SÉTIMO CAPÍTULO
Tempo estimado de leitura: 20 minutos
Portsmouth, New Hampshire, 23 de Dezembro de 2024:
%Ágata% caminhava pelas ruas ainda cobertas de um leve manto de neve fresca. O frio da manhã mordiscava suas bochechas, e o ar gelado fazia com que sua respiração formasse pequenas nuvens enquanto ela se aproximava da livraria.
Ao virar a esquina, lá estava ele. %Taehyun%, encostado na porta, com um sorriso descontraído no rosto e segurando uma embalagem de café para viagem com dois copos fumegantes.
— Bom dia — ele disse, com a voz tão calorosa que parecia aquecer o ar frio ao redor.
%Ágata% parou diante dele, estreitando os olhos desconfiada, mas sem conseguir evitar um sorriso.
— Você é sempre assim tão pontual?
— Só quando vale a pena — ele respondeu sem hesitar, oferecendo um dos cafés para ela. —
Latte com um toque de canela, do jeito que você gosta.
— Como você sabe que eu gosto assim? — Ela pegou o copo, arqueando a sobrancelha.
— Tenho meus métodos — ele brincou, e antes que ela pudesse responder, ele se inclinou para frente e a surpreendeu com um selinho rápido.
%Ágata% congelou por um segundo, os olhos arregalados, a mente tentando acompanhar o que acabara de acontecer.
— %Taehyun%! — Ela exclamou, mais surpresa do que irritada, enquanto o calor subia para suas bochechas.
Ele deu de ombros, com um sorriso travesso.
— É só um bom dia. Achei que merecia um toque especial.
— Toque especial? — Ela balançou a cabeça, tentando esconder o rubor no rosto. — Você é muito atrevido, sabia?
— Já me disseram isso antes — ele respondeu, parecendo se divertir com a reação dela.
Ela soltou um suspiro, sem saber se ria ou se o repreendia, mas acabou sorrindo de leve.
— Entra logo antes que a gente congele aqui fora.
%Taehyun% riu e a seguiu para dentro da livraria, fechando a porta atrás de si.
Enquanto ela tirava o casaco e se preparava para mais um dia de trabalho, não conseguia evitar os pensamentos que rodopiavam em sua mente. O gesto dele, tão espontâneo, ainda fazia seu coração bater um pouco mais rápido.
E, pelo sorriso que %Taehyun% carregava enquanto organizava alguns livros no balcão, ele sabia exatamente o efeito que causava.
❄️❄️❄️
A manhã na livraria transcorreu de forma tranquila, mas com uma energia palpável no ar. %Ágata% e %Taehyun% trabalhavam em sintonia, quase como se tivessem feito isso juntos por anos. Entre organizar os livros recém-chegados e atender os poucos clientes que apareciam naquela manhã fria, a conversa fluía naturalmente, repleta de pequenas provocações e risadas ocasionais.
%Taehyun%, sempre atento, parecia fazer questão de estar próximo, seja ajudando-a a alcançar livros nas prateleiras mais altas ou anotando pedidos especiais dos clientes. Apesar disso, %Ágata% tentava manter o foco no trabalho, ainda refletindo sobre o selinho inesperado que ele lhe dera mais cedo.
Quando o relógio marcava meio-dia, %Taehyun% se aproximou, segurando dois sanduíches que havia preparado e trazido de casa, além de duas garrafas de água.
— Hora de uma pausa para o almoço. — Ele disse, colocando os itens no balcão.
%Ágata%, que estava arrumando alguns papéis, levantou o olhar e arqueou uma sobrancelha.
— Trouxe sanduíches para nós?
— Claro. Se eu fosse esperar você sair para almoçar, talvez passássemos o dia todo sem comer.
Ela sorriu, aceitando o sanduíche.
Os dois sentaram-se perto da janela, onde a luz do sol tímida iluminava o espaço. Enquanto comiam, o clima permaneceu descontraído, e os assuntos iam desde os livros preferidos de cada um até comentários sobre o movimento da livraria.
— Amanhã vamos abrir só até o meio-dia, por ser véspera de Natal — %Ágata% comentou casualmente, enquanto tomava um gole de água.
%Taehyun% levantou o olhar, curioso.
— Meio-dia? E o que você vai fazer depois disso?
— Nada de especial. Geralmente, fico em casa, leio um pouco, talvez assista a algo na TV...
— Nada de visitas ou encontros familiares?
%Ágata% hesitou por um momento, o olhar desviando para a janela.
