Drácus Dementer


Escrita porHels
Revisada por Natashia Kitamura


Capítulo 33

Tempo estimado de leitura: 9 minutos

  Respiro fundo e abro os olhos, encarando o teto claro e limpo. Empurro a coberta que me cobria, e sinto algo enrolado em minha mão esquerda. Levanto levemente o tronco e vejo uma atadura manchada de sangue, enrolada ao redor da palma da minha mão.
  Apoio os cotovelos sobre o colchão, ainda encarando minha mão enfaixada. Tento fazer alguns movimentos de abrir e fechar, mas era um pouco dolorido, impossibilitando uma rápida mobilidade da minha mão esquerda.
  – Eu suturei o seu machucado com algumas coisas que encontrei em um dos kits de primeiros socorros.
  Ergo meu olhar para frente, vendo Wendy parada na entrada do quarto. Ela segurava as próprias mãos e tinha os ombros encolhidos, enquanto me observava com preocupação.
  Os seus olhos estavam bem avermelhados e eu podia enxergar as olheiras e as pequenas veias vermelhas que indicavam uma noite de sono mal dormida. A cor do seu rosto também parecia ter sumido, ela estava pálida como uma doente.
  – Sei que não deveria me arriscar em uma coisa tão delicada. Mas o seu machucado estava bem feio, e eu não conheço nenhum médico aqui em Upiór, acho que nem tem. – Wendy se explica com a voz baixa, mexendo nos próprios dedos de forma nervosa. – Também coloquei um pouco daquela pasta de Erva-Laranja pra ser de diminuía a sua dor.
  Me sento sobre a cama e depois coloco os pés para fora do colchão para me levantar. Sinto algo nos meus pés, e quando olho para baixo, vejo mais ataduras. Os meus pés não doíam, mas era um pouco incômodo a textura das ataduras contra a sola deles.
  Estranhamente, sinto uma sensação de calor, como se o dia do lado de fora estivesse quente. Então, caminho até à janela do quarto e afasto a cortina para o lado, vendo apenas a rigorosa neblina que escondia a rua e as casas do vilarejo.
  Escuto os passos de Wendy se aproximarem, onde, depois, sinto sua mão encostar em um dos meus braços.
  – Elena… deveríamos ligar pra vovó. Eu sei que ela vai voltar hoje, mas esse seu machucado está muito feio, e também... – Uma estranha sensação correr por todo meu corpo, dos pés à cabeça, e antes que eu pudesse raciocinar direito, meu corpo se vira em um movimento apressado, para que depois, eu conseguisse agarrar em um dos pulsos de Wendy, a puxando com força e a prendendo entre o meu corpo e a janela, impedindo-a de terminar sua fala.
  – Nem pense em ligar pra ela. Você entendeu? – Minhas palavras saem um pouco ásperas demais, o que assusta Wendy, fazendo seus olhos começaram a marejar.
  Espantada com minha própria atitude, solto o pulso de minha irmã e me afasto dela.
  – Wendy... eu... eu... me desculpe. Eu não queria fazer isso. – Um pouco exasperada, passo as mãos por meus cabelos emaranhados.
  – Está tudo bem. – Minha irmã funga, e depois limpa o nariz com as costas de uma das mãos.
  Seu pulso ficou um pouco vermelho e manchado pelo sangue da minha atadura.
  Sem hesitar, com os olhos ainda marejados, Wendy volta a se aproximar de mim com seus pés descalços.
  – Você precisa ver isso. – Wendy pisca os olhos, repetidas vezes, afastando as lágrimas que ameaçavam sair.
  Cuidadosamente, ela segura em minha mão machucada e me leva até o banheiro de nosso quarto; e pelos ombros, ela me coloca de costas para o espelho.
  – Tira sua blusa. – De frente para mim, ela pede.
  Encarando seus olhos nervosos, sinto como se um pressentimento ruim me abraçasse, enquanto a sensação de calor de antes, se perpetuava por todo o meu corpo.
  Mesmo com todas essas impressões, começo a desabotoar os botões do pijama que estava usando. Lentamente, deslizo o tecido fino de cor rosa-claro e branco, pelos ombros, até sentir meu tronco completamente despido de qualquer peça de roupa.
  – Agora olhe no espelho. – Wendy aponta para objeto de vidro atrás de mim, e esse simples gesto, faz com que eu seja atingida outra vez pelo pressentimento ruim.
  Minha irmã sustentava seu olhar contra o meu, e eu podia enxergar todo o seu assombro. Sua laringe se movimentava algumas vezes, devido ao seu nervosismo que a fazia engolir em seco.
  Com uma última troca de olhares, viro minha cabeça e olho sobre os ombros, vendo refletido no espelho, muitos traços escuros desenhados nas minhas costas.
  Eu reconhecia a estaca em formato de cruz, e reconhecia o morcego.
  Marcado na minha pele, em todos os cantos das minhas costas, estava a mesma tatuagem que minha mãe e vovó tinham.
  – Depois de trazer você da cozinha pro quarto, tentei te dar um banho para tirar todo o sangue dos seus machucados... – Vendo Wendy através do espelho, ela engole em seco de novo. – Quando a água caiu nas suas costas, ela levou embora todo o sangue, e debaixo dele tinha isso. Sem machucados, sem cortes, só isso.
  Viro minha cabeça de volta em direção a minha irmã, não conseguindo acreditar em tudo que estava escutando.
  Eu estava assustada.

