Drácus Dementer


Escrita porHels
Revisada por Natashia Kitamura


Capítulo 40

Tempo estimado de leitura: 12 minutos

  Eu nem consigo acreditar que seis meses se passaram desde que me juntei à igreja. Seis longos meses treinando e estudando sobre vampiros. Compreendendo agora como essas criaturas não deveriam existir.
  Eles nos matam para sobreviver, e bebem nosso sangue como se fosse vinho, apenas para que continuem jovens eternamente. Isso não parece certo para mim, não parece mesmo.
  Tudo pelo que tive que passar, eu não poderia culpar ninguém a não ser essas criaturas, afinal, os Van Helsing só existem por conta dos vampiros. Talvez, se Vlad III não tivesse sido alguém tão ruim, eu poderia ser uma humana comum, ou nem existisse, o que também não me parece uma opção ruim.
  Padre Abel clareou a minha mente para os conhecimentos divinos, me colocou e me direcionou no caminho certo, o caminho da humanidade, aquela para qual tenho um dever até o meu último suspiro nessa terra.
  Fazendo parte dos Filhos Da Sombra, dentro de uma equipe, uma nova família, eu também pude acompanhar todo sofrimento que cada uma das três garotas que dividiam seu tempo comigo, passavam; em como um vampiro pode destruir uma vida toda, forçando simples humanos a carregarem um enorme fardo, lembranças amargas que os fazem tomar decisões que mudaram suas vidas para sempre.
  O Vaticano havia acabado de emitir uma informação importante e secreta, os que trabalham lá haviam descoberto quando seria a próxima lua de sangue. Parece que se já tinham algumas hipóteses em relação à data, mas era preciso confirmar antes. Há cada seiscentos anos, uma nova lua de sangue pinta o céu da noite, e essa era a chance única de um novo Drácula, líder dos Drácus Dementers e dos poucos vampiros comuns, renascer através de uma nova criatura.
  Por este importante motivo, Upiór, o local que abriga os oito filhos do último Drácula, Herny III Dracul, era o grande alvo da vez. E o Vaticano não era o único que estava de olho no pequeno vilarejo afastado, todos os Drácus Dementers estavam também. Já nos foi avisado que na lua de sangue, era provável que uma grande quantidade dessas criaturas se acumule aqui em Upiór; Drácus Dementers e vampiros vindos de todos os lugares.
  Sendo todos Drácus Dementers, quando um dos filhos de Henry assumir seu lugar, o seu poder será ainda maior, e ele terá uma grande fome e precisará se alimentar para suprir seu novo corpo, e Upiór se tornaria seu cardápio. Por isso, Filhos Da Sombra de todos os lugares do mundo estavam vindo aos montes para esse vilarejo, para nos ajudar na grande noite.
  Há uma semana, Padre Abel montou pequenos grupos na igreja, pedindo que todos eles - minha equipe e eu estávamos incluídas - distribuíssem cartazes por Upiór, sobre um falso aviso de que uma infestação de lobos estava rondando o vilarejo, e que seriam eles os culpados pelos recentes sumiços dos jovens de Upiór, como Caleb e Lydia.
  A mãe de Caleb, uma mulher que tinha o conhecimento sobre as criaturas, mas que na época fingiu para mim que não sabia de nada, também estava ajudando na evacuação de Upiór, pois o nosso intuito era tirar o máximo de pessoas possíveis desse lugar, antes da lua de sangue.
  Ainda existiam aqueles que se negavam a deixar Upiór, com a desculpa de que não tinham medo de alguns lobos selvagens, e era exatamente por conta dessas pessoas que ainda estávamos espalhando cartazes pelo vilarejo. E, também, era por conta dessas pessoas que Padre Abel precisou de alguns voluntários que, em sua grande maioria, eram Filhos Da Sombra aposentados, para ajudar. Eles ficariam encarregados de vigiarem os moradores teimosos durante a lua de sangue, para evitar que eles fossem mortos.
  Minha mãe e Wendy estavam completando uma dessas equipes, ambas disseram que não poderiam ficar longe de Upiór em uma noite onde eu arriscaria minha vida para ajudar os humanos. Eu sentia a preocupação delas apenas nas trocas de olhares que tínhamos, mas como minha mãe mesma disse há seis meses, ela respeitaria minha decisão, e como minha decisão foi essa, ela queria estar por perto. Eu até que tentei mandar, ao menos, Wendy para casa, mas sendo a Wendy que ela é, não tive sucesso algum. De qualquer forma, eu estava um pouco mais tranquila, sabendo que havia muitas equipes treinadas aqui no vilarejo, e sei que os que ficarem cuidariam muito bem dos outros.
