Hidamari

  Os rapazes da %Flow% desembarcam no aeroporto de Fortaleza e vão diretamente para o hotel. Internamente, ambos os vocalistas estão entristecidos pela partida de Salvador, principalmente pelo fato de %Li% não ter vindo com eles na viagem. Claro que eles entendem que a moça precisa trabalhar e que seria egoísmo demais exigir que ela largasse tudo e fosse com eles, mas o sentimento não deixa de passar pelos corações de %Kohshi% e %Keigo%.

  %Keigo% entra em seu quarto no hotel, que divide com Got’s, e deita-se na cama, largando a mochila ao lado dela. Em sua mente, o beijo que deu em %Li% passa repetidas vezes desde que se despediu dela horas atrás. A excitação que sentiu durante o beijo faz ele relembrar as sensações que teve ontem, o calor do corpo de %Li%, o aroma do cabelo dela, sentir a cintura da moça em suas mãos e o gosto de seus lábios nos dele de maneira tão gostosa. Ele quer tanto repetir esse beijo. É o seu maior anseio agora.

  O rapaz solta um suspiro prolongado e mexe em seu celular. Ele trocou contato com a %Li% durante os dias que ficou em Salvador, para sua surpresa há uma mensagem não lida dela.

  Ele sorri abobado ao fim da mensagem e pensa, brevemente, se a tecnologia já está avançada ao ponto de já conseguir engarrafar o gosto do beijo de alguém. Pois é justamente isso que ele quer provar agora: o gosto dos lábios de %Li%. Espantando os pensamentos bobos de sua mente, %Keigo% pega sua mochila e abre o bolso frontal. Lá, além das coisas que ele sabe que guarda ali, há um potinho com algo dentro. Ele o retira e abre o pote, há um bolo dentro e, preso à tampa, um bilhete. Junto há também uma polaroid do momento que eles viram o Porto da Barra à noite, coincidentemente foi momentos antes do ex-namorado de %Li% aparecer e quase estragar todo o passeio.

  O bolo está cheiroso e aparentemente gostoso também. %Keigo% retira um pedacinho e põe na boca, saboreando o gosto que é muito bom. Ele sente pedacinhos de algo que há na massa do bolo se espalharem por sua língua. Em volta do pote há uma etiqueta escrito “Bolo de Aipim” tanto em português quanto em inglês e, só então, %Keigo% se lembra do nome e manda uma mensagem para %Li%.

  — Oi, %Li%, está aí? — pergunta ele. Dois minutos depois vem a resposta.

  — %Keigo%! Estou sim, como foi a viagem? — questiona %Li% e o coração de %Keigo% dispara só pelo fato de estar conversando com ela novamente.

  — Muito boa! Obrigado! — agradece ele e completa: — Achei o seu presente. Muito obrigado, %Li%! Está gostoso o bolo — ele manda um emoji com a língua para fora.

  — Está mesmo? Que bom que gostou! Eu quem fiz — ela manda um emoji com um sorriso e %Keigo% devolve com um emoji com a boca aberta.

  — Sério? Nossa, %Li%, você é talentosa na cozinha também. Incrível, né?!

  — Confesso que meu bolo de aipim é realmente bom — ela se gaba um pouco e eles riem. — Eu fiz de madrugada com a ajuda de um dos camareiros e do pessoal da cozinha do hotel.

  — Ah, que legal! Ficou realmente incrível!

  — Eu achei que fosse demorar para conseguir mandar um pedaço para você provar, então resolvi apressar as coisas.

  — Essa incerteza me deixa angustiado — confessa %Keigo%, de repente, e %Li% manda um emoji confuso para ele.

  — Incerteza de quê?

  — Se eu vou ver você de novo — ele diz e manda um emoji triste.

  Por alguns segundos, %Li% sente-se angustiada também, no fundo ela também não sabe quando poderá ver %Keigo% novamente e isso a deixa agoniada, porém, ela não sabe se deve contar a ele já que não tem certeza do que sente de verdade pelo rapaz.

  — Eu posso visitar vocês nas minhas férias — diz ela na intenção de envolver todos os membros da banda. %Keigo% manda outro emoji triste.

  — Ah, nós da banda, né? — pergunta ele, querendo confirmar.

  — Sim. Você e os rapazes. Acabei me acostumando com vocês. Em ter vocês por perto todo dia — ela ri ao fim da frase e %Keigo% manda um emoji rindo também.

