Ballet Shoes


Escrita porElla Souza
Editada por Isabelle Castro


Capítulo XXII

Tempo estimado de leitura: 29 minutos

  O fim de semana chegou e trouxe com ele a preguiça. Passei praticamente o sábado inteiro lendo revistas na cama e atendendo as ligações de %Abi%, que sempre me fazia um convite e eu recusava todos. Não queria ter que tirar o pijama quentinho e sofrer em cima de um salto alto só porque ela queria ir para um bar, ou algo assim. Meu notebook estava aberto ao meu lado e de vez em quando eu passeava pelo Tumblr e Twitter, mas nada que me prendesse por mais de cinco minutos. Enquanto eu terminava de ler uma coluna sobre esfoliação de pele, uma janelinha apitou no meio da tela do meu computador. Me assustei mais ainda quando vi que era uma chamada no Skype e quem estava me ligando era Zayn.
  Eu não sabia muito bem o que fazer. Fiquei nervosa e afastei as revistas para o lado e coloquei o notebook em minha frente. Passei as mãos pelos meus cabelos e tentei arrumá-los da melhor forma que pude. Quer um conselho? Não lave o cabelo e depois passe a tarde inteira deitada em cima dele, porque o resultado final é um cabelo amassado e desgrenhado. O melhor que eu pude fazer foi amarrá-lo em um coque alto e torcer para que a minha webcam não me deixasse tão esquisita. Aceitei a chamada e esperei as câmeras carregarem.
  - Vas happening? – Zayn fez uma voz engraçada. Ele também estava no quarto dele, deitado de bruços na cama.
  - Oi, Malik. – Sorri. – Juro que ainda vou entender essa sua frase de efeito.
  - Se é frase de efeito, não precisa ser entendida. – Ele riu. – Só apreciada.
  - Hmm, que filosófico! – Também ri. – Tudo bem com você?
  - Tudo ótimo, %Tah%. E por aí?
  - Estou bem! Passei o dia inteiro sem fazer nada. – Gargalhei da minha preguiça e encostei em um travesseiro.
  - Eu percebi. O único jeito pra eu te ver hoje foi por trás de uma tela de computador. – Zayn mudou de posição e deitou de lado, apoiando o cotovelo na cama. Garotos que usam regata deveriam ser proibidos de flexionar o bíceps daquela maneira.
  - Eu sei, Z. Desculpa. – Fiz um bico de lado. – Sentiu a minha falta?
  - É claro que senti. Quem você acha que mandou a %Abigail% te ligar o dia inteiro?
  - Zayn Malik admitindo sentir falta de alguém? Isso é novidade pra mim. – Afastei um pouco o computador e me deitei de barriga pra baixo no colchão.
  - Você não é só alguém, %Tah%. – O sorriso que seguiu a sua fala me fez desejar estar ao lado dele naquele momento. Maldita preguiça!
  - Nesse caso... Por que você não passa aqui amanhã?
  - Eu já ia fazer isso mesmo, mas ainda bem que você me convidou. – Fez uma cara engraçada e eu ri.
  - Então você planejava aparecer aqui sem mais nem menos? E se eu estivesse com outro? – Perguntei me fazendo de séria, como se fosse possível acontecer algo desse tipo.
  - Ahh, é assim? – Ele também ficou sério. – Pode deixar que sempre que eu quiser te ver, ligarei com três dias de antecedência pra marcar horário. Não quero atrapalhar a sua agenda de compromissos.
  - Ai, meu Deus! – Ri alto e balancei a cabeça sem acreditar que Zayn estava realmente falando aquilo. – Para de ser idiota, Zayn!
  Nós dois rimos sem motivos por mais dez minutos. Eu não era muito fã de Skype ou outras redes sociais, porque não sabia como dar sequência a uma conversa. Se pessoalmente eu já era terrível em puxar assunto, por meios tecnológicos eu era pior ainda. Mas aquela noite com Zayn estava sendo mais do que agradável. Eu não estava mais preocupada com o meu cabelo bagunçado ou com a minha aparência desleixada, pois o que importava era a companhia.
