Ballet Shoes


Escrita porElla Souza
Editada por Isabelle Castro


Capítulo LVI

Tempo estimado de leitura: 45 minutos

  Pela primeira vez em dias eu consegui dormir até as 13hrs da tarde. E ainda teria ido mais longe se uma criatura peluda não me tirasse do sonho bom que eu estava tendo. %Patch% não gostou tanto da sua caminha quanto eu esperava, por isso preferiu passar a noite inteira na minha. Perdi a conta de quantas vezes acordei com um focinho gelado na minha orelha, ou algo mordiscando o meu pé. No geral o filhote não deu trabalho algum, porém, o único problema era que ele conseguia descer da cama, mas não subir. Então sempre que o pequeno pulava pra fora e resolvia querer voltar, começava a chorar e eu tinha que puxá-lo de volta.
  Foi exatamente assim que ele me acordou aquela tarde; choramingando e cavando o colchão. Ele estava de pé, com as patas dianteiras apoiadas na cama e tentava pular, mas não conseguia. Se qualquer outra pessoa tivesse me acordado, eu teria reclamado e ficado de mau humor, mas com %Patch% foi totalmente o contrário. Acabei rindo e o puxei para a cama mais uma vez. O bichinho queria brincar, então começou a correr pela cama como um foguete e balançava o rabo e fugia quando eu tentava pegá-lo de novo.
  - Você já acorda animado, Bo? – Falei com %Patch% sem esperar muito uma resposta. – Quer brincar? Cadê o brinquedo?! Pega o brinquedo ali...
  Apontei para o cachorro de pelúcia marrom, esperando que fosse buscá-lo e nada aconteceu. %Patch% continuou pulando como um louco e eu comecei a imaginar o que ele acharia de brincar em uma cama elástica. Desistindo de pedi-lo para pegar o brinquedo, deixei a preguiça de lado e me coloquei de joelhos na cama, pegando-o eu mesma. O filhote pareceu entender esse meu movimento, pois pulou em cima do bichinho pra impedir-me de pegar. Fui mais rápida e começamos a brigar pelo ursinho de pelúcia. Ele parecia uma criança e com certeza tinha a energia de uma.
  Teríamos continuado com a brincadeira se o meu celular não tivesse começado a vibrar em cima da minha mesinha de cabeceira. Joguei o bichinho de pelúcia no canto do quarto e %Patch% ficou louco, indo atrás do brinquedo. Gargalhei divertida, encantada com tudo que ele fazia. Busquei meu celular pra ver quem me mandava uma mensagem tão cedo assim e sorri ao ver o nome da minha madrasta na tela. Ela devia estar querendo saber o que eu tinha achado dos presentes e possivelmente arrancar algum comentário sobre a reação de Zayn. Abri a mensagem e me deparei com uma foto de Lux usando o suéter que lhe dei de presente.

“Olha quem amou o presente! Ela não o tira desde ontem. (x)”
“Ficou perfeito! Ela gostou das sapatilhas também?”
“Gostou tanto que já disse que quer ser bailarina quando crescer.”
“Missão cumprida! Haha. Aliás, obrigada pelos presentes! Lou também amou o iPad.”
“E você? Só gostou do iPad?”
“Não... Eu gostei dos outros também. Você adivinhou o que eu estava precisando.”
“Toda garota com um namorado bonito como o Zayn precisa estar sempre com coisinhas novas, se é que me entende.”
“Só me diga que meu pai não sabe nada sobre isso! Eu não quero que ele faça certos comentários da próxima vez que me ver.”
“Nós mulheres temos que nos unir, %Tah%. Pode ficar tranquila que será o nosso segredo.”
“Obrigada! Ahh, diga para Lux que ela vai ter um amiguinho pra brincar quando vier aqui de novo! (x)”

  Enviei uma foto que tirara de %Patch% na noite passada e pude imaginar a animação da minha irmãzinha ao descobrir que eu tinha um cachorro fofo com quem ela poderia brincar. Não quem se cansaria primeiro, mas minhas apostas estavam em Lux. Parei de me comunicar com Rachel assim que meu relógio biológico apitou e eu tive que me levantar para ir até o banheiro. %Patch% me seguiu e tentou morder meus pés, ainda querendo brincar. O ignorei por um momento, já que precisava me aliviar. Acendi a luz do banheiro e me deparei com uma pequena poça no meu tapete branco. Coloquei as mãos na cintura e olhei para o cachorro ao meu lado, que balançava o rabo como se não tivesse nada a ver com aquilo. “Pelo visto mais alguém se aliviou aqui!” Eu poderia brigar com %Patch% para começar a educá-lo, mas algo me dizia que ele não entenderia nada. De acordo com um dos panfletos que Liam arrumou na Pet Store, não adiantava brigar com os filhotes horas ou minutos depois que eles fizeram a coisa errada, pois não iriam se lembrar. “Bem, pelo menos não foi no meu carpete.” Dei de ombros.
