Drácus Dementer: Lycanthrope


Escrita porHels
Revisada por Natashia Kitamura


Capítulo 4

Tempo estimado de leitura: 28 minutos

  Do lado de dentro do banheiro, posso sentir a presença que sei que está no meu quarto. Preparada, pego a faca de caça que estava presa na parte detrás do cós das minhas calças pretas e, em seguida, seguro na maçaneta da porta, girando-a com cuidado enquanto empurro a porta com cautela. Não sei a quantos minutos estou no banheiro me arrumando para mais um dia nesse lugar, mas, a pelo menos uns três minutos, eu conseguia sentir a presença que invadiu.
  Seguro com força a faca e abro a porta de uma vez, expirando alto e forte ao encontrar o garotinho de cabelos escuros, sentado sobre a minha cama enquanto balança seus pés cobertos por sapatos lustrosos.
  – Você me assustou. – Falo, e coloco a faca de volta ao cós das calças. – Você não deveria entrar assim, Hyun.
  Caminho até o outro lado da cama, onde eu havia deixado o meu celular. Depois, coloco a mão por cima do bolso traseiro, sentindo o papel dobrado que guardei ali.
  – Eu queria te ver. – Ele me encara com seus grandes olhos escuros, piscando lentamente em seus longos cílios.
  Suspiro, sabendo que mesmo sendo uma criança, Hyun também me causava uma sensação um pouco estranha agora, afinal, ele também é um vampiro e, com certeza, tem mais idade do que aparenta. É um fato que eu preciso me concentrar nesta missão, mesmo com um pé atrás por essas criaturas, e a única maneira de fazer isso funcionar, vai ser fazendo com eles o mesmo que me fizeram. Pode até soar como maldade da minha parte, mas penso que esse garotinho sentado na minha cama, usando shorts pretos e uma blusa branca e meias que iam até os joelhos, poderá me ajudar muito. Talvez ele possa me contar alguma coisa que os outros nunca falariam.
  Antes mesmo que eu pudesse colocar meu pequeno plano em prática, escuto leves batidas na porta do quarto, seguido pela entrada de Jin, que mesmo após quatro anos, continuava impecável como sempre, talvez seu cabelo escuro tenha crescido um pouco, e isso parecia ser a única diferença.
  – Hyun, vá brincar um pouco. Eu preciso falar com a Elena.
  – Mas eu cheguei primeiro. – Hyun cruza os braços, com uma feição emburrada.
  Jin o encara sério.
  – Você pode ficar com ela depois, vai ter muito tempo para isso. Agora, dê o fora. – Jin enfatiza sua fala, e faz Hyun saltar da cama, irritado, enquanto caminha até à porta e a bate com força.
  Jin nega com a cabeça, antes de se aproximar de mim.
  – Crianças, você sabe como elas são. – Jin ri. – A propósito, seja bem-vinda à nossa casa.
  – Obrigada. – Respondo, um pouco tensa por estar sozinha com ele.
  De qualquer forma, a faca de caça estava nas minhas calças e estou pronta para usá-la se for preciso.
  – Me desculpe por não poder recebê-la quando chegou. Estive um pouco ocupado, mas agora, gostaria de ter uma rápida conversa com você. – Ele cruza os braços em suas roupas elegantes.
  Assinto.
  – Estou ouvindo.
  Jin me encara por alguns segundos, antes de falar:
  – Preciso confessar que sabia do seu caso com o Taehyung no passado. Mas não pensei que iria tão longe assim. Na verdade, fiquei bem surpreso quando descobri que ele te enviou um dos anéis. – Ele faz uma pequena pausa, e me encara por mais alguns segundos. – Vamos ser sinceros aqui, da última vez, você e a igreja estavam tentando nos matar. Então, eu não sei o que você pretende com isso, aceitando o pedido do Taehyung.
  Meu corpo fica ainda mais tenso, mas tento não demonstrar.
  – Não é nada pessoal, nós gostamos de você por aqui, isso é verdade. Mas o Taehyung é o Drácula agora, ele não deveria estar noivo de uma humana e muito menos uma que é um Van Helsing. – Jin descruza os braços e se vira para sair, me encarando uma última vez sobre os ombros. – Eu estarei de olho em você, Elena. Não se esqueça.
