Dois.
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O decorrer da semana na casa dos Tonks e na grande maioria das casas bruxas, não foi muito agitado. A maioria das famílias voltava aos poucos às suas rotinas, aliviados pela derrota de Lorde Voldemort e mais confiantes em um futuro melhor para toda a comunidade. Aquelas que haviam perdido algum parente ou amigo, no entanto, embora felizes com o final daquela Guerra, ainda sentiam o luto recente.
O Profeta Diário e outros jornais estampavam em suas capas algumas notícias mais importantes e recentes: A Queda do Lorde das Trevas, A História de Harry Potter, A Indicação de Kingsley Schaklebolt como Primeiro Ministro Interino e, nos últimos dois dias, as Homenagens da Batalha de Hogwarts.
Andrômeda, é claro, continuava chorando sempre que pensava na filha, marido e genro, por isso tratava de ocupar a cabeça com o neto. Mesmo que fosse trabalhoso cuidar do pequeno Teddy, preferia quando tinha a desculpa de seu choro para ficar acordada no meio da noite, embora também conversasse bastante com a sobrinha durante aqueles dias. Algumas amigas a visitavam para oferecer palavras de conforto, mas sempre parecia pior para a mulher lembrar-se de que aquilo não era apenas um sonho ruim ou que Dora não estava apenas no trabalho. Mesmo inconscientemente acabava olhando o relógio próximo às 5 horas, esperando que a mulher chegasse do Ministério, tagarelando como sempre.
Sirius e Harry também haviam passado na casa algumas vezes durante a semana, o mais novo para conhecer o afilhado e dizer o quanto sentia pelas perdas de Andy, garantindo que poderia ajudar com qualquer coisa que precisassem, inclusive dinheiro.
Cedrico, apesar de ser bem-vindo e saber que não precisava se preocupar com a mais velha contando sobre suas visitas a Sirius, preferiu ficar alguns dias longe depois da mulher ter escutado aquela conversa um tanto
constrangedora. No terceiro dia ele apareceu para ajudar, tendo até mesmo feito compras para facilitar a vida das duas que estavam focadas no bebê.
Andrômeda de certa forma preferia quando o rapaz estava visitando, quando tinha Sirius ou mesmo Harry Potter — embora sua presença não fosse tão comum no seu dia a dia, qualquer coisa que a distraísse dos últimos acontecimentos e a ajudasse a se manter ocupada, fosse com conversas ou cozinhando.
%Samantha% se sentia ainda mais cansada do que no dia após a Batalha, ainda não conseguia dormir por horas seguidas e se sentia culpada por vários acontecimentos, apesar de saber que não eram necessariamente sua culpa. Também queria conversar com o pai sobre Victoria e entender por completo toda a história das Horcruxes, mas achava que tudo aquilo poderia esperar, sua prioridade naquele momento era saber que sua tia e afilhado estavam bem. Havia feito uma promessa de que os ajudaria da mesma forma que os Tonks sempre a ajudaram e protegeram, qualquer outra coisa que não envolvesse Andrômeda e Teddy naquele momento teria que esperar.
Na sexta-feira a campainha tocou pela segunda vez naquela manhã, às 10h30 Cedrico apareceu usando vestes sociais escuras. Assim como Sirius e Harry, já sentados no sofá enquanto esperavam as duas mulheres descerem. Sirius brincava com Teddy que sempre parecia desconfiado ao olhar para o homem nos primeiros minutos, mas logo depois começava a sorrir, mexendo-se agitado sempre que tentava pegar seu cabelo ou barba. Quando tia e sobrinha apareceram, também usando roupas escuras, os homens levantaram-se prontos para saírem. Cedrico, %Samantha% e Harry aparataram em Hogsmeade, caminhando os metros que faltavam até os terrenos de Hogwarts, enquanto Sirius e Andrômeda usaram Pó de Flu por causa do bebê, chegando pela lareira da sala do Diretor, assim como vários outros bruxos.