  Apesar do emoji, a expressão que %Keigo% faz agora é apática e triste. Ele queria mesmo que ela dissesse que sente falta dele e que iria viajar para ver ele e mais ninguém. Outra vez pensamentos egoístas tomam conta da mente do cantor.

  %Kohshi% divide quarto com o irmão e mal liga para o que ele faz agora. O vocalista está mexendo em sua mochila e encontra algo que o deixa emocionado e surpreso: dentro de um potinho embrulhado com uma etiqueta escrito "brigadeiro", em inglês e português, e uma polaroid da foto que tirou com %Li% e os outros lá em Salvador. A nostalgia toma conta do rapaz que sorri abobado ao ver a foto, seus olhos mirando a moça de cabelos cacheados.
Ele resolve mandar uma mensagem para agradecer.

  O sorriso dele volta a aparecer com sua última frase. Beijo. Ah, o beijo em %Li% que ele tanto quer repetir. O que o deixa mais entristecido é a incerteza se vai ou não ver a moça novamente.

  — Ah, a %Li% é uma fofa! — a menção do nome dela faz %Kohshi% erguer seu olhar para o irmão.

  — O que tem ela? — questiona ele, curioso.

  — Olha o que ela deixou na minha mochila! — %Take% ergue a polaroid com a mesma foto que %Kohshi% e %Keigo% receberam. — Tem até uma mensagem aqui. Fofa!

  — Também recebi um — comenta %Kohshi% ainda sorrindo. — Junto com um potinho de brigadeiro.

  — Brigadeiro? — pergunta %Take% em tom confuso.

  — É um doce brasileiro. %Li% disse que é bem gostoso e eu disse que queria provar algum dia, então ela fez e mandou para mim — explica e mostra um sorriso idiota novamente, olhando para o potinho em suas mãos.

  — Hm… posso provar?

  — Só um pouco — alerta %Kohshi% com a sobrancelha arqueada vendo o irmão levantar e sentar-se em sua cama.

  — Deixa eu ver… — %Take% pega o pote da mão do irmão e o analisa, curioso. Abre a tampa e enfia a colherzinha que %Li% manda junto com o potinho. Ao colocar na boca e provar, %Take% arregala o olhar de surpresa. — Que incrível!

  — Deixa eu provar — %Kohshi% puxa o pote das mãos de %Take% e prova a iguaria tendo a mesma reação do irmão. — Divino! Nossa, muito bom!

  — Me dá mais? — o mais novo estende a mão para pegar mais, porém é impedido por %Kohshi%.

  — É meu! — ele tira o pote do alcance de %Take%.

  — Não seja assim, %Kohshi%. Me dê mais um pouco!

  — Não! É meu!

  — Vou reclamar com a %Li% que você não quer dividir comigo! — ameaça o rapaz, rindo. %Kohshi% fica de pé na cama e ergue o pote para o mais alto possível.

  — Não ouse ligar para ela! — ameaça o mais velho. — %Li% fez o brigadeiro para mim, %Take%. Você já provou, chega!

  %Kohshi% e %Take% têm mais alguns minutos de discussão antes do mais velho ser vencido pelo cansaço e dar mais um pouco do doce para o irmão. Após a discussão, ambos descem até o hall do hotel onde encontram os outros e vão todos para a piscina aproveitar um pouco o dia. Assim como Salvador, a capital do Ceará é bastante quente e abafada, ambas lembram a cidade natal deles no verão. %Kohshi% se estica em uma das espreguiçadeiras que rodeiam a piscina, ajeitando seus óculos escuros no rosto e põe o celular na mesinha ao lado. Ele fecha os olhos, sentindo a luz solar o incomodar e respira fundo, a saudade que sente da capital baiana é intensa. Jamais lhe passou pela mente sentir tanto a falta de uma cidade que não fosse a dele. Chega a ser engraçado pensar que passar duas semanas totalmente incríveis em Salvador fosse deixá-lo tão saudosista e excitado ao mesmo tempo. Mas, não é uma excitação de animação e sim de tesão. Os mesmos pensamentos pervertidos passam pela mente do cantor novamente, os mesmos que ele pensou quando beijou %Li%. Os espantando, o rapaz aproveita o calor de Fortaleza.