— Não, nada disso. Faz tempo que as coisas não são exatamente... normais na minha família.
%Taehyun% não pressionou, apenas assentiu compreensivo.
— Então, se você não tiver planos, podemos continuar as buscas no porão. Afinal, parece que estamos começando a encontrar respostas.
— Você não desiste, não é?
%Ágata% balançou a cabeça, mas o sorriso no rosto mostrava que ela não achava a ideia ruim. O almoço seguiu leve, e mesmo sem dizer nada, ambos sabiam que estavam criando uma rotina que parecia estranhamente familiar e confortável.
❄️❄️❄️
O restante da tarde passou de forma produtiva na livraria. %Ágata% e %Taehyun% trabalharam lado a lado, intercalando momentos de concentração com pequenas conversas descontraídas. O movimento foi modesto, com alguns clientes entrando para comprar presentes de última hora ou buscar encomendas feitas anteriormente.
%Taehyun%, como sempre, se mostrou solícito e eficiente, ajudando os clientes a encontrarem o que precisavam e organizando os livros devolvidos às prateleiras. %Ágata%, por outro lado, dividia seu tempo entre administrar o caixa e reler as anotações feitas no porão.
Quando o relógio marcou seis horas, o céu já estava completamente escuro, e a livraria começou a esvaziar. %Taehyun% caminhou até a porta e girou a placa para "Fechado".
— Acho que por hoje terminamos — ele disse, se espreguiçando com um sorriso satisfeito.
%Ágata% olhou para ele, hesitante.
— Pode ser que sim para você, mas eu vou ficar mais um pouco. Quero tentar descobrir mais coisas lá no porão.
%Taehyun% franziu o cenho, preocupado.
— Tem certeza? Você precisa descansar, %Ágata%.
Ela deu de ombros, caminhando até o balcão para pegar o caderno de anotações.
— Estou acostumada a ficar até mais tarde aqui. E, sinceramente, não quero perder o fio da meada.
Ele cruzou os braços, encostando-se ao balcão.
— Não precisa. Você já ajudou muito hoje — respondeu ela, mas a voz saiu um pouco menos firme do que pretendia.
%Taehyun% não pareceu convencido, mas respeitou a decisão dela.
— Tudo bem. Mas se você precisar de algo, me liga, ok?
%Ágata% sorriu de leve, grata pela preocupação.
Com isso, ele pegou o casaco e se despediu, lançando um último olhar na direção dela antes de sair pela porta principal. %Ágata%, por sua vez, soltou um longo suspiro, fechou a porta que levava ao porão atrás de si e desceu as escadas, pronta para mergulhar mais fundo nos mistérios que seu avô havia deixado para ela.
❄️❄️❄️
%Ágata% desceu as escadas do porão com passos firmes, mas o coração ligeiramente acelerado. O silêncio ali embaixo parecia mais pesado à noite, mas ela se acostumara a isso ao longo dos anos. Ao alcançar a mesa que usava como base de trabalho, soltou o caderno de anotações e espalhou os papéis que %Taehyun% ajudara a organizar mais cedo.
Ela começou revisando as anotações feitas no dia anterior, tentando encontrar padrões ou conexões que não percebera antes. Cada carta, cada mapa, cada símbolo rabiscado parecia ter um propósito maior, mas era como montar um quebra-cabeça sem saber exatamente como a imagem final deveria ser.
"Uma chave para o legado." As palavras ecoavam em sua mente enquanto ela passava os dedos por um pequeno mapa desgastado que havia encontrado entre os documentos. Havia marcas em pontos específicos e, no canto, um símbolo estranho que parecia um
"T" estilizado.
%Ágata% franziu a testa, pegando uma lupa que estava ali por acaso. Ela examinou o símbolo mais de perto e percebeu pequenos traços que, à primeira vista, pareciam apenas detalhes decorativos, mas que poderiam ser algo mais.
— O que você quis dizer com isso, vovô? — murmurou para si mesma.
Enquanto mergulhava nos papéis, sua mente vagava de vez em quando para %Taehyun%. O selinho daquela manhã ainda pairava na sua memória, e ela se pegava sorrindo sozinha antes de balançar a cabeça e voltar ao trabalho. Era difícil ignorar como ele parecia disposto a ajudá-la, mesmo quando ela mesma não tinha certeza de onde aquilo a levaria.