A circulação de pessoas por toda Hogsmeade e Hogwarts estava muito maior que o normal, bruxos vindos de vários lugares da Inglaterra e alguns de outros países, vinham prestar suas homenagens. E, entre eles, muitos Nascidos-Trouxas acompanhados de seus pais e outros familiares, porque o Ministério resolveu abrir uma exceção aquele dia, Trouxas poderiam se misturar com os bruxos, visitar Hogsmeade e Hogwarts pois, assim como os bruxos, muitos deles também haviam sofrido nos últimos anos, fossem com os filhos bruxos ou no dia-a-dia dos Trouxas.
Era estranho para todos os bruxos que já conheciam o Castelo verem a Escola com tantas paredes e torres caídas, destruída após a Batalha. Hogwarts só começaria a ser reconstruída após as homenagens em um sinal de que, mesmo com tudo o que havia acontecido, os bruxos teriam um recomeço, assim como a própria Escola. A comunidade bruxa se reergueria, maior e melhor do que nunca, pois Kingsley estava determinado a aproveitar seu tempo de Ministro Interino para começar vários projetos que deveriam ter continuidade. Embora precisassem manter o sigilo como forma de proteção, ele se empenharia em acabar de uma vez por todas com todo o preconceito dos bruxos Sangue-Puros com os Nascidos-Trouxas, além, é claro, de esforçar-se para melhorar as condições em Azkaban, retirando os Dementadores da prisão e também melhorar as condições de julgamentos para evitarem o máximo possível novos casos como Sirius Black, principalmente nos próximos dois anos, sabendo que teriam muito trabalho com os Comensais da Morte que sobreviveram.
O trio andou lado a lado pelos terrenos de Hogwarts em direção à frente do Lago Negro, local no qual estariam realizando as homenagens. O dia estava claro com poucas nuvens no céu, o sol já estava alto, mas a brisa gelada amenizava o calor que as roupas escuras causavam. Sirius e Andrômeda, a qual segurava o pequeno Teddy, estavam em pé junto aos Diggory e Hagrid, próximos às fileiras de cadeiras brancas de frente a um tablado, com um grande mural ao redor com fotos e nomes de todos os bruxos, Centauros, Duendes e Elfos que haviam perdido a vida.
Andavam lentamente até eles quando viram os Weasley sentados em cadeiras mais ao canto. Rony e Gina, ao verem o grupo, levantaram para encontrar com eles depois de alguns dias afastados, e o ruivo tocou no ombro de Hermione que estava sentada ao lado dos pais.
Conversaram por alguns minutos, ninguém parecendo no clima para piadas ou conversas descontraídas, mas também querendo amenizar o clima pesado do dia.
— E seus pais? — %Samantha% perguntou ao ver os Granger de longe.
— Ah, estão um pouco confusos com tudo — Hermione suspirou, passando a mão pelos cabelos —, mas entenderam meus motivos. Só preciso levá-los ao St. Mungos mais algumas vezes para garantir que eles estão bem com todos esses feitiços da memória.
— Foi difícil para encontrá-los? — Harry tornou, sabendo que a amiga passou dias na Austrália à procura dos pais.
— Menos do que eu imaginava — confessou, sorrindo pequeno —, pensei que não conseguiria chegar a tempo, mas nosso voo chegou em Londres de madrugada, passamos no St. Mungus antes e viemos para Hogwarts — avisou, passando as mãos pelo rosto, cansada. — Achei que seria bom para eles também virem aqui, sabe? Sempre ficaram curiosos com a escola…
— E como foi quando eles descobriram que vocês dois estão juntos? — Cedrico sorriu, apontando da morena para Rony, que avermelhou no mesmo segundo olhando para o outro lado.
— Eles ainda não sabem — Mione sussurrou, o rosto corado. — Achei melhor esperar um pouco, muita informação ao mesmo tempo.
— Eu acho que você deveria ter dito antes — Gina palpitou, atraindo a atenção dos amigos —, qualquer coisa você apagava a memória deles de novo!
— Há. Há. — Rony riu irônico para a irmã, logo puxando outro assunto, tentando distrair-se por mais alguns minutos.
