Capítulo XXXV
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- %Star%, a apresentação é amanhã! – Não tinha nenhum tom de comemoração na voz de Nicholas e ele estava sendo um pé no saco naquela sexta-feira.
- Eu sei disso, Nick! – Joguei as mãos para o alto e caminhei até a barra de ballet em frente ao espelho. Inclinei-me sobre ela e respirei fundo. – Mas o que você quer que eu faça? Eu não consigo dar esse pulo, não consigo!
- Eu quero que você se esforce mais!
Nós dois estávamos bem cansados devido às longas horas de ensaio que enfrentamos naquela manhã, mas ele devia estar me testando, já que não parava de me cobrar. Nossa rotina estava pronta e preciso admitir que a apresentação seria linda. A única coisa me preocupando era um salto que Nick insistia em adicionar a ela. Não era um salto normal, como os que eu estava acostumada, e eu não consegui realizá-lo em nenhuma das nossas tentativas. Quando eu cheguei mais perto de acertar, acabei perdendo o equilíbrio e caindo no chão. A partir daí só fiquei mais preocupada ainda em me machucar antes do “grande dia” ou até mesmo ir ao chão durante a apresentação. Realmente não tinha como decidir entre um ou outro, já que os dois eram péssimos.
- Você está de brincadeira, né? – O olhei pelo reflexo do espelho e não sabia se devia começar a chorar ou gritar com ele. – Me esforçar mais? Não sei se você percebeu, mas quem está toda esfolada de tanto cair no chão aqui sou eu!
- Mas você não está se concentrando! – Bufou.
- Eu desisto, Nick! – Seria melhor sair dali do que acabar brigando mais ainda e falar algo que eu pudesse me arrepender depois. Saí de perto da barra e comecei a andar em direção à saída da sala, pisando forte.
- Ei, espera! – Me parou no meio do caminho e eu nem ao menos o olhei. – Me desculpa, %Tah%... É que quando eu fico nervoso, eu fico assim.
- Eu também estou nervosa, sabia? É a primeira vez que eu vou dançar em frente à Academy inteira e quero que tudo seja perfeito! Mas aparentemente não vamos ser perfeitos porque eu acerto a droga desse pulo! – Falei tudo de uma vez e quase perdi o ar.
- Calma, calma. – Segurou os meus ombros e eu respirei fundo. – Vamos ser perfeitos sim, você vai ver! E eu acredito que você vai conseguir dar esse pulo...
- Duvido muito. – Rolei os olhos e ri irônica.
- Vamos tentar uma última vez? – Ele pediu e eu choraminguei. – Por favor, vai? Diz que sim?
- Você não vai mesmo desistir disso, né? Argh, tá bem!
Descobri algo novo aquela manhã: Nick conseguia ser pior que eu quando queria alguma coisa. E olhe que eu já era muito chata! Como não teria outra escolha, balancei a cabeça de um lado para o outro e balancei os ombros, meio que me preparando. O meu parceiro de dança sorriu satisfeito e me soltou, indo para o canto da sala. Eu fiz aquele sinal de “tô de olho em você”, também indo para o meu lugar, e ele só riu. “Fique calma, %Tah%, vai dar tudo certo.” Repeti várias vezes na minha cabeça. Quem sabe assim eu acredito, né?
Foquei o meu olhar em Nick, já que ele seria o meu ponto de apoio. Demorei um pouco demais para começar a minha corrida em direção a ele, mas pelo menos consegui sair do lugar. Ao chegar na metade do caminho que nos separava, fiz plié para pegar impulso no chão e saltei. Eu poderia ter me concentrado um pouco mais, mas não via o motivo, já que tinha certeza que terminaria no chão. Abri as minhas pernas até formar o ângulo de 180º, desejando que eu só precisasse fazer aquilo. Com a mesma velocidade que as abri, voltei a juntar uma perna à outra. Nick se apressou a me segurar pela barriga e me levantar para o alto. Eu o olhei com um sorriso, mas ele me reprovava com os olhos.
- O que é? O salto foi bom! – Reclamei e ele me colocou no chão.
- O salto foi bom sim, mas não foi o que combinamos!
- Tudo bem, Nick, eu vou aprender a voar e aí nós fazemos o que você quer, ok? – Por mais que eu tentasse não me estressar, estava sendo cada vez mais difícil.
- Pelo menos se você não conseguir virar, ainda podemos fazer esse pulo de frente mesmo. – Deu de ombros. – E se você cair, é só fingir que esse era o nosso objetivo o tempo todo. Se você começar a sangrar, é até melhor, porque aí a nossa apresentação vai ser bem polêmica.
- Isso mesmo, Nicholas, pensamento positivo! – Ironizei, mas acabei rindo.
- Vai dar tudo certo! – Me puxou para um abraço e me deu um cascudo.
- Você vai se arrepender de ter feito isso! – Reclamei e o empurrei.
Ele começou a correr pela sala e eu fui atrás. Nick me irritara a manhã inteira, então aquele seria o momento da minha vingança. Dei sorte de o chão da sala ser tão encerado, pois o garoto tinha medo de escorregar e acabava correndo bem devagar, o que me deu a chance de alcançá-lo. Para alguém que já caiu tantas vezes em um curto período de tempo, o medo de escorregar acaba indo embora. Aproveitei que as minhas pernas estavam acostumadas a saltar e pulei em cima de Nicholas, agarrando-o pelos ombros e levando nós dois ao chão. Ele gritou e eu soltei uma risada maléfica no maior estilo “Muahaha”. O que eu não sabia era que estávamos sendo vigiados, por isso a voz feminina que apareceu em seguida me assustou muito.
- Eu não vou nem perguntar o que está acontecendo. – A diretora estava parada na porta da sala, provavelmente se perguntando o porquê de ter escolhido justamente aquele casal pra ser o encerramento do baile de inverno.
- Diretora... Oi. – Falei meio sem jeito, saindo de cima de Nick e arrumando a minha saia de chifom.
- Olá, Srt. Tomlinson. Sr. Hoult. – Continuou séria como sempre. – Podem me acompanhar, por gentileza?