  Uma buzina soou em um volume tão alto que até Zayn escutou do outro lado e se assustou. Devia ser o carro de algum dos vizinhos, já que o carro do meu irmão tinha um tom mais grave. Quando o som se repetiu mais quatro vezes, eu rolei os olhos e sentei na cama. Teria que ir ver que escândalo era aquele que estava acontecendo na frente da minha casa. Do jeito que aquele condomínio era cheio de frescura quanto a barulhos e regras da boa vizinhança o desavisado que continuava a “perturbar a paz” poderia se meter em problemas.
  - É melhor eu ir ver o que está acontecendo... – Tive até que falar um pouco mais alto para ser escutada.
  - Sem problemas, %Tah%. Te vejo amanhã? – Zayn sorriu e acenou um “tchau” cheio de vontade de me pedir pra ficar mais um pouco.
  - Com certeza! – Assoprei um beijo e observei o sorriso dele aumentar pela última vez antes de abaixar a tela do meu notebook e encerrar a nossa sessão no Skype.
  Ainda com um sorrisinho no rosto, eu levantei da cama e corri para fora do quarto indo escada a baixo. A buzina irritante não parava de gritar e a porta de casa estava aberta. Assim que vi Liam e Harry rindo de algo no jardim eu não sabia se devia ficar mais preocupada ou me tranquilizar. Provavelmente nenhuma das duas coisas. Me juntei a eles e antes que perguntasse o que estava acontecendo, obtive a minha resposta. Louis estava dentro de um carro vermelho. Ou melhor... Ele era vermelho por baixo de toda a lama e sujeira que o cobria.
  - Finalmente você apareceu! – Harry se virou na minha direção, mas eu passei direto por ele e fui até meu irmão.
  - Surpresa! – Louis ficou em pé, aproveitando que a capota do conversível estava abaixada.
  - O que é isso? – Eu também já sabia a resposta para aquela pergunta, já que reconheceria o meu carro até embaixo d’água. – O que aconteceu com o meu bebê?
  - Eu sei que ele está um pouco sujo... Mas pelo menos chegou, né? – Lou desceu do carro e foi até onde eu estava.
  - Um pouco sujo? Parece ele estava enterrado em um pântano! – Eu não estava fazendo drama, o carro realmente estava muito sujo. Mas Louis tinha razão, pelo menos meu carrinho já estava comigo novamente e eu não teria que depender de caronas ou ônibus. – Você sabe o que aconteceu pra demorarem tanto pra entregar? Paris não é longe daqui.
  - O dono da transportadora disse que tiveram alguns “problemas”, mas não entrou em detalhes. – Ele falou e me entregou as chaves. – Podemos levar ao lava jato amanhã e ele vai ficar novinho em folha.
  - Tudo bem. – Murmurei baixinho. – Vai ficar tudo bem, meu amor...
  - Ela está mesmo falando com o carro? – Escutei Liam perguntar para os meninos, mas preferi ignorar.
  - Você ainda não viu nada. – Harry foi quem respondeu. – Esse carro é realmente um bebê pra ela.

+++

  Do que adianta ser um domingo se você não consegue dormir até tarde? Foi com esse pensamento que eu acordei bufando naquela manhã. Não que eu estivesse irritada, muito pelo contrário, mas estava planejando dormir até a hora do almoço. Infelizmente a imagem do meu carro totalmente sujo estacionado ao lado de fora da minha casa me assombrava ao ponto de não me deixar dormir. Não, eu não sou uma louca por limpeza que chega a ter pesadelos se algo estiver minimamente fora do lugar, mas meu carro era algo precioso pra mim. Eu o tinha desde os dezessete anos, quando ganhei de meu pai como presente de aniversário. E não era só um veículo ou meio de transporte; era um símbolo de independência que me permitia ir para qualquer lugar sem precisar de ninguém. Como meus avós sempre confiaram muito em mim, eles não ficavam perguntando para onde eu ia ou de que horas estaria em casa novamente... Então era perfeito só pegar o carro e sair dirigindo sem destino. Por isso e outras coisas eu tinha um carinho e cuidado muito grande com o meu “bebê”, como gostava de chamar.