Cedrico apertou o ombro da namorada por um momento, apontando com a cabeça para o outro lado do terreno ao ver seu melhor amigo andando de braços dados com uma ex-colega de sala, uma sonserina com quem ele vivia de implicância.
— É isso que eu chamo de reviravolta — sussurrou, sorrindo pequeno. — Jamais imaginei que Winter fosse dar uma chance ao Monty.
— Eu pensei que ela não o suportava — a loira comentou, olhando-os conversarem com Rogério Davies e Evie Darling, a corvina amiga de Gina. %Samantha% a reconheceu da Batalha lembrando-se de que a menina duelou ao seu lado por alguns minutos contra os Comensais.
— Acho que é verdade o que dizem — Cedrico deu de ombros —, é uma linha tênue entre amor e ódio.
— E como estão as coisas com o Sirius? — Gina perguntou ao casal.
— Não o vi com muita frequência essa semana — %Sam% explicou —, passei os últimos dias com a Andy.
— Pelo menos quer dizer que você não precisa se preocupar tanto antes de darem uns beijos, não é? — Mione sorriu, vendo-os rirem baixo ao concordar. Harry arqueou a sobrancelha.
— Não esqueça que eu posso falar pro Sirius sobre isso. — Apontou para eles.
— Aham e eu aproveito e conto certas coisas sobre os últimos sete anos — Black retrucou, vendo-o rir pequeno e negar com a cabeça.
— Estava só brincando, calma.
Quim subiu no tablado de madeira pegando um pequeno megafone e olhando ao redor. Não muito depois as conversas cessaram por completo e todos se sentaram.
— Não temos palavras para expressar a dor presente desse último ano, e em especial nos últimos sete dias — começou a dizer com sua voz calma — com o número de vidas que perdemos, sendo elas mágicas ou não. Todos aqueles que perdemos farão uma imensa falta para nós; pais e mães, filhos e filhas, irmãos e irmãs, amigos… Muitos dos Trouxas que morreram não estavam envolvidos, nem mesmo sabiam sobre nosso mundo. Os bruxos e criaturas mágicas que perdemos sacrificaram-se por algo maior, sabendo que talvez não tivéssemos uma nova chance de encerrar o domínio de Voldemort e seus Comensais. — Quim respirou fundo, tentando manter a compostura embora fosse difícil, ainda mais ouvindo o choro que não demorou a chegar aos seus ouvidos. — Nenhum deles morreu em vão, nenhum sacrifício foi à toa. Nós seguiremos em frente, sabendo que foi por todos nós que eles se sacrificaram, para que nós pudéssemos continuar em um mundo melhor. Com tudo isso, mais uma vez ficamos com a lição de que o mais importante não é o nosso sangue ou a quantia de ouro no Gringotes, mas o caminho que decidimos seguir, os amigos e familiares que temos ao nosso lado, pessoas que amamos e que nos amam, independentemente de qualquer situação.
Schaklebolt continuou seu discurso por mais de quinze minutos, por vezes precisando parar, a voz falhando aos poucos.
— Sei que alguns dos nomes que estão aqui talvez não façam sentido para todos — continuou, tendo ouvido comentários sobre Severo Snape e Victoria Lestrange —, mas garanto que nenhum está em vão. Todos sacrificaram-se de alguma forma por nosso mundo, por seus amigos e familiares. Amanhã teremos uma edição especial em todos os jornais com os nomes de todos aqueles que perderam suas vidas, contando um pouco de quem eram. — O homem respirou fundo tentando manter a voz forte antes de tornar a olhar para todos à sua frente. — Que a Batalha de Hogwarts seja lembrada como o dia em que todos nos unimos para derrotarmos as Artes das Trevas e que fique como um aviso para o futuro. Nós sempre estaremos aqui para defender nosso mundo, para defender nossos amigos e todos aqueles que amamos. E que o dia de hoje seja marcado como nosso recomeço. A Escola, que é o maior símbolo do nosso mundo, estará aberta no dia Primeiro de Setembro para mais um ano letivo. E como Alvo Dumbledore dizia: Hogwarts estará sempre aqui para ajudar a todos que dela precisarem! E assim seguiremos, juntos, mais unidos e fortes do que nunca.
