Em uma noite fria de inverno, as sirenes soaram dentro da floresta, dando início à caçada de vampiros. A família %Boo%, conhecida como a pioneira nesse assunto, sempre liderava os grupos, traçando estratégias e agindo de forma silenciosa, surpreendendo as suas presas e as matando sem piedade. Mas, dessa vez, parecia que algo estava errado, e quanto mais caminhavam para as profundezas da floresta, mais silenciosa ela ficava, o que era algo incomum, principalmente nessa época do ano que os seres sobrenaturais costumavam dar festas de boas-vindas aos novos membros do clã. Os vampiros sempre eram barulhentos demais – de acordo com a família %Boo% –, ainda mais por não saberem que estavam prestes a serem atacados, então, era suspeito eles não estarem em meio a comemorações e falatórios, fazendo com que os líderes dessem a ordem para que todos os presentes recuassem. Porém, no momento em que se viraram para trás, foram surpreendidos por uma névoa densa, e assim que perceberam que a presa era eles, a família abandonou os seus aliados, fugindo por uma rota de fuga que só eles sabiam. De longe, era audível os sons das espadas e dos gritos de horror e de dor, mas os mais velhos não podiam se importar menos; portanto que continuassem com seus status intactos e vitórias na mesa, eles não ligavam de sacrificar os seus companheiros. A sede de poder era tanta, mas tanta, que o casal não reparou que havia deixado o seu único herdeiro para trás, e ao se darem conta desse detalhe, se viram obrigados a retornarem à floresta, não por se preocuparem com filho, mas para garantirem que o casamento arranjado com a família Mahina seguisse sem problemas maiores.

  Dentro da floresta tudo estava turvo, e os sons estridentes das espadas iam cessando, de forma que %Boo% %Seungkwan% sabia que os humanos estavam perdendo. Para si, era um alívio que o ataque estava perto do fim, ele nunca foi a favor da prática da família e tampouco concordava em participar das caçadas, contudo, por ser um nobre e o único herdeiro, ele era obrigado a estar presente. %Seungkwan% tinha plena noção de que sua família havia abandonado os aliados, caso contrário, o número de mortes de humanos teria sido quase nulo, visto que seus pais dominavam a arte da espada. Ele sabia também que os seus progenitores voltariam para buscá-lo assim que percebessem o seu sumiço, mas só quando amanhecesse, para não correrem o risco de serem atacados. Por mais preparado que estivesse, o frio ainda era avassalador, e %Boo% precisava urgentemente acender uma fogueira para ajudar a se manter aquecido, apesar de ter total noção de que estava vulnerável por estar sozinho. O rapaz caminhou por um tempo até encontrar uma caverna, e ao checar que estava segura, a adentrou, tendo uma surpresa nem um pouco agradável. A cena era consumida por sangue e ódio, e ao entender rapidamente o que estava acontecendo, ele sacou sua espada, a cravando nas costas do caçador, vendo o seu corpo sem vida cair no chão. %Seungkwan% não sentia pena daquele homem, principalmente pelo estado ele havia deixado os vampiros à sua frente. O nobre não ligava se seria atacado em seguida, a única coisa que importava era conseguir diminuir um pouco o sofrimento dos feridos, no entanto, possuía plena noção de que se se aproximasse repentinamente, poderia acabar que nem o caçador.

  — Eu não vou atacá-los — jogou a espada no chão, longe de si —, só quero me proteger do frio.

  Nenhuma resposta lhe foi dada.

  Os olhares daquelas criaturas eram de dor e medo, e %Boo% percebeu que eles deveriam ser recém-criados pela quantidade de sangue que havia no ambiente. O seu coração doía ao vê-los nessa situação, e ele tentou chegar mais perto bem lentamente, tirando a sua mochila das costas para pegar o seu kit de primeiros socorros, até que o rapaz sentiu um arrepio correr pela sua espinha ao perceber que tinha um canivete quase perfurando sua pele por trás de seu pescoço.