  Não me importei em ser observada por %Patch% enquanto fazia a minha higiene matinal e escovava meus dentes. O cachorro também pareceu um pouco entediado enquanto eu deixava os pijamas para trás e vestia algo mais casual. Ou seja, um short jeans com estampas floridas e uma camisa listrada de mangas compridas. Nos pés, uma sandália com apenas algumas tiras. Deixei o cabelo solto, mas usei uma faixa para segurar a franja. Ainda no closet, peguei a coleira azul de %Patch% e me virei para sair.
  - Quem quer passear? – Falei com o cachorro afinando a minha voz e ele pulou mais uma vez. – Ok, acho que o seu nome deveria ser Jumper. Vem cá, vem cá.
  Bati nas minhas pernas esperando que %Patch% se aproximasse, mas isso também não aconteceu. O cachorro era meu há quase dois dias e eu não esperava que ele fosse começar a me obedecer imediatamente, mas eu podia tentar, né? Quem sabe com a minha repetição constante ele não acabaria pegando o jeito? Ao menos consegui mantê-lo parado para encaixar a correia na coleira em volta de seu pescoço e estávamos prontos pra ir passear. Com um puxão, %Patch% me arrastou até a porta e esperou pacientemente que eu a abrisse para que ele pudesse passar. “Quando esse cachorro crescer eu vou ter problemas, porque ele já é forte agora!” Balancei a cabeça com uma risada e também saí do quarto, guardando o meu celular no bolso.
  - Boa tarde, %Tah%! – Harry estava no corredor quando eu passei e beijou a minha bochecha. – Indo passear?
  - Nosso primeiro passeio como mãe e filho! – Sorri enquanto %Patch% balançava o corpo inteiro para cumprimentar Haz.
  - Aproveite o ar livre, pequeno. – Se curvou e fez carinho no filhote.
  - Onde estão os meninos? – Olhei em volta, investigando os quartos de Liam e Louis com os olhos, mas nenhum deles estava por ali.
  - Foram jogar futebol no campo. – Massageou o peito como se sentisse uma dor ali.
  - E por que você não foi junto?
  - Não estou me sentindo muito bem... – Como se para dar ênfase ao que falava, um espirro escapuliu. – Acho que é gripe.
  - Awn, eu sinto muito, Hazza! – Fiz carinho em seu ombro. – É melhor você ir deitar... Quando eu voltar te faço um chá bem quentinho.
  - Obrigado, %Tah%. – Fungou.
  Nos despedimos com um abraço, pois %Patch% estava impaciente. Harry realmente não parecia nada bem, pois seus olhos estavam fundos e o nariz vermelho como o de um palhaço. Meu instinto me pedia pra ficar e cuidar dele, mas agora eu tinha novas responsabilidades. Huskys são conhecidos por serem ativos e precisarem de constante exercício, especialmente nos tempos frios. Então eu aproveitaria que os outros meninos da casa estavam jogando futebol e iria fazer-lhes uma visita no campo. Comecei a descer as escadas, mas algo ficou pra trás. Olhei para o meu cachorro que esticava uma patinha na minha direção como se pedisse ajuda.
  - Ainda não consegue descer, huh? – Subi três degraus e o peguei no colo. – Pular da cama e descer degraus não é tão diferente assim, Bo.
  Não resisti e enchi o filhote de beijos. Seu pelo era macio e deslizava entre os meus dedos, tornando muito difícil soltá-lo. %Patch% pareceu retribuir os beijos, pois lambeu o meu pescoço e acabou espirrando com o meu perfume. Foi um espirro curto e agudo, quase como o som dos seus latidos. O mantive em meus braços até atravessar o hall e sair de casa. Teria continuado acariciando meu bichinho se ele não tivesse ficado tão animado ao ver que estávamos do lado de fora e quase se jogou dos meus braços para ir até o chão. “Já entendi, já entendi!” O coloquei no chão depois de checar sua coleira mais uma vez e ele disparou pela calçada. Quase perdi o braço com o novo puxão que levei, mas o segui.