Quando Kingsley terminou seu discurso, todos os presentes se levantaram, batendo palmas por um minuto completo. Os Elfos Domésticos de Hogwarts também estavam presentes, e também quiseram homenagear os amigos que haviam morrido durante a Batalha, estalando os dedos três vezes e fazendo assim luzes coloridas aparecerem.
Instantes depois, uma chuva de flechas caiu dos céus, vindas da orla da Floresta Proibida, de onde os Centauros permaneceram, prestando uma homenagem silenciosa.
Poucas pessoas haviam ido embora, a maioria permanecendo após as homenagens feitas por todos, conversando uns com os outros. %Samantha% havia acabado de deixar Teddy com Harry quando notou uma figura mais afastada olhando tudo de longe. Passou a língua pelos lábios antes de andar naquela direção.
Draco Malfoy viu a prima se aproximando, colocando as mãos no bolso da calça e olhando-a por alguns segundos até que ela sorriu pequeno.
— Por que está aqui, sozinho?
— Não sabia se era uma boa ideia — disse baixo, olhando para o lago —, mas achei que seria certo vir.
— Ninguém iria te azarar por vir prestar condolências, Draco.
— Será? — tornou, encarando-a com a sobrancelha erguida. — Meu pai era um Comensal, assim como eu e minha mãe.
— Mas todos vimos o que você fez durante a Batalha. Acredite, algo assim se espalha rápido — avisou, passando a mão pelos cabelos antes de voltar a olhá-lo. — Por que fez aquilo? Se tivesse dado errado, poderia estar morto.
Draco deu de ombros, encarando os sapatos.
— Sua voz irritante ficou martelando na minha cabeça — confessou. — Se eu quisesse realmente resolver a situação da minha família, não poderia continuar me escondendo. — Suspirou, olhando-a de lado. — Imagino que não seja tão nobre quanto os outros, mas…
— Não é sobre ser nobre, Draco — a garota o cortou —, é sobre fazer a coisa certa, e foi isso o que você fez. Todos temos nossos motivos. Seus pais são sua família e você se importava com eles, independente de terem sido Comensais. — Passou a língua pelos lábios, acrescentando em seguida: — Embora eu realmente tivesse vontade de bater em você e no seu pai algumas vezes.
— Como se isso fosse de agora. — A encarou contrariado. — Você nunca perdeu uma chance de tentar me azarar, %Samantha%.
— Tinha meus motivos, não tinha? — Piscou. — E não é como se você não se aproveitasse para tentar me fazer ser expulsa, principalmente quando Snape estava por perto.
Draco sorriu pequeno, concordando com um aceno ao suspirar.
— Quem diria que esses seriam os menores dos nossos problemas.
%Samantha% suspirou, olhando para o castelo.
— Minha mãe pensou em vir, mas depois achou melhor não. Meu pai vai passar por um julgamento, mas é provável que fique uns meses em Azkaban.
— Você também vai precisar? — perguntou, vendo-o negar com um único aceno.
— Tive que falar com o Ministério essa semana, mas por ora é só.
— Espero que fique tudo bem — disse sincera, encarando-o nos olhos.
Malfoy suspirou, pensando por um instante antes de estender a mão.
— Por? — perguntou confusa, embora tivesse aceito o aperto.
— Sei lá, tentar me ajudar mesmo quando eu não merecia. — Deu de ombros, constrangido. A loira sorriu para o primo.
— No fundo você não é tão insuportável quanto aparenta, Draco. Só precisa andar com as pessoas certas.
O loiro sorriu de lado, dizendo irônico:
— Pior você, que mesmo com quem anda continua sendo chatinha assim.
A prima riu, dando de ombros.
— Tem certas coisas que não mudam mesmo.
