aos vinte anos, com o braço desajeitado em torno dos ombros de Sofia. — Ele já era todo protetor! Repararam no jeitinho que ele olha para ela? É amor estampado no olhar desde mocinho!
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  Anselmo, rindo, colocou os óculos para enxergar melhor.
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  — Isso aí não é amor, é vergonha. O menino provavelmente só estava bêbado e com vergonha da foto que você estava tirando.
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  — Ah, Anselmo, deixa de ser ranzinza! — Lúcia retrucou, batendo de leve no ombro do marido. — Você não entende nada de sutilezas. Eu, sim, sempre percebi. Essa menina já fazia parte da nossa família desde o início.
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  Roberto e Helena trocavam olhares cúmplices, rindo do entusiasmo. Mas quando Lúcia soltou a próxima frase, eles quase engasgaram com o café.
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  — Agora quero conhecer a Sofia de verdade. Não só a amiga que sempre vinha passear... a futura neta de verdade!
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  Roberto engoliu em seco, mas não teve tempo de intervir.
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  — Isso mesmo! — Anselmo completou, animado. — Se eles estão juntos, então precisamos ver como os dois funcionam lado a lado. Quero observar se Miguel aprendeu alguma coisa com a vida, se sabe tratar a moça com o cuidado que ela merece.
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  Helena, tentando aliviar o peso da expectativa, sorriu:
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  — Nada melhor do que o sítio para um final de semana em família! Lá todo mundo relaxa, tem espaço, comida boa, e podemos... conviver melhor com eles como casal.
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  — Perfeito! — Lúcia bateu palmas. — Um fim de semana inteiro! Vou preparar um cardápio especial. Vou até fazer o doce de leite caseiro que a Sofia adora.
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  — E eu vou ligar para o caseiro mandar ajeitar a churrasqueira. Quero testar o Miguel — disse Anselmo, com ar sério. — Se esse rapaz vai ser o genro do Antônio, precisa provar que sabe acender fogo e assar carne direito.
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  Roberto gargalhou.
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  — Se depender de mim, o Miguel passa no teste com louvor...
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  Enquanto Lúcia já anotava uma lista mental de receitas e lembrava de separar os lençóis de hóspedes, Helena e Roberto sentiam a armadilha se fechar com uma doçura quase assustadora. Não havia mais como voltar atrás.
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  Quando os dois se despediram, já na porta, ouviram Lúcia gritar da cozinha:
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  — Tragam os dois logo, Helena! Quero ver esse casal juntinho na varanda, igualzinho nas minhas lembranças!
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  Helena riu nervosa, acenando.
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  — Pode deixar, Lúcia. Logo, logo vocês terão o fim de semana perfeito com os dois.
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  E, no carro, já a caminho de casa, Roberto suspirou, resignado:
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  — Helena, estamos ferrados. Metemos os meninos em um compromisso sem os avisar... com direito a bolo de fubá e doce de leite.
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  Ela riu, mas a verdade era que também estava ansiosa. Agora, eles tinham entrado em território perigoso: as mãos apaixonadas dos avós.
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N O I V A D O • D E • C O N V E N I Ê N C I A

  O telefone tocou na sala da casa de Vera e Antônio em uma tarde de terça-feira. Vera, que estava recortando receitas de uma revista antiga para “futuras ocasiões especiais”, atendeu sem imaginar o entusiasmo que viria do outro lado da linha.
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  — Vera, querida! — era a voz animada de Helena soando no viva voz, já que Vera sempre atendia assim e, que falava como se tivesse acabado de descobrir um tesouro. — Preciso compartilhar uma coisa maravilhosa!
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  Antônio, sentado à mesa lendo o jornal, ergueu uma sobrancelha. Ele conhecia bem aquele tom exaltado de Helena: vinha bomba por aí.
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  — O que foi, Helena? — perguntou Vera, já com um sorriso curioso.
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  Do outro lado, Helena mal se segurava:
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  — Contamos para os avós! Para o seu Anselmo e a dona Lúcia! E você não imagina… eles estão radiantes com o namoro da Sofia e do Miguel! Radiantes!