  — Mais um passo e eu enfio a lâmina por completo — %Seungkwan% não ousou se mexer, mas não conseguiu conter o riso anasalado. — O que é tão engraçado?

  — É riso de nervoso, perdão — engoliu a seco, tentando demonstrar que estava com “medo”. — Que tal colocarmos esse canivete no bolso e eu te ajudar a cuidar deles?

  — Por que eu confiaria em você?

  — Aquele caçador ali não morreu sozinho — deu de ombros —, e não é difícil tirar esse canivete da sua mão.

  No segundo seguinte, %Boo% se virou tão rápido que o único reflexo da vampira foi pular pra trás, sem soltar a lâmina em sua mão. Ela olhou para o corpo caído e depois para as duas espadas, vendo que o rapaz não estava mentindo. A garota rolou os olhos, guardando o canivete na bolsa e finalmente olhou para %Boo% %Seungkwan%, que a encarava com uma feição um tanto... surpresa?

  Ela inclinou a cabeça, visivelmente confusa ao mesmo tempo que não pôde deixar de reparar o quão bonito o humano era. Os seus olhos pareciam ter um brilho diferente ao olhá-la, e ela achou uma graça as suas maçãs do rosto serem tão marcadas, além de estarem avermelhadas juntamente da ponta do nariz; era nítido que ele era um nobre e estava no meio dos caçadores, contudo, também era claro que o rapaz não representava nenhum perigo, não só por ele ter dito isso, mas por conta da sua intuição – um dos poderes da vampira era conseguir ver a aura dos vivos, o que a ajudava a diferenciar as pessoas boas das ruins com facilidade.

  — Você é médico? — Perguntou ao se aproximar dos outros vampiros.

  — Estudando para ser um — disse ao se agachar, tirando o que precisava da mochila.

  — Ótimo, me ajude a cuidar deles. Precisamos ir embora antes do nascer do sol — por mais que não demonstrasse, %Boo% sabia que a garota estava preocupada. — A propósito, meu nome é %Bree% Vatore.

  — %Boo% %Seungkwan% — acenou brevemente com a cabeça. Ele se virou para os mais novos, sorrindo para tentar tranquilizá-los: — Prometo que não vou demorar, tudo bem? Se doer, vocês podem apertar essa pelúcia. Ou morder, como preferirem.

  As crianças assentiram, e os mais velhos começaram os cuidados, terminando os curativos quase uma hora depois. %Boo% não imaginava o quão feio estavam as feridas deles, e o seu coração doeu mais uma vez ao ver o que os caçadores fizeram com seres tão indefesos. Ele odiava fazer parte da família %Boo% e os seus feitos contra os seres sobrenaturais, e odiava o fato de ser impedido de viver a sua vida como bem entendesse; odiava ter suas asas cortadas e ter que estudar em segredo, já que se sua família soubesse, eles eram capazes de o trancarem dentro de casa pra sempre; odiava também saber que o seu futuro já estava traçado, e que em breve teria que se casar, sendo esse o único motivo da sua família se importar consigo.

  — Obrigada pela ajuda — %Bree% o trouxe de volta para a realidade, observando que os olhos dele estavam marejados. — As crianças dormiram e estão bem, acho que temos um tempinho até que os demais cheguem para nos levarem pra casa.

  — Ah... — o seu coração acalmou ao vê-las sem dor e dormindo profundamente. — Obrigado por não ter me matado e ter permitido que eu cuidasse deles.

  — Qualquer ajuda é bem-vinda — suspirou ao se sentar no chão, sendo acompanhada pelo rapaz. — Não foi difícil perceber que você não faz parte dos caçadores, apesar de ser um.

  — Para o público eu sou — encostou a cabeça na parede, respirando fundo. — Quando se nasce em uma família de caçadores, você não tem escolha. Mas, quando eles não estão olhando, eu posso ser quem eu realmente quero ser.

  — Ter o seu destino traçado sem a sua permissão é o verdadeiro inferno.

  — Pois é — riu sem humor.