%Samantha% achou que após a cerimônia em homenagem a Batalha de Hogwarts os dias passaram mais rápidos. Talvez fosse a sensação de encerramento que todos repetiam sem parar nos jornais e ao conversarem uns com os outros, porque, teoricamente, tudo havia tido um final e todos poderiam começar a seguir em frente.
Na prática, é claro, as coisas não eram tão fáceis. Andy continuava sofrendo tanto quanto no primeiro dia e foi por isso que a loira resolveu passar o mês todo com ela, sabendo que seria bom para ambas.
Sirius, embora sentisse falta da filha dentro de casa, entendia seus motivos e ele mesmo visitava Andrômeda com frequência para distraí-la, ajudar com Teddy, comprar comida ou levar roupas para %Sam%. A única coisa que o incomodava de leve naquilo tudo era saber que não tinha controle das horas que Cedrico passava junto de sua filha, e menos ainda se ele estava ou não dormindo na casa, mesmo que o casal sempre garantisse que não. Com o passar dos dias, foi junto de Harry para o Beco Diagonal e para lojas dos Trouxas, comprando algumas roupas e outras coisas que o afilhado precisava. Conversaram bastante no decorrer das semanas, tanto para Potter se inteirar do que havia acontecido durante os meses que esteve longe, quanto para explicar tudo que Sirius não sabia sobre as conversas que havia tido com Dumbledore desde seu quinto ano em Hogwarts.
Harry finalmente estava começando a se sentir feliz, ainda sentia o peso de tudo o que havia acontecido nos últimos meses, mas ao mesmo tempo parecia chegar ao ponto em que poderia aproveitar a vida que tinha, algo que parecia lhe ter sido negado por anos.
Se sentia realmente bem-vindo na casa de Sirius, uma casa que, pela primeira vez na vida, também poderia chamar de sua. O padrinho gostava de contar sobre momentos diferentes que havia passado junto a James e Remo, e todas as vezes que o Potter precisou se desculpar com Lily na esperança que, em algum momento, a ruiva resolvesse dar uma chance a ele. Contou sobre como o amigo estava nervoso no primeiro encontro do casal e de como esteve perto de atrasar mais do que Lily no dia do casamento. Harry gostava de ouvir aquelas histórias, o fazia imaginar o quanto seus pais haviam sido felizes e no quanto James era apaixonado por sua mãe.
Quando %Sam% voltou para casa, após passar semanas com Andrômeda, os três ficaram acordados até o dia amanhecer conversando sobre diversos assuntos, incluindo várias das vezes que os dois amigos haviam quebrado as regras em Hogwarts, o que fazia Sirius gargalhar, dizendo o quão orgulhoso estava dos dois.
Aquele havia sido o primeiro dia em meses no qual todos se sentiram em paz, como se o peso que carregavam nos ombros e do peito tivesse sumido por pelo menos algumas horas.
E foi entre uma conversa e outra enquanto estavam rindo, que Harry confirmou algo que já suspeitava, havia passado a enxergar %Samantha% como sua melhor amiga, mais próxima até de uma irmã. Sentia por ela o mesmo sentimento de afeto que tinha por Hermione, embora, no fundo, achasse que preferia um pouco mais a loira por serem mais parecidos. Sabia que tinha realmente se apaixonado em algum momento dos últimos anos e só percebeu de verdade o que era no quarto ano, não era por menos que sentira tanta raiva de Cedrico naquela época, e até achava que havia sido importante para ele passar por aquilo, achava que tinha amadurecido um bom tanto após a conversa que tiveram no Três Vassouras, no qual revelou seus sentimentos e que a amizade dos dois até mesmo se fortaleceu depois daquilo. Contudo, estava ainda mais satisfeito ao saber que tinha realmente superado o amor não correspondido dela, o que significava que poderia, oficialmente, seguir em frente, e até mesmo já sabia quem gostaria de chamar para sair — só esperava que tivesse mais sorte com Gina.
Um dos momentos mais complicados para Sirius e %Samantha% após o funeral havia acontecido poucos dias após o retorno dela para casa, aproveitando que Harry tinha ido visitar os Weasley para finalmente conversarem sobre Victoria.