  Após o show, todos retornam ao camarim para tentar descansar um pouco antes da viagem para o Rio de Janeiro, a última da turnê pelo Brasil. A vibe de Fortaleza foi tão intensa quanto a de Salvador e eles ficam animados para o último show na cidade carioca. O produtor da banda sugere que eles gravem um vídeo para agradecer todo o carinho e a maravilhosa recepção que tiveram e é justamente isso que eles fazem agora. Com o vídeo gravado, duas horas após, eles voltam ao hotel e seguem até o aeroporto de Fortaleza rumo à última parada.

  Na manhã seguinte eles já estão no Rio de Janeiro e saem para visitar a cidade. Todos acham tudo muito bonito, a vista é realmente deslumbrante. %Kohshi% tira fotos individuais dos amigos e %Take% tira a foto dele com o Cristo Redentor de plano de fundo. Ele faz questão de enviar diretamente para %Li% com uma mensagem junto.

  Ele nunca tinha sido tão direto em demonstrar seus sentimentos e vontades a alguém, ainda mais tratando-se de uma mulher, mas, ele sente que deve dizer, que deve realmente externar o que quer, pois sabe que a possibilidade de rejeição é maior. Isso porque ambos moram, literalmente, em lados opostos do planeta e %Kohshi% não quer ter o arrependimento de não ter falado. Às vezes, arriscar é preciso, não é mesmo?

  %Li% chega tão atordoada com o cansaço do trabalho que mal teve tempo de olhar as mensagens de seu celular durante todo o dia. Há muitas que não foram respondidas. As últimas que ela viu foram o vídeo que %Keigo% mandou sobre o show em Fortaleza e uma foto de %Kohshi% no Cristo Redentor. O dia foi tão corrido que ela não conseguiu respondê-los devidamente, mas nem precisa mais, já que há novas mensagens de ambos. Antes de visualizar tudo, a moça termina de preparar seu café e um sanduíche de pão com queijo e presunto que ela coloca no forninho elétrico para aprimorar o gosto, derretendo o queijo. Com tudo pronto, ela leva seu prato com dois sanduíches e uma xícara de café na mão até à sala, onde está seu notebook, e senta-se no sofá, repousando sobre a mesa de centro o prato e bebendo um gole de café. Ela pega seu celular e abre primeiramente a mensagem de %Keigo%, logo abaixo do vídeo há algumas mensagens dele todas enviadas há poucos minutos.

  %Li% lê as mensagens e se engasga com o café que toma. O que deu na cabeça do %Keigo% para mandar tantas coisas assim? Nossa, ela também está envergonhada agora e curiosa para saber o que tinha na mensagem apagada. Ela vê que o rapaz está online e responde:

  %Keigo% não responde. %Li% morde um pedaço de um dos sanduíches e abre a conversa com %Kohshi% que tem tantas mensagens após a foto enviada por ele mais cedo quanto na conversa com %Keigo%. O conteúdo é basicamente o mesmo, com um detalhe que faz a moça cuspir seu café após ler. Mais precisamente uma das mensagens enviadas às 20h16.

  Depois dessa mensagem não há mais nenhuma. %Li% responde ao rapaz, após recuperar-se do engasgo.

  A fotógrafa está tão envergonhada agora e dá graças a Deus de não estar no mesmo ambiente que os vocalistas ou senão nem saberia o que fazer. Ela termina de comer ainda pensando nas mensagens dos rapazes. Será que eles queriam dizer tudo o que disseram ou foi só o álcool falando por eles? %Li% não sabe o que pensar, não sabe o que sentir, não sabe como agir. Certamente, se ouvisse qualquer uma dessas declarações pessoalmente, ela os beijaria, perdendo totalmente o controle de si mesma e sabe-se lá o que aconteceria depois.

  Após tomar o último gole de café, %Li% coloca a xícara em cima do prato na mesa de centro e pega seu notebook, repousando-o em seu colo e recostando no sofá. Com ele já está ligado, ela abre o programa de edição de vídeo e começa a editar as filmagens que fez nessas duas semanas com a %Flow% para construir o documentário. A produção deles deu o prazo de um mês para a entrega, é tempo suficiente para que esteja concluído o trabalho e o documentário esteja nas mãos da produção da banda. O primeiro vídeo que ela edita é de um dos passeios que fizeram, logo na primeira semana, até o Pelourinho, onde %Kohshi% quase é assaltado. Muitos minutos se passam e os vídeos vão se acumulando na timeline do programa, o penúltimo que %Li% edita agora é o que ela gravou no aeroporto sem que ninguém percebesse.