  — Bom... — se virou para o rapaz, o vendo ainda mais vermelho. — Sei que não é muito, mas queria retribuir a sua ajuda. Se importa de eu ver o seu ombro?

  — Saiba que eu sou um homem noivo, senhorita — disse em um tom descontraído, arqueando a sobrancelha.

  — Senhor noivo, você prefere morrer de frio e nunca se casar ou viver para voltar para a sua noiva?

  %Seungkwan% queria a primeira opção.

  Não por culpa da sua noiva, ela era tão vítima quanto a si, mas por querer se livrar do seu futuro e ser finalmente livre. No seu momento atual, ele não via outras saídas, principalmente por sua família ser tão influente que qualquer passo em falso faria eles o punirem severamente enquanto fingiam ser uma linda família para o olhar do público.

  — Você não precisa morrer para se livrar do que tanto te aflige — %Bree% puxou a manga do casaco dele, vendo as inúmeras marcas espalhadas pelo seu braço. — Se eu deixar dois furos aqui, vai chamar muita atenção.

  — Você vai me morder? — A encarou confuso, ignorando a fala sobre morte.

  — É o único jeito de te manter aquecido, não temos nada para fazer uma fogueira, e se fizéssemos, chamaria muita atenção.

  — Vejo que tem razão, mas... — ponderou, mordendo o lábio inferior. — Vai doer?

  — Sim, mas só um pouco. Logo você se acostuma.

  — Posso segurar a sua mão?

  — Pode, senhor noivo. — %Bree% riu com o pedido. Nunca que em todos esses anos viu um caçador pedindo para segurar a mão de um vampiro, e visivelmente %Seungkwan% estava um tanto nervoso por ser mordido. — Essa mordida não será capaz de te transformar, apenas te aquecerá.

  Assim que %Boo% assentiu, ele tirou o casaco e desceu um pouco o seu hanbok, aguardando os próximos passos da mulher. Como combinado, ela segurou a mão dele e percebeu que esse simples toque o fez se acalmar, sem contar que a sua pele era macia, o que a fazia querer ficar de mãos dadas por muito mais tempo. Contudo, %Bree% focou no que precisava fazer, e ao posicionar sua boca no ombro gélido do rapaz, ela o mordeu, escutando o seu grunhido baixinho. A mordida não levou mais do que dez segundos, mas a adrenalina misturada com o medo fez com que o corpo de %Boo% se aquecesse quase que instantaneamente, e ele encarou a vampira como se a mulher fosse a sua heroína.

  — Muito obrigado, senhorita canivete.

  — De tudo o que você podia me chamar, escolheu logo “canivete”? — Arqueou a sobrancelha.

  — Você insiste em me chamar de “senhor noivo” — rolou os olhos.

  — Mas foi você que me disse que era noivo.

  — Isso não importa — fez um biquinho — e o meu casamento é arranjado.

  — E o que tenho a ver com isso?

  — Eu quero te conhecer melhor.

  A cabeça de %Bree% havia dado um nó, e ela estava impressionada com tamanha ousadia do rapaz. Ela não era contra amizade com humanos, inclusive, possuía várias, porém, %Boo% %Seungkwan% fazia parte dos caçadores e era o único herdeiro da família %Boo%. Vatore não podia arriscar a segurança dos seus por causa de alguém, por mais que soubesse que o rapaz protegeria não só ela, mas também os outros vampiros.

  — Você já deve saber a resposta.

  — E se os nossos encontros forem no alto da montanha? Durante o inverno não há tantas caçadas, e eu consigo sair da mansão com a desculpa de que vou caçar sozinho. Vamos nos encontrar daqui dez dias quando o sol se pôr.

  A vampira suspirou, tentada a aceitar a proposta. Ela estava tão curiosa quanto ele, e gostaria de poder conhecê-lo melhor, mesmo sabendo que poderia acabar entrando em um amor proibido e essa situação não ter um fim nada bom.