  Essas são suas palavras finais, antes que ele saia do quarto.
  Suspiro alto e depois mordo o cantor de dentro da minha bochecha.
  As coisas precisam ser feitas com mais rapidez, nós não teremos outra chance depois disso.
  Como combinado por mensagem mais cedo, saio do meu quarto e vou até o quarto da Wendy, encontrando as garotas lá, todas sentadas na cama.
  – Já ia te chamar. – Wendy diz assim que entro no quarto.
  – Tive um pequeno atraso. – Respondo enquanto fecho a porta.
  – Que tipo de atraso? – Sally me olha desconfiada.
  – Do tipo que nos avisa que precisamos ser rápidas. – Caminho até à cama e me sento do lado da Wendy, ficando de frente para Lilu e Sally.
  Elas me olham um pouco confusas e atentas.
  – O que vocês descobriram ontem? – Pergunto, e Sally suspira.
  – Praticamente nada, esse lugar é enorme. – Sally responde.
  – É um castelo, né. – Lilu fala, e Sally a encara séria. – Mas eu encontrei um lugar estranho.
  – Que lugar? – Pergunto.
  – Fui descendo até encontrar o porão, mas não achei um porão. Era um lugar estranho, como se fosse usado para rituais. Tinha um desenho no chão, velas, estátuas e umas coisas assim.
  Franzo o cenho, imaginando o que poderia ser.
  – Eu quero ver isso depois. – Falo e Lilu assente.
  – Mais cedo o Padre me mandou uma mensagem avisando que as nossas coisas já chegaram. Isso é bom. Nós precisamos das nossas armas. – Wendy diz.
  – Vamos nos dividir em duplas. Se vamos trazer nossas armas, então é melhor que busquem elas pessoalmente para nada dar errado. Enquanto isso, as outras duas ficam aqui e continuam vasculhando o castelo. – Digo e todas assentem.
  – Acho que seria bom que você ficasse. Com certeza vai ser muito mais fácil pra vocês descobrir alguma coisa. – Wendy me encara.
  – Certo. Então a Lilu fica comigo e vocês duas vão encontrar o Padre. – Ainda sentada, enfio a mão dentro do bolso e puxo o papel dobrado. – Quero que mostrem isso pra ele também. Achei na sacada do meu quarto ontem de noite. – Desdobro o papel e coloco no meio do nosso estranho círculo sobre a cama.
  – Lycanthropia? Isso não é sobre lobos? – Sally me encara séria e de sobrancelhas franzidas.
  Assinto.
  – Foi exatamente o que eu pensei.
  – Nós não sabemos tanto assim sobre lobos. – Sally diz preocupada.
  – E quem deixou isso na sua sacada? – Wendy me encara confusa.
  – Eu não sei. Escutei alguém batendo na porta, depois segui uma sombra que tinha os olhos amarelos e só encontrei o Taehyung. Mas eu tenho certeza que os olhos que vi, não eram os dele.
  – Quer dizer que tem um lobo no castelo do Drácula? – Lilu arregala os olhos.
  – É por isso que vocês precisam mostrar isso pro Padre.
  – Você vai contar alguma coisa, você sabe... pra eles? – Wendy me olha apreensiva.
  – Não. Não vou contar nada. Nós vamos descobrir o que é isso e vamos continuar com a nossa missão.
  – Certo. Acho que já podemos ir então, as coisas estão loucas. – Sally se vira para Wendy, que assente.
  Após nossa pequena reunião, Wendy e Sally saem do castelo e vão atrás do Padre. Lilu e eu ficamos para trás, tentando pensar sobre tudo que deveríamos fazer hoje. E acabamos no meu quarto, conversando sobre os lugares dos quais poderíamos esconder as armas que Wendy e Lilu trariam. E não tendo muitas opções além do guarda-roupa ou debaixo do colchão (parecendo seres os lugares mais “seguramente escondidos”), acabei sendo vencida pelas reclamações de Lilu sobre estar com fome.
