Capítulo único
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Você já reparou que sempre (e quando eu digo sempre, é sempre
mesmo!) que uma coisa daquelas muito boas, do estilo “muito melhor do que eu poderia imaginar”, entra na sua vida, vem sempre depois de uma coisa ruim? Se você nunca notou isso comece a pensar, que tenho certeza que vai achar pelo menos um acontecimento do tipo na sua vida e posso até ajudar com exemplos, quer ver? Quando você achou aquela vaga de emprego boa depois de meses procurando, participa de processos seletivos para a empresa até não poder mais e ali, lá no último, quando você já tinha certeza que aquela vaga era sua, eles vão lá e escolhem outra pessoa, algum tempo depois, às vezes quando você menos espera, aparece uma vaga que é A vaga, aquela dos sonhos mesmo.
Também temos a famigerada vida amorosa mais morna possível seguida do (re)encontro da alma gêmea, não é? Se você estiver se perguntando agora se é isso que aconteceu comigo já respondo que sim, foi. Clichê ou não, pode se sentar que lá vem história, porque vou contar como essa estranha lei do universo foi aplicada na minha vida. Prazer, sou %Natalia% %Ueno% e vou contar uma história digna de filme clichê natalino, meu tipo preferido de clichê.
Bom, começando do começo (dã), na época da escola tive meu primeiro
crush, era meu melhor amigo, mas que agora o mundo todo conhece: Shawn Mendes. Enfim, a gente sempre ficou no famoso chove não molha, sempre que eu achava que era a vez da nossa história começar, ele arrumava uma nova namorada, depois de meses, quando eu finalmente deixava pra lá e, muito de má vontade, começava a olhar para outros garotos, ele terminava com a garota e lá vamos nós tudo de novo.
Continuamos nessa durante todos nos últimos cinco anos da escola e acompanhei todos os três namoros que ele já teve, nenhum deles sendo muito bem sucedido (o que eu agradeço aos céus, porque não sou boba nem nada, né?) e ele também acompanhou todos os meus dois relacionamentos, que também não foram tão bem sucedidos assim não.
Depois da escola, inevitavelmente, cada um seguiu seu caminho, eu para a faculdade e ele fazer sucesso pelo mundo todo como já sabemos e o contato entre o grupo da escola foi ficando cada vez mais esporádicos. Até tentávamos organizar alguma coisa sempre que possível, mas dá para contar nos dedos de uma mão só quantas vezes fomos bem sucedidos nessa tarefa ao longo desses anos.
Mas, mesmo assim, sempre que Shawn tinha algum tempinho entre um show e outro e uma viagem e outra, ele me ligava e eu sempre atendia, não importa a hora, não importa onde estivesse. Desesperada? Não, prefiro chamar de amiga atenciosa.
Uma das últimas vezes que nos falamos por telefone era quase Natal e estava finalizando as compras de presentes quando atendi sua ligação.
- Olha se não é o amigo mais famoso que eu tenho!
- Oi %Nat%! Você vai estar em casa para o Natal? Esse ano vou conseguir voltar com mais calma e passar um dias por ai, podíamos marcar alguma coisa?
- Vou sim e claro que podemos, só me avisar o dia. Mas e ai, em que lugar do mundo você está hoje?
Depois de conversarmos mais um pouquinho desligamos e corri mandar mensagem para nossa amiga em comum, a %Mari%, a shippadora oficial de nós dois – como ela mesma gosta de nomear. Depois da nossa surtada básica de pré adolescentes, coisa que não me orgulho, mas que acontecia toda vez que o nome de Shawn estava envolvido na nossa conversa e, segundo dela, dessa vez era a vez que tudo ia dar certo e quem era eu para tirar a esperança da menina né, acreditei junto.
No dia seguinte ao Natal combinamos de tomarmos um sorvete e depois ir para algum outro lugar “colocar o papo em dia”, que foi onde tudo desandou; não lembro o que levou a que, porque, na minha memória, tudo não passa de um borrão, mas em um momento estávamos conversando e no outro já estávamos aos beijos no lounge da casa dele.