- Claro!
- Viu? Estamos encrencados por culpa sua. – O menino sussurrou na minha orelha e eu dei uma cotovelada em suas costelas.
Nenhum de nós três falou mais coisa alguma. A diretora deixou a sala e eu fui correndo pegar a minha bolsa e muda de roupas no banquinho de madeira como de costume. Pelo menos Agnes teve compaixão e esperou que eu me juntasse a ela e Nick do lado de fora. Seguimos adiante, passando pelo corredor deserto e chegando até o elevador. Aproveitei aquele percurso pra me cobrir com o meu cardigan comprido. Nunca gostei de ficar andando por aí com o uniforme de ballet e ninguém pareceu se importar com o que eu estava fazendo. Era melhor me enrolar com aquele agasalho do que perder tempo indo até o banheiro e trocar tudo. Principalmente por Agnes aparentar estar com pressa.
O elevador nos levou até o subsolo, onde eu nunca havia estado até aquele momento. O lugar não parecia um porão abandonado como o que eu achava e era perfeitamente iluminado e limpo. Passamos pelo único caminho até ele terminar em uma porta branca de madeira. Agnes a abriu e revelou um verdadeiro salão de baile, o qual estava quase totalmente decorado com o tema da festa que aconteceria no dia seguinte. %Abi% disse que o “baile de inverno” tinha esse nome por ser uma espécie de celebração ao início do inverno. Pode até ser óbvio demais, mas os enfeites eram em formato de flocos de neve e derivados.
Olhei em volta e estudei cada detalhe daquele salão: O teto era bem alto e tinha lâmpadas caindo em uma espécie de cascata que ia de um lado outro, mas não eram todas que estavam acesas. No centro do salão estava um espaço realmente grande e vazio, onde deveria ser a pista de dança. Ao redor estavam algumas mesas redondas que ainda não foram totalmente arrumadas e nem ao menos cobertas por uma toalha ou coisa assim. Mais ao fundo e em frente á pista de dança estava um palco de mais ou menos um metro e meio de altura, onde algumas pessoas arrumavam instrumentos. Entre essas pessoas eu consegui avistar certo garoto que eu reconhecia mesmo estando de costas.
Um sorriso surgiu em meus lábios e a vontade de correr até o meu namorado e abraçá-lo era maior que tudo. Eu cheguei até mesmo a me virar na direção do palco e dar um passo naquela direção, mas Nick me impediu. O olhei sem entender, mas ele indicou a diretora com um aceno de cabeça e eu deduzi que ela deveria querer dar algum aviso importante, já que tinha nos arrastado até ali. Terminei ficando no mesmo lugar e perdendo Zayn do meu olhar, já que ele começou a conversar com um garoto baixo e nem ao menos tinha notado a minha chegada no salão.
- Bem, acho que todos já estão aqui, então eu posso começara falar. – Voltei a olhar para Agnes e notei que não era mais apenas eu e Nick que estávamos por ali: Jessica estava ao lado de Brigitte e mais três meninas que eu não conhecia, um quarteto de estudantes de teatro, uma garota que eu sabia que cantava e mais outras pessoas que eu não me preocupei em identificar. – Como podem ver, o baile de inverno vai continuar a acontecer aqui e esse é o espaço que vocês terão para se apresentar...
Olhar novamente na direção do palco foi uma péssima ideia, pois assim que meu olhar encontrou o de Zayn, eu já não consegui prestar atenção em mais nada do que a diretora falava. Não sabia há quanto tempo o garoto estava me olhando, mas o seu sorriso denunciava que já fazia um tempo. Ele acenou de longe e eu fiz o mesmo, com um sorriso que conseguia ser maior que o dele. “Oi.”, apenas mexi os lábios e ele respondeu da mesma forma: “Oi, %Tah%.” Fez uma palhaçada em seguida, pegando duas baquetas da mão do garoto com quem estivera conversando momentos antes e fingiu tocar uma bateria invisível. Eu ri e cobri a boca com as mãos, tentando não chamar a atenção de quem estava ao meu redor.
- Então Nicholas e %Star% serão os últimos. – Escutar o meu nome me fez olhar para a diretora e me perguntar o que eu poderia ter perdido. – Certo?
- Certíssimo. – Nick respondeu ao ver que eu estava mais perdida que cego em tiroteio.
- É... – Falei só pra não ficar calada.
- Muito bem. Outro aviso que eu também tenho que dar é que no fim da noite estaremos revelando os primeiros resultados da peça Romeu e Julieta, por isso alguns de vocês que estavam pensando em sair mais cedo devem ficar até o final. – Ou seja, eu deveria ir embora o mais rápido possível pra não ter que escutar que Brigitte seria o par romântico de Zayn assim que eles ganhassem os papeis principais, o que era bem óbvio que iria acontecer. – Observem bem o espaço e decidam se precisam mudar alguma coisa nas suas apresentações. Caso contrário, estão liberados.
Me impressionava cada vez mais o fato de aquela diretora não saber sorrir, pois ficava séria o tempo inteiro. Coitado do marido dela, se é que ela tinha um... De qualquer forma, a senhora se afastou e foi falar com algum professor de teatro que estava esperando por ali. Eu olhei para o espaço da pista de dança, imaginando se a minha própria apresentação caberia ali dentro, mas tinha certeza que sim.
- O espaço é bem legal... – Nick se virou pra mim após também estudar o local.
- É sim... Mas acho que não teremos espaço pra fazer aquele pulo que você queria. – Menti. – Mas ele nem era tão importante, né? Então não tem problema se a gente deixar ele de lado...
- Boa tentativa, %Tah%. – Riu. – Tem espaço de sobra pra fazer o pulo.
- Droga. – Resmunguei.
- Você não vai conseguir escapar!
- Escapar do que? – Senti braços fortes me envolvendo por trás e Zayn beijou a minha bochecha após perguntar.
- Das garras da morte! – Dramatizei.
- A %Star% não confia em mim, então não quer fazer o passo mais importante da nossa apresentação. – Nick explicou e eu senti Zayn me apertar mais ainda. – Mas eu já falei que ela vai se sair bem.