  Aceitando que eu não conseguiria voltar a dormir, me sentei na cama e levantei devagar. Caminhei até a janela e abri as cortinas. O Sol não estava brilhando no céu porque era coberto por nuvens acinzentadas, mas o dia não estava feio. Era apenas mais uma manhã normal e fresca. Estiquei os braços para me espreguiçar e uma idéia me ocorreu. Eu poderia usar aquela manhã que não estava tão fria para lavar o carro! Seria mais barato do que levar para um lava jato e eu com certeza teria mais cuidado e dedicação do que qualquer um. Além do mais, seria divertido. Fui até o banheiro e fiz a minha higiene matinal. Prendi os cabelos em um coque baixo e usei uma faixa para segurar a minha franja, partindo para o closet em seguida. Peguei o primeiro biquíni que achei em uma das gavetas e também vesti um short jeans por cima.
  Os outros moradores ainda estavam dormindo (sorte a deles!) então a casa inteira estava em silêncio. Desci as escadas tranquilamente até chegar à cozinha. Em algum lugar dali eu teria que encontrar produtos de limpeza. Comecei a procurar nos armários, vasculhando de um em um, até achar um balde, uma esponja e uma espécie de sabão líquido. Aparentemente eu tinha tudo que precisava para começar o meu trabalho. Parti para o lado de fora da casa e lá estava o meu carro coberto pela lama. Antes de qualquer coisa, usei o controle do carro para subir os vidros e a capota, já que pretendia lavar apenas o lado de fora. Achei a mangueira que usávamos para regar o jardim quando não chovia largada na grama e usei-a para encher o balde. Também usei o jato da mangueira para tirar o excesso de sujeira e boa parte da lama que já havia secado e formado algumas crostas duras que dariam muito mais trabalho para sair manualmente.
  Demorei pelo menos meia hora pra limpar as laterais do carro, incluindo os vidros e detalhes das portas. Minhas pernas tinham manchas de lama e meu corpo estava úmido. Não cheguei a ficar molhada literalmente, mas sempre que os respingos de água batiam na minha pele eu tinha um arrepio de frio. Com a esponja na mão, eu espalhei um pouco de sabão na tampa da frente do carro e comecei a esfregar. Meu braço estava doendo, mas eu não podia parar.
  - Bom dia, %Tah%. – A voz de Liam me fez virar em sua direção. Ele estava parado na varandinha de casa e tinha uma caneca na mão.
  - Bom dia, Leeyum! – Sorri, parando o que estava fazendo por um instante.
  - Acordou cedo hoje. – O menino ainda estava meio sonolento e começou a se aproximar. Eu pude sentir o cheiro do café que ele estava bebendo. – Você realmente não conseguiu esperar pra limpar o carro, né?
  - Você conseguiria? – Coloquei uma mão na cintura e ri baixo. – Meu carro é lindo demais pra estar todo sujo!
  - É realmente um bom carro... Conversível, fácil de dirigir e a direção é do lado esquerdo!
  - Graças a Deus é do lado esquerdo, porque eu nunca vou conseguir dirigir os carros ingleses. É estranho demais. – Me inclinei um pouco e voltei a trabalhar. Não tinha tempo a perder.
  - Já tentou? Não é tão ruim depois que você pega o jeito. – Liam começou a rodear o meu carro, estudando-o.
  - Uma vez só, mas, mas... – Bufei pela minha falta de argumentos. – Agora eu não preciso tentar!
  - Um dia eu te mostro e você vai ver que não é um bicho de sete cabeças. – Ele virou a caneca e terminou a sua bebida. – Quer ajuda?
  - Achei que nunca ia oferecer! – Eu ri. – É claro que sim. Você pode ficar com a parte de trás e eu termino essa que já comecei.
  - Tá bem! – Sem mais nem menos Liam tirou a camisa, ficando apenas de bermuda. Admito que o olhei na hora em que fez isso, mas desviei o olhar antes que ele notasse.