  Como %Bree% previu, ela e %Seungkwan% haviam entrado em um amor proibido – mais precisamente, estavam juntos há seis meses.

  Apesar de muita relutância, ela o encontrou dez dias após se conhecerem, e ele a aguardava com um pequeno buquê de lírios na mão e um sorriso apaixonante, e não demorou muito para que Vatore se apaixonasse pelo caçador. %Seungkwan% sempre se admirava ao vê-la, não só por sua beleza deslumbrante, mas por sua amada ser tão incrível, forte e ser dona de um sorriso que o fazia se derreter por dentro. Depois de um tempo, eles decidiram aumentar o número de encontros, e quando perceberam, não conseguiam viver longe um do outro, por mais que soubessem das limitações que tinham. Por meio de %Bree%, %Boo% podia avisar aos vampiros os planos de seus pais e aliados, os ajudando a se prevenirem dos ataques; ele queria ser aceito pela família da namorada, mas não se importava se os demais iriam odiá-lo, afinal, ele carregava o sobrenome daqueles que faziam mal aos vampiros, então, mesmo que não fosse aceito, gostaria de ajudá-los o máximo possível. Até o momento, nenhum dos caçadores suspeitava de %Seungkwan%, porém, sua família havia percebido a sua mudança sutil ao longo dos meses, e eles decidiram que queriam adiantar o casamento. Claro que %Boo% não queria isso, no entanto, com a desculpa do casório, poderia sair bem mais, portanto, aproveitaria essa brecha para se encontrar com %Bree%, e mal podia esperar para vê-la novamente.

  Entretanto, quando subiu no alto da montanha, quem encontrou foi a sua noiva, e não a sua amada.

  Pela surpresa em seu rosto, ele sabia que ela não esperava que os guardas fossem intercepta-la e muito menos que seu noivo estaria ali, contudo, %Boo% usou dessa chance para ajudá-la, já que, pelo seu olhar para si, o rapaz podia dizer que Mahina Yue não estava nem um pouco feliz com a união.

  — Eu pedi que minha noiva me encontrasse aqui — sorriu para a garota, estendendo a mão a ela. — A menos que queiram participar do nosso encontro, peço que se retirem.

  Os guardas engoliram a seco e saíram, deixando os dois jovens em um completo silêncio.

  — Obrigada — agradeceu depois de um tempo, o olhando. — Você também veio se encontrar com o seu amor?

  — S-sim? — %Seungkwan% a encarou totalmente assustado, sem imaginar que ela soubesse do seu segredo, o que fez com que o seu nervosismo surgisse rapidamente.

  — Não precisa ficar com medo — Yue sorriu —, eu sou apaixonada por um demônio e a minha família é caçadora de demônios e exorcista. Bom, você deve saber disso, já que é o meu noivo.

  — É, eu sei — ele se agachou, precisando de uns segundos para se recompor e processar toda a informação.

  — Eu esbarrei com a sua namorada na metade do caminho, e a alertei sobre os guardas. Não que eles fossem fazer algo com os moradores daqui, mas os olhos vermelhos dela a faria ficar em apuros já que achariam que ela é um demônio.

  — Ela é uma vampira... — %Seungkwan% se levantou, levando a mão a boca ao perceber o que havia falado.

  — É, eu sei — o imitou, rindo. — Jun, meu namorado, me contou sobre o clã Vatore, e depois da quantidade de livros que li em busca de como me livrar do meu futuro, ficou fácil reconhecer os seres sobrenaturais.

  — Por que está me contando tudo isso?

  — Simples: não tenho nada a perder. E não é difícil saber que você está na mesma situação que a minha.

  Yue mostrou o seu braço por debaixo do hanbok, e assim como o de %Kwanie%, havia diversas marcas pela pele, o que fez o seu coração apertar. Apesar da sua cabeça estar uma bagunça agora, ele se sentia aliviado por ter alguém no mesmo barco que o seu, e o rapaz nunca imaginaria que de todas as pessoas, a sua noiva, que até então, não conhecia, seria pessoa que ele poderia confiar o seu segredo.