Antes mesmo de começar a explicar tudo o que havia acontecido, Sirius pegou uma caixa azul que tinha guardada em seu quarto, pedindo para que ela abrisse.
%Sam% retirou de dentro um medalhão de ouro com um pingente em forma de coração. Ao abri-lo reparou em duas fotos já gastas, na primeira seu pai (muito mais novo) sorria ao piscar. Na segunda, viu a si mesma quando era apenas um bebê, mexendo-se inquieta, olhando para os lados.
— Kingsley soube que você ainda não tinha pegado o que Dumbledore havia te deixado no testamento — explicou em voz baixa, sentado na poltrona e encarando a mais nova.
— Por que estava com ele?
— Porque ele sempre soube de tudo. — Suspirou, passando a mão pelos cabelos. — Victoria achou que se algo desse errado, em algum momento você precisaria saber da verdade, Dumbledore poderia te explicar o que aconteceu.
— Ele sempre soube o motivo dela? — perguntou surpresa, vendo o mais velho acenar com a cabeça.
— Victoria é o melhor exemplo de: o inferno está cheio de boas intenções. Ela sabia que havia errado no começo e não teria como voltar atrás, tentou nos proteger e, principalmente, te proteger como pode. Claramente não foi a melhor das ideias a forma que ela escolheu, mas no final funcionou, você cresceu bem e está viva.
—
Bem é uma palavra forte — replicou, umedecendo os lábios.
— Talvez não tão bem quanto seria se tivesse nós dois ao seu lado, e, sinceramente, não posso imaginar como foi quando você descobriu que estávamos em Azkaban, mas pelo menos você passou todo esse tempo com os Tonks, teve uma família para te apoiar e te educar. Poderia ter sido bem pior, %Samantha%.
— Sei que sim — concordou, suspirando. — Poderia ter acabado com os Malfoy…
— Foi Narcisa quem sugeriu à Victoria a se passar por uma Comensal, embora eu tenha certeza de que ela não imaginou que sua mãe fosse continuar agindo como agiu após todos esses anos.
— Eles também sabiam? — tornou com o cenho franzido, sentindo como se todos soubessem tudo sobre sua família, menos ela mesma.
— Acredito que só Narcisa.
%Sam% concordou ainda segurando o medalhão em mãos, pensativa.
Black respirou fundo, olhando para as mãos por um momento.
— Quando Victoria foi levada à Azkaban, semanas após eu ter sido preso, só o que eu queria saber era se você estava bem. Passei boa parte dos anos em silêncio na minha cela, evitando ao máximo prestar atenção no que os Comensais diziam. Todo dia, um funcionário do Ministério aparecia para nos levar comida e, quando necessário, cobertores e agasalhos para o frio, não que fossem o suficiente — acrescentou. — De qualquer forma, Victoria estava em uma cela próxima à minha, vez ou outra ela tentava conversar comigo, mas não se arriscava a dizer muito porque outros Comensais estavam ao redor — contava em voz baixa. Embora odiasse se lembrar do tempo em que passou preso, sabia que era importante que sua filha entendesse tudo o que havia acontecido. — Sua mãe era uma mulher muito bonita, você deve ter reparado — disse, escolhendo com cuidado as palavras —, e era bem comunicável, facilmente ganhava a atenção das pessoas ao seu redor. Foi em uma dessas vezes que ela conseguiu que esse funcionário do Ministério me entregasse uma carta. Passei meses com ela escondida embaixo do meu colchão — riu sem humor —, considerei jogá-la fora inúmeras vezes, mas nunca tive coragem, queria saber o que havia acontecido, em que momento ela tinha mudado tanto e como eu nunca percebi. Meu maior problema desde que sua mãe chegou em Azkaban foi meu ego, não suportava o fato de ter sido manipulado daquela forma.