  O meu ajudante deixou sua caneca de lado, pegou a mangueira e começou a trabalhar. Eu estava bem concentrada no meu próprio serviço e limpava o vidro do carro. Muitas vezes eu tive que praticamente me deitar em cima do capô para alcançar os lugares mais afastados e acabava me molhando. Liam tinha sorte de ser alto, mas isso não o dava o direito de ficar rindo de mim quando eu quase escorregava por causa do sabão.
  - Hey, %Tah%. – Ele me chamou. – Está usando a esponja?
  - Por enquanto não... Troca pela mangueira?
  - Manda! – Liam pediu e eu atirei de qualquer jeito a esponja cheia de sabão pelo ar. Ele foi pego de surpresa, mas conseguiu pegar o objeto. O problema é que, com o susto, o menino acabou segurando com muita força e espirrou espuma no próprio rosto. – %Star%!
  - Desculpa! – Não consegui segurar o riso. – Você é que disse “manda”!
  - Mas não falei isso pra você jogar como uma doida! – Fez uma careta enquanto limpava o rosto.
  - Se você prestasse atenção, isso não teria acontecido. – Joguei a cabeça para trás e gargalhei alto. Minha barriga até doeu do tanto que eu estava rindo.
  - Pare de rir! – Liam reclamou e me pegou de surpresa ao apertar o “gatilho” da mangueira e espirrar uma quantidade razoavelmente grande de água em mim.
  - AI! – Gritei por não estar esperando aquele golpe baixo. – Isso não vale!
  - Ah, não é? – Algo no olhar dele me disse que eu não gostaria do que estava por vir.
  Ele mirou em mim novamente e tentou me acertar com o jato de água. Felizmente, pra mim, abaixei rápido o suficiente e consegui escapar. Liam não desistiu e correu atrás de mim, me fazendo correr na direção oposta a dele. Para ser mais exata, ele ficou de um lado do carro e eu do outro.
  - Liam, para de brincadeira! – Me abaixei usando a janela do carro como escudo. Ele estava rindo e eu também.
  - Não é brincadeira. É vingança! – Ele gritou e tentou me acertar novamente, correndo mais uma vez.
  - Sai daqui! – Gargalhei e também corri.
  Minha sorte é que a mangueira já não tinha mais como esticar e Liam teve que recuar. Aproveitei para dar a volta completa no carro e pegar o balde cheio que tinha deixado na grama. Não contei com a rapidez de Liam e senti a água gelada molhar a parte de trás do meu short e minhas pernas. Gritei mais uma vez e me virei pra ele. Na primeira oportunidade que tive, joguei a água do balde e o atingi em cheio. Pelo menos agora ele estava tão molhado quanto eu.
  - Você vai ver só! – Liam pegou a esponja que havia caído no chão e a jogou em mim.
  - Socorro! – Não sei exatamente pra quem eu gritei por socorro, mas naquela altura não estava preocupada em fazer sentido. Eu me cobri tentando proteger o meu rosto e a esponja acabou atingindo a minha barriga. – Fui atingida!
  - É assim que nos vingamos em Wolverhampton! – Comemorou todo cheio de si e eu peguei a esponja mais uma vez e a atirei nele. Acabei atingindo o seu rosto e Liam parou de me perseguir, cobrindo um dos olhos e fazendo uma careta de dor. – Meu olho!
  - Você tá bem? – Me preocupei de verdade, correndo até ele. – Li, me fala!
  - Ahá! – Ele gritou ao tirar a mão do olho. O sem graça estava brincando o tempo todo e eu havia me preocupado pra nada.
  Não sabia se batia nele por ter me assustado ou se corria dele. Optei por essa segunda opção e me virei de costas para tentar fugir. Liam foi mais rápido, pra variar, e me abraçou pela cintura, levantando os meus pés do chão. Foi uma cena bem parecida com o dia na piscina, quando ele me carregou e me jogou na água, mas a diferença era que ele não tinha onde me jogar, então ficou me girando enquanto eu me debatia e morria de rir. O mais forte também estava rindo e nenhum de nós notou que um carro prateado já havia sido estacionado atrás do meu e uma figura masculina se aproximava.