  — Você também tem uma marca que te conecta ao seu namorado? — Yue assentiu, apontando para o seu ombro. — Uau, a minha também é no mesmo lugar!

  — Sério? — Mahina o olhou surpresa, o puxando para mais perto. — Assim, sei que acabamos de nos conhecer, mas... eu pretendo me tornar um fantasma.

  — Como? — %Boo% piscou algumas vezes, atônito.

  — Foi a única forma que descobri para conseguir me livrar do meu futuro e continuar sendo eu mesma, quer dizer, perderei as memórias, mas isso é algo para a Yue youkai resolver. Já estou te deixando avisado para não achar que eu fugi ou te deixarei viúvo — a mulher riu baixinho, encarando o céu —, mas, eu realmente não suporto mais viver nesse casulo sufocante. As vezes eu prefiro pensar na morte do que ter que continuar fazendo parte dessa família.

  O rapaz sentiu como se tivesse levado um soco no estômago e a sua única reação foi permitir que as lágrimas rolassem por seu rosto. Ter a sua vida moldada e ter que viver dentro de uma caixa sem poder errar era difícil, e toda vez que era repreendido, ele sabia que o seu corpo guardaria a cicatriz para sempre. Crescer em meio à violência e desprezo o fazia querer desistir de tudo, e por mais que tivessem coisas as quais ele gostava, era difícil continuar dia após dia vivendo naquela família. Estudar medicina e, posteriormente, conhecer %Bree%, o ajudaram a continuar em pé, e %Boo% queria mais do que nuncq conseguir escapar do seu futuro para poder recomeçar e ser quem verdadeiramente gostaria de ser sem medo de sofrer nas mãos dos seus parentes.

  — Podemos ajudar um ao outro — Yue limpou as lágrimas dele com um lenço, sorrindo. — Não sei quando verei o Jun novamente, mas enquanto isso, posso te ajudar a encontrar uma forma de se livrar do seu futuro.

  — Por quê?

  — Eu já não te falei os meus motivos? — Rolou os olhos. — Se não quiser ajuda, voltarei para os meus aposentos.

  — Ei, me espera!

  %Boo% deu uma corridinha para alcançar Yue, e durante o restante do caminho, eles iam conversando sobre as possibilidades existentes para %Seungkwan%, e conforme os dias passavam, ambos chegaram a conclusão de que a melhor saída para o rapaz seria se tornar um vampiro.

  %Bree% não havia ficado tão feliz assim com a ideia, mas, se era uma vontade genuína do seu amado, o que poderia fazer era apoiá-lo. Ele contou sobre a sua decisão no início do verão, em uma noite calorosa durante o encontro sob a luz do luar. A brisa balançava as folhas das árvores e refrescava brevemente o casal, que após um tempo, conversavam sobre aleatoriedades do clã Vatore. %Seungkwan% queria guardar cada detalhe desse momento em sua memória, queria aproveitar cada segundo da presença da sua amada em seus braços por saber que esse seria o último encontro deles por um tempo.

  — Não quero te deixar ir — disse baixinho ao abraçá-la, respirando fundo e sentindo o seu perfume de lavanda que tanto adorava.

  — Também não quero — %Bree% deitou a cabeça no peito dele, suspirando. — Mas, nos veremos em breve, certo? Você e Yue conseguirão fugir de seus pais.

  — Sim, e aí poderei me juntar a você e a sua família — fez um carinho nas costas dela. — E Yue poderá se encontrar com Jun.

  — E esquecer essa história de se tornar uma youkai sem memórias — Vatore se afastou um pouco do rapaz, o encarando. — Nunca imaginei que me tornaria amiga de um caçador de vampiros e de uma exorcista. E olha que já conheci muita gente ao longo da minha longa vida.

  — E eu nunca imaginei que me apaixonaria perdidamente por quem eu deveria caçar. Talvez, durante a minha vida, eu estivesse caçando o amor, um sentimento o qual eu não senti até te conhecer — %Kwanie% segurou o rosto da namorada com carinho, sorrindo — Você é o amor da minha vida, %Bree% Vatore. Se existe amor eterno, com certeza é você.