  – Pronto, podemos ir para o próximo lugar. – Meg diz, depois de colar um cartaz nas tábuas de madeira que interditavam a antiga loja de Caleb.
  As três garotas que estavam comigo, seguem pela direção contrária da loja, se afastando. Fico alguns segundos parada no mesmo lugar, segurando um bocado de cartazes, enquanto encaro a loja. Esse lugar foi essencial para que eu começasse a descobrir a verdade, mas também foi um marco de uma grande ruína. Vim descobrir algum tempo depois que o pai de Caleb, o fundador desta loja, foi alguém que tinha conhecimento sobre vampiros e que, com o intuito de ajudar os moradores de Upiór, passou a vender alguns itens místicos que contavam a história do vilarejo; e mesmo que grande parte dos moradores achasse isso besteira, contando que eles comprassem, já estariam se protegendo sem saber. Os pais de Caleb nunca contaram, de fato, para ele, sobre a história dos vampiros, mas após a morte do pai, Caleb decidiu continuar com a loja para manter a memória de seu pai viva, mesmo que no fundo ele não acreditasse nos itens místicos também.
  – Elena, vamos! – Lilu grita, e se eu não estivesse tão acostumada com seu jeito, eu teria me assustado.
  Suspiro e me afasto da loja, indo em direção às garotas que me esperaram mais à frente.
  Nós seguimos por Upiór colando cartazes e os distribuindo em todo lugar e para cada pessoa, até mesmo batemos de porta em porta relembrando do perigo dos "lobos selvagens".
  Entendo o motivo da igreja não revelar de uma vez a existência de Drácus Dementers, isso poderia gerar uma grande crise, mas, ainda sim, era estranho sair por aí falando que pessoas como Caleb e Lydia, foram mortos por lobos do mato. Era estranho porque eu sabia a verdade, sei melhor do que ninguém como é estar do outro lado, aquele que permanece no escuro sem saber de nada.
  Tanta coisa aconteceu nesses últimos meses, e acho que mudei bastante, ganhei uma nova percepção das coisas, e se antes eu achava que conseguia enxergar as situações passadas de um novo ângulo, hoje eu tinha isso muito bem claro na minha cabeça. Lydia, por exemplo, foi alguém que além de ter servido como um bom vinho para os filhos de Henry, também foi usada para me vigiar, assim como Wendy. Suas enormes encomendas na loja não passavam de um plano dos vampiros para tirar todas as ervas da loja Van Helsing de cena, e sabendo que ainda haviam algumas reservas, eles usaram minha irmã para queimar o que faltava. E quando Lydia não tinha mais utilidade, ela foi descartada, como na vez em que tivemos aquele estranho encontro na floresta, aquilo foi um sinal claro dos filhos de Henry brincando comigo, tentando me fazer ver atrás das cortinas. Se nós duas ficamos vivas depois daquela queda dolorosa, foi porque eles permitiram, me deram o empurrão final para que eu começasse a me mexer em busca da verdade que ninguém nunca me contou.
  Eu até poderia me sentir um pouco idiota por ter demorando tanto para começar a ir atrás da verdade, mas agora entendo que não era tão simples. Eu passei a minha vida toda com a minha família colocando ideias na minha cabeça de que tudo isso era uma grande besteira, que vampiros não existiam. Foi uma forte ideologia que deveria se instalar até a minha morte, mas os filhos de Henry, aqueles irmãos, estavam dispostos a quebrar essa ideologia que carreguei por quase dezenove anos.
  Durantes esses últimos meses, também pude perceber a real utilidade de Blarie e Amia em toda essa grande bagunça. Depois que Padre Abel me explicou sobre os filhos de Drácula estarem condenados a roubarem almas no lugar onde o Drácula morreu, sei que Blarie e Amia eram como uma ponte. Quando os conheci, Amia estava viajando, então tudo fez sentido, pois se eles estão "presos" a Upiór, alguém precisa ser essa ligação entre os irmãos e o resto da sua espécie. E mesmo com as inúmeras saídas dos irmãos, sei que eles precisam se manter em um tempo maior nesse vilarejo, logo, Blarie e Amia desempenham esse papel de ponte entre eles e o restante.
  Por mais desprezíveis que sejam, essas criaturas estão longe de serem burras. Os seus passos parecem sempre mais longos que os nossos. Eles são perigosamente ardilosos.