  - Parece que você não mentiu quando disse que estaria com outro. – A voz de Zayn fez Liam parar de girar e eu senti o estômago gelar de susto.
  - Você chegou! – Me separei de Liam e sorri para o recém chegado. Eu não havia me esquecido que ele viria me ver, só não sabia a hora que ele apareceria.
  - Hey... – Liam o cumprimentou um pouco tenso.
  - Cheguei sim. – Zayn ignorou o meu outro amigo e eu senti a tensão crescer ainda mais.
  - Liam estava me ajudando a lavar o carro. – Expliquei. Não que eu devesse alguma explicação, mas era óbvio que Zayn não havia gostado nada do que viu.
  - Eu vou entrar... – Liam falou baixo e se retirou. Não sei se ele queria não piorar as coisas ou se estava querendo evitar assistir alguma troca de carinho entre eu e Zayn.
  - Só porque eu cheguei? – Zayn comentou com ironia e eu o reprovei com o olhar.
  - Não faz assim! – Me aproximei. – Ter ciúme não combina com você.
  - Não é ciúme! – Reclamou, mas eu não o dei ouvidos.
  Fiquei na ponta dos pés e o segurei pelo rosto com as duas mãos. Não queria acabar entrando em uma discussão boba e, principalmente, estava com saudade dos lábios dele nos meus. Não me aproximei muito porque não queria molhá-lo também, mas Zayn não pareceu se importar ao me abraçar com força pela cintura. Eu sorri assim que nossos lábios se encontraram e fechei os olhos. Zayn devia estar tentando me engolir, porque deu início ao beijo com tanta vontade e quase violência que eu me assustei. Era o jeito dele de provar para si mesmo que eu estava com ele naquele momento e não pertencia a mais ninguém. Cada dia que passava, Zayn me ganhava e me conquistava mais um pouco. Eu já não conseguia tirá-lo do meu pensamento e as tais “borboletas no estômago” pareciam mais pombos gigantes. Eu tinha medo de dar nome àquele sentimento que estava florescendo e não queria me precipitar, mas às vezes era difícil ignorar. Preferi parar de pensar em qualquer coisa e apenas prestar atenção no nosso beijo. Eu retribui da melhor forma possível, mostrando pra ele que também tinha toda aquela vontade que ele sempre fez questão de demonstrar. Aos poucos a velocidade foi diminuindo, como se ele começasse a ficar mais calmo. Eu passei a mão direita entre os fios escuros do cabelo de Zayn e o abraço em minha cintura afrouxou, mas não se desfez. Quando as nossas respirações já estavam ofegantes, nos separamos com um pouco de relutância.
  - Eu preciso de um banho. – Foi a primeira coisa que eu consegui falar e Zayn sorriu cheio de segundas intenções.
  - Precisa, é?
  - Não nesse sentido, idiota! – Ri e dei um tapinha em seu ombro.
  - Não importa o sentido, %Tah%. Posso te ajudar em todos que você quiser. – Piscou.
  - Eu sei tomar banho sozinha, Malik. – Rolei os olhos, mas sorri. Me afastei e comecei a andar na direção da entrada de casa.
  - Você já me deu banho! – Ele me seguiu. – É justo.
  - Mas é diferente, porque você estava bêbado! – Aparentemente ele ainda iria insistir bastante.

+++

  “TOC TOC” Alguém batia na porta do meu banheiro pela quarta vez. Desde que eu comecei a tomar banho fui incomodada primeiro por Harry, avisando que chegou, em seguida Zayn veio perguntar se eu tinha me afogado e Louis foi o terceiro, mas eu não entendi muito bem o que ele queria. O importante mesmo é que todos eles estavam atrapalhando o meu momento de banho. Eu já estava vestida quando fui interrompida pela última vez, mas ainda estava secando o cabelo.
  - Quem é agora? – Perguntei alto o suficiente para o som da minha voz não ser abafado pelo barulho do secador.
  - Sou eu. – Liam respondeu.