  De frente para a porta do quarto, assim que abro, tenho minha primeira surpresa do dia ao encontrar Blarie parada do outro lado, com uma expressão incerta e talvez um pouco envergonhada.
  Fico parada no mesmo lugar, com Lilu atrás de mim. Encaro a garota de cabelos púrpura, esperando que ela fale alguma coisa.
  – Err... bem... eu já estou aqui a alguns segundos, estava tomando coragem para bater na porta. – Blarie segura suas mãos na frente do corpo e sorri um pouco tímida, algo bem diferente do que me lembro. – Pensei em te chamar pra um passeio no castelo, eu posso te mostrar um pouco do lugar.
  Eu ainda me sentia sem jeito em rever todos esses vampiros que fizeram parte da minha vida no passado, mas não acho que isso seja algo apenas meu, já que Blarie não parece tão confortável com isso agora. Desde que a vi, ela não soltou nenhuma das suas piadas de duplo sentido, mostrando como o clima entre todos nós mudou depois de quatro longos anos.
  – Nós adoraríamos. – Lilu me abraça pelos ombros e responde Blarie, que assente.
  – Acho que podemos fazer isso depois do café. Estarei esperando vocês lá embaixo. – Blarie sorri de uma maneira animada, mas contida. Ela parecia verdadeiramente satisfeita com a resposta de Lilu.
  Em seu longo vestido roxo-claro e branco, Blarie se vira e caminha pelo corredor, até sumir de vista.
  – Por que você fez isso? – Me viro para Lilu.
  – Eleninha, sei que mais do que ninguém que você não queria estar aqui. Mas se continuar com essa atitude, afastando todos eles, não vamos conseguir nada. – Ainda mantendo seu braço sobre os meus ombros, Lilu me puxa para mais perto, apertando sua bochecha contra a minha. – Por que não tenta usar isso a seu favor? Se eles te querem por perto as coisas serão mais fáceis pra gente. Não estou pedindo pra voltar a ser amiga deles, mas você pode fingir, não pode? – Ela desencosta nossos rostos e me encara com expectativa.
  Suspiro.
  – Posso.
  Lilu sorri.
  – Legal. Agora vamos comer.
  Como se tivesse perdido mais uma batalha, sem vontade, sigo Lilu pelos corredores até que encontrássemos a sala de jantar, onde, em volta da enorme mesa com as mais variadas comidas, apenas Blarie e Amia ocupavam seus lugares.
  – Bom dia. – Amia diz, antes de bebericar o que quer que esteja tomando em uma xícara de porcelana.
  – Bom dia. – Lilu cantarola, se sentando em uma das cadeiras do outro lado da mesa, não se importando com Amia, mesmo depois de tudo que ela fez.
  Bem, essa era a Lilu, não acho que ela se preocupe com muitas coisas. Às vezes, ela parece estar bem fora da realidade, sua seriedade só costuma aparecer em momentos críticos.
  Me sento do lado da Lilu, que já comia, ficando de frente para Blarie e Amia.
  – Onde está todo mundo? – Pergunto, enquanto Lilu tentava enfiar dois pedaços de pão de uma vez só na boca.
  – Quando você faz parte da família principal de uma espécie tão poderosa, sempre tem muitas coisas para fazer. – Amia sorri, bebericando o conteúdo da sua xícara de novo.
  – Alguns saíram e os outros devem estar pelo castelo. – Blarie completa, apoiando seu cotovelo sobre a mesa e o rosto sobre a mão.
  – Aproveitando que estamos juntas, quero te fazer um convite. – Amia me encara, fazendo Blarie e Lilu que encararem também.
  – Que convite? – Levanto as duas sobrancelhas, antes de pegar um pedaço do pão doce que Lilu comia.
  – Taehyung está ocupado hoje. Provavelmente, foi encontrar suas outras noivas. – Ela coloca a xícara sobre o pires de porcelana, ajeitando suas mãos sobre a mesa em uma postura impecável.
  – Outras noivas? – Lilu pergunta de boca cheia, me encarando confusa.
  – Não pensou que seriamos as únicas, não é, querida? – Amia arqueia as sobrancelhas e depois ri.