  – Você não precisa entrar se não quiser. – Meg toca meu ombro, quando chegamos na loja da minha avó. Essa seria nossa última parada hoje.
  Seis meses se passaram e eu não posso carregar para o resto da vida o pesar de ser destruída pela minha avó.
  Depois do que ela fez, Padre Abel achou melhor que ela se aposentasse, levando com ela Sebastian, seu último parceiro vivo de equipe. Minha equipe está no lugar da sua agora, não devo mais nada a essa mulher amarga que, até hoje, pensa ter feito aquele grande show para me proteger.
  – Tudo bem. – Assinto para Meg, enquanto as três garotas me encaram com atenção.
  Elas sabem sobre tudo, não há segredos entres os Filhos Da Sombra.
  Meg sorri, sem mostrar os dentes, de uma maneira compreensiva que, ao mesmo tempo, me encorajava.
  As garotas tomam a frente e entram antes de mim. Atrás, os meus passos são mais lentos, porque preciso de algum tempo para observar cada detalhe desse lugar que não vejo há seis meses. Mesmo fazendo tento um tempo que não coloco os meus pés aqui, ainda posso sentir todos os momentos que passei nesse lugar, que não mudou absolutamente nada.
  Hoje sei que essa loja existe pelo mesmo motivo que a loja de Caleb existia, para proteger os moradores. Talvez a minha avó já não estivesse dando conta e deixou muitas coisas passarem, enquanto tomou más decisões, como vender tanta erva para Lydia. Penso que esse foi seu bilhete para o declínio. Por mais que um Van Helsing tenha uma longa vida, a velhice chega para todos.
  Vejo sua figura carrancuda parada atrás do balcão amarelo, não havia mais motivos para ser uma boa mulher na minha frente, eu já sabia a verdade e podia enxergar tudo.
  Suas cores eram escuras, assim como as da loja, que um dia pareciam vibrantes e quentes. O interior era frio como uma caverna, mas eu entendia o motivo disso.
  – Trouxemos mais alguns cartazes pra você colocar na loja, ordens do Padre. – Meg - que mais parecia a líder da equipe do que eu - tenta ser amigável, colocando sobre o balcão sua pequena pilha de cartazes, seguida por Sally, que faz o mesmo.
  Paro ao lado de Lilu, que estava a dois passos atrás de Meg e Sally.
  Os olhos de minha avó nem se permitem observar os cartazes, eles encaram diretamente a mim, e se ela pudesse soltar fogo por eles, eu estaria morta agora.
  – É bom que ajude mesmo, já que foi você que os trouxe até o vilarejo. – Minha avó diz, de forma áspera.
  – Pensei que os vampiros já estavam atacando antes dela vir pra Upiór. Se não em engano, essa era a sua tarefa, investigar e impedir que coisas como essas acontecessem. – Sally diz, enquanto inclina, levemente, a cabeça para o lado.
  O rosto de minha avó fica vermelho, e parecia que sua cabeça poderia explodir em fumaça, como nos desenhos animados.
  – Antes dela chegar, eles não atacavam dentro do vilarejo, só as margens. – Ela quase grita, transbordando fúria.
  Lilu se afasta de mim, dando dois passos para frente e, logo depois, ela bate sua mão - que segurava um cartaz – contra o balcão amarelo, fazendo Meg saltar ao seu lado.
  – É melhor pendurar isso aqui na sua loja, se não quiser que nada de ruim te aconteça, vovó. – Lilu diz, calmamente.
  Os olhos de minha avó se estreitam, enquanto seu rosto fica cada vez mais vermelho.
  – Está me ameaçando, garota? – Ela range os dentes.
  – Não estou te ameaçando, mas existem criaturas perigosas rondando por aí. – Lilu afasta sua mão do balcão amarelo, e se vira, caminhando para fora da loja.
  Meg e Sally a seguem.
  Olho uma última vez para minha avó, antes de me virar e ir com as garotas.
  – É melhor que você mate aqueles malditos sugadores de sangue rápido, porque eu vou tacar fogo naquela mansão outra vez, e se você estiver lá dentro, vai queimar com eles. – Suas palavras de fúria me fazem parar rente à porta da loja, mas escolho ficar em silêncio e sair sem olhar para trás.
  Minha equipe e eu voltamos para a igreja, precisávamos recepcionar a chegada das demais equipes que ainda viriam, pois a lua de sangue estava se aproximando como um silencioso morcego voando na noite, pronto para atacar.

Capítulo 40
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