  - A porta está destrancada, Li. Pode entrar. – Deixei o secador de lado e peguei a escova de cabelo.
  - Você está vestida? – Ele perguntou ao abrir a porta e espiar por uma fresta.
  - Não, Liam. Eu vou deixar você entrar aqui enquanto eu ainda estou pelada. – Ironizei, mas não fui grossa. – Claro que estou vestida, besta.
  - Só estava me certificando, oras! – Liam riu e entrou no banheiro. – Você está linda.
  - Mas eu nem estou arrumada! – Olhei o meu reflexo pelo espelho. Não, eu não estava “linda”; estava super simples. – É só um vestidinho...
  - %Star%, quando alguém te faz um elogio, você deve aceitar, sabia?
  - Desculpa. – Fiz um biquinho. Eu tinha essa mania chata de “não aceitar elogios”, ou não saber como responder a eles. – Então obrigada pelo elogio!
  - Bem melhor. – Cruzou os braços e continuou me olhando. – O Zayn falou alguma coisa?
  - Sobre o quê? – Assim que terminei de arrumar o cabelo e prender a minha franja de lado com uma presilha, comecei a passar o lápis de olho.
  - Sobre nós. Digo... Sobre mim, ou o que ele viu quando chegou.
  - Não falou nada, Li. Não precisa se preocupar com isso. – Coloquei o lápis de lado assim que meus olhos claros estavam bem marcados. Borrifei um perfume no meu pescoço e pulsos. – E também não tinha nada de mais...
  - Talvez pra você não tenha. – Ele falou baixo e eu o encarei.
  - Como assim?
  - Olha, %Star%... – Liam fechou a porta e nós ficamos dentro do banheiro. Eu não estava entendendo o que ele queria, mas seu olhar era sério. – Eu não consigo mais fazer isso. Não consigo mais fingir que não sinto nada por você.
  - Mas, Liam... – Tentei interrompê-lo, mas ele me fez parar de falar ao colocar o indicador sobre os meus lábios.
  - Por favor, me deixa terminar. – Falou em um suspiro e eu balancei a cabeça em afirmação. – Eu gosto de você, %Star%, muito. Você é uma garota incrível e eu nunca conheci ninguém assim, com todas as suas pequenas manias... Desde que eu te vi naquela estação de trem, não consigo pensar em outra coisa. Eu tentei não fazer disso uma grande coisa, por nós morarmos na mesma casa e você ser a irmã do meu melhor amigo, por isso me envolvi com a Candice. Mas não adiantou. Eu devia ter falado tudo isso antes e te chamado pra sair, mesmo que você dissesse não, mas eu fui um idiota por ter esperado até agora. E eu sei que você está com outro e não se preocupe, porque eu não vou fazer nada pra atrapalhar. Mas tenha certeza que eu não vou desistir.
  Eu não sabia o que responder, não sabia o pensar, não sabia o que fazer. Não esperava por aquela declaração e ele devia saber disso. Liam deixou um beijo na minha testa e saiu do banheiro com um pequeno sorriso. Devia se sentir aliviado, de certa forma, por finalmente descarregar tudo aquilo que estava guardando de mim. Minha maior preocupação é que aquilo mudasse a nossa amizade. Eu não queria que o clima entre a gente ficasse entranho e não queria ser tratada de forma diferente. Para mim as coisas estavam perfeitas como estavam. Também não queria ele me “esperasse”. Não seria justo com ele e nem comigo. Fiquei me olhando no espelho, estudando a minha expressão de espanto. Não nego que as palavras do meu amigo mexeram comigo, mas ao mesmo tempo eu preferia que Zayn tivesse falado aquelas coisas em seu lugar. Ótimo, eu estava confusa. Confusa com tantas coisas que nem mesmo conseguia definir o motivo da minha confusão.
  Como ficar ali sozinha não iria resolver absolutamente nada, resolvi sair do quarto e me juntar aos meninos. Assim que cheguei à sala, encontrei Zayn sozinho no sofá. Nenhum sinal dos outros três meninos, o que era muito estranho.
