Ballet Shoes


Escrita porElla Souza
Editada por Isabelle Castro


Capítulo XIX

Tempo estimado de leitura: 24 minutos

  “BONG BONG BONG” era o que eu sentia na minha cabeça quando acordei naquela tarde de domingo. Parecia que eu ia explodir de tanto latejar de dor. Eu me mexi na cama e acabei esbarrando em alguém. Abri os olhos, assustada, mas logo vi que era %Abi% que também dormia ali. Eu não lembrava como tinha chegado na cama e muito menos como a noite passada havia acabado. Minha última lembrança era de estar conversando com %Abi% em um canto e Niall nos chamando pra jogar alguma coisa que envolvia shots de tequila.
  - %Abi%, acorda... – A balancei devagar, ainda meio sonolenta.
  - Sai, mãe. – Ela resmungou, me empurrando para o lado.
  - Eu não sou a sua mãe! – Gargalhei, me arrependendo totalmente em seguida. Qualquer movimento brusco que eu fizesse tornava a minha dor de cabeça pior. – Já passa das quatro horas da tarde, %Abigail%!
  - Não me chama assim! – Rosnou, mas pelo menos estava acordada.
  - Eu preciso de informações. – Falei ao me sentar devagar na cama. – O que aconteceu ontem?
  - Além de você ficar muito bêbada? – %Abi% virou de frente pra mim e riu. – Nada ruim aconteceu se é o que te preocupa. Até porque você tem uma amiga muito boa que cuidou de você a noite inteira.
  - Detalhes, %Abi%!
  - Ok, ok! Mas não grita. – Ela pressionou a testa com os dedos. Devia estar do mesmo jeito que eu. – Depois que nós bebemos muito naquela brincadeira que o meu Nialler inventou, fomos jogar twister. Mas preciso dizer que ninguém ganhou? Você também dançou em cima da mesa, aliás. Querendo tirar a roupa, mas eu não deixei.
  - Ai. Meu. Deus. – Peguei um travesseiro e o abracei, escondendo o rosto. – Mudança de planos, eu não quero saber de mais nada, ok?
  - É melhor mesmo... – %Abi% riu novamente eu quis entrar embaixo da cama e não sair nunca mais.
  Ficamos conversando na cama por mais alguns minutos até resolvermos tomar alguma providência com as nossas dores de cabeça. Com certeza meu irmão teria um pouco de energy juice para curar a minha ressaca. Saí do quarto com %Abi% ao meu encalço e descemos as escadas em direção à cozinha. Assim que entramos na sala de jantar, Liam apareceu com um sorriso impecável nos lábios. Ele não devia ter bebido tanto quanto eu.
  - Bom dia, princesa. – Liam me abraçou e beijou a minha bochecha.
  - Não seria ‘boa tarde’, Leeyum? – Retribuí o abraço e sorri.
  - Isso não é hora para sermos técnicos, %Tah%. – Ele riu, me soltando. – Seu remédio está em cima da mesa.
  - Cof cof. – %Abi% limpou a garganta nem um pouco discreta. – Bom dia pra você também, Liam.
  - %Abi%! Eu nem te vi aí. Boa tarde! – Liam coçou a nuca, acenando para a minha amiga.
  Nada de abraços para ela? Então tá. Fiquei rindo daqueles dois e peguei uma das duas canecas que estavam em cima da mesa. Apontei a outra para %Abi% e dei um gole na minha bebida. O gosto de tangerina era agradável, mas os outros ingredientes (desconhecidos, diga-se de passagem) que meu irmão colocava ali dentro deixavam o energy juice um pouco amargo. Não era a minha bebida preferida, mas fazia milagres. E não era só uma cura para a ressaca, mas também um energético muito potente. Lembrei da ceninha que Zayn fez na primeira vez que bebeu o energy juice e fiquei rindo sozinha. Meus amigos me olharam sem entender nada; %Abi% rolou os olhos, achando que eu estava louca, e Liam riu comigo, sem precisar saber do motivo. Porque, sim, ele era bobo assim; capaz de rir só porque você está rindo.
  Olhei em volta, prestando atenção pela primeira vez. Eu podia não me lembrar da noite passada inteira, mas sabia que havia acontecido uma guerra de comida. A sala, o corredor, a cozinha... Tudo estava limpo. Até mais limpo que antes, pra falar a verdade. Duvidava muito que qualquer um dos meus amigos tivesse se disposto a fazer uma faxina na casa. %Abi% parecia não notar nada de diferente, já que bebia da sua caneca e vazias caretas a cada gole.