   Quando eu penso que as coisas não podem piorar, elas pioram.
  – Na verdade, Taehyung precisa escolhê-las ainda. Mas tenho quase certeza que ele vai fazer isso hoje. Por isso, estou pensando em visitar a Madame Dorothea amanhã, para começarmos os preparativos, você sabe, um casamento precisa de um grande planejamento e quanto antes começarmos, melhor.
  Amia entrelaça seus dedos sobre a mesa, e encaro anel em seu dedo que era idêntico ao meu.
  – Claro. – Forço um sorriso.
  Sinto os olhos de Lilu sobre mim, mas apenas estou tentando fazer o que ela sugeriu. Se estou fadada a essa “relação", vou adorar saber o que a noiva do Drácula deve fazer.
  – Ótimo. Esteja pronta amanhã e teremos um agradável dia. – Amia sorria de volta, fazendo todo meu interior enjoar só de olhá-la. Ela era a pior de todas e eu nunca vou esquecer o que ela fez com a Wendy.
  – Podemos ir agora, Blarie? – Pergunto para a garota de cabelos púrpura, e ela assente, se levantando da sua cadeira.
  – Eu ainda não terminei. – Lilu resmunga, e eu a puxo pelo braço, a arrastando para longe da mesa. Ela ainda conseguiu alcançar mais um dos pães e pegando-o antes que saíssemos da sala de jantar, deixando Amia sozinha.
  Blarie nos conduziu para o primeiro andar do castelo, entrando no mesmo corredor que eu entrei quando vim ao baile de máscaras. E passando pela entrada onde Yoongi sumiu naquela noite, a mesma que eu planejava espiar, ela abre uma porta que nos leva para um grande pátio, uma parte descoberta com um caminho de pavimento cercado por flores e plantas; e segundo Blarie, esse era só um dos muitos pátios que transpassavam o castelo e levava para diversos lugares diferentes desse enorme terreno dos vampiros.
  – Antes de irmos, eu preciso te falar isso, senão vou enlouquecer de incômodo. – Blarie para abruptamente no meio do caminho, sem mais nem menos, se virando para mim.
  Lilu para atenta, do meu lado.
  – Eu sei que Amia já deve ter falado muitas coisas pra você. Mas você precisa saber que ela só é uma das noivas do Taehyung, porque Jin meio que surtou quando soube que o Taehyung te enviou um anel. É complicado, você sabe, os vampiros não aceitariam que o Drácula se casasse com uma humana, uma Van Helsing. Isso poderia fazer com que os outros vampiros deixassem de obedecê-lo.
  Por algum motivo, sinto como se meu coração parasse por alguns segundos.
  – Você conhece o Taehyung um pouco, sabe como ele pode ser irritante, e o Jin percebeu que ele não estava disposto a ceder. Por isso, pediu que ele tivesse outras noivas, dessa vez, vampiras, se não as coisas poderiam ficar complicadas com os outros vampiros.
  Sinto Lilu me encarar, e meu coração para de novo. Eu realmente não sei o que dizer, não esperava escutar isso, mas as coisas não podem mudar.
  – Obrigada por me contar, eu acho. – Forço um sorriso, e peço que ela continue andando, enquanto tento me livrar de qualquer desconforto e me focar no meu plano.
  No final, esse pátio nos levou até os fundos do castelo, onde entramos em um caminho estreito e de grama aparada entre as árvores altas da floresta; subindo mais um pouco, a colina onde o castelo ficava. E, aos poucos, as árvores foram sumindo e dando lugar a vegetação alta com muitas lápides enterradas entre elas. Os nomes estavam escritos em romeno e as datas eram absurdamente antigas.
  – Esse aqui é o cemitério dos vampiros. – Blarie se vira de frente para nós duas e continua subindo a colina, agora, de costas. – Aqui são enterrados as noivas e os familiares do Drácula.
  – Um pouco mórbido ter um cemitério no quintal de casa. – Comento, observando as lápides.
  – Não quando você é um vampiro. – Blarie ri.
  – Então é aqui que vocês plantam as Ervas-Vermelhas? Inteligente. Um estoque grande. – Lilu diz de forma natural, fazendo Blarie sorrir sem jeito e se virar para frente, nos dando as costas.