  - Olha quem finalmente apareceu! – Zayn sorriu ao se levantar e andar ao meu encontro.
  - Eu nem demorei muito. – Fiz um bico e o abracei assim que ele se aproximou o suficiente.
  - Tá tudo bem, %Tah%? – Me abraçou de volta e beijou o topo da minha cabeça.
  - Está sim. Porque não estaria? – Ri nervosa. Era melhor mudar de assunto... – Onde está todo mundo?
  - Eles foram para alguma praça, se eu entendi bem. Estão nos esperando lá. – Separamos o abraço e Zayn me guiou para a porta. – Vamos?
  - Ahh, sei qual é a praça! – Sorri ao me lembrar do dia em que Lou tentou me ensinar a andar de patins. – Vamos.
  Zayn me deixou passar primeiro e fechou a porta da minha casa assim que saímos. O jardim estava bem mais arrumado do que eu o havia deixado quando fui tomar banho e alguém tinha terminado de lavar o meu carro. Algo me dizia que eu já sabia quem. Fui despertada dos meus pensamentos quando Zayn segurou a minha mão e entrelaçou os dedos nos meus. Caminhamos de mãos dadas pela calçada enquanto eu indicava o caminho que deveríamos seguir para chegar até a praça. O garoto ria ao meu lado falando que aquele condomínio era enorme e que alguma celebridade deveria morar por ali e eu não sabia.
  - Quem sabe você se muda pra cá quando ficar famoso! – Brinquei. – E aí sim eu vou conhecer uma celebridade.
  - Quem disse que eu vou me lembrar de você quando ficar famoso?
  - É claro que vai! Como você acha que eu vou aparecer nas capas de revistas se não me aproveitar da sua fama?
  - Que aproveitadora! – Ele gargalhou. – Eu sei que você não faria isso.
  - E eu sei que você não esqueceria dos velhos amigos. – Soltei a mão do menino e o abracei de lado. Zayn passou o braço por cima dos meus ombros e continuamos o resto do caminho naquela posição.
  - Você acredita, %Tah%? Que um dia eu vou ficar famoso? Não só pela fama... Mas você acha que eu serei reconhecido pelo meu trabalho? – Zayn ficou pensativo e até um pouco aéreo. Eu teria dado tudo pra saber o que se passava naquela cabecinha.
  - É claro que sim! – Parei de andar ao notar que ele estava cabisbaixo. – É o seu sonho, não é? Então por que não daria certo? Você tem talento e pode conseguir tudo que quiser.
  - Eu queria ter essa sua certeza. – Ele encarou os próprios pés e eu fiquei na frente dele.
  - Hey... – Delicadamente apoiei o indicador embaixo do queixo bem definido de Zayn e o fiz olhar pra mim. – Eu não quero que você duvide disso, ok? Porque o seu futuro vai ser brilhante e qualquer um pode ver isso. Hoje você pode estar aqui... Mas amanhã vai estar no topo do mundo.
  - Você vai estar lá comigo? – Um sorrio apareceu enquanto ele me escutava. Zayn acariciava a minha bochecha com o polegar e nossas testas se encostaram.
  - Sempre. – Sussurrei.
  Fechei os olhos assim que o outro fez o mesmo e encostou os lábios nos meus. Ficamos naquele selinho por alguns segundos até começarmos a mexer os lábios e aprofundar o contato. Zayn desceu as mãos pela lateral dos meus braços e parou ao entrelaçar nossos dedos mais uma vez. O beijo não durou muito, mas foi o suficiente pra me provar aquilo que, no fundo, eu já sabia. Toda a confusão foi embora da minha cabeça e eu sabia o que queria; ele. Parecia certo, parecia “feito pra ser”. Demorei um pouco mais para abrir os olhos e, assim que o fiz, encontrei-o sorrindo pra mim. Um sorriso que falava mais que qualquer palavra, que qualquer declaração. Eu me sentia bem, confiante e feliz. Não sorrir de volta foi impossível.