  - Hey, Li. – Perguntei ao puxar uma cadeira para me sentar.
  - Sim? – Liam me olhou e eu terminei a minha bebida antes de continuar.
  - A fada da limpeza passou por aqui? – Perguntei com uma risada.
  - Eu sabia que tinha algo estranho aqui! – %Abi% notou finalmente e eu ri mais ainda.
  - Ahh, é verdade! Eu esqueci de contar... – Liam encostou o corpo na mesa e cruzou os braços. – Você conhece uma moça chamada Dorota?
  - Dorota? – Aquele nome não me era estranho... – Dorota! É claro! Ela foi a minha babá desde que eu nasci. Mas quando meus pais se separaram, ela voltou para a Inglaterra e eu só a via quando vinha passar as férias aqui... Mas o que isso tem a ver com a limpeza da casa?
  - Pelo que eu entendi, ela veio visitar e acabou ficando mais tempo pra limpar tudo. – Liam explicou. – E seu irmão está pensando em contratá-la pra trabalhar aqui.
  - Mas ela não pode trabalhar aqui como empregada... Dorota é da família. – Fiz um bico de lado e minha dor de cabeça já começava a diminuir.
  - Mas pode ser uma boa ideia, %Tah%. Porque eu não quero mais ser a sua babá. – %Abi% riu e eu fiz uma careta pra ela. Que menina chata!
  Minha melhor amiga também terminou a bebida dela e nós três fomos para a sala. Ficamos assistindo TV até que %Abigail% resolveu ir embora e eu e Liam ficamos sozinhos. Passamos mais um tempo assistindo desenhos e ele me levou até o seu quarto para me mostrar o seu último ensaio fotográfico. Eu comentava todas as fotos que ele me mostrava e apontava as coisas que gostava, ou que ele poderia melhorar; como iluminação e essas coisas. Mas é claro que o profissional ali não era eu e, apesar de tudo, Liam era um bom fotógrafo. Conversamos sobre várias coisas, mas Zayn não estava incluído em nada. Era como se Liam quisesse ignorá-lo e eu preferia assim. Ele me contou que, mesmo gostando do seu trabalho, também não era aquilo que ele achava que seria. Assim como Lou comentou um dia. Eu tinha certeza que os dois não ficariam muito tempo naquele estúdio e isso me preocupou. Liam só estava em Londres e longe de sua família por causa daquele emprego e a ideia de ele ir embora não me agradava em nada. Eu já estava mais do que apegada àquele menino que mais parecia um filhote de labrador e não o deixaria partir.

+++

  A segunda feira chegou mais rápido do que eu esperava e trouxe consigo as minhas aulas cansativas. A cada dia que passava, os professores pareciam cobrar sempre mais. Perdi a conta de quantas vezes tive que dormir com os pés enfaixados para não sujar a minha cama de sangue. Essa primeira aula foi aquela onde todos os alunos ficam juntos em um salão enorme. Por um lado eu gostava daquela aula, porque era uma forma de comparar o meu nível com o dos outros bailarinos. Mas por outro... Eu tinha que aguentar Brigitte durante uma hora e meia. Fazia de tudo para ignorá-la e ficar o mais distante possível da oxigenada, mas ela gostava de me provocar. Sempre estava tentando me atrapalhar e até me fez cair no chão quando eu estava na metade de uma pirueta. Todos os alunos viram aquilo, mas não havia nada que pudessem fazer. Eu já tinha ouvido falar que o mundo do ballet era muito competitivo, mas era a primeira vez que algo assim acontecia comigo.
  %Abi% e eu deixamos a sala de aula pra trás e eu tentava andar sem mancar. Sim, além de tudo, a vaca ainda me fez machucar o tornozelo quando me derrubou. Estávamos indo em direção ao refeitório quando Brigitte e as suas duas seguidoras passaram rindo ao meu lado. É claro que elas estariam indo pra lá também! Eu tentava ser forte, mas a cada passo que dava a pontada de dor que eu sentia me fazia lembrar o sorrisinho “eu sou melhor que você” que a loira dava toda vez que me olhava.
  - %Abi%, você pode ir até o refeitório sem mim? Não estou com tanta fome assim...