  Colocando exageros de lado, deixei %Patch% me guiar enquanto ia conhecendo o condomínio. Ele parava aqui e ali, marcando seu território – se por assim dizer – e eu o esperava terminar. Seria uma boa ideia treiná-lo para apenas fazer as suas necessidades fora de casa, pois isso pouparia muitos dos meus tapetes. O único ponto negativo disso é que nos dias de chuva eu não poderia levá-lo para passear. A não ser que colocasse galochas e uma capa de chuva em %Patch%! Consegue imaginar como ele ficaria lindo? Porque eu consigo. Assim o clima de Londres não afetaria a rotina que eu começava a criar.
  Depois de quase dez minutos de tanto andar e parar, consegui chegar à área da piscina e do campo de futebol, onde Liam e Louis jogavam. Pelo que pude ver, Liam era o goleiro e se atirava na grama verde sempre que Louis chutava a bola na direção do gol. Como já era de se esperar, meu irmão acertava a maioria das vezes e Liam batia na grama e se curvava sobre ela em protesto. Acabei rindo alto demais daquela cena, o que delatou a minha chegada. Os meninos acenaram e eu corri até lá com %Patch% em meu encalço. Passei pela grade entrada da quadra e, aproveitando que o lugar era todo cercado, soltei a cólera para que meu pequeno pudesse correr livre.
  - Olha quem apareceu! – Liam se jogou na grama mais uma vez, fazendo %Patch% correr até ele pra ver o que estava acontecendo.
  - Quem está ganhando? – Me aproximei de Lou e passei um braço em volta de seus ombros.
  - Eu, é claro. – Se gabou e me envolveu pela cintura. – Quer jogar?
  - Vá para o gol, Tommo! – Pisquei confiante.
  - Vamos lá, Tomlinson. Me deixe orgulhoso. – Lou bateu no meu ombro e correu para o gol da direita, já que o da esquerda estava sendo ocupado por Li e %Patch%.
  O respondi com um “Pode deixar” convencido, mesmo que toda a minha convicção não passasse de uma fachada. Eu não era tão boa assim com esportes, mas ainda sabia chutar uma bola, então não devia ser tão difícil assim, certo? Me abaixei para desatar a minha sandália e fiquei descalça, sentindo a grama fria sob a sola do meu pé. Louis já pegara as luvas de goleiro e se aquecia fazendo algumas flexões. Tantos anos convivendo com o garoto me ensinaram que aquilo não passava de uma tentativa de me intimidar, porém, eu também sabia o quanto ele era bom naquele jogo. Estralei os dedos e girei a cabeça para me alongar.
  Corri até onde a bola estava posicionada no campo, há alguns metros do gol, e parei. Dei alguns pulos sem sair do lugar e em seguida treinei como a chutaria. Devia ser algo bem engraçado de se ver, pois Lou gargalhou na minha direção e flexionou os joelhos, esperando a minha bomba. Cheguei a assistir alguns jogos de futebol na TV, mesmo que não entendesse quase nada, e tentei uma “manobra” que muitos jogadores pareciam saber executar com perfeição. Para resumir, fingi que ia chutar para um lado e acabei chutando para o outro. Como era de se esperar, Lou segurou a bola, mas não precisou fazer muito esforço. Falhei miseravelmente ao chutar e o meu lance foi mais fraco do que eu esperava. Pra completar meus dedos ainda ficaram doloridos por terem pegado de mau jeito no objeto redondo.
  - Uau. Essa foi uma jogada ótima! – Lou foi irônico e gargalhou.
  - Eu sou uma dançarina, ok?! – Tentei justificar a minha falta de talento naquele esporte. – Quero ver você fazer um sissone!
  - Wow, wow... Não precisamos entrar em xingamentos aqui. – Liam se aproximou. – O problema é que você está chutando errado.
  - Como alguém chuta errado, Leeyum? – Cruzei os braços.
  - Você está chutando com a ponta do pés. Não com a palma. – Apontou para o próprio pé, ilustrando o que queria dizer.
  - Ah... – Afirmei com a cabeça e depois fiz careta. – Hã?
  - Ok... Vou deixar vocês aí e impedir o meu sobrinho de comer aquela borboleta. – Lou me fez olhar na direção de %Patch%, que perseguia uma pobre borboleta que voava baixo. – E essa é uma frase que eu nunca pensei que fosse dizer.
  - Vou te mostrar, %Tah%. – Liam conseguiu a minha atenção novamente quando Lou saiu correndo para brincar com o meu filho. – Espera aqui.
  - Tá bem... – O observei correr até onde Louis largara a bola de futebol e a pegou.
  - Pronto. – Voltou para onde eu estava e deixou o objeto na minha frente. – O que você tem que prestar atenção é que não pode chutar de qualquer jeito. Tem que calcular o ângulo.