- É claro que vai! – Me olhou de lado. – Ela é sempre perfeita em tudo que faz.
- Que exagerado! – Sorri e inclinei o rosto na direção do de Zayn, dando-lhe um selinho demorado.
- Eu vou indo, ok? – Nicholas devia estar se sentindo deslocado, por isso preferia ir embora. – Nos falamos mais tarde, %Tah%?
- Com certeza. – Eu tentei abraçar o meu parceiro, mas Zayn me prendeu em seu abraço. – Descanse!
- “Nos falamos mais tarde, %Tah%?” – Zayn fez uma voz fina imitando Nick assim que este foi embora.
- Para de ser chato, Malik! – Acabei rindo daquela imitação e virei de frente para o garoto, passando os braços em volta do pescoço do mesmo.
- Vai defender o amiguinho, é? – Fez birra e me olhou sério.
- E se eu for? – Provoquei.
- Eu não deixo! – Riu. Acho que Zayn até tinha tentado ficar bravo comigo, mas não conseguiu resistir aos meus sorrisos.
- Oi, pombinhos. – Aquele garoto com quem Zayn estivera conversando no palco se aproximou.
- Olá! – Desfiz o abraço e me virei para o recém chegado.
- Meu nome é Josh. Josh Devine. – Pegou a minha mão e a beijou, totalmente galanteador. – Você deve ser a %Star%.
- Pode me chamar de %Tah%. – Sorri tentando ignorar o rubor de minhas bochechas.
- Josh é o nosso baterista. Ele sempre toca quando eu e Niall temos alguma apresentação, mas não estuda aqui. – Zayn explicou.
- Isso explica eu não lembrar de ter te visto por aqui! – Comentei.
- %Tah%, você não pode lembrar de todo mundo que estuda aqui. – Meu namorado rolou os olhos.
- Mas eu lembraria dele. – Pisquei para Josh de brincadeira, mas mesmo assim ele corou.
- Epa. – Zayn notou o que eu fizera. – É melhor a gente ir encontrar a %Abi% e o Niall antes que eu perca a namorada para um baterista.
- Você sabe o que falam sobre bateristas, né? – Josh sorriu convencido.
- Que são bons com as mãos? – Mordi o lábio só pra causar mais ciúme ainda.
- Ok, é realmente hora de ir embora.
Zayn sabia que eu e Josh estávamos apenas brincando, mas mesmo assim me agarrou pela cintura e praticamente me arrastou para fora do salão de baile. O que restou para fazer foi acenar para o baterista de longe e tentar não acabar tropeçando e caindo no chão, já que Zayn estava andando rápido demais. Nós deveríamos estar indo até a sala de aula de %Abi%, pois pelo horário a aula de Niall já tinha acabado e a dela estaria acabando.
- Hey, eu ainda tenho que me trocar!
+++ Uma coisa que eu amo em sanduicherias londrinas é que os funcionários não se importam se você acabar ficando por lá durante horas depois de terminar comer. E foi exatamente isso que %Abi%, Niall, Zayn e eu fizemos; resolvemos ficar estirados nos bancos do Burger King após o almoço. Eu nunca havia comido tanta batata frita em uma refeição só e estava quase passando mal. %Abi% tentou me controlar, falando que eu deveria maneirar na comida para ainda caber no meu vestido de baile, mas essa lembrança me fez comer ainda mais. Culpa do nervosismo que me dominava! Eu sempre invejei aquelas pessoas que param de comer quando estão nervosas, mas comigo era exatamente o contrário: Eu comia sempre mais e depois ainda ficava com o peso na consciência e me achava gorda demais.
Eu estava praticamente deitada em um daqueles bancos estofados, aproveitando que estava bem no canto, e tinha as minhas pernas em cima de Niall, que estava sentado ao meu lado e batucava nas minhas canelas com dois canudos. Zayn estava do meu outro lado e tinha a cabeça deitada no meu ombro; fazendo %Abi% ocupar a cadeira em frente a minha e quase babar na mesa. Coloquei a mão sobre a barriga e ri sozinha. Os outros três me olharam como se eu fosse louca e se perguntavam qual era a graça.
- Eu comi tanto que até estou triste... – Ri mais uma vez.
- Mas você está rindo... Tristeza não deveria ser o contrário? – %Abi% estava tentando achar algum ponto de lucidez naquele meu comentário.
- Sim, mas o caso não é esse! – A olhei e balancei a cabeça. – É só que... Ficar triste por comer demais é meio patético.
- Principalmente quando muitas pessoas ficam tristes por não ter o que comer. – Niall me olhou com cara feia e Zayn acabou rindo também. – Qual é a graça agora?
- Eu não sei! – Gargalhou mais uma vez e eu fiz o mesmo.
- Por que estamos rindo? – Levei uma mão ao rosto, mas não consegui parar de rir.
- Vocês estão loucos! – %Abi% nos olhou com decepção.
- Acho que o Zayn andou dividindo a erva dele com a %Tah%. – Niall comentou com a namorada e eu gargalhei.
- Shhhhhhhh, Niall! – Zayn jogou uma bolinha de guardanapo no loiro. – Nós ainda não estamos nesse nível. Minha erva é uma coisa preciosa e eu não posso dividir com qualquer pessoa.
- Heeeeeeey! – Dei uma cotovelada nele. – Eu não sou qualquer pessoa, ok? Pare de esconder essa erva de mim!
- Tsc tsc tsc. – Uma senhora que passou por nós nos reprovou, provavelmente tendo escutado o que estávamos falando.
- A gente divide com você também, moça! – Falei sem pensar, fazendo meus amigos rirem. Eu não costumava dar respostas assim, principalmente para pessoas de idade, o que me fez começar a achar que tinha algo na minha bebida.
- Você está louca mesmo. – %Abi% ainda ria e a senhora apressou o passo para se distanciar da gente.
- Deve ser o sono! – Cocei os olhos e Zayn me olhou com um sorriso, deixando um beijo na minha bochecha. – Quando eu chegar em casa vou dormir a tarde toda!