  - Tá brincando, %Tah%? – Paramos de andar e ela me encarou séria. – Você não fazer isso só porque a ridícula vai estar lá. Não pode fugir dela assim.
  - Eu não estou fugindo de ninguém! – Rolei os olhos. – Só quero ignorar a existência daquele desperdício de vida o máximo que eu puder.
  - Eu não vou conseguir te fazer mudar de ideia, né? – %Abi% já começava a pegar o jeito de como as coisas funcionavam comigo. Eu só afirmei que não e ela bufou. – Então pelo menos vai até a enfermaria e dá uma olhada nesse pé?
  - Vou sim. – Fiz um “x” no peito, como uma promessa.
  %Abi% disse que passaria lá pra me ver depois que comesse alguma coisa e eu fui em direção à enfermaria. Nunca tinha estado lá antes, mas foi fácil de encontrar graças às placas de informação. Uma enfermeira idosa, mas de aparência bem cuidada, me atendeu assim que eu entrei na sala. As ‘paredes’ eram de vidro, o que permitia a visão do lado de fora e vice versa. Aquela falta de privacidade me deixou um pouco desconfortável, mas eu também notei que tinha uma cortina de correr que protegia as duas macas hospitalares.
  - Em que posso ajudar, senhorita? – A moça sorriu pra mim.
  - Eu acho que dei um jeito no meu tornozelo, porque não consigo pisar direito... – Expliquei e apontei para o meu pé dolorido.
  - Vamos dar uma olhada nisso, minha querida.
  Ela estava sendo tão simpática comigo que eu fiquei super tranquila. Fomos até uma das macas e ela me ajudou a subir. Fiquei mais ou menos na metade do ‘colchão’ e a minha perna direita ficou esticada. Também tirei o meu sapato e agradeci não estar com a meia calça que ia até os pés, porque aquilo só iria complicar as coisas. A senhora Mary (descobri se nome depois de ler no crachá) tocou o meu tornozelo levemente e eu gemi de dor. Foi pior ainda quando ela girou o meu pé e eu senti como se ele estivesse se quebrando por dentro.
  - Desculpe, querida, não queria machucar.
  - Não tem problema... – Fingi ser forte. – É algo sério?
  Antes que a enfermeira pudesse responder, Zayn apareceu do nada e parecia que estava correndo em uma maratona, porque estava quase sem ar. Era a primeira vez que eu o via depois da noite de sábado e não conseguia lembrar nem de como havíamos nos despedido. Acho que aquele foi um dos motivos que me deixou tão nervosa quando o vi.
  - Que aconteceu? %Abi% falou que você quebrou o pé! – Ele estava tão preocupado que eu esqueci a minha dor por um momento e sorri.
  - E você não sabe como a sua amiga é exagerada, Zayn? – Ao ver que eu estava bem, ele pareceu se acalmar um pouco. – Não quebrei nada. Certo?
  - Certo. – Mary respondeu. – Não precisa se preocupar, a sua namorada está bem.
  - Eu não sou... – Fiquei vermelha quando a enfermeira usou aquele termo.
  - Ainda bem! – Zayn interrompeu quando eu tentei corrigi-la. – Mas o que ela tem?
  - Ela só torceu levemente o pé. Vê como está inchado? Essa moça tem que deixar o pé em repouso agora, então nada de fazer esforço. O que incluí ir pra casa agora.
  - Ir pra casa? Eu ainda tenho aula, não posso ir pra casa! – Me desesperei. Já tinha faltado uma aula e não queria perder outra.
  - %Star%, se a médica está falando que você não pode fazer esforço, você não vai fazer esforço! – Zayn falou todo autoritário e eu me senti uma criancinha.
  - Eu vou enfaixar seu tornozelo pra que você não force demais e pode deixar que eu levo um atestado para a secretaria. Não se preocupe, querida, isso não vai te prejudicar.
  Bufei baixo e cruzei os braços. A enfermeira pegou uma faixa e envolveu todo o meu pé direito, principalmente na região do meu tornozelo. Zayn só ria das caretas que eu fazia e eu já não sabia mais se era por causa da dor ou do jeito que aqueles dois estavam me tratando. Tudo bem, o “certo” seria eu descansar e não fazer esforço, mas eu não conseguia aceitar que Brigitte estava me fazendo perder uma aula importante. A senhora também me deu uma pomada que deveria aliviar o inchaço e prometeu que eu já poderia voltar a dançar no dia seguinte. Tive que prometer que ficaria de cama e me cuidaria direitinho.