  Cutuco Lilu com o cotovelo e ela me olha, sussurrando “o quê?". Nego com a cabeça, antes de andar mais rápido e alcançar Blarie, que estava indo em direção a uma pequena escada do lado de um, aparente, penhasco. E, de fato, confirmo isso quando chego nos degraus de cimento que estavam quase cobertos pelas folhas alaranjadas e pedras da terra; fazendo uma pequena curva na colina, o lado direito não havia nenhum suporte a não ser uma bela descida para o final de um penhasco. Peço que Lilu tome cuidado ao subir e ela me mostra a língua dizendo que estava tudo bem, e quando chegamos ao final da escada, a primeira e única coisa que vemos no pequeno espaço de terra em que estávamos, era uma construção de pedra com a palavra Nosferatu” cravada ao alto dela debaixo do teto em formato de telhado.
  – Essa é a cripta de todos os Dráculas que existiram. – Blarie diz, enquanto caminha até à construção de pedra.
  – Eles estão enterrados aí? – Lilu se aproxima de Blarie e tenta espiar enquanto ela abre a cripta.
  – Não. Os Dráculas nunca são enterrados aqui. Ninguém nunca sabe onde eles são enterrados. Essa cripta é mais como um memorial.
  É claro que os Dráculas não estariam enterrados em um lugar comum. Imagina todos os segredos que poderiam descobrir através do corpo do vampiro mais poderoso, isso é perigoso, apesar de que poderia ser um grande avanço para a humanidade caso a igreja os encontrasse.
  – Todos esses retratos, cada um deles foi um Drácula de uma época diferente.
  Dentro da cripta, haviam retratos pendurados por todos os lados, alguns eram pinturas e outros eram fotografias que iam se modernizando ao longo de cada imagem. Também haviam alguns bancos de pedra para que pudessem deixar flores e velas para os que já morreram.
  Admirando cada detalhe do lugar iluminado apenas pela luz que vinha de fora, me aproximo do que parece ser o último retrato, do lado de um espaço vazio que daria continuidade assim que mais um Drácula morresse. O nome “Henry III Dracul” estava escrito na borda da foto de um homem de cabelos brancos e longos, com os olhos escuros e puxados, e era impossível negar, seus traços sérios lembravam um pouco de cada um daqueles irmãos, especialmente, Taehyung e Yoongi. Quando me recordo do retrato da Amélia, lembro de achar o sorriso do Taehyung idêntico ao de sua mãe, mas se o tirasse, Taehyung seria uma cópia de seu pai.
  – Eu o conheci um pouco. – Olho para o lado quando Blarie se aproxima. – Quando trago flores para essa cripta, é pra agradecer a morte de Henry.
  Franzo as sobrancelhas.
  – Por quê?
  – Acredite, esse não é um vampiro que você gostaria de conhecer. Até mesmo eu posso admitir isso.
  Encaro de novo a foto do homem sério, e acabo concordando internamente com Blarie, ele não me parece alguém que foi bom, se é que um vampiro pode ser.
  – Então, esse aqui é o grande maldito que começou com tudo isso?
  A voz de Lilu nos faz olhá-la. Ela estava do outro lado, de frente para um dos quadros, e quando nos aproximamos, percebo ser uma pintura de Vlad III, O Empalador.
  Encaro Blarie, sem saber o que dizer. Lilu não está me deixando agir com o plano com esses comentários.
  Blarie se aproxima de Lilu, coloca as mãos para trás do corpo e se inclina perto de seu ombro.
  – Não se esqueça que antes de ser um vampiro, ele foi um humano ainda mais terrível.
  Lilu encara Blarie, que ri.
  – Dessa vez você me pegou. – Lilu suspira e dá de ombros.
  – Vamos. Aqui não tem muita coisa. – Ainda rindo, Blarie indica a saída da cripta.
  Por um momento, quase rio com ela, ao relembrar das vezes em que estivemos juntas no passado. Sei que não foram muitos momentos, mas eu realmente cheguei a considerar uma amizade entre nós duas.