- Epa, como é essa história? – A ruiva levantou a cabeça e a apoiou na mão. – Você esqueceu que vamos ao salão?
- Se ferrou, %Tah%. – Niall riu.
- É hoje? Não acredito. – Fiz um bico enorme. – Porque você teve que marcar uma hora no salão de beleza em plena sexta feira?
- Pra podermos nos preparar para o baile de amanhã!
- Vocês nem precisam disso! – Zayn desencostou a cabeça do meu ombro. – As duas já são lindas.
- Awn, que namorado fofo. – Ri e o puxei pelo queixo até estar com os lábios juntos aos dele.
- Por que você não fala algo assim, pudincup? – %Abigail% fez uma careta esperando uma boa resposta do namorado.
- Porque você teria uma resposta diplomática pra me explicar o que duas garotas precisam fazer em um salão de beleza!
- Ele tem razão, %Abi%, é bem isso o que você faria. – Zayn concordou após eu ter liberado a boca dele.
- E eu adoraria saber que explicação é essa, porque ainda estou com muita preguiça de passar o dia inteiro em um salão! – Resmunguei.
- Duas palavras pra você, %Star%. – Fez o número ‘2’ com os dedos. – Girl time. Nunca mais passamos um tempo juntas, só nós duas!
- E não podemos fazer isso na minha casa? Ou até na sua!
- Claro que não! Salão de beleza é um santuário para mulheres. Não sei como as coisas funcionam lá em Parrí, mas por aqui é assim. – Zombou o meu jeito de falar ‘Paris’, o que me fez mostrar a língua pra ela. – Vai ser divertido... Nós podemos fofocar, falar mal das pessoas, olhar revistas de moda... Eu até deixo você puxar saco daquela Corine.
- Carine! – A corrigi e rolei os olhos. – Mas tudo bem, você me convenceu!
- Carine não é aquela que mandou uma caixa pra você? – Zayn devia se lembrar da “coisinha” que Carine pediu a Rachel para me entregar na noite em que ele foi conhecer a minha família.
- É ela mesma! – Sorri animada. – %Abi%, você tem que ver que sapatos lindos ela me mandou! Uma palavrinha pra você: Dior!
- Tá vendo? Esse é o tipo de coisa que se fala durante o “girl time” de vocês. – Niall fez aspas no ar, entediado com nossos comentários sobre moda, sapatos, bolsas e derivados, já que ele tinha sido obrigado muitas vezes a escutá-los. – Especialmente quando os namorados de vocês estiverem bem longe, tendo um “boy time”.
- Por falar em “boy time”. – Também fiz aspas no ar, imitando-o de propósito. – O que você achou de sair com o Harry e o Liam no sábado?
- Eles são bem legais! – Sorriu. – É uma pena que o Liam não bebeu com a gente, mas foi uma noite divertida. Quer ver a foto que ele tirou de mim e do Harry?
- Claro que quero! – Na minha cabeça já passava as milhões de situações que poderiam estar por trás daquela tal foto.
- Hm, já estão até tirando fotos juntos? – Zayn entortou o nariz, com ciúmes do seu melhor amigo.
- Você sabe que é o meu primeiro amor, Z. – Nialler piscou e pegou o celular no bolso para procurar tal foto. – Aqui, %Tah%.
- Deixa eu ver... – Peguei o celular e a primeira coisa que eu fiz foi rir alto ao ver a imagem. – Narry!
- Narry? – Niall perguntou sem entender.
- Niall + Harry. – Zayn explicou. – Ela tem mania de juntar dois nomes e formar um só.
- Vocês dois são “Ziall”, aliás. – Sorri e entreguei o celular para que Zayn também visse a foto. – Agora eu quero uma foto de vocês!
- Minha e dele? – O loiro perguntou.
- Qual o problema, Niall Horan? Não pode mais tirar fotos comigo? Só com seu novo amiguinho? – Meu namorado ficava muito fofo tendo ataques de ciúmes.
- Haz é um amiguinho muito fotogênico! Nós temos milhares de fotos juntos. – Falei com um sorrisinho ao pegar o meu próprio celular dentro da bolsa.
- Até você, Tomlinson? – Fechou a cara pra mim.
- Eu to brincando, idiota. – Gargalhei e passei por cima de Niall para que ele ficasse ao lado de Zayn. Quase caí sentada no colo dele, o que fez o moreno resmungar ainda mais. – Vai logo, façam uma pose!
Acho que Zayn ainda ficou fazendo charme por uns dois minutos, reclamando que Harry acabaria substituindo ele como meu namorado e como melhor amigo de Niall. Eu só fiquei rindo e escutei %Abi% voltar a falar que ele estava tendo ciúmes do garoto errado, já que Liam era quem realmente representava perigo por gostar de mim. Eu a belisquei por baixo da mesa, pois não queria que Zayn soubesse desse pequeno detalhe, principalmente porque os dois pareciam se gostar um pouco e eu tinha certeza que poderiam se tornar bons amigos se tivessem a oportunidade de passar um tempo juntos. Por fim “Ziall” parou de brigar e os dois se abraçaram. Cada um fez uma cara diferente e eu não perdi tempo em bater a foto. “Bater a foto?” Em que anos estamos mesmo? Anyway, você entende o que eu quero dizer.
Aproveitamos aquele embalo pra tirar várias outras fotos, não só dos meninos, mas também de mim e %Abi%. A ruiva pegou o próprio telefone e me puxou para que tirássemos juntas fazendo várias caretas engraçadas e até mesmo fingindo que éramos bem sensuais. Um funcionário em simpático viu o que estávamos fazendo e trouxe duas coroas coloridas, daquelas que todo Burguer King dá para os clientes. Nós duas o agradecemos e colocamos na cabeça, voltando a tirar fotos. Os meninos se juntaram a nós e continuamos a fotografar.