  %Seungkwan% selou seus lábios calmamente, dando início a um beijo doce e com um sabor agridoce de saudade. Por mais que soubesse que a veria logo, seu coração ficava aflito por causa do medo, e o rapaz não queria perder a sua amada e nem pensar nessa possibilidade. Apesar de nunca ter sido ganancioso, desde que conheceu %Bree%, ele cada vez mais queria o seu amor, e se pudesse ter uma realidade em que os dois continuassem juntos, %Kwanie% faria de tudo para tornar isso uma realidade.

  Mas, como nem tudo são flores, o seu plano ficou por um fio.

  %Seungkwan% e Yue tinham tudo organizado.

  Eles usavam o casório como desculpa para ajeitarem todos os detalhes, e a fuga estava marcada para o final do verão, quando a cidade estava movimentada e os guardas mais dispersos. Os jovens encontrariam Blake Vatore, um dos líderes do clã, que os ajudariam a passar pela fronteira, e até então tudo estava correndo como planejado.

  Se não fosse por um pequeno detalhe: a família Mahina.

  Os parentes de Yue, em uma maneira de manter a filha debaixo de suas asas, contratou um guarda pessoal para a garota sem que ela soubesse, e por mais que tenham tomado todo o cuidado possível, a jovem e %Kwanie% foram interceptados na floresta que dava para a fronteira, impossibilitando eles de prosseguirem com o plano. Rapidamente, os jovens estavam cercados, e quando Yue viu uma brecha, ela correu e puxou %Seungkwan%, o empurrando de uma altura considerável – nada que fosse machucá-lo, apenas deixaria uns arranhões.

  %Boo% a encarou confuso até entender a situação, e ao perceber que sua amiga não viria, o seu coração apertou.

  Ele queria escalar aquele pequeno penhasco para trazer Yue consigo, o plano era para os dois fugirem juntos, e no segundo seguinte, a mulher sumiu do seu campo de visão, e a única coisa que conseguia escutar era o som dos passos dos guardas.

  Demorou um pouco para o rapaz começar a andar, e quando chegou na fronteira, ele foi surpreendido por %Bree% que pulou em seus braços, o apertando; %Seungkwan% afundou o rosto na curvatura do seu pescoço, sentindo aquele cheiro de lavanda que tanto gostava e o acalmava, permitindo que o choro viesse com tudo.

  Finalmente, ele estava livre. Livre do seu futuro, da sua família e daquele casulo que só lhe fazia mal. Contudo, o seu coração doía não só pela ansiedade e nervosismo, mas também por não ter a sua amiga ao seu lado e por não ter sido capaz de ajudá-la. A sua liberdade era o sonho que tanto desejava, no entanto, a realidade podia ser mais dura do que imaginava.

  %Boo% não se tornou um vampiro logo de cara, inclusive, demorou até mais do que o esperado para a sua transformação chegar. A viagem que tiveram pela frente para chegarem ao clã foi longa, e %Seungkwan% teve um bom tempo para pensar e repensar se isso era algo que ele realmente queria. Não é como se Blake não acreditasse no desejo do rapaz, porém, aquela era uma escolha que mudaria toda a sua vida, e o jovem precisava pensar muito bem antes de tomar qualquer decisão. No meio disso, %Boo% e %Bree% decidiam formas de contactarem Jun e até tiveram a ideia de irem ao inferno, mas, Blake deixou claro que o demônio do sono trabalhava de uma maneira diferente dos demais, e eles não conseguiriam entrar no seu limbo nem se pedissem ajuda à rainha – sem contar que se Yue realmente virasse uma youkai, provavelmente ela sumiria da memória de todos. Pensando em outras alternativas, %Seungkwan% citou Lux, o espírito que ficou de ajudar Yue a atingir seu objetivo, no entanto, Mahina nunca lhe contou como ela o conheceu, o que os levava a estaca zero. No fim, eles não sabiam exatamente o que fariam, mas não desistiriam de encontrar a amiga e uma forma de ajudá-la, mesmo que Yue sumisse de suas lembranças.