  - Vamos? – Zayn pegou a minha mochila e passou por cima do próprio ombro.
  - Vamos pra onde? – O olhei sem entender.
  - Tem certeza que você não bateu a cabeça também? – Ele gargalhou. – Eu vou te levar pra casa, bobinha.
  - Não precisa, Zayn. Você ainda tem uma aula hoje e eu posso muito bem pegar um taxi. – Desci da maca quase caí no chão. Me apoiar em um pé machucado não era a ideia mais inteligente.
  - Você é mais importante que uma aula, %Star%. – Ele me segurou pela cintura, me impedindo de cair no chão. Antes que eu pudesse falar qualquer coisa, Zayn passou o braço embaixo dos meus joelhos e começou a me carregar.
  - Zayn! – Me segurei nos ombros dele. – Você vai me derrubar! Eu ainda consigo andar.
  - Dá pra ficar quieta? – Ele riu. – Eu não vou deixar você cair.
  Vendo que não teria muita escolha, o deixei me carregar para fora da enfermaria. Não vou negar que era bom sentir os braços fortes de Zayn ao meu redor e a visão que eu tinha de seu rosto era maravilhosa. Fomos nos aproximando da saída e %Abi% apareceu junto com Niall.
  - O que aconteceu com a minha pequena? – Ela falou, preocupada. Com certeza aquela cena de Zayn me carregando piorava as coisas.
  - Essa criança vai ficar de repouso e eu vou cuidar dela. – Zayn respondeu e rolei os olhos.
  - Estou de castigo, %Abi%! – Fiz um biquinho e o garoto aproveitou para colar os lábios nos meus, roubando um selinho. – Pode ser que eu comece a gostar disso.
  - Safada! – Niall brincou e nós rimos.
  - Eu te ligo mais tarde, ok? – Mandei um beijo para o casal.
  Quando passamos pela escadaria, Brigitte estava lá. Zayn nem ao menos virou o rosto, mesmo com os chamados dela. A oxigenada sempre competia comigo e tentava me sabotar, prova disso era o meu tornozelo machucado por culpa dela. E algo me dizia que me ver nos braços do ex-namorado dela não seria muito bom. Zayn me colocou dentro do carro e deu a volta pra entrar também.

+++

  - Até quando você vai me carregar? – Perguntei já mais calma e menos birrenta quanto Zayn me carregava escada acima. – Eu me sinto uma princesa.
  - Eu te carrego até quando você quiser, princesa %Star%. – Ele riu e eu passei as unhas pela nuca dele, acariciando. Notei que aquilo o deixou arrepiado e sorri.
  Entramos no meu quarto e ele me colocou delicadamente na cama. Para melhorar, Zayn ainda arrumou os meus travesseiros e colocou uma almofada embaixo do meu pé. Eu adorava ser mimada daquele jeito e com certeza ficaria mal acostumada.
  - Você precisa de alguma coisa? Quer água, ou algo pra comer? – Permaneceu parado ao lado da minha cama.
  - Zayn, eu não estou doente... – Eu o olhava, rindo. Bati no espaço vazio ao meu lado, para que ele sentasse. – Eu só quero você.
  - Me quer, é? – Sorriu sacana e eu percebi o sentido das minhas palavras. Ele tirou os sapatos e se deitou ao meu lado, com o cotovelo na cama e a cabeça apoiada na mão.
  - Não! – Gargalhei.
  - Nem um pouco? – O cafajeste aproximou o rosto do meu e eu olhei para o outro lado na mesma hora. Aproveitando que tinha o meu pescoço livre, ele roçou os lábios ali e me causou um arrepio. – Tem certeza?
  - Cala a boca. – Ri baixo e olhei pra ele novamente.