  A filmagem é interrompida, na certa por ela mesma naquele momento. %Li% decide que obviamente esse vídeo não irá para o documentário, mas ela não o apaga de seu computador, o salvando em uma pasta em meio aos documentos. Outro vídeo chama a atenção dela, também tinha sido gravado no aeroporto, ela só não se recorda se antes ou depois desse com %Keigo%.

  Esse vídeo também foi interrompido e também não irá para a edição final do documentário. Ele é salvo juntamente com o outro na mesma pastinha no notebook da fotógrafa. %Li% finaliza a peneira nas mídias audiovisuais feita por sua câmera, já passa das 23h e, antes de dormir, ela resolve dar uma breve olhada nas fotos que tirou. Claro que são muitas, mas é apenas uma olhadinha. Ela vai passando uma a uma de maneira despretensiosa até que, em meio a elas, uma lhe chama a atenção. A foto é de %Kohshi%, no momento do show, ele em cima do palco olhando diretamente para a lente da câmera de %Li% com seus óculos escuros arriados na ponta de seu nariz e apontando o dedo indicador para a moça. Ela lembra-se desse momento, sentiu vontade de gritar nessa hora, mas teve que se controlar para não alarmar ninguém. A foto seguinte é tão saudosa quanto essa, na imagem há %Keigo% virado de costas para o público, de costas para %Li% e alisando sua coxa para ela. Só para ela. Logo após, %Li% se lembra de que ele a encarou sorrindo e pulou do palanque caminhando na direção oposta.

  Ela separa ambas as fotos e as move para a mesma pasta dos vídeos. Ter essas lembranças dos dois vocalistas que embalaram sua adolescência é bem especial para %Li%. A saudade que ela está de tê-los por perto a faz ficar entristecida agora, colocando o notebook de volta na mesinha e deitando-se no sofá. Com os olhos fechados, ela inevitavelmente pensa em todos os incríveis momentos que teve ao lado de %Kohshi% e %Keigo%. Claro que ela sente falta dos demais membros da banda também, mas os dois realmente a marcaram nessa visita. Uma marca nos lábios e no coração.

  Já dizia Calcinha Preta, em “Mágica”: “O amargo da saudade que tira o sono e não passa, não passa.” É isso que ela sente apertando seu peito agora.

  Saudade de ambos.

  Muita saudade.

  O dia de %Li% %Silveira% começa mais cedo que o normal. Nesse momento ela está cobrindo um grave acidente que ocorreu na Avenida Paralela, uma das principais ligações de Salvador, famosa por ligar o centro empresarial da cidade ao aeroporto. Ela estaciona sua moto no acostamento e prepara seu equipamento para tirar algumas fotos do ocorrido. Preservando as vítimas, ela faz cliques da população em volta, curiosa com o acidente, do trânsito que já está bastante complicado e do SAMU que atende aos feridos. Após tirar as fotos, %Li% guarda sua câmera, retorna para sua moto e segue rumo à sede da Rede Bahia.

  — Bom dia, Pedro! — diz a moça assim que para em frente ao portão principal, sua voz sai um pouco abafada por conta do capacete.

  — Bom dia, dona %Silveira% — responde o homem, em tom divertido. Pedro é o porteiro plantonista do horário. — Chegou cedo hoje, hein?!

  — Pois é, estava na Paralela, teve um acidente horrível lá — comenta ela, observando o portão se abrir o suficiente para passar com a moto e acelerando-a.

  — Alguma vítima fatal? — indaga o homem, curioso.

  — Ainda bem que não, mas tem um que foi levado para o HGE (Hospital Geral do Estado) — informa %Li% e segue até o estacionamento, parando a moto em uma das vagas específicas e retirando seu capacete. Ela caminha, com o capacete pendurado em seu braço, até a portaria onde Pedro está.

  — Espero que fique bem logo — afirma Pedro assim que %Li% se aproxima.

  — Também, viu? — comenta ela e completa: — Tem algo para mim aí? — pergunta referindo-se às encomendas e cartas para os funcionários que sempre deixam na portaria.

  — Tem — responde Pedro e dá a volta no balcão e pega um pacote, estendendo-o para %Li%. — Chegou ontem, mas você já tinha ido embora.

  — Obrigada, Pedro! — agradece ela. — Bom, deixa eu ir porque ainda tenho que passar as fotos para atualizar a matéria do acidente no site. Até mais tarde!