  Um ano se passou e logo o inverno chegou novamente, trazendo consigo um cenário gélido ao mesmo tempo bonito, palco de inúmeros encontros entre %Seungkwan% e %Bree%, que estavam mais apaixonados do que nunca. %Boo% havia sido transformado recentemente, e por mais que fosse difícil lidar com a sua nova força ou a sua sede, o rapaz ia aos poucos se acostumando a nova realidade, e não havia um dia sequer que ele se arrependesse da sua escolha – especialmente por ter sua amada ao seu lado todos os dias.

  — Pensando em que, amor? — %Bree% se sentou ao seu lado, o entregando uma taça de vinho. A noite caía lindamente e o clima estava agradável, um ótimo cenário para um pequeno encontro.

  — Como meus pais devem ter caído nas ruínas — suspirou profundamente antes de olhá-la —, e sinceramente, espero que isso tenha acontecido.

  — Pelo o que você me contou — Vatore segurou a mão dele, fazendo um carinho com o polegar —, acredito que eles tenham sim, além de terem que lidar com o julgamento pelo único herdeiro deles ter ido embora. Eles e a família dela merecem tudo de ruim.

  — Concordo — %Kwanie% encarou os céus. — Acho que Yue conseguiu o que queria. Parece que minhas memórias com ela querem sumir, mas por causa do que escrevemos e da foto, consigo mantê-las.

   — A mesma coisa comigo — sorriu tristonha, deitando a cabeça no ombro do rapaz. — Não sei o motivo, mas acho que a encontraremos quando for a hora certa. Só espero que ela esteja bem.

  — Queria ter alguma notícia dela, contudo, Lux sumiu do mapa — %Kwanie% e Vatore suspiraram juntos. Blake, em uma de suas viagens, tentou reunir informações sobre a jovem para seus filhos, contudo, a essa altura, todos já haviam esquecido dela, e o espírito que a ajudou não podia ser encontrado em lugar nenhum.

  — Vamos torcer para que ela e Jun se encontrem. — %Boo% concordou.

  — Sabia que vai fazer um ano que nos conhecemos?

  — Óbvio que sei, amor — %Bree% riu baixinho, se virando para o namorado. — Já estamos no inverno.

  — Tanta coisa mudou de lá pra cá — levou a mão livre para o rosto dela, fazendo um carinho. — Nunca pensei que me tornaria o que a minha família caçava, mas, é engraçado como isso nunca me causou um sentimento conflitante. Por mais que seus pais tenham falado sobre eu pensar bem, desde que eu e Yue pesquisamos sobre, eu sabia que não mudaria de ideia. Era algo que eu precisava fazer por mim... para conseguir ser livre e poder viver a minha vida sem arrependimentos. E foi a escolha que me permitiu ficar com você sem pôr a sua vida em perigo, meu amor — %Seungkwan% sorriu lindamente em meio às lágrimas. — Obrigado por tudo, %Bree%. Prometo que te recompensarei ao longo da minha longa vida.

  — Saiba que te cobrarei todos os dias, senhor caçador — a garota o olhou apaixonadamente, rindo. — Temos uma longa vida pela frente, e inúmeros dias para reescrever nosso história e um novo futuro. E é incrível poder estar ao seu lado para sempre.

  — Será que no próximo ano deveríamos nos casar? — Ele colou suas testas, sorrindo.

  — Será? Posso pensar com carinho no seu caso...

  Eles diminuíram a distância e selaram seus lábios calmamente, em um beijo que simbolizava tudo aquilo que sentiam um pelo outro. Agora, ambos tinham a eternidade pela frente, e dia após dia, escreveriam uma nova história e criariam uma nova realidade, onde podiam ser livres e felizes ao lado um do outro.