  Com um suspiro baixo, caminho para fora da cripta, sentindo vontade de correr para dentro outra vez quando meu coração salta em meu peito ao ver Jimin parado perto das escadas. Engulo em seco ao perceber que seus olhos encaravam apenas a mim e nada mais. E se antes eu deixei que algum sentimento nostálgico me invadisse por conta da Blarie, agora eu parecia ter levado um soco no estômago.
  Ele estava ali, parado a poucos metros, usando roupas elegantes como me lembro, com a pele tão pálida e lábios avermelhados. Seus cabelos estavam diferentes, um pouco mais curtos nas laterais e maior na parte de cima, deixando alguns fios pendurados em sua testa.
  – Vamos na frente? – Blarie pergunta para Lilu.
  – Por quê? – Lilu me encara desconfiada.
  – Tem um lugar muito legal que eu quero te mostrar. Os antigos Dráculas costumavam sacrificar humanos lá.
  Os olhos de Lilu se arregalam.
  – Então, vamos logo. – Apressada, Lilu me deixa para trás, caminhando com Blarie, e passando ao lado de Jimin como se ele não estivesse ali.
  Quando os cabelos alaranjados e púrpuros somem, sinto como se meus pés estivessem colados no chão e eu não pudesse me mover. Me sentindo a mesma Elena de quatro anos atrás, tão frágil e vulnerável, volto a encarar Jimin que, com uma expressão apreensiva, começa a se aproximar de mim lentamente.
  – Eu disse que aquela não seria a última vez que nos veríamos. – Incerto sobre fazer isso ou não, Jimin sorri minimamente fechado quando para perto.
  O ar sai do meu nariz em uma risada nervosa e sem som.
  – Por favor, não vamos voltar para Upiór. Você não precisa mais fingir. Aquilo foi uma ameaça. – Falo em meio as batidas nervosas do meu coração.
  Jimin enruga as sobrancelhas.
  – Eu nunca te ameaçaria, Elena. – Ele estende sua mão para tocar o meu braço, mas eu recuo.
  – Não tenho mais dezoito anos, Jimin. Não sou mais uma garotinha boba. Você e o Taehyung não vão me enganar outra vez.
  Todo aquele sentimento que eu tentei guardar em uma caixinha no fundo do meu coração, parece ter sido destrancada agora, me fazendo sentir tudo que senti a quatro anos atrás.
  – Você precisa entender, Elena. Não havia outra escolha pra nós. – Jimin gesticula, ficando um pouco frustrado.
  Aperto os olhos, o encarando com descrença.
  – Você não pode dizer isso, porque sempre tem uma escolha. – Fervilhando nesses sentimentos, tudo começa a ser transformado em irritação dentro de mim. Irritação pelo seu fingimento, irritação por me sentir assim outra vez, irritação por estar nessa porcaria de lugar.
  A expressão de Jimin também muda e, aos poucos, ele também parece ficar irritado.
  – Você não vai me fazer continuar essa discussão depois de quatro anos, Elena. – Ele expira alto.
  – Não vamos continuar porque você sabe que eu estou certa.
  Ele estreita os olhos, me encarando com irritação.
  – Não posso pedir desculpas por nascer como um vampiro, Elena. As minhas leis e os meus princípios são diferentes dos seus. E nem por isso, eu digo que os humanos estão errados em nos caçarem e matarem, porque isso é o que vocês são. – Ele estava transbordando tanto quanto eu, talvez até mais, já que se vira e vai embora depois de quase gritar no alto da colina.
  Suas palavras me atingem certeiramente, fazendo os meus olhos arderem em lágrimas de irritação que eu não iria derramar.
  Mais decidida do que nunca a dar um fim em tudo isso, desço as escadas e caminho apressada entre as lápides e depois as árvores até que eu estive de volta aos fundos do castelo.
  – Oi. – Sobressalto quando Hyun aparece em um dos cantos dos fundos.
  – Eu já pedi pra você parar de fazer isso, Hyun. – Respiro pesadamente, me recompondo do susto.
  – Desculpa. Você tá brava? – Ele me encara através de seus grandes e redondos olhos escuros, e percebo nesse momento minha chance.