***

  Provavelmente, perdi a manhã inteira encarando aquela suposta “tatuagem” nas minhas costas; não parecia para ver as horas.
  Não pode ser uma simples coincidência que minha mãe, vovó e agora eu, tenhamos essa mesma tatuagem nas costas. Sei que elas estão escondendo alguma coisa.
  – Isso não parece certo, Elena. – Wendy diz ao meu lado, enquanto me olha incerta.
  Nós duas estávamos paradas em frente à porta do quarto de vovó.
  – Você entende o que está acontecendo, Wendy? – Pergunto, virando minha cabeça para o lado para olhá-la melhor.
  – Não. – Ela cruza os braços em sua blusa de frio em tom de vermelho-escuro.
  – É justamente por isso.
  Wendy franze o cenho, assumindo uma expressão um pouco assustada.
  – Mas o que vamos procurar aí dentro? – Ela aponta com a cabeça para a porta fechada.
  – Não sei, qualquer coisa que explique tudo que está acontecendo com a gente.
  Wendy permanece com a mesma expressão, sempre olhando para os lados como se temesse que vovó chegasse a qualquer momento, o que era uma besteira, pois ela avisou que só chegaria de noite.
  – Por que você não procura no sótão e deixa o quarto comigo? – Sugiro, para ver se um pouco do seu nervosismo ia embora.
  Ela assente.
  Outra vez encaro a porta de madeira, percebendo como a cor dela parecia mais escura. Na verdade, tudo parecia mais escuro, as cores eram mais apagadas, como se acompanhassem o dia nublado do lado de fora da casa.
  – O que foi? – Wendy pergunta, quando coço os dois olhos de uma vez.
  – Não é nada. Vai logo olhar o sótão. – Paro de coçar os olhos.
  Sem dizer nada, Wendy se afasta de mim e vai em direção à porta que levava para o sótão.
  Seguro na maçaneta da porta e a giro, empurrando-a para dentro. O quarto estava extremamente escuro, e me apresso ao procurar pelo interruptor, mas mesmo depois de ligar a luz, o quarto ainda era escuro, dificultando que eu enxergasse como deveria.
  Saio do quarto por um momento, e olho para o corredor mais iluminado, mas essa sensação de ter um filtro nos meus olhos, que deixava tudo em cores mais escuras, não sumia.
  Coço os olhos de novo, e quando volto a abri-los, tudo continua melancólico como antes.
  Suspiro e volto a entrar no ambiente escuro, tentando ignorar isso.
  De volta ao quarto organizado de vovó, começo a fazer o que vim fazer, e vou até sua cama e olho debaixo dela, mas não havia nada. Também checo debaixo do colchão, e sem sucesso.
  O próximo lugar que procuro, são as gavetas das duas pequenas cômodas que haviam no quarto, mas não encontrei nada demais nelas.
  Até debaixo do tapete redondo, eu olhei.
  Sem desistir, vou em direção ao guarda-roupas de vovó, onde abro a porta de madeira, que me revela alguns vestidos e camisas ajeitados em cabides. Primeiro, olho dentro dos bolsos de algumas das peças de roupas, e depois as empurro para o lado, procurando pelo chão e fundo do guarda-roupas. Afasto todos os sapatos, e não encontro nada além de algumas fotos antigas.
  Quando já estava pronta para desistir e ir checar a outra parte do guarda-roupas, toco na parede do fundo e escuto um barulho mais agudo, algo oco.
  Bato algumas vezes no lugar e ao redor dele, me cerificando que apenas aquele pedaço fazia um barulho diferente.
  Espalmo as duas mãos sobre a parede, e começo a empurrar para cima e para baixo, vendo um pedaço do fundo se desprender dos demais. Puxo o falso tampão para longe da parede, arregalando os olhos em surpresa, ao ver um baú de tamanho médio escondido em um buraco na parede.
  Com cuidado, retiro o baú do buraco e o coloco no chão, na minha frente. Ele estava empoeirado e parecia ser bem velho. Para a minha sorte, ele não estava trancado, então não perco tempo e o abro, vendo que seu interior era aveludado, mantendo os dois pequenos livros, em bom estado.
  Pego primeiro, o livro que estava por cima, ele tinha a capa preta, assim como o outro livro. Começo a folheá-lo, mas preciso piscar os olhos algumas vezes e, até mesmo, coçar de novo, porque o amarelo das folhas e o preto da escrita, pareciam escuros demais para que eu enxergasse.
  Me afasto do guarda-roupas e vou para debaixo da lâmpada do quarto, na esperança de que isso me ajude.
  Fecho os olhos com força por alguns segundos, e quando os abro, aproximo bem o livro do meu rosto e, para minha infelicidade, tudo parecia ser escrito em outra língua que eu não faço a menor ideia de qual seja.
  Pego o segundo livro e verifico suas folhas, percebendo que ele também era escrito na mesma língua que o primeiro livro.
  Suspiro, um pouco decepcionada, mas continuo folheando os livros, tentando entender, pelo menos, as figuras que pareciam ter sido desenhadas a mão.
  Olho de todos os ângulos e viro o livro em todas as direções, mas eu realmente não conseguia entender o que era isso; alguma coisa inteiramente preta, que parecia usar um manto ou lençol que cobria todo seu corpo, acho que a figura também estava flutuando no ar, não sei, ao certo, nunca vi antes. As suas mãos eram as únicas coisas que se diferenciavam do resto, saindo debaixo do que o cobria, sendo finas e com dedos bem longos.
  – Dementer. – Leio em voz alta a escrita acima da figura.
  Essa palavra fazia parte do título do livro vermelho e dourado, que fica na loja do Caleb, eu me lembro; Drácus Dementer.
  O que diabos era isso?

Capítulo 33
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