  Voltamos a caminhar e não falamos mais nada. O silêncio que se estabeleceu entre nós era confortável e um quase podia ler o pensamento do outro. Trocávamos olhares de vez em quando e sorrisos cheios de significado surgiam.
  - Até que enfim vocês chegaram! – Louis foi o primeiro a notar a nossa aproximação. – Eu já estava indo atrás de vocês.
  - Preguiçoso do jeito que você é, Lou? Seria mais fácil você mandar o Harry. – Falei enquanto andávamos até a parte da grama em que os meninos estavam sentados. Eu evitei um pouco olhar para Liam, mas notei que ele segurava um violão.
  - Talvez. – Meu irmão riu e abriu a roda para que nós pudéssemos sentar com eles.
  Eu me sentei ao lado de Harry e Zayn sentou entre eu e Lou. Liam estava na minha frente e sorria como se nada estivesse acontecendo, o que me tranquilizou um pouco. Harry falou que eles estavam cantando e que Liam estava esperando para mostrar a nova música que tinha escrito. Eu me lembrava dele comentando que estava trabalhando em algo e que mostraria quando estivesse pronta, então aquele devia ser o momento.
  - Essa é aquela música que você estava escrevendo? – Perguntei.
  - É sim, %Tah%. – Sorriu, afinando o violão.
  - Você escreve muitas letras? – Zayn foi quem perguntou. Eu não me meti e deixei os dois conversarem, já que eu ainda queria ver os dois juntos em uma banda.
  - Algumas... – Respondeu simpático. – Eu geralmente escrevo usando experiências próprias como inspiração.
  - Isso é bom. Torna o sentimento mais autentico.
  - Dá pra vocês dois pararem de papo? Estou curiosa pra escutar essa música! – Cortei o assunto antes que fosse um pouco longe demais. Os dois só riram e Liam se preparou pra começar.
  - O nome é Loved you first. – Liam começou a dedilhar o violão e eu gelei ao escutar aquele titulo. Não deveria ser pra mim, não poderia ser pra mim.

Girl, it should be me driving to your house, knocking on your door, kissing you on the mouth.
(Garota, deveria ser eu dirigindo até a sua casa, batendo na sua porta e beijando a sua boca)
Holding on your hand, dancing in the dark.
(Segurando a sua mão, dançando no escuro)
‘Cause I was the only one who loved you from the start.
(Porque eu fui o único que te amou desde o começo)

  Liam cantou diretamente pra mim. Ele não se importava em deixar na cara, mas eu torcia para que Zayn não percebesse nada. Tentei desviar o olhar, mas não consegui. Eu estava presa naqueles versos.

But now when I see you with him it tears my world apart.
(Mas quando eu vejo você com ele, isso despedaça o meu mundo)
Because I’ve been waiting all this time to finally say it, but now I see your heart has been taken
(Porque eu estive esperando esse tempo todo pra finalmente dizer isso, mas agora eu vejo que o seu coração foi tomado)
and nothing could be worst.
(E nada podia ser pior)
Baby, I loved you first.
(Baby, eu te amei primeiro)

  Meu irmão olhava pra mim como se esperasse uma reação. Ele sabia que aquela música era pra mim e, por mais que eu não quisesse admitir, eu também sabia. Liam estava louco? Uma pessoa não pode simplesmente aparecer do nada e falar várias coisas que você não estava preparada para ouvir e depois cantar uma música como aquela. “I loved you first.”

Girl it should be me calling on your phone, saying you’re the one and that I’ll never let you go.
(Garota, deveria ser eu ligando no seu telefone, falando que você é a única e que nunca vou te deixar ir)
I never understood what love was really like, but I felt it for the first time looking in your eyes.
(Eu nunca entendi o que o amor era, mas pude sentir pela primeira vez olhando em seus olhos)
I had my chances, could’ve been where he is standing.
(Eu tive as minhas chances, podia ter estado onde ele está)
That’s what hurts the most, girl, I came so close but now you’ll never know…
(Isso é o que mais machuca, garota, eu cheguei tão perto e agora você nunca vai saber...
Baby, I loved you first…
(Baby, eu te amei primeiro)
Capítulo XXII
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