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  Vera engasgou levemente.
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  — Ah… então vocês… contaram?
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  — Claro! — respondeu Helena, quase ofendida. — Como não contar? Eles precisavam saber que finalmente nosso Miguel encontrou a pessoa certa! E, olha, a dona Lúcia já disse que a Sofia é a nora perfeita. O seu Anselmo quase abriu o vinho de guarda para comemorar!
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  Antônio baixou o jornal, interessado.
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  — Isso é sério? — perguntou, se inclinando para ouvir melhor a ligação. — Seus sogros estão comemorando como se fosse noivado?
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  Helena riu.
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  — Não só como se fosse: eles já falam da Sofia como “a futura neta de verdade”. E, minha amiga, você sabe como eles são quando colocam uma ideia na cabeça.
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  Vera, meio surpresa, meio encantada, pôs a mão no peito.
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  — Meu Deus… a Sofia já sabe? Helena, isso é maravilhoso! A Sofia adora os avós do Miguel e sempre os tivera como os avós dela, já que infelizmente, eu e o Antônio perdemos nossos pais faz tempo.
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  — Esse é o problema, não contamos para as crianças ainda! — Roberto entrou na conversa, pegando o telefone da esposa de supetão. — Antônio, meu amigo, papai quer provar que o Miguel está pronto para ser o marido da sua filha, e conhecendo o meu filho como eu conheço, ele vai odiar que contamos antes deles!
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  Antônio não conseguiu segurar a risada.
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  — Helena e Roberto, vocês são mesmo incorrigíveis. Mas confesso que estou aliviado. Vera vive dizendo que a Sofia precisa de alguém à altura, e… olha, Miguel é um rapaz honrado.
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  Helena aproveitou a deixa para lançar sua ideia triunfal, se aproximando do telefone de novo:
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  — Então vamos fazer o seguinte: nada melhor do que aproximar as famílias, não é? Que tal um fim de semana no sítio dos meus sogros? Todos juntos, em clima de família, com tempo de sobra para os jovens se curtirem… sem perceberem que estamos dando corda, claro!
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  — Ah, Helena! — Vera bateu palmas, empolgada. — Isso é perfeito! Um fim de semana inteiro, longe da correria, eles vão se soltar mais, ficar mais à vontade…
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  — E a gente observa de camarote — completou Roberto, malicioso. — Sem pressão, só criando o ambiente ideal para eles começarem a pensar em casamento. Catorze anos ao lado um do outro, já basta não é? Não precisam namorar por muito mais tempo!
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  — Até porque, essa é a idade ideal para eles! Miguel está com 32 e Sofia com 31! Precisamos pensar nos nossos netos! — Helena falou verdadeiramente preocupada.
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  Antônio coçou o queixo, mas estava claramente convencido.
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  — Está decidido, então. Vamos armar esse encontro como quem não quer nada. Diga para o seu Anselmo que nós levaremos vinho e sobremesas. Vai ser inesquecível!
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  Helena deu um gritinho de satisfação, já imaginando a cena.
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  — Isso, Antônio! Exatamente! Um encontro de família, simples, casual, mas que vai marcar o início de uma nova fase. Ah, eu já consigo ver a Sofia e o Miguel caminhando de mãos dadas pelo sítio, com a dona Lúcia suspirando atrás deles…
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  Vera suspirou, rindo.
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  — Helena, você me mata de ansiedade! Eu só espero que eles não estranhem tanta empolgação.
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  — Eles não vão estranhar, Vera, confie em mim. Jovens nunca percebem essas coisas.
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  Do outro lado, Antônio olhou para a esposa e comentou em voz baixa:
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  — Esses dois estão tão cegos de paixão que talvez sejam os únicos que não percebam.
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  Os quatro caíram na risada, cúmplices. E assim, com uma simples ligação telefônica, o fim de semana no sítio foi decretado — para a alegria dos pais e para o completo azar de Miguel e Sofia, que ainda não tinham ideia da armadilha carinhosa em que estavam prestes a cair.