  Nossos rostos estavam tão próximos que eu não pude deixar de sentir o hálito quente de Zayn bater no meu rosto. Nos olhamos por uns segundos e eu o puxei devagar pela nuca, acabando com qualquer distância entre os nossos lábios. Começamos trocando alguns selinhos que foram se transformando em algo maior. Minha língua avançou um pouco e foi de encontro à dele. Trocamos brincadeiras e deixamos o beijo o mais lento possível. Era como se estivéssemos aproveitando cada momento, cada detalhe. Nada poderia nos atrapalhar, já que estávamos sozinhos em casa. Na minha cama... A coisa começou a esquentar demais quando eu senti aponta gelada dos dedos de Zayn traçando uma pequena linha na minha barriga, por baixo da minha blusa. Eu segurei a sua mão por reflexo e a afastei. O beijo parou quase no mesmo instante e meus olhos azuis se abriram devagar. Ele se afastou um pouco.
  - Desculpa... – Zayn falou enquanto estudava a minha expressão.
  - Não precisa se desculpar. – Eu sorri, passando a ponta dos dedos pelo rosto dele. – Só vamos com calma, ok?
  - Você é que manda. – Ele também sorriu e encostou os lábios nos meus mais uma vez. – Aliás, o que aconteceu com o seu pé?
  - Achei que nunca ia perguntar. – Ri, rolando os olhos. – Foi a sua querida Brie. Como você já deve saber, nós duas temos uma aula juntas. E hoje ela esbarrou “sem querer” em mim e eu dei um mau jeito no tornozelo na hora que caí.
  - Isso não foi legal da parte dela. – Zayn falou parecendo irritado. Já era a segunda vez que ela fazia algo contra mim e ele não gostava nada daquilo.
  - Mas deixa pra lá. Pelo menos não quebrou nem nada... – Mudei de assunto assim que pude. Ficar falando sobre a ex do cara que você está começando a se envolver não é legal.
  Era incrível como nós dois podíamos conversar por horas e parecia que apenas minutos haviam passado. Zayn me fazia rir de praticamente qualquer coisa que saísse da sua boca e eu adorava aquilo. Às vezes eu tinha impressão de que o conhecia há anos. Quem sabe de uma vida passada, não é? Ele acariciava os meus cabelos e eu repousava o rosto no ombro dele. Aquela era uma posição tão confortável que eu poderia pegar no sono a qualquer momento.
  - %Star%? Você escutou isso?
  - Hm? O quê? – Pisquei algumas vezes para afastar o sono.
  - Eu escutei um barulho lá embaixo. Seu irmão está em casa? – Assim que parei pra prestar atenção notei que de fato havia alguém no andar de baixo.
  - Não, ele e o Li geralmente só voltam pra casa a noite. – O olhei assustada. – Será que é assalto?
  - Fica aqui e eu vou lá ver...
  Zayn levantou da cama, mesmo que eu tivesse tentado impedi-lo. Desejei mais do que nunca estar com o tornozelo curado pra poder correr atrás dele. O garoto saiu do meu quarto, mas deixou a porta aberta. Ele parecia um espião, pisando com cuidado para não fazer barulho algum e olhava para os lados. Eu teria rido se não estivesse com tanto medo. Olhou pra mim fazendo um sinal de silêncio, levando o indicador até os lábios e sumiu da minha visão. O ouvi descer as escadas devagar e sentei na cama. Não conseguia mais ficar deitada. Meu susto aumentou assim que escutei um grito agudo vindo da cozinha. Mas não era um grito de Zayn e sim de uma mulher. O mais estranho é que ela começou a gritar por socorro e eu decidi que não ficaria ali sem fazer nada.
  Era mais difícil andar com o pé enfaixado porque eu não conseguia pisar direito. Resultado: Tive que sair do quarto e passar pelo corredor pulando como um saci e me apoiando na parede. A parte mais crítica foi de fato a escada. Se eu já tropeçava nela usando os dois pés, imagine daquele jeito. Escutei Zayn pedir calma para a intrusa da casa e ela ainda continuava gritando. O estranho que ela chamava ele de ladrão. Dorota! É claro que deveria ser ela. Lembrei do que Liam me falou sobre meu irmão querer contratá-la e era a única explicação que eu conseguia pensar. Terminei de descer a escada com vida e vi Dorota correr atrás de Zayn com um rolo de macarrão nas mãos. O coitado estava desesperado e, logo que me viu, se colocou na minha frente pra me proteger.
  - Essa mulher é louca, %Star%! Vá pra sala!
  - Não, Zayn... Ela não e louca. – Ri e passei na frente dele, deixando Dorota me ver e parar de tentar assassinar o meu amigo. – E ele não é um assaltante, Dora.