  Ela se despede e sai da portaria, caminhando até a recepção interna, onde agradece por já ter ar condicionado no ambiente, apesar de ser inverno, faz calor nessa manhã em Salvador. Antes mesmo dela chegar e cumprimentar a recepcionista chamada Silvana, %Li% é barrada por um berro que a faz virar-se para encarar sua fonte.

  — Léo? — a incredulidade está estampada na face de %Li% agora. — O que faz aqui? Como deixaram você entrar? — sem responder as perguntas dela, Léo marcha até a moça e a segura pelo pulso com força.

  — Você beijou aqueles cantorzinhos?!?! — brada ele com muita raiva e a sacode de forma violenta, fazendo o pacote que ela segura cair no chão e sua mochila pender de seu ombro esquerdo e escorregar para a junção de seu cotovelo.

  — Como sabe disso? Como entrou aqui?! Está me machucando! — reclama ela, tentando se livrar dele sem sucesso.

  — Responde se é verdade! — Léo continua a gritar.

  — Está me vigiando? Seu idiota, perseguidor! Me deixa em paz, Leonardo! — %Li% grita de volta. — Não te devo satisfações!

  — Não acredito que beijou eles... — diz em tom magoado e ignorando as falas dela.

  A confusão chama a atenção dos seguranças e outros funcionários que chegam à sede, dentre eles Lipe que vai logo acudir a amiga.

  — Solta ela, Léo! O que está fazendo aqui? — Lipe puxa o braço musculoso de Léo, sem sucesso.

  — Ah, isso dói, Leonardo! — reclama %Li% ao ser puxada com mais força por ele e em seguida ela é jogada no chão.

  — Sua traidora! Você não tinha esse direito de me trair! — brada o outro com raiva.

  — O que está havendo?! — indaga um dos seguranças que é seguido por mais cinco homens.

  — Ele invadiu a recepção e está agredindo a %Li% — informa Lipe já agachado ao lado de %Li% para ajudá-la a se levantar.

  Léo é contido pelos seguranças que o retiram dali, mesmo assim ele sai ainda ameaçando %Li% que apenas o encara com medo em seu olhar.

  — Você está bem? — diz Lipe, preocupado.

  — Estou — ela solta um suspiro cansado e se levanta por completo sentindo o braço doer. Na queda, ela cai por cima do braço onde está seu capacete pendurado e com isso machuca o cotovelo. — Só com um pouco de dor, mas já vai passar.

  — Vem, vou te levar na enfermaria.

  — Não precisa, Lipe, sério.

  — %Li%... — ele tenta convencê-la de tomar uma atitude definitiva. — Você precisa fazer algo...

  — Eu sei, Lipe — a moça interrompe a fala do amigo, já sabendo onde ele quer chegar. — Me acompanha até a delegacia? — pede ela com um nó na garganta.

  — Claro — concorda Lipe com um meio sorriso nos lábios.

  Léo e %Li% saem dali diretamente para a delegacia do bairro que não é longe dali. A moça dá queixa de Léo por agressão e perseguição, já que ele mesmo confessou saber de coisas que somente se ele estivesse na Groove, saberia. Além disso, %Li% revela aos policiais fatos passados que teve com o rapaz e, com isso, é aconselhada a solicitar uma pedida protetiva contra ele que logo é pedida pela moça. Após registrar o boletim de ocorrência, os dois amigos retornam à sede do jornal e iniciam seu trabalho.

  Já passa das 11h, Otto, diretor do Correio, soube do ocorrido com %Li% e resolve dar o dia de folga para ela. Com isso, ela pega sua moto e volta para seu apartamento.

  %Keigo% pega a toalha que havia separado antes de começar seu treino e a joga na cabeça, enxugando seus cabelos e rosto molhados de suor. É o primeiro exercício que faz desde que chegou ao país natal de volta da turnê no Brasil. Ele confere a hora no celular e pensa mil vezes antes de mandar uma mensagem para %Li%. Ele sabe que esse é o horário que normalmente ela chega do trabalho e que lá em Salvador já é noite. A vontade crescente de falar com ela o vence e ele manda uma mensagem tímida.

  Mensagem enviada.