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N O I V A D O • D E • C O N V E N I Ê N C I A

  A sala dos pais de Sofia estava iluminada por uma tarde preguiçosa, cheirando a pão recém-saído do forno. Vera e Antônio trocaram olhares cúmplices enquanto Sofia e Miguel terminavam seus cafés. A conversa foi conduzida com a sutileza de um elefante em loja de cristais.
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  — Então, meus queridos — começou Vera, ajeitando o cabelo com um ar ensaiado —, os avós do Miguel estão ansiosos para ver vocês dois. Vai ser ótimo um final de semana no sítio. Família reunida, clima gostoso, nada demais.
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  — É — Antônio complementou, exagerando na naturalidade. — Só um passeio simples, sabe? Tranquilo.
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  Sofia estreitou os olhos.
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  — Passeio simples… com churrasco, trilha, fogueira, e… uma plateia de parentes?
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  — Ah, imagina! — Vera acenou com a mão, fingindo desprezo. — Só um encontro casual. Vocês vão adorar.
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  — Claro, o sítio do vovô e da vovó é sempre agradável, não é, Sofi? — Miguel falou soando simpático apesar de um pouco incomodado.
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  — Sim, eu já estava mesmo com saudades deles. — Sofia comentou sorrindo leve.
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  Miguel deu um sorriso engessado, agradeceu e, num gesto automático, segurou a mão de Sofia.
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  — A gente precisa ir — ele disse rápido, inventando uma desculpa qualquer sobre um compromisso urgente.
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  Na rua, Miguel manteve a expressão firme até ligar o carro. Mas, assim que arrancou, começou a rir de um jeito nervoso, quase histérico.
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  — Ok… ok, isso saiu do controle.
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  Sofia, no banco do passageiro, o encarou desconfiada.
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  — Você está mais nervoso agora do que quando a mentira começou. O que está acontecendo, Miguel?
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  Ele apertou o volante, respirou fundo e desviou o olhar da estrada por um instante.
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  — É que… eu nunca te contei isso. Meus avós sempre tiveram essa ideia de que eu e você éramos… — ele procurou a palavra certa, quase engasgado. — Destinados.
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  — Como assim, destinados? — Sofia arqueou a sobrancelha, surpresa.
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  — Eles sempre amaram a ideia da gente juntos. Desde a primeira vez que você foi lá em casa, na época da faculdade. Eles diziam que a gente lembrava o relacionamento deles, que seria lindo se tivéssemos a mesma história de amor.
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  Sofia arregalou os olhos, sem saber se ria ou se se emocionava.
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  — Você está dizendo que seus avós já me viam como… futura neta?
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  Miguel soltou uma risada curta, nervosa.
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  — Exatamente. E agora… agora eles acreditam que é real.
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  Ele estacionou em frente a um café. Os dois entraram, pediram qualquer coisa — nem lembrariam depois o que — e sentaram-se numa mesa perto da janela. Miguel recostou-se na cadeira, passou a mão no rosto e deixou escapar:
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  — Sofi, isso fugiu do nosso controle. Um mês atrás era só uma mentira inocente. Agora… vamos passar o fim de semana dormindo no mesmo sítio como se fôssemos quase noivos!
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  Sofia deixou a xícara na mesa encarando-o com uma indignação teatral.
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  — Ah, não vem jogar essa no meu colo, não! Foi você quem aceitou sorrindo quando minha mãe pediu foto de casal pra mostrar às amigas.
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  — E foi você quem não desmentiu quando minha mãe mandou flores no meu nome pro seu trabalho! — Miguel rebateu, erguendo o dedo como quem faz ponto em debate.
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  — Eu ia desmentir como? “Pessoal, obrigada, mas quem mandou as flores não foi o Miguel, foi a mãe dele que acha que somos namorados, mas é invenção nossa. Aliás, deixa eu avisá-la antes que ela mande a caixa de bombons” ?
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  — Tá, a gente se embananou juntos, admito. — Ele suspirou, derrotado, mas logo retomou a provocação. — Mas você também não precisava ter postado aquela foto no churrasco da minha família com a legenda “meu parceiro favorito”.
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  Sofia ergueu o queixo.
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  — Foi ironia!