Logo após o beijo não sabia o que falar, então não falei nada, dando a ele a chance de começar a conversa do jeito que preferisse, se quisesse discutir sobre o que tinha acabado de acontecer, ok, se não quisesse partir para qualquer outro assunto ok também, mas acredito que o grande erro aconteceu nessa decisão, porque o que ele tinha para me falar naquele momento não era nada parecido com o que eu queria ouvir:
- Isso não era para ter acontecido... Não podia ter acontecido.
- Eu... O quê? – Muito legal ouvir algo do tipo de quem você acabou de beijar, ainda mais se esse alguém costumava ser seu crush da vida inteira.
- %Nat%, não me leve a mal, mas eu preciso ficar um pouco sozinho agora.
E sem responder nada sai pela porta, recolhendo minha dignidade, que tinha ido para o chão.
Depois desse dia a gente se evitava cada vez mais, até a conversa, que antes durava horas e horas e tinha assunto que não acabava mais, se tornou igual a de dois conhecidos, que tem mais silêncio constrangedor do que, de fato, conversa. %Mari% não podia estar mais brava com a situação, ela queria, logo que tudo aconteceu, ir tirar satisfações, mas eu não deixei, temendo que ela só piorasse as coisas.
Eu já não via esperanças de um futuro para nós dois, por isso, quando meus pais insistiram, pela milésima vez, que seria bom fazer um intercambio no Japão, para aumentar a minha
network, juntar um dinheiro e também “me reconectar com as minhas raízes” – palavras deles, não minhas, não pensei duas vezes antes de aceitar e alguns meses depois estava partindo para a famosa terra do sol nascente.
Alguns meses depois, quando estava chegando no meu pequeno apartamento, ouvi a notificação de mensagem no celular, que estava dentro da bolsa, hora que cheguei em casa peguei o aparelho para ver o que %Mari% queria agora. Só que não era %Mari%. Era Shawn.
“Você tem planos para hoje?”
Shawn
15/03 – 21h42
O quê? Que tipo de mensagem era aquela? Estávamos a meses sem nos falar e, do nada, recebo aquilo? Mas, apesar da vontade de digitar tudo isso que estava pensando, só respondi com uma palavra, esperando que ele fosse me dar mais explicações:
“Não?”
%Natalia%
15/03 – 21h49
“Eu tive uma ideia aqui e, desculpe se estiver sendo um pouco doido, mas eu tenho que te ver”
Shawn
15/03 – 21h49
“Estou há algumas milhas do Japão e estive pensando se poderia ir te visitar”
Shawn
15/03 – 21h50
“Acho que precisamos conversar”
Shawn
15/03 – 21h50
Enquanto eu pensava na resposta para a primeira pergunta ele já tinha me mandando mais outras seguidas. Queria que ele não tivesse o poder de bagunçar a minha cabeça e me deixar sem conseguir juntar as palavras para conseguir formar uma resposta coerente, não precisava nem ser boa, só coerente já estava bom, mas nem isso eu conseguia quando ele estava envolvido, logo eu, que sempre fui tão boa com as palavras.
Aliás, como ele sabia que eu estava no Japão? Aposto que a fofoqueira da %Mari% tinha contado, podia até ver ela esperando eu vir para o intercambio para mandar tudo o que tinha dito que não era para ela mandar. Mas tudo bem, depois eu me resolvia com ela.
“Tudo bem, me avisa quando estiver chegando então”
%Natalia%
15/03 – 21h53
Passei o endereço de casa para ele e fui tomar um banho e preparar alguma coisa para nós comermos, tudo meio correndo porque tinha esquecido de perguntar a que horas ele chegava.
No fim, consegui aprontar tudo antes de ele chegar, o que não foi uma coisa tão boa assim, porque agora estava andando igual a uma boba pelo pequeno espaço que venho chamando de casa desde o último mês e querendo mandar mensagem há cada dois segundos perguntando onde ele estava e, quando já estava ficando cansada de andar, ele chegou.