  - Calcular o ângulo! Saquei. – Afirmei com a cabeça e me preparei para chutar quando Liam me fez parar. – O que?
  - Você ainda está fazendo errado! – Riu e me puxou com cuidado até se posicionar atrás de mim. Perto demais. Seu pé se moveu atrás do meu e tive que me segurar em seus braços pra não perder o equilíbrio. – Sente isso?
  - Eu sinto a sua perna... – Respondi agradecendo mentalmente por estar de costas pra ele, dessa forma Liam não podia ver o rubor em minhas bochechas. Usando a própria perna, ele movimentava a minha para frente e para trás.
  - Abra o pé um pouco mais... – Aconselhou enquanto aparava a minha cintura.
  - Como se abre um pé, Liam? – Gargalhei. – Tem um bisturi aí?
  - Não assim, sua besta. – Também riu. – Dobre o pé!
  - Não está facilitando! – Ri mais uma vez e Liam decidiu sair de trás de mim e se ajoelhar para me mostrar o que eu deveria fazer com o pé. – Só isso? Porque não falou antes?
  - Eu tentei! – Se levantou e ficou ao meu lado. – Agora tente chutar. Não esqueça de colocar toda a sua força em uma perna só.
  - É melhor se afastar!
  Adverti com uma risada e o observei me obedecer. Assim que todos estavam à uma distância segura do meu pé, fiz o que Liam ensinou e “dobrei” o pé para pegar um bom ângulo. Bati na bola com a palma do pé e acertei o gol. É claro que era bem mais fácil quando não tinha nenhum goleiro por ali e só o que eu fiz foi chutar pra frente, mas mesmo assim! A bola pegou bem mais velocidade do que na minha primeira tentativa e não saiu do rumo que eu a mandei. Quando a rede branca começou a balançar, dei um grito de felicidade e corri até Liam, literalmente pulando em seus braços.
  - Eu consegui! Eu consegui! – Abracei Liam pelo pescoço. – Obrigada!
  - Eu só te ensinei a chutar! – Riu, mas me abraçou de volta, demorando um pouco demais pra me soltar.
  - Acho que mereço uma volta olímpica, não? – Perguntei torcendo para que ele dissesse que sim.
  - Vá em frente. – Deu espaço para que eu pudesse passar.
  Comecei a correr em volta do campo com os braços abertos, enquanto cantava a música tema das Olimpíadas. Eu estava me animando demais por uma coisa tão simples, mas não me importei. Talvez fosse %Patch% que me fazia ficar boba assim, talvez a alegria do filhote liberasse o melhor de mim. Rimas à parte, passei correndo por Lou e pelo animal. Quando me dei conta, os dois começaram a correr atrás de mim e a minha volta olímpica se transformou em uma corrida pela minha vida. %Patch% conseguia ser mais rápido que nós dois e acabou me alcançando e se misturando com os meus pés. Acabei tropeçando para não pisar nele e fui ao chão. Louis foi o primeiro a começar a rir e Liam o seguiu. O filhote não me mordeu nem nada parecido, mas voltou a me atacar com aquelas lambidas que começavam a me fazer cócegas.

+++

  - Alou? – Zayn atendeu a minha ligação no terceiro toque.
  - Hey, baby! Sou eu. – Sorri inconscientemente por escutar a sua voz. – Tudo bem?
  - Estou sozinho em uma casa enorme... Só estaria melhor se a minha namorada estivesse aqui. – O escutei sorrir do outro lado. – Quer vir me fazer companhia?
  - Não sabe como eu gostaria de poder ir! – Ri e me sentei na cama com cuidado para não amassar o vestido. – Daqui a pouco Nick vai passar aqui e vamos ao Ballet.
  - Ugh, esse Nicholas. Eu não vou com a cara dele, sabia? – Bufou, me fazendo imaginar a sua cara de irritado.
  - Quem não sabe disso, Malik? – Rolei os olhos com um sorriso nos lábios. Eu adorava vê-lo com ciúmes. Ou ao menos escutá-lo, como era o caso. – Aliás, seu filho sente a sua falta!
  - %Patch%? Ele está aí com você?
  - Agora não... Lou está mantendo-o entretido pra que ele não resolva brincar com o meu vestido. – Passei as mãos pelo tecido felpudo do meu vestido de gala. Até que pra quem teve apenas um dia para arrumar uma roupa apresentável, eu estava bem bonita. – Esse menino não cansa nunca! Você tinha que ver o quanto ele correu hoje a tarde no campo!