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  — Foi munição! — ele retrucou, mas o canto da boca denunciava o riso.
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  Os dois ficaram em silêncio por alguns segundos, até que começaram a rir ao mesmo tempo. Era uma risada meio desesperada, meio cúmplice.
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  — A gente precisa contar logo a verdade — Sofia disse, recuperando o fôlego.
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  — Concordo — Miguel respondeu. — Mas não nesse final de semana. Não com meus avós sonhando com a gente de mãos dadas na varanda.
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  Eles se encararam, e por um instante o riso deu lugar a algo mais silencioso. Uma curiosidade, quase um arrepio de expectativa. Sofia mexia distraidamente no canudo do suco, olhando para a rua como quem busca uma saída mágica.
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  — Então a gente precisa de um plano. — disse, firme. — Não dá pra continuar empurrando isso com a barriga.
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  Miguel assentiu, também tentando parecer racional.
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  — Concordo. Então… vamos contar a verdade no sítio. Reunimos todo mundo, explicamos que foi um mal-entendido e pronto.
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  — Ah, claro. — Sofia ergueu uma sobrancelha. — Você imagina a cara dos seus avós quando a gente disser: “Surpresa, não é namoro, é só teatro!”?
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  Miguel fez uma careta, já derrotado.
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  — Tá. Talvez não seja a melhor hora.
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  — Nem lugar. — ela completou, tomando um gole do suco. — Você quer matar dona Lúcia do coração?
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  Ele suspirou, apoiando o cotovelo na mesa e o queixo na mão.
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  — Então a gente conta depois.
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  — Depois quando?
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  — Depois do churrasco de sábado.
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  — E quando tiver a fogueira no sábado à noite? — ela rebateu. — Vai todo mundo esperar a gente cantar música romântica de casal.
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  Miguel sorriu de lado.
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  — Tá, então depois da fogueira.
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  — Aham. — Sofia cruzou os braços. — Até parece que não vai ter dança lenta com a gente no meio.
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  Os dois riram, mas o riso rapidamente cedeu a um silêncio cheio de implicância.
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  — Ok, então… domingo. — Miguel tentou de novo. — Depois do almoço, na despedida.
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  — Claro, ótima ideia. — Sofia ironizou. — Bem na frente da mesa inteira, com sobremesa na mão. “Querem pudim? E já que estamos aqui, nosso namoro não existe”.
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  Miguel bateu a mão na testa.
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  — Tá ficando impossível, Sofi.
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  — Já ficou impossível. — ela rebateu, apontando para ele. — Você começou com a desculpa do “a gente conta depois”, e eu fui na onda. Agora estamos presos no roteiro.
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  Miguel se recostou na cadeira, soltando uma risada nervosa que virou gargalhada.
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  — Estamos vivendo uma novela mexicana! Só falta alguém aparecer com um cavalo branco e uma serenata.
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  Sofia tentou segurar a risada, mas acabou cedendo também, escondendo o rosto nas mãos.
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  — Isso é surreal.
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  — É pior. — ele inclinou-se para a frente, baixando a voz. — Eu acho que a gente está se divertindo demais nessa mentira.
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  As palavras ficaram suspensas entre eles. Sofia mordeu o lábio, desviou o olhar para a janela, mas não conseguiu esconder o rubor que subiu às bochechas.
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  — Não começa, Miguel. — ela disse, tentando soar firme, mas a voz saiu mais baixa do que queria.
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  Ele apenas deu um meio sorriso, aquele típico sorriso de quem sabe que cutucou na ferida certa.
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  — Só estou dizendo a verdade.
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  Por alguns segundos, ficaram em silêncio, cada um mergulhado nos próprios pensamentos. Depois, Sofia respirou fundo e mudou de assunto com um humor forçado:
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  — Ok, então vamos adiar mais um pouquinho. A gente conta depois do final de semana.
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  — Depois do final de semana. — Miguel repetiu, erguendo a xícara de café como quem faz um brinde.
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  Ela tocou o copo no dele, num gesto simbólico.
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  — Depois do final de semana.
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  Mas, no fundo, nenhum dos dois acreditou realmente que seria tão simples.
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