Depois dos cumprimentos, nenhum de nós sabia muito bem como iniciar a conversa, a tensão entre nós era palpável e, com certeza, alguém conseguiria cortar com uma faca até. Até que ele resolver dar o primeiro passo:
- Japão, han? Finalmente decidiu ouvir seus pais?
- Sim, quem sabe fosse melhor respirar novos ares...
Mais um pouco de silencio constrangedor? Legal!
- Olha, %Nat%, desculpa pelo jeito que as coisas ficaram entre a gente, depois daquele dia não consegui mais te tirar da minha cabeça, já devo ter escrito umas vinte musicas sobre você, se somar com as outras tenho certeza que você já tem mais música do que qualquer outra pessoa...
Tão bonitinho quando ele desanda a falar desse jeito. Espera, o quê? Músicas sobre mim?
Mais músicas sobre mim?
- Posso até te ouvir pensando sobre tudo isso que acabei de te falar.
- Você quer que eu faça o que, Shawn? Você, do nada, aparece aqui e despeja tudo isso pra cima de mim. Até ontem achava que você nunca tinha ligado para mim e já nem mais lembrava do que aconteceu no Natal passado.
- Espera, você que nunca ligou para mim, desde a época da escola. Até me incentivava a namorar as outras meninas que comentava com você.
- E você queria que eu fizesse o quê? – Tá, posso ter gritado um pouco com ele nessa parte, porque ele me olhava um pouco assustado.
- Olha, esquece isso, eu vim aqui para a gente se acertar de vez, seja como amigos, como sempre fomos, ou como qualquer outra coisa que você quiser, a única coisa que não dá mais é para continuarmos do jeito que tudo estava...
- Acho que está bem claro para você o que eu quero, não?
- Não, %Nat%, mas sorte sua que eu te conheço muito bem...
Então, finalmente, ele me beijou, era tão bom e leve quanto eu me lembrava da última vez, a diferença é que dessa vez estava tudo as claras e aconteceu com calma e carinho, do jeito que sempre sonhei. Ou melhor, melhor do que sempre sonhei.
Depois de recuperar todos os meses e anos perdidos, resolvi perguntar para ele como a %Mari% tinha contado que estava aqui.
- Como você sabia que eu estava no Japão, aliás?
- Eu vi no seu Instagram, não é sempre que tenho tempo de olhar os stories, mas ainda bem que hoje consegui, senão não estaria aqui...
- Ainda bem! – Me estiquei um pouco para beijá-lo mais uma vez. E talvez não fosse culpa da meliante dessa vez... – Mendes, infelizmente amanhã cedo tenho aula, vou precisar dormir, mas você pode ficar se qui...
- Sério que eu vou ter que te convencer a não dormir ainda, %Nat%? Poxa, daqui a pouco eu já vou ter que ir embora.
Não preciso nem dizer que fui convencida facinho né? Tinha que aproveitar pelo passado e pelo futuro também, porque não era sempre que íamos conseguir nos ver e, além disso, foi para isso que inventaram o café, tenho certeza!
Mais tarde, quando chegou a hora dele ir para o próximo local de show nos despedimos com a promessa de nos falarmos todo dia e nos visitarmos sempre que desse e foi assim que tudo continuou pelo ano todo, Shawn ia para onde eu estivesse sempre que podia e eu ia me encontrar com ele também sempre que conseguia e assim as coisas foram ficando cada vez mais sérias, os encontros cada vez mais frequente e a saudades quando estávamos longe cada vez maior e não me custou nada para perceber que a partir daquele momento toda aquela paixão adolescente (qual desconfio que nunca foi embora) voltou a tona e floresceu, finalmente podia chamar aquele homem com um rosto lindo, mas com uma alma mais linda ainda e um coração gigante, que ama o que faz e se dedica a sua música com todo o amor que pode de namorado.
Alguns bons meses antes do Natal meu intercambio acabou e eu voltei para casa e esse vai ser o primeiro Natal que iremos passa juntos como namorados oficialmente, exatamente um ano depois de toda aquela confusão e eu não poderia estar mais feliz com tudo que nos levou até o que temos hoje.
Mal posso esperar para compartilhar os próximos Natais e também minha vida toda com Shawn.
Fim