  Não demora muito e %Li% responde:

  Segundos depois, ansioso, %Keigo% a responde:

  Questiona ele, seu coração acelerado por não saber se ela aceitaria o pedido. Porém, quando vê a positiva de %Li%, ele se anima e corre para o espelho para arrumar os cabelos de maneira que ele não pareça que acabou de acordar. O rapaz queria tomar um banho antes, mas prefere ligar assim mesmo, pois está doido para falar com ela.

  Logo, ele abre o aplicativo do Skype e liga para %Li%.

  — Oi, %Li%! Boa noite! — %Keigo% acena para a imagem de %Li% que sorri ao ver o rapaz.

  — Oi, %Keigo%! Boa noite... quer dizer, bom dia para você, né? — eles riem brevemente. — Estava malhando, né?

  — Sim! Acabei meu treino agora. Me desculpe por estar suado — diz ele e sente as bochechas avermelharem, coçando a nuca com a mão livre.

  — Tudo bem, %Keigo% — responde %Li%, ignorando a imagem que lhe passa na mente agora em pensar em %Keigo% com o corpo todo suado.

  — Estou atrapalhando você?

  — Oh, não! Não está, eu ia começar a editar, mas estou um pouco cansada — responde.

  — Quer descansar? Podemos nos falar depois...

  — Eu gosto de conversar com você, %Keigo%. Fique tranquilo — apressa-se a moça e %Keigo% não consegue evitar o sorriso genuíno que lhe toma a face.

  — Fico feliz em saber — as bochechas dele ficam mais vermelhas. — Bom, o dia amanheceu bastante bonito hoje, veja — ele vira a câmera do celular para a janela de seu apartamento para que %Li% possa ver o lindo céu que faz hoje. Quase sem nuvens.

  — Nossa, realmente é lindo! — admira-se a fotógrafa e logo em seguida tem uma surpresa. — Kurama!

  — O que houve? — curioso, %Keigo% volta a câmera para si e olha a imagem de %Li% segurando um gato da cor bege em seu colo. — Oh, um gatinho! — diz ele, sorrindo.

  — Não falei dele, né?

  — Não. Qual o nome dele?

  — Kurama — repete %Li%.

  — Por causa de Naruto? — indaga o rapaz, retoricamente, mas %Li% responde com um gesto de cabeça e ri. — Criativo!

  — Fã tem dessas doideiras — ambos riem dessa vez e %Keigo% concorda com um gesto de cabeça.

  — Verdade, né? — diz ele. — %Li%...

  — Diga, %Keigo% — ela olha novamente para a tela e retira Kurama de cima de si, concentrando-se no que %Keigo% irá falar.

  — Lembra das mensagens que te mandei quando estava no Rio de Janeiro? — %Li% sente o coração acelerar.

  — Lembro — responde ela e se ajeita no sofá, sentando-se com o corpo ereto. — O que tem elas?

  — Eu... bom, eu queria pedir desculpas. Eu estava muito... muito bêbado — ele abaixa o olhar, tímido e %Li% sente uma vontade imensa de ir até o %Japão% para abraçar ele.

  — Oh, não faz mal, %Keigo%. Não peça desculpas — diz ela e %Keigo% volta a encará-la.

  — Mesmo assim quero me desculpar — ele faz um gesto demorado com a cabeça, pedindo desculpas.

  — Está desculpado — informa %Li% e o rapaz ergue seu rosto com uma expressão agradecida e sorri.

  — Obrigado, %Li%, você é mesmo muito gentil — ele coça a testa, bagunçando um pouco os cabelos que estão grudados ali por ainda estarem molhados de suor. A imagem paralisa a fotógrafa do outro lado da linha. — De qualquer forma, eu não me arrependo tanto de ter dito o que eu disse, eu realmente sinto a sua falta.

  — Eu também sinto... — confessa ela e %Keigo% a encara com os olhos levemente marejados.

  — Bom, eu vou desligar, ok? — desconversa ele, sentindo que iria chorar caso continuasse a falar.

  — Oh, ok. Tudo bem — %Li% volta à realidade e espanta novamente os pensamentos impuros da mente.

  — Vou tomar banho, mais tarde teremos reunião lá na gravadora — informa ele.

  — Hmm, algo que possa me contar? — pergunta ela, curiosa e com um sorriso sapeca que logo é sacado por %Keigo%.

  — Quer informações privilegiadas, não é? — ele semicerra os olhos e ambos riem.

  — Claro! Sou amiga de vocês agora, não sou?

  — Claro que é!

  — Vantagens de ser amiga e fã! — ela diz, simplesmente.