Fez uma pausa, esfregando o rosto com as mãos parecendo exausto, antes de continuar:
— Em algum momento resolvi finalmente deixar meu orgulho de lado e ler aquela carta. Victoria dizia que havia, de fato, passado informações de dentro da Ordem, mesmo sabendo que não deveria. Ela sempre teve uma necessidade de ser aceita pelas irmãs — explicou, olhando para a filha. — Bellatrix e Narcisa nunca superaram a decisão dela de se casar comigo, e Victoria não aguentava mais ser ignorada pela família que ela tanto prezava. Sinceramente, hoje eu penso que foi realmente algum tipo de milagre termos nos casado e você ter nascido — sorriu pequeno —, porque se não tivéssemos sido impulsivos para casar tão rápido, nada teria acontecido. Acho que casar comigo foi o único ato de rebeldia que Victoria conseguiu realizar. Ela me amava, é claro — adicionou rápido ao ver a expressão chocada no rosto da loira —, mas não acho que apenas isso fosse o suficiente para pensar em termos uma família… De qualquer forma — continuou, passando a língua pelos lábios —, foi por isso que ela começou a passar informações da Ordem. Primeiro, coisas pequenas que ela não achava serem muito importantes. Mas o Lorde sabia que poderia conseguir algo a mais dela, Victoria era a Comensal que ele precisava; casada com um membro da Ordem, com acesso fácil a Dumbledore e a maioria dos segredos que tínhamos. — Respirou fundo, coçando a barba antes de continuar. — Em algum momento, Voldemort a convidou pessoalmente para ser uma Comensal e, como você deve imaginar, esse não é o tipo de convite que se pode recusar. Victoria sabia que se recusasse estaria com problemas e, não só ela, nós dois também.
%Samantha% permanecia em silêncio, deixando seu cérebro processar lentamente todas aquelas informações, vez ou outra olhando para seu pai, quase como se quisesse confirmar que o que escutava era verdade.
— Voldemort prometeu-lhe que, se aceitasse, não precisaria se preocupar conosco, nós dois estaríamos protegidos, pois os Comensais teriam ordens de não nos machucar. Imagino que aquilo foi um baque para Bellatrix. Talvez você se lembre — disse, um tanto irônico —, nós nunca nos demos muito bem. Sempre quisemos matar um ao outro. — Sirius riu rouco, lembrando-se de conversas e duelos passados que havia tido com a mulher. — Victoria aceitou porque não tinha mais o que fazer. Pelo menos ela achou que não. Talvez se tivesse me dito em tempo o que estava acontecendo poderíamos ter-nos escondido, assim como James e Lily. — Suspirou antes de tornar a encarar os olhos da filha. — Em determinado momento, todos percebemos que ele estava atrás dos Potter, mas não sabíamos exatamente o motivo, apenas que ele queria matar Harry. Hoje, é claro, sabemos que foi Severo quem contou sobre a profecia para o Lorde. De qualquer forma, eram poucos de nós que sabíamos sobre a casa em Godric’s Hollow e, quando fizemos o feitiço, decidimos, apenas entre James e eu, trocar, ao invés de eu ser o fiel, o que é claro, imaginamos ser óbvio para Voldemort, resolvemos confiar em Rabicho. — Fungou baixo ao lembrar-se, passando a mão pelos olhos. — Parecia o plano perfeito, mas Victoria já estava passando muito mais informações para ele. Foi ela quem contou ao Lorde das Trevas que Rabicho era o Fiel do Segredo.
%Sam% encarou o pai por incontáveis minutos, a boca aberta. Sentiu o coração apertar ao saber daquilo, sua mãe havia entregado os pais de Harry a Voldemort.