Depois de algumas horas, %Ágata% encontrou uma carta que não havia lido com atenção antes. A letra familiar do avô preenchia a página:
"Minha querida neta, se você estiver lendo isso, é porque o momento chegou. Confie no instinto que corre em suas veias. Este legado é mais do que livros e mapas; é sobre a essência de quem somos. Você não está sozinha nessa jornada. Há aqueles que compartilham do mesmo sangue e do mesmo propósito." Ela parou, sentindo um arrepio subir pela espinha. As palavras pareciam destinadas a ela agora, como se seu avô soubesse exatamente o que ela precisaria ouvir.
Antes que pudesse interpretar mais, ouviu um ruído vindo do andar de cima. Parou, segurando a respiração.
A voz inconfundível de %Taehyun% ecoou pela escada. Ela levantou-se rápido, subindo até a porta do porão. Ao abri-la, viu %Taehyun% segurando uma sacola de papel, com um sorriso meio culpado.
— Eu não consegui ficar em casa sabendo que você estaria aqui sozinha. Então trouxe comida.
%Ágata% o encarou por um momento, surpresa, mas logo abriu espaço para ele entrar.
— Você realmente não sabe respeitar a privacidade de uma pessoa, não é? — disse com uma ponta de humor, escondendo a gratidão.
— Só estou cuidando da minha chefe — respondeu ele, entrando e colocando a sacola sobre a mesa.
Enquanto ele tirava os recipientes de comida, ela o observou, sentindo algo aquecer em seu peito. Talvez, afinal, ela não estivesse tão sozinha nessa jornada quanto imaginava.
%Ágata% respirou fundo, sentindo o aroma da comida que %Taehyun% trouxera se misturar com o ar envelhecido do porão. Enquanto ele terminava de organizar os recipientes na mesa improvisada, ela não conseguiu evitar que sua mente voltasse às palavras da carta de seu avô:
"Este legado é mais do que livros e mapas; é sobre a essência de quem somos." — Você encontrou algo novo? — perguntou %Taehyun%, enquanto se sentava, observando-a com curiosidade.
Ela balançou a cabeça, mais para si mesma do que para ele.
— Talvez. Meu avô era um homem peculiar, mas isso... isso é maior do que eu imaginava. Ele deixou tantas pistas, mas parece que ele queria que eu chegasse às respostas sozinha.
%Taehyun% a encarou por um momento antes de pegar um pedaço de papel que ela deixara de lado mais cedo.
— Vamos por partes. O que sabemos até agora?
%Ágata% suspirou, se sentando ao lado dele. Pegou o mapa desgastado que havia examinado antes e o colocou entre eles.
— Este mapa... os pontos marcados não são aleatórios. Eles correspondem a lugares específicos que meu avô mencionava em suas histórias. Lugares que ele visitou em viagens pelo mundo.
%Taehyun% inclinou-se, analisando as marcas.
— E este símbolo aqui? Parece um "T" estilizado.
— Sim. Eu pensei que fosse apenas uma assinatura, mas agora acho que é mais do que isso. Pode ser um emblema, algo que ele criou para representar... não sei, talvez nossa família, nossa linhagem.
%Taehyun% franziu a testa, pensativo.
— E a carta que você leu? Ele mencionou "confie no instinto que corre em suas veias". Isso soa como algo hereditário. Talvez ele acreditasse que você tivesse algum tipo de... conexão especial com esse legado.
%Ágata% o olhou, hesitando.
— Meu avô sempre dizia que a família tinha um "chamado". Algo que passava de geração em geração, mas ninguém nunca levava isso a sério. Só parecia uma dessas coisas que os velhos gostam de repetir.
— E se não for só isso? — sugeriu %Taehyun%, com os olhos brilhando de entusiasmo. — E se ele realmente acreditasse que você era a pessoa destinada a continuar o que ele começou?
%Ágata% passou a mão pelos cabelos, pensativa.
— Faz sentido... Ele sempre se referia ao passado como algo que precisava ser preservado, mas nunca explicou o porquê. E agora, com tudo isso...
Ela pegou outro papel, uma lista de objetos mencionados em uma das cartas.
— Olha isso. Essa lista de itens. Alguns eu reconheço, porque estão aqui na livraria, mas outros... eu nunca ouvi falar.
— Como o quê? — perguntou %Taehyun%, se inclinando para olhar.
— Como esta "chave de jade". Meu avô sempre mencionava uma viagem que fez à Ásia, mas nunca falou sobre trazer algo de lá.
Ela parou, arregalando os olhos.
— Espere. Ele desapareceu por meses em uma viagem para a Coreia, lembra?
%Taehyun% assentiu, intrigado.
— Sim, você mencionou isso antes.