  — Tem razão. Bom, iremos decidir nossas próximas músicas e, consequentemente, qual será o single do novo CD.

  — CD novo?! Ohhhh, por essa eu não esperava! Que feliz saber disso — comemora ela e %Keigo% sorri abertamente.

  — Fofa... — ele sussurra para si mesmo.

  — Hm?

  — Nada, nada — desconversa ele, sem jeito. — Bom, eu adorei conversar com você, %Li%. Sempre é muito agradável.

  — Digo o mesmo de você, %Keigo%. Se quiser, pode continuar me ligando — ela diz sorridente.

  — Posso mesmo? Olha que eu ligo, hein?!

  — Pode sim, %Keigo% — reafirma ela.

  — Então, ok! Ligarei sempre para você nesse mesmo horário porque sei que já está em casa — ele dá um sorrisinho fofo que quase derrete %Li%. — E, quem sabe, eu te convença a malhar comigo.

  — Malhar? Não prometo nada... — eles riem.

  — Não vou desistir disso — ele dá um sorriso convencido e %Li% se rende ao sorriso do rapaz.

  — Ok, %Keigo%. Bom, vou deixar você ir para não te atrasar.

  — Tchau, %Li% e tenha uma boa noite de sono. Descansa, ok? — pede ele.

  — Obrigada, %Keigo%! E você tenha um bom e produtivo dia — deseja a moça.

  — Até amanhã!

  Eles finalizam a ligação, ambos com o coração acelerado por falarem um com o outro. %Keigo% cobre seu rosto com ambas as mãos, o celular ainda em sua pose, e balança a cabeça envergonhado.

  — Meu Deus, eu estou apaixonado!

  Ele diz para si mesmo e senta-se no chão da sala de seu apartamento, recostando no sofá e pensando em %Li%.

  O apartamento de %Kohshi% não é tão grande, mas é o suficiente para abrigar um homem solteiro. Ele senta-se na poltrona e põe seu notebook no colo, abrindo o Skype em seguida. Minutos atrás ele mandou uma mensagem para %Li% perguntando se ela estava ocupada e a resposta foi negativa. Conversa vai, conversa vem, agora ele está ligando para ela por videochamada para conversarem melhor.

  — Boa noite, %Li%! Consegue me ver e me ouvir? — diz %Kohshi% assim que a moça atende a chamada.

  — Oi, %Kohshi%! Consigo sim! — responde %Li% ajeitando-se no sofá. Ela acaba de comer um prato cheio de cuscuz com leite.

  — Que bom! Também consigo te ver e te ouvir — afirma %Kohshi%. — Sempre bom falar com você.

  — Também adoro falar com você. Me diz, o que está fazendo? — indaga %Li%, curiosa em saber mais sobre a rotina dele.

  — Acabei de tomar banho — %Li% confirma a informação ao notar os cabelos de %Kohshi% molhados e bagunçados em sua cabeça. Imediatamente ele passa ambas as mãos nos cabelos, jogando-os para trás e alguns fios teimosos voltam a cobrir parte de sua testa. — E irei jogar um pouco antes da reunião mais tarde.

  — Hm, terá reunião da banda? — ela se faz de desentendida.

  — Sim! Vamos decidir o novo single do CD novo — diz %Kohshi% e %Li% abre a boca em um falso sinal de surpresa.

  — Que ótimo! Músicas novas! — eles riem um pouco.

  — O que faz para se distrair nas horas vagas? — ele pergunta, esporadicamente.

  — Fotógrafo — eles voltam a rir.

  — Achei que essa fosse a sua profissão — comenta %Kohshi% um pouco confuso.

  — Fotografar me acalma, ainda mais quando tenho uma paisagem como Salvador — explica %Li% e o vocalista concorda com um gesto de cabeça.

  — Tenho que concordar. Salvador é uma linda cidade — diz ele. — Assim como você é.

  — Ah, %Kohshi%... assim me deixa sem jeito — instintivamente ela joga uma mecha de cabelo para trás da orelha. — Bom, e você %Kohshi%, o que faz para se distrair? Canta? — desconversa ela.

  — E desenho — acrescenta ele, rindo.

  — Ah, me lembro de alguns desenhos seus. São incríveis!

  — Obrigado, %Li%! — agradece o rapaz. — Eu também jogo, né?

  — Que tipo de jogo você gosta?