— É claro que Voldemort não teve muito trabalho para persuadir Rabicho, meia dúzia de palavras e ele se vendeu como o rato que era. — Respirou fundo, a voz falhando por um momento. — Depois que tudo aconteceu, Victoria sabia que não tinha realmente acabado. Antes de querer matar Harry, Voldemort tinha outro segredo, já estava fazendo todas as suas Hocruxes sem que ninguém mais soubesse. — Sirius parou por um momento, sentindo a garganta seca. — Régulo foi o primeiro a descobrir sobre isso, ele também sabia que Victoria estava passando informações para tentar te manter em segurança, os dois eram muito amigos — disse, sentindo-se estranho ao lembrar do irmão mais novo, o qual por anos, nem mesmo sabia o que havia acontecido. — Contou tudo para Victoria antes de tentar destruir uma delas, sabendo que talvez não voltasse. Depois que eu fui preso, sua mãe sabia que era uma questão de tempo até ela acabar em Azkaban, foi quando contou tudo a Dumbledore, sabendo que em algum momento Voldemort retornaria. Foi por isso que deixou com ele esse medalhão — apontou com a cabeça para a joia nas mãos da filha —, para que no momento certo você soubesse de tudo o que aconteceu.
%Samantha% olhou para baixo, sem saber o que pensar com tudo aquilo.
— Harry já sabe que foi ela…?
— Já — concordou. — Eu contei há alguns dias, não dei tantos detalhes, mas ele sabe. Não se preocupe, ele não nos culpa por nada disso. E, é claro, ficou com raiva ao saber, mas também ficou preocupado ao pensar em como você reagiria quando descobrisse.
A loira acenou, olhando pela janela por alguns instantes com o cenho franzido.
— Eu não espero que você entenda ou perdoe tudo o que sua mãe fez, ela sabia que estava errada. Eu mesmo não a desculpo por tudo, só espero que você perceba que, por mais errado que tenham sido as decisões que ela tomou, no fundo ela achou que era por um bom motivo.
%Samantha% o encarou por um momento, negando com a cabeça.
— Não melhora em nada saber que ela fez tudo isso por minha causa, pai.
— Eu sei que não — suspirou, passando a mão pelos cabelos —, mas agora você sabe da verdade e dos motivos dela. Já é meio caminho para seguir em frente, não?
Sirius abriu a porta dando de cara com Cedrico parado do outro lado com um sorriso educado. Suspirou, negando com a cabeça antes de dar espaço para o loiro.
— Eu deveria saber que %Samantha% de volta significava sua presença constante na casa.
Diggory riu, colocando as mãos nos bolsos.
— Depois de tudo o que passamos, Sirius? Já até morei aqui!
O moreno arqueou a sobrancelha, encarando-o por alguns segundos.
— Podem se passar dez anos e nem assim você vai ter minha aprovação total, Cedrico. — Cruzou os braços, dando-se por vencido no instante seguinte. — Contudo, hoje até estou feliz que você tenha dado as caras.
— Aconteceu alguma coisa? — perguntou, olhando ao redor à procura da namorada.
— Eu contei sobre Victoria — explicou, olhando por um momento em direção ao segundo andar, passando a mão pelos cabelos —, não acho que ela vá aceitar tão bem o que aconteceu. Pelo menos não agora.
Cedrico concordou com um aceno, travando a mandíbula. Sentiu a curiosidade dominar seu corpo e quase perguntou ao homem o que havia acontecido, mas imaginou que não seria o melhor momento para aquilo, também sabendo o quão difícil deveria ser para Sirius.
— Você está bem? — questionou ao encará-lo, o cenho franzido.
Black sorriu pequeno, acenando com a cabeça.
— Já tive meu tempo para assimilar tudo. Pode ir — disse, subindo ele mesmo as escadas em direção ao próprio quarto. — E hoje nem mesmo vou cobrar a porta aberta.
Cedrico o seguiu para o segundo andar, bufando.
— É claro que não, ela provavelmente está chorando. Que golpe baixo! — resmungou, vendo o mais velho rir ao concordar, sumindo pelo corredor. O rapaz bateu na porta da namorada, escutando-a responder pouco depois. Diggory entrou no quarto seguindo diretamente para o lado dela na cama ao vê-la encolhida, abraçada ao travesseiro.
— Vai ficar tudo bem, %Sam% — sussurrou, tirando os sapatos e deitando-se junto a ela, abrindo os braços para que se aconchegasse contra seu peito, abraçando-a apertado instantes depois. — Vai ficar tudo bem, meu amor.