  – Não, está tudo bem. – Acalmo minha voz. – Você ainda quer passar algum tempo comigo? – Pergunto e ele assente. – Então, por que não me mostra algum lugar bem legal desse castelo? Ele é muito grande e eu não consegui ver muita coisa. – Forço um sorriso gentil.
  O garotinho franze o cenho e fica por alguns segundos em silêncio, pensando.
  – Tem um lugar que eu não posso ir. O Jin não deixa. Mas eu sei onde ele esconde a chave, aí eu já fui lá uma vez, mas ele não sabe. Você quer ir, Elena?
  – Sim, eu quero, Hyun. – Sorrio, dessa vez de verdade, pois isso seria um ponto positivo para mim. Jimin me incentivou mais que nunca a continuar com o nosso plano.
  – Tá bom. Mas você não pode contar pra ninguém, tá? – Hyun segura minha mão e me encara enquanto me puxa para a porta do pátio.
  – Não vou contar. Eu prometo. – Sorrio e deixo que ele me leve para dentro do castelo.
  Depois de subirmos alguns andares, Hyun me leva até o corredor onde o escritório do Taehyung ficava. Nós entramos em uma porta diferente, dando em mais um escritório, provavelmente o do Jin, pelo que o garotinho me contou. Hyun corre até à cadeira atrás da mesa do escritório e arrasta ela para perto de uma estante de livros, enquanto eu fico perto na porta para me certificar de que ninguém nos veria. Depois, o garoto puxa o quinto livro da terceira fileira, pegando uma chave escondida atrás dele.
  – Aqui! – Ele se vira para mim e me mostra a chave, depois de saltar da cadeira.
  – Shh! Fala baixo, Hyun, ou vão nos descobrir. Agora deixa tudo do jeito que estava.
  Ele assente e empurra a cadeira de volta ao lugar, vindo correndo em minha direção e pegando minha mão de novo.
  Quando saímos do escritório do Jin, subimos mais um andar e entramos em um espaço com dois corredores. Hyun me puxa para o lado esquerdo, para dentro de um corredor iluminado por velas em castiçais. O garotinho para na terceira e última porta do lado direito, enfiando a chave na fechadura dourada. Peço que ele gire a porta de modo devagar para não fazer barulho, e depois de assentir, ele faz isso, abrigando a porta. Olho uma última vez para o corredor, o vendo vazio, e entro na sala com Hyun. E assim que o garotinho liga a luz do cômodo, meus olhos encaram tudo com avidez.
  Era uma sala grande e espaçosa, com estantes que iam do chão até o teto, por toda parte. E nas prateleiras de cada uma das estantes, haviam potes de vidro com um par (em cada) de redondas bolinhas. Na frente dessas estantes com potes de vidro, haviam manequins sem cabeça, que vestiam deslumbrantes vestidos de noivas, alguns nem pareciam ser dessa época, mas, mesmo assim, ainda eram lindos. E isso era tudo que encontrei nessa sala.
  Curiosa, caminho sobre o carpete vinho, me aproximando de uma das estantes, retirando um dos potes de vidro da prateleira, me surpreendendo ao perceber que o par de bolinhas que havia em cada pote, na realidade, era um par de olhos, cada um de uma cor diferente e todos muito bem conservados.
  – Hyun, você sabe por que isso está aqui? – Me viro, levantando o pote de vidro.
  Hyun nega com a cabeça, me observando silenciosamente.
  Me sentindo totalmente desorientada por ver isso, pego meu celular que estava guardado no meu bolso traseiro, desde que sai do quarto, e começo a fotografar os potes, com o intuito de mostrá-los para o Padre Albert. Os vestidos de noiva são os próximos, e acabo me encantando mais do que devia ao examiná-los... esse sentimento.
  – Esse é um lugar muito legal, e eu estou feliz porque você me mostrou ele, mas acho que devemos ir agora, antes que nos descubram. – Falo para Hyun, depois que tenho todas as fotos que preciso.
  Ele assente, e nós dois deixamos a sala, em seguida, devolvendo a chave para o mesmo lugar de antes.