  — Gosto de jogos de tiro, mas em geral, jogos apocalípticos são o meu fraco. O que eu mais gosto é Dead by Daylight, conhece?

  — Ouvi falar. É bom? — indaga ela fazendo uma expressão interessada.

  — Muito! Você joga alguma coisa?

  — Só petiscos para o meu gato — ambos riem da piada de %Li%.

  — Tem um gato? Como se chama?

  — Kurama — diz. — Espera um pouquinho — ela deixa o celular em cima da mesa de centro e sai da vista de %Kohshi%. Segundos depois ela reaparece e pega o celular novamente. — Olha ele aqui! — ela mostra o gatinho para %Kohshi%.

  — Oh, que fofo!

  — Sim! É siamês — diz ela.

  — Na verdade, ele é um falso siamês — a informação faz %Li% franzir o cenho.

  — Como assim?

  — O verdadeiro siamês tem a cabeça alongada em formato triangular e seus pelos são compactos. Sem contar o corpo que é longilíneo — após a explicação de %Kohshi%, a moça solta um som de entendimento. Logo, o rapaz completa: — Mas o Kurama é mais bonito o siamês original. Prefiro gatinhos assim — %Li% o encara e sorri.

  — Também prefiro — diz. — Obrigada pelo elogio, %Kohshi%.

  — Você merece todo elogio...

  — Hm? — ela ouve o que ele diz, mas resolve deixar passar e se fingir de desentendida novamente.

  — Nada... — ele sorri sem jeito.

  — %Kohshi%, eu preciso desligar agora, se importa?

  — Claro que não, não quero te atrapalhar.

  — Não atrapalha. Para compensar o pouco tempo, pode me ligar de novo amanhã e conversamos melhor. Que acha?

  — Acho perfeito!

  — Combinado, então!

  %Kohshi% e %Li% se despendem. Enquanto ela espanta os pensamentos sobre ele, tentando se concentrar na edição do documentário, %Kohshi% não consegue o mesmo nível de concentração, ficando preso na imagem dela sorrindo para ele há poucos segundos.

  Tais pensamentos são interrompidos momentaneamente por uma ligação de seu irmão.

  — Oi, %Take%... — diz ele ao atender.

  — Nossa, que felicidade logo cedo, irmão! — zomba %Take%, rindo.

  — O que quer, %Take%? — o mais velho ignora a provocação, suspirando cansado.

  — Está confirmada a reunião mais tarde, hein? Estou ligando para te lembrar.

  — Era isso? Eu já sei — responde %Kohshi% de forma levemente sem paciência.

  — Você está bem, cara?

  — Apenas cansado e... bom, deixa para lá.

  — Fala, cara. Sabe que eu te sacaneio, mas eu sou seu irmão e te amo — diz %Take% e %Kohshi% arqueia a sobrancelha aguardando por alguma piadinha que vem em sequência. — Mas não quando você me nega comida! Aí já é o cúmulo!

  — Sabia! — ambos riem. — Ah, cara, eu não sei, acho que estou sentindo algo que é loucura imaginar — introduz %Kohshi%.

  — Como assim?

  — Acho que estou apaixonado — confessa ele e %Take% dá um grito do outro lado da linha.

  — Por quem? Eu conheço?! — dispara o outro, ansioso.

  — Conhece.

  — Conheço??? Fala quem é!

  — Não conte para ninguém, está ouvindo? — exige %Kohshi%.

  — Não vou contar, %Kohshi%! Quem acha que sou? Um fofoqueiro? — indigna-se o mais novo e ambos riem brevemente.

  — A %Li%.

  — MENTIRA?! — berra %Take%, eufórico.

  — Não grite!

  — Desculpa! — diz %Take% e ri em seguida. — Pela %Li%? Como foi isso?

  — Nos beijamos — confessa %Kohshi% e %Take% dá outro grito de euforia.

  — Quando foi isso que eu não vi!?

  — Quando fomos naquele bar no último dia, lá perto do hotel.

  — Ahhh, meu Deus e você nem me contou!

  — Estou contando agora — %Kohshi% dá de ombros.

  — Conte-me tudo logo!

  %Kohshi% ri balançando a cabeça e conta tudo o que aconteceu entre ele e %Li% em Salvador, fazendo o irmão voltar a prometer que não contaria a ninguém. De tudo, %Kohshi% só tem a certeza de uma coisa.

  — Realmente, eu estou apaixonado.