Quando as minhas bochechas já estavam doendo de tanto que eu ri, fiz %Abi% guardar o telefone afirmando que a minha beleza estava cansada. É claro que ela perguntou: “Qual beleza? Só se for a interior.” E eu tive vontade de bater nela, mas como queria que ela me passasse as fotos daquela tarde, seria melhor não fazer nada. A ruiva era aspirante a fotógrafa, por isso era de se esperar que ela não enrolasse para passar fotos para um pendrive ou até mesmo por e-mail, porém o que ela tinha de talento tinha de preguiça.
- Hey, %Tah%? – Zayn me chamou e assim que eu o olhei pude escutar um “clic” vindo de seu celular.
- Por favor, me diz que isso não foi uma foto! – Reclamei.
- Agora sempre você me ligar é essa foto que vai aparecer. – Sorriu orgulhoso e me mostrou a tela do seu celular, afastando o aparelho assim que eu tentei pegá-lo. – Linda como sempre.
- Linda? Onde? – Acho que eu tinha fotos piores que aquela, mas mesmo assim não era uma que eu gostaria de ser associada: Minha boca estava entreaberta, como se eu estivesse na metade de uma frase, e um dos meus olhos parecia estar maior que o outro. Sem falar que o meu cabelo estava um horror! – Você não vai apagar isso, né?
- Não mesmo. – Riu e guardou o celular.
- Tá tudo muito bom, tá tudo muito lindo... – %Abi% se pronunciou e todos olharam pra ela. – Mas nós temos que ir, %Tah%.
- Já? – Fiz bico.
- Não! – Zayn se jogou por cima de Niall e me abraçou, impedindo-me de levantar. Há um motivo para Zayn sempre se sentar ao meu lado, mas infelizmente naquela hora ele estava do outro lado da mesa, por isso praticamente esmagou o amigo.
- Sorry, Zaynster. – %Abi% começou a me puxar pela mão, quase arrancando o meu braço fora.
- Cuidado, gente, eu sou uma só! – Reclamei tentando me soltar dos dois que estavam me disputando. – Baby, eu tenho que ir com ela porque já tinha prometido.
- E precisa cumprir? – Fez um biquinho.
- Se tem uma coisa que você deve saber sobre mim... É que eu nunca descumpro uma promessa. – Mordi o bico que ele fazia e ambos sorrimos em seguida.
- Isso mesmo! – %Abi% me soltou e olhou diretamente para Niall. – O que é algo que certas pessoas deveriam fazer.
- Uhhh, senti um clima aí. – Ri e esperei %Abi% levantar para poder fazer o mesmo.
Nialler não se pronunciou e apenas fingiu que não sabia do que ela estava falando. Eu não iria esquecer aquele assunto e tinha certeza que %Abi% me contaria se algo tivesse acontecido. Os meninos também se levantaram e nos acompanharam até a porta. A minha amiga ainda estava com a coroa dela na cabeça, por isso uma criança riu e apontou para ela. Agradeci por ter guardado a minha na bolsa, pois não aguentaria uma criancinha rindo da minha cara. Zayn e Niall tiveram que arrastá-la pra fora do restaurante, impedindo-a de ir reclamar com a menina que ainda ria. Atitude sábia, diga-se de passagem.
- %Tah%, posso ir dirigindo? – Como %Abi% não estava com o carro dela, nós teríamos que ir para o salão com o meu.
- Claro que pode. – Joguei a chave do meu conversível vermelho e ela a segurou no ar.
- Tem certeza que vai deixar ela dirigir o seu carro? – Zayn me abraçou de lado e ficamos nos olhando.
- É melhor do que ter que aguentá-la no banco de trás, gritando e jogando os braços pra cima.
- Ei, isso só aconteceu uma vez!
%Abi% tentou se defender, mas eu mal a escutava. Minha atenção estava em outra coisa; ou melhor, outra pessoa. Já disse que sempre adorei a forma que Zayn dividia a atenção entre meus lábios e meus olhos? Era a forma dele de dizer: “Eu quero te beijar.” E, acredite, eu não o fazia esperar muito tempo pra realizar aquela vontade. O abracei pelo pescoço e aproximei nossas bocas, mas não cheguei a beijá-lo de uma vez. Ficamos brincando com os lábios um do outro enquanto o mundo a nossa volta se silenciava. Zayn me abraçou ainda mais e eu tive que ficar na ponta dos pés para igualar nossas alturas. Quando nossas línguas finalmente se chocaram, senti um arrepio percorrer a minha pele e me entreguei ainda mais àquele beijo. Pensar que poderia ser a última vez que estaríamos tão juntos assim até o dia seguinte me fez apertá-lo ainda mais contra o meu corpo. Uns podem pensar: “Hey, pra que tanto drama? Vocês vão se ver amanhã!” Mas “amanhã” é tempo demais, principalmente quando se está apaixonada.
+++ O salão de beleza que %Abigail% me levou parecia coisa de cinema. A recepção em si parecia aquelas de hotel e todos os ambientes eram bem climatizados. Sem falar que todos os funcionários te tratavam como se você fosse parte da realeza. Como ainda era tecnicamente cedo, o lugar não estava cheio, por isso nosso horário foi adiantado e quatro mulheres vieram nos chamar na sala de espera, onde estávamos até então.
Seguimos para outra sala e elas nos indicaram duas poltronas gigantescas onde deveríamos sentar; ou deitar, já que eram cadeiras reclináveis. É claro que %Abi% já foi logo ocupando uma e deitando como se estivesse em casa. Eu acabei fazendo o mesmo, mas me mantive bem mais comportada, já que sou uma dama. Duas mulheres foram para o lado dela e duas continuaram comigo. Pelo visto enquanto uma cuidasse das minhas mãos, a outra cuidaria dos meus pés. Geralmente eu fazia as minhas unhas sozinha, mas com certeza poderia me acostumar àquela mordomia toda.
- Eu poderia morar aqui. – Sorri ao fechar os olhos e relaxar naquela cadeira super confortável.
- Isso porque você não queria vir, né? – Minha amiga riu ao meu lado. – Podemos ir ao que interessa? De quem vamos falar mal primeiro?
- %Abi%, que coisa feia! – Abri os olhos para fitá-la e acabei rindo da cara de “eu não tenho culpa” que ela fez. – Por que temos que falar mal de alguém? Não podemos apenas comentar que a nossa querida Brigitte vai estar mais que insuportável depois de amanhã?