***

  Assim que Wendy e Sally voltaram para o castelo, reúno minha equipe e mostro as fotos que tirei. Todas ficam tão surpresas quanto eu, mas, infelizmente, não temos qualquer palpite sobre o que possa ser isso. De qualquer forma, Padre Albert pediu que as garotas avisassem que devemos ir encontrá-lo amanhã, e ele com certeza deve ter algum palpite sobre isso. Parece que a folha da página solta que eu encontrei com a palavra Lycanthropia foi mais do que o suficiente para criar uma pequena reunião entre todos nós.
  Lilu nos disse que Blarie a levou até o mesmo lugar que ela já havia ido, mas que ela não pôde investigar muito por não estar sozinha. Já Wendy e Sally trouxeram nossas roupas vindas direto de Hammond, assim como nossas armas, que escondemos do melhor jeito que pudemos. Combinamos de nos aprontar para o jantar e terminar o restante do dia de uma maneira mais tranquila, já que na manhã seguinte, teríamos muito o que conversar com Padre Albert.
  E depois de um longo banho e uma roupa confortável que dessa vez era minha, caminho até à sacada aberta, a fim de tomar um pouco de ar enquanto mando uma mensagem para minha mãe, dizendo como estavam as coisas aqui na Transilvânia. Com os olhos atentos na mensagem que eu escrevia, apoio meus cotovelos no batente da sacada, sentindo vento do final da tarde me atingir.
  Respiro fundo e facho os olhos, mexendo meu pescoço de um lado para o outro, depois que envio a mensagem para minha mãe. Abro os olhos novamente e observo a bela paisagem que o castelo me oferecia, e algo em especial atrai minha atenção. Mesmo estando a alguns andares de distância do chão, minha visão ainda é muito boa, e agradeço ao meu sangue Van Helsing por isso. Andando entre as estatuas do jardim, Taehyung caminhava ao lado de uma garota da qual não consigo ver com precisão os traços (mesmo que minha visão seja melhor que a de um humano comum, ela não fará milagres). Ela estava com um dos braços enlaçado ao dele e, por algum motivo, imagino que ele está rindo ou sorrindo para a garota. Ela deve ser uma das noivas que ele ainda deveria escolher, as que Amia me contou.
  Me afasto da sacada quando percebo que estava apertando meu celular com mais força do que deveria. Volto para o quarto com a intenção de encontrar uma das garotas, e pensar em outras coisas que realmente mereciam a minha atenção, e não no Taehyung andando no jardim com uma garota qualquer que supostamente vai ser mais uma das suas noivas.
  – Você não tem ideia do quanto eu queria te ver. – Ergo a cabeça rapidamente, encarando espantada e assustada a pessoa que estava sentada na ponta da minha cama, com as penas cruzadas e as mãos apoiadas no colchão.
  – Quando você entrou aqui? – Fico parada na entrada do quarto para a sacada.
  – Eu pensei que tinha me visto. – Jungkook arqueia as sobrancelhas, e depois se levanta da cama.
  Ele enfia as mãos para dentro dos bolsos das calças, e começa a caminhar em minha direção.
  – Nosso último encontro não foi muito agradável. Mas eu preciso dizer, você continua encantadoramente linda. – Ele para mais perto do que eu gostaria, e sorri de um jeito sem-vergonha.
  – Eu preciso sair. – Falo, me sentindo nervosa por ser encarada por esses olhos escuros e grandes, que pareciam que iriam me despedaçar.
  – Tudo bem. – Ele sorri de novo, antes de inclinar seu corpo em direção ao meu, rapidamente, encostando seus lábios contra os meus. Com os olhos arregalados, tento inclinar meu corpo para trás, mas Jungkook tira uma das mãos dos bolsos e passa ao redor da minha cintura, me mantendo perto, enquanto seus lábios continuam sobre os meus.
  Quando ele se afasta, por um segundo, penso que as minhas pernas podem falhar. Parada no mesmo lugar, segurando meu celular, o vejo sorrir mais uma vez, antes de se virar e sair do quarto, me deixando completamente atônita, sabendo que tudo havia começado de novo e eu estava nisso outra vez, do mesmo jeito.

Capítulo 4
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