  - Pequena %Star%, como você cresceu! – A mulher largou o rolo de macarrão em cima da mesa e correu para me abraçar. Não correu literalmente, mas se aproximou de forma rápida.
  - É tão bom te ver! – A abracei de volta e Zayn continuou sem entender o que estava acontecendo. Dorota continuava do mesmo jeito que eu me lembrava, exceto pela maior quantidade de rugas em seu rosto.
  - O que você está fazendo em casa tão cedo? Lou me falou que você só chegaria na hora do almoço. – Ela olhou desconfiada para Zayn.
  - Dorota, esse é Zayn. Um amigo da Academy. Eu machuquei o tornozelo e ele me trouxe pra casa. – Expliquei e apontei para o meu pé enfaixado. Zayn me segurava pela cintura, me dando equilíbrio já que eu só tinha um pé no chão. – E, Zayn, essa é Dorota. Ou Dora, como eu chamava quando era pequena. Ela praticamente me criou.
  - É um prazer, Dorota. – Ele esticou a mão para que ela a apertasse.
  - Me desculpe por ter tentado te matar antes. – Dorota sorriu e os dois apertaram as mãos.
  - E a senhorita não deveria estar na cama? – Zayn me olhou.
  - Ora, me desculpe se eu tive que descer pra salvar a sua vida, monsieur.
  - Agora que já estou a salvo, vou te levar de volta. – Sem mais nenhuma palavra, ele me carregou novamente.
  - Eu vou fazer algo pra vocês almoçarem, tá bem? Já que eu vim aqui pra preparar um almoço surpresa para a minha pequena %Tah%, mas foi ela quem me surpreendeu. – Dorota parecia falar sozinha e já foi para a cozinha.
  Zayn estava me carregando de volta para o quarto, mas eu pedi para ficarmos na sala mesmo. Pelo menos lá tinha televisão e seria mais fácil pra ir comer quando o almoço já estivesse pronto. Como não tinha nenhum programa interessante, acabamos decidindo escolher um filme. Zayn riu da minha coleção, falando que eu só tinha musicais e filmes de romance. Até que não era mentira, mas falando assim parecia que eu era uma adolescente melosa. Não tenho culpa se amo filmes de terror, mas prefiro alugá-los de vez em quando do que comprar e só assistir uma vez. O moreno pegou a capa do filme “Diário de uma paixão” e disse que nunca havia assistido. Eu fiquei espantada, porque aquele era o meu filme preferido de todos os tempos. Já sabíamos o que assistir! Zayn relutou no começo, mas eu fiz chantagem emocional e ele acabou aceitando.
  Como sempre fui muito folgada, simplesmente deitei no sofá e passei as pernas por cima de Zayn. Ele não se importou nem um pouco e até fez massagem no meu pé machucado. Assistimos o filme e algumas vezes eu sussurrava as falas dos personagens mesmo sem perceber. Na verdade quem notou aquela minha mania foi Malik. Fiquei com muita vergonha e tentei me controlar pra não repetir aquilo. Pausamos o filme assim que Dorota nos chamou para comer. Não deixei Zayn me carregar dessa vez e ele só me ajudou a ir pulando até a mesa.
  A comida de Dora só perdia para a da minha avó. Posso dizer que Zayn também gostou, porque repetiu o prato duas vezes. Ele amava frango, então adorou aquela refeição. Dorota sentou-se à mesa com a gente, querendo saber das “novidades”, do que eu estava achando da cidade e blábláblá. Zayn também entrou na conversa e disse que seria o meu guia turístico. A minha babá percebeu que tinha algo acontecendo entre nós dois e até perguntou se estávamos namorando. Eu quase engasguei com o suco e respondi que não antes que Zayn pudesse fazer qualquer comentário capaz de me deixar vermelha de vergonha.
  Liguei para Louis e avisei do que tinha acontecido com o meu pé, porque ele reclamaria de eu não ter contado antes de ele chegar em casa e todas essas cosas de irmão mais velho. Eu disse que estava em casa, mas omiti a parte que Zayn estava comigo ali. Conhecendo Lou, ele ficaria pensando milhares de besteiras e acabaria se atrapalhando no trabalho que já nem estava tão bom assim. Eu e o meu acompanhante do dia terminamos de assistir o filme e, pra variar, eu estava chorando com a última cena. Zayn riu de mim no começo, mas ao ver que eu realmente estava emocionada, ele me abraçou.

Capítulo XIX
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