- O que vai acontecer amanhã? – Perguntou e eu voltei a minha atenção para a mulher que lixava as minhas unhas.
- Agnes falou que os papeis principais serão revelados amanhã, no fim da noite.
- E você ainda acha que ela vai ganhar o papel principal?
- Você não? – A olhei de lado. – Ambas sabemos que ela é uma das melhores dançarinas da Academy!
- E mesmo assim ela não foi a convidada pra fechar as apresentações do Snow Ball. – Cantarolou confiante.
- E nem eu fui chamada para o callback! – Respondi da mesma forma.
- Mesmo assim, você não sabe o resultado ainda! Ninguém sabe! – Eu sentia que %Abi% começava a ficar irritada com o meu pessimismo. – Você e o Zayn vão acabar ganhando os papéis principais e aí quero ver você admitir que eu estou certa!
- Com licença? – A moça que estava cuidando das minhas mãos chamou nossa atenção. – Eu não queria me meter, mas preciso dizer que você não deveria estar sendo tão negativa com algo que ainda nem aconteceu.
- Obrigada! – %Abi% estava agradecendo-a por concordar com ela. – Vai ver assim essa cabeçuda escuta.
- E mesmo que você não ganhe esse tal papel principal... – Foi a vez da manicure de %Abigail% se intrometer. – Não vai ser divertido pelo menos participar? Você tem que dar o seu melhor de uma forma ou de outra.
- Acho que vocês tem razão... – Me rendi.
- Qual é a peça, que mal lhe pergunte?
- Romeu e Julieta. – Respondi. – Eu fiz o teste para o papel de Julieta, mas ficarei feliz com qualquer um.
- Assim que se fala! – A minha manicure sorriu de forma engraçada e olhou para a minha amiga. – E qual papel você quer?
- Sra. Capuleto! – Fez cara de metida.
- E eu tenho certeza que você vai conseguir esse papel, %Abi%. Você é uma atriz incrível!
- Espero que as duas voltem aqui pra nos contar como foi esse resultado, porque vamos ficar torcendo. – A moça que cuidava dos meus pés falou pela primeira vez.
- Pode deixar!
Continuamos conversando animadas e aquelas manicures/pedicuras se mostraram bem curiosas. Nós não nos importamos nada de comentar e fofocar com elas, até mesmo respondendo as suas perguntas. Acho que é isso que as mulheres fazem ao ir em salões de beleza, né? Contar dos problemas para estranhos? Parece uma espécie de terapia, pra falar a verdade. Até que eu estava gostando muito de ter prometido a %Abi% que a acompanharia durante aquela tarde, sem falar que nós duas estávamos mesmo precisando de um tempo só pra nós duas.
Quatro mãos realmente trabalham mais rápido que duas, pois em mais ou menos vinte minutos nossas unhas já estavam bem cuidadas e pintadas. Eu pedi para a moça que estava fazendo os meus pés ter um cuidado dobrado, pois eu teria uma apresentação de dança importante e não podia ter nenhuma unha encravada e me incomodando. Ela entendeu perfeitamente o que eu quis dizer e fez uma massagem divina nos meus pés, daquele tipo que te deixa andando nas nuvens. %Abi% reclamou que eu estava tendo atenção especial, por isso acabou ganhando uma massagem também.
- %Abi%, você nem vai dançar amanhã! – Ri quando levantamos daquelas poltronas deliciosas.
- Mas vou ter que me aguentar em cima de um salto alto, ok? – Fez careta pra mim.
- Aham, tá bem. – Gargalhei.
- Uhh, se não é a minha ruiva preferida?! – Um homem super “alegre” apareceu do nada na nossa frente e abraçou %Abi%. – Há quanto tempo você não em aqui, meu bem?
- Jean Paul, meu cabeleireiro preferido! – Sorriu e olhou pra mim por cima do ombro dele. – Já faz um tempo, né? Mas hoje eu vim pra fazer uma super hidratação!
- Já estava na hora mesmo! – Se virou pra mim. – E quem é essa belezura?
- Essa é a minha amiga %Star%!
- Oi... É um prazer. – Estiquei a mão para cumprimentá-lo, mas ao invés de apertá-la, ele segurou a ponta dos meus cabelos.
- Virgem, com certeza! – Falou ao examinar meus fios castanhos e eu não soube nem o que falar.
- Como? – Arregalei os olhos e %Abi% riu da minha cara.
- Não é isso que você está pensando, pervertida. – Continuou rindo e Jean a acompanhou.
- Seu cabelo é virgem, querida. – Explicou com a voz cínica. – Nunca levou química, tinta, na-da.
- Ahh, sim! – Ri do quão idiota eu devia estar parecendo naquele momento.
- Mas nós vamos mudar isso hoje! – %Abi% devia estar louca!
- Ótimo! Já sei exatamente o que fazer... – Virou de costas pra nós e começou a andar. – Uhh, girl, você vai ficar um arraso!
- %Abi%, eu não vou pintar o cabelo! – Fiquei parada no mesmo lugar e ela segurou as minhas mãos.
- Por favor, %Tah%... O Jean é um cabeleireiro ótimo! E não vamos pintar o seu cabelo de verde ou algo assim! – Tentou me acalmar, mas só a citação de pintar o meu cabelo de verde me fez arregalar os olhos mais uma vez. – Calma! Você nunca quis dar uma mudada no visual?
- Já... Mas sempre acabei mudando de ideia. – Respondi sem acreditar muito que estava quase concordando com aquela ideia.
- Então pronto! Vamos começar devagar... Eu não vou te deixar ruiva como eu, não se preocupe. E se você não gostar, pode sempre voltar para o que era antes. – Ela estava disposta a me convencer.
- Eu não sei... – Continuei relutante.
- Você não vira britânica antes da primeira makeover! – Sorriu de orelha a orelha e eu senti que ela havia me convencido com aquele argumento.
- Nada muito exagerado, ok? – Rolei os olhos.