— Minha mãe dizia que ele voltou diferente. Mais reservado, como se tivesse descoberto algo que não podia compartilhar.
Ela olhou para o símbolo no mapa novamente, como se estivesse enxergando-o pela primeira vez.
— Acho que preciso encontrar essa chave de jade. Ela é a próxima peça do quebra-cabeça.
%Taehyun% sorriu, inclinando-se mais perto dela.
— E onde começamos a procurar?
%Ágata% mordeu o lábio, perdida em pensamentos.
— Acho que o porão ainda guarda algumas respostas. Mas se não encontrarmos nada aqui, talvez... talvez tenhamos que buscar além da livraria.
O olhar de %Taehyun% era firme, determinado.
— Então vamos descobrir juntos.
O tom dele fez algo em %Ágata% se aquecer, e ela percebeu que, pela primeira vez, talvez estivesse realmente pronta para desvendar o mistério que seu avô deixara.
%Ágata% e %Taehyun% se concentraram intensamente nos documentos restantes, suas mãos alternando entre folhear papéis amarelados e anotar possíveis conexões no bloco de notas. A atmosfera no porão era tensa, mas repleta de expectativa, como se algo prestes a ser revelado pairasse no ar.
— Olha isso — %Taehyun% quebrou o silêncio, segurando uma carta dobrada com cuidado. — Está assinada pelo seu avô, mas tem um destinatário.
%Ágata% se aproximou rapidamente, espiando por cima do ombro dele.
—
"Para K.J. Kim, com esperança e lealdade." — ela leu em voz alta. — Kim? Esse nome aparece em várias anotações dele.
%Taehyun% assentiu, apontando para um trecho sublinhado na carta.
— Aqui ele fala sobre "a chave que guarda a verdade". Isso parece diretamente relacionado à tal chave de jade que mencionamos.
— Mas quem é K.J. Kim? — %Ágata% perguntou, mordendo o lábio enquanto folheava freneticamente outro caderno. — Deve ser alguém que ele conheceu na viagem à Coreia. Talvez tenha confiado algo importante a essa pessoa.
%Taehyun% ficou em silêncio por um momento antes de pegar outro pedaço de papel que havia deixado de lado.
— Espere, isso aqui... é um recibo. Ele é de uma remessa internacional enviada para Portsmouth.
— De onde? — %Ágata% perguntou, inclinando-se ainda mais para ler.
— Da Coreia. É datado de um mês depois que ele voltou.
— Então a chave pode estar aqui, na cidade? Talvez até mesmo na livraria.
Eles começaram a procurar nos arredores com ainda mais determinação, revirando caixas, examinando objetos antigos e abrindo gavetas esquecidas. Depois de quase uma hora, %Taehyun% parou ao lado de uma estante antiga, puxando uma pequena caixa de madeira que estava escondida atrás de uma fileira de livros.
Ela correu até ele, ofegante, enquanto ele abria a caixa com cuidado. Dentro, havia um objeto envolto em tecido de seda. %Taehyun% desdobrou o tecido com reverência, revelando uma pequena chave esculpida em jade verde.
— É isso. — %Ágata% sussurrou, com os olhos arregalados.
A chave era incrivelmente detalhada, com um padrão intrincado que lembrava galhos de árvores se entrelaçando. No centro, o símbolo
"T" estilizado estava gravado com precisão.
— É mais bonita do que eu imaginei... — ela murmurou, quase sem fôlego.
%Taehyun% olhou para ela, sério.
— Isso confirma tudo. Seu avô deixou isso para você, %Ágata%. Ele sabia que você chegaria até aqui.
— Mas o que ela abre? — ela perguntou, segurando a chave como se fosse feita de vidro, tão preciosa parecia.
%Taehyun% balançou a cabeça.
— Ainda não sabemos, mas... — Ele apontou para o mapa. — Talvez a resposta esteja no próximo ponto marcado.
%Ágata% concordou, com uma determinação renovada brilhando em seus olhos.
— Então é isso. Amanhã, depois do Natal, vamos até o próximo lugar.
%Taehyun% sorriu, pegando o caderno para anotar o progresso deles.
— Só se você prometer não tentar resolver tudo sozinha antes disso.
Ela riu, colocando a chave com cuidado de volta na caixa.
— Prometo. Mas amanhã, %Taehyun%, eu quero respostas.
Enquanto subiam as escadas para deixar o porão, %Ágata% sentia que, pela primeira vez, estava começando a desvendar o verdadeiro legado de seu avô. E, de alguma forma, sabia que essa era apenas a ponta do iceberg.