%Abigail% praticamente gritou e me puxou até a sala onde Jean Paul já separava amostras de tinta para que eu pudesse escolher. Como não tinha experiência nenhuma com aquele assunto e muito menos sabia qual cor combinaria mais comigo, decidi deixar tudo nas mãos da minha amiga e do cabeleireiro. Algo me dizia que eu iria me arrepender eternamente dessa decisão, mas já que estava na chuva, iria me molhar.
Deixei os dois discutindo o meu futuro e fui me sentar em uma cadeira giratória que ficava em frente à bancada de Jean, me olhando no espelho. Acho que aquele foi um momento de despedida, já que eu fiquei brincando com os meus cabelos castanhos e guardando na memória a forma e cor que eles tinham. “Isso vai ser bom, %Star%. Mudar faz bem...” a parte da minha consciência que gostava daquela ideia tentava confortar a parte que achava tudo aquilo uma loucura. Deixei aquela discussão interna assim que %Abi% se sentou na cadeira ao meu lado com um sorriso de satisfação nos lábios.
- E aí? – Perguntei com uma mordida no meu lábio inferior.
- Você vai ver quando estiver pronto! Sei que vai amar o resultado. – Aquela resposta deveria ter me tranquilizado, mas só me deixou mais apavorada ainda.
- %Abi%... – Choraminguei e Jean também se aproximou.
- Pronta para a mudança radical? – O homem perguntou super afeminado e eu escondi o rosto nas mãos. – Não fique assim, queridinha. Você vai gostar da sua primeira vez.
- Eu já ouvi isso antes e não foi o que aconteceu! – Falei nervosa, sentindo-o começar a separar os meus cabelos em partes. Eu estava com medo demais pra olhar.
Tudo bem que eu nunca havia pintado os meus cabelos antes, mas sabia um pouco como tudo funcionava. Jean andava de um lado para o outro, pegando potes e bisnagas com algo bem cremoso e misturava tudo em um potinho. Meu cabelo já estava completamente dividido e separado em várias mechas, me tranquilizando um pouco mais. Eu cheguei àquele momento na vida que você para e pensa: “Tudo bem, não tem mais jeito, eu estou mesmo fazendo isso.”, então tive que me acostumar com a ideia de que estaria completamente mudada em poucas horas.
Minha amiga se mostrou muito companheira enquanto tinha o cabelo dela cuidado por outra pessoa. Ela sempre estava me falando que tudo ficaria bem e que eu deveria confiar mais no bom gosto dela, coisa que eu achava muito difícil no começo. A gente se conhecia há o que? Dois meses? Três? Era tempo suficiente pra ela me conhecer e saber do que eu gostaria ou não, certo? Certo? Concordo!
- As senhoritas desejam alguma coisa? – Uma senhora bem simpática se aproximou e olhou para mim e para %Abi% com um sorriso maternal.
- Adoro essa parte! – Sorriu como uma criança que se preparava pra pedir um doce. – Eu quero uma daquelas rosquinhas que você trouxe pra mim da outra vez! E o que você quer, %Tah%?
- Ahn... Eu não sei! O que posso pedir?
- Qualquer coisa. – A senhora continuou sorrindo daquele jeito.
- Qualquer coisa... Qualquer coisa? – Achei difícil de acreditar que eu poderia escolher qualquer coisa.
- Qualquer coisa! – %Abi% não foi nem de perto tão paciente quando a moça. – Anda logo, %Tah%! Eu quero as minhas rosquinhas!
- Desculpa! – Nunca funcionei bem sobre pressão, mas teria que fazer o meu melhor. – Quero... Um frozen yogurt de baunilha e pêssego.
- Uhh, ótima escolha! – Jean me olhou pelo espelho e piscou. Eu começava a achar que aquele “uhh” era a sua frase de efeito.
- Eu volto já. – A moça anotou os nossos pedidos e se afastou.
- Você devia ter pedido as rosquinhas também. São divinas. – %Abi% levou a mão até os lábios como os italianos fazem quando a comida está muito boa, me fazendo rir.
- E você devia ter me falado isso antes de me apressar! – Briguei.
- Não tenho culpa se você demorou meia hora pra decidir o que queria! – Falou no mesmo tom.
- Meninas, calma... Não quero que destruam uma amizade tão linda bem aqui na minha cadeira. – Jean dramatizou mais do que devia e fingiu secar uma lágrima.
- Não se preocupa, J. – %Abi% sorriu. – É sempre assim.
- Podemos brigar, mas a gente se ama. – Também sorri e mandei um beijo pra ela.
- Vocês são lésbicas ou algo assim? – Sussurrou para nós.
- Não mesmo! – Gargalhei alto. – Nós temos namorados, ok?
- Você já conhece o meu Nialler! – %Abi% se fez de ofendida. – Ah, e ela é a namorada do Zayn.
- Uhhhh, girl! Aquele pedaço de céu na terra?
- Acho que é esse mesmo... – Respondi. É normal ter ciúmes de um cabeleireiro gay de meia idade?
- Psiu, %Tah%. – %Abi% me chamou e tinha uma revista em mãos.
- O que é... – Parei na metade da pergunta ao ver quem estava na capa da nova Elle. – CARINE!
- Você está apaixonada por essa mulher e ela ainda aparece justamente na capa da revista que eu pego pra ler? – Atirou o objeto na minha direção e eu o segurei.
- É o destino! – Ri da minha sorte e comecei a folhear aquela revista.
Senti que um dos indivíduos que estavam perto de mim comentaram algo comigo, mas eu estava distante demais pra escutar qualquer coisa. Passei as páginas rapidamente até encontrar o que eu estava procurando: A entrevista exclusiva com Carine Roitfeld. Eu não estava apaixonada por ela, como %Abi% havia brincado, mas vamos concordar que ela era um exemplo de mulher! Independente, bem sucedida, inteligente e, acima de tudo, muito simpática. Você pode achar que eu falo tão bem dela por causa de todas as coisas que ganhei da mesma, mas isso não é verdade. Eu continuaria a idolatrá-la mesmo se não pudesse nem ao menos pegar algo emprestado do closet da Models One.
- Aqui diz que ela está criando a própria marca de roupas! – Falei após ler um trecho da entrevista.
- Fascinante. – A outra menina fingiu bocejar. – Ela vai te dar mais roupas quando tiver essa marca própria?
- Eu espero que sim! – Ri interesseira. – Mas ficarei contente se ganhar pelo menos um convite para o desfile...
- Que chatice!
- Bom saber que você acha isso! – Tirei os olhos da revista para encará-la. – Se eu puder levar uma convidada, não será você!
- Uhh, girl! Me leva no lugar dessa boba! – Jean parou de passar um produto na ponta dos meus cabelos, me fazendo prestar atenção na cor que estava na ponta do pincel.
- Jean Paul, por favor, me diga que você não está pintando a ponta dos meus cabelos de azul! – Me desesperei.
- Claro que não, bobinha! – Riu, mas não me convenceu. – Não é só porque a química é azul que a cor da tinta também vai ser!
- Relaxa, %Tah%. – %Abi% também tentou me acalmar.
- Vou tentar... – Respirei fundo.
A voz na minha consciência começou a gritar que aquilo era uma má ideia e que eu não deveria acreditar em tudo que a minha amiga falava, mas já era tarde demais. Todas as mechas que Jean havia dividido do meu cabelo estavam enroladas com papel alumínio e esperavam a tal química fazer efeito. Pelo menos a minha raiz continuava intacta, então a mudança aconteceria só nas pontas. %Abigail% também tinha que esperar a hidratação fazer efeito, então continuou sentada ao meu lado enquanto nossos cabeleireiros foram descansar em outra sala. Não sei quem estava pior; eu com pedaços de alumínio no cabelo, ou ela com uma touca térmica que cobria quase a sua cabeça inteira. Acabamos rindo uma da outra e ainda bem que as nossas bolsas estavam longe, pois assim ninguém iria pegar o celular pra registrar aquele momento de vergonha alheia.
- Aqui está o que vocês pediram... – Aquela mesma senhora voltou e entregou uma caixa com rosquinhas para %Abi% e entregou-me o iogurte em seguida.
- Obrigada! – Agradecemos na mesma hora.
- Qualquer coisa é só me chamarem, sim? – A moça era muito simpática, mas em sua cabeça só devia estar passando: “Por favor, não me chamem mais.”
- Então essas são as rosquinhas que você acha tão gostosas? – Dei uma boa olhada na comida da minha amiga, que as escondeu. – Na França chamamos isso de Crueller.
- Que nome difícil! – Riu e nem ao menos tentou pronunciar. – Eu gosto de chamar de se-queria-provar-devia-ter-pedido-pra-você.
- Não quero mais, senhora egoísta! – Estirei a língua pra ela e me concentrei no meu delicioso doce, dando a primeira colherada. – Isso aqui sim tá bom!
- E como chamam yogurt em Parrí? – Perguntou.
- Em Parrí... Chamamos de yaourt. – Respondi com a boca cheia.
- Onde estão os seus modos, %Star%? – Riu de mim e eu abri a boca, mostrando a minha língua cheia de comida. – Eeeeeew! Que francesa mais mal educada!
- Besta. – Tive que rir. Até quando eu seria “a estrangeira”?
- Já que estamos falando nisso... – Engoliu um pedaço da rosquinha que mastigava. – É verdade que os franceses não tomam banho todos os dias?
- Você está mesmo perguntando isso? – Se há algo que eu nunca gostei são esses mitos regionais e infelizmente as pessoas só prestam atenção nos ruins. – É verdade que os ingleses bebem o dia inteiro?
- Alguns de nós bebem. – Riu, mas ao menos entendeu a minha indireta.
+++ - Pronta pra ver o resultado? – Jean Paul perguntou, mas eu ainda tinha os folhos fechados.
Depois que eu e %Abi% terminamos de comer nossos doces, ainda tivemos que esperar mais quarenta minutos até os nossos cabeleireiros voltarem e nos mandarem até o lavatório. Nós duas nos separamos pela primeira vez, já que os únicos lavabos disponíveis estavam bem distantes um do outro. Como era o único jeito, cada uma foi para o seu lugar e eu preciso admitir que aquela espécie de poltrona conseguia ser mais confortável que aquela em que eu tive minhas unhas feitas. Também reparei que Jean não foi quem lavou o meu cabelo, pois ele apenas ficou vigiando enquanto uma funcionária fazia o “trabalho sujo”, por assim se dizer. Claro que eu não me importei, pois ela parecia ter mãos de anjo e desembaraçou os meus cabelos milagrosamente devagar e ainda fez uma massagem relaxante no meu couro cabeludo.
Após toda essa lavagem, voltamos para o salão principal e eu sentei novamente na cadeira em frente à bancada de Jean, porém, de costas para o espelho. Pois é, eu realmente só poderia ver o resultado no final. %Abi% já estava pronta e com o cabelo bem seco assim que comecei a ter o meu secado por outras duas mulheres e o cabeleireiro chefe só dava dicas e palpites. A minha amiga e ele trocavam sorrisos que eu não sabia o que queriam dizer, mas a minha curiosidade só aumentava. Eu decidi fechar os olhos e só voltei a abri-los quando escutei aquela pergunta.
- Não tenho certeza! – Ri e ele girou a minha cadeira de frente para o espelho, mas não tinha nada de diferente... – Eu continuo do mesmo jeito...
- Espere até ver a parte de trás! – %Abi% voltou com aquele sorriso e Jean pegou um espelho menor pra poder me mostrar a parte de trás do meu cabelo.
- Voilá. – Exclamou e também sorriu.
- Wooooooooooow. – Acabei sorrindo também ao ver o resultado. Mexi nos meus fios, estudando a nova cor. A parte de baixo do cabelo estava bem clara desde a raiz, sendo que as outras mechas de cabelo estavam daquela cor apenas nas pontas. Era uma espécie de californiana avançada. Não estava nada natural, mas tenho que concordar que estava lindo. – Eu amei!
- Eu falei que você ia gostar. – %Abi% estava realmente certa... Como sempre.