  - Ele está te dando trabalho, huh? – O escutei gargalhar. – Ainda prefiro ver o que você está vestindo. Nada muito curto, eu espero.
  - Zayn Malik acha que vai controlar o que eu uso? – Balancei a cabeça com os olhos semicerrados. – Mas para a sua informação... Estou bem comportada.
  - Muito bem! E não é que eu queira controlar o que você usa, só acho justo não estar tão atraente quando for sair com um cara que não seja eu. – Falou como se tivesse toda razão do mundo. – O que é bem impossível.
  - Não seja bobo, Zayn! – Ri e alterei a minha voz para algo mais travesso: - Agora porque não me conta o que você está usando?
  - Só uma bermuda preta... Sem camisa... – Falou devagar, sabendo que me provocaria.
  - Aquele convite pra ir até aí ainda está de pé? – Mordi meu lábio inferior.
  - Deixarei a porta aberta. – Escutei sua risada rouca. – Aliás, você deveria ter uma cópia da chave.
  - Claro! E a sua mãe acharia isso muito normal. – Ri. O que Trisha faria se o filho desse a chave da casa para a namorada de apenas dois meses? – Vamos fazer assim... Quando você sair de casa e for pra um lugar só seu, aí sim você me dá a chave, ok?
  - Anjo, quando eu sair de casa você vai morar comigo. – Disse como se aquela fosse a decisão mais simples do mundo.
  - Está me chamando pra morar com você? – Me fiz de surpresa.
  - Estou te pedindo pra casar comigo. – A voz de Zayn saiu quase séria demais.
  - Malik! Quando você vai parar de brincar com essas coisas? – Passei uma mão pelos cabelos, conferindo se o penteado trabalhoso que eu fizera ainda estava no lugar.
  - Assim que você acreditar que eu falo sério.
  - Tá bem, Tá bem! – Ri baixo.
  - “Tá bem, tá bem.” – Me imitou. – Ficou nervosa, %Tah%?
  - Cala a boca! – Ri mais uma vez e dessa vez senti as bochechas queimarem. – Alguém tocou a campainha... Acho que tenho que ir.
  - Então não vai vir pra cá? Droga!
  - Baby, nós vamos viajar depois de amanhã! – Levantei da cama e verifiquei se o vestido amassou. – E eu terei muito tempo pra te aproveitar sem camisa.
  - Bom saber das suas intenções para essa viagem, %Star%! – Se fez de ofendido, mas eu sabia que ele estava adorando essa minha versão sapeca.
  - É, eu é que sou a má intencionada nesse relacionamento. – Peguei a minha bolsa em cima da escrivaninha e a coloquei embaixo do braço para conseguir abrir a porta. – O que você vai ficar fazendo enquanto eu estiver fora?
  - Acho que Niall e %Abi% vem pra cá e vamos assistir algum filme. – Pareceu mais entediado do que deveria. – Me avisa quando voltar pra casa?
  - Aviso sim! E se cuide, ok? – Parei no topo da escada, tentando prolongar aquela conversa o máximo possível.
  - Você é que tem que se cuidar! – Seu tom ganhou um toque de despedida que não me agradou, mas eu tinha mesmo que ir. – E aproveite... Eu sei o quanto você queria ir assistir a esse espetáculo.
  - Obrigada, baby! Ainda sinto a sua falta...
  - Também sinto a sua, Anjo. – A vontade de beijá-lo só fez aumentar. – Eu te amo.
  Encerrei a ligação assim que notei que era observada do fundo das escadas. Nick e Louis me encaravam como se esperassem alguma reação. Balancei a cabeça por nenhum deles ter falado nada esse tempo todo e guardei o aparelho na minha bolsa de mão. Dei uma última conferida nos cabelos e na roupa, segurando a barra do vestido para não tropeçar enquanto descia a escada. Nicholas, que estava vestido impecavelmente fino dos pés à cabeça e me ajudou a descer os últimos degraus. Lou segurava %Patch% nos braços e parecia cada vez mais apegado ao bichinho. Pelo menos assim eu ficaria tranquila em deixar o filhote pra trás quando fosse viajar com Zayn.
  - Uau. – Nick beijou as costas da minha mão de forma galanteadora. – Você está de tirar o fôlego.
  - Você também não está nada mal, Nicholas. – Sorri e me virei para meu irmão. – Tchau, Lou. E tchau, Bo!
  - Divirtam-se, crianças. – Louis nos acompanhou até a porta.
  - Até depois, Louis! E tchau, pulguento. – Nick acenou para os dois.
  - Para de chamar ele assim! – Só não empurrei o garoto porque tive medo de amassar o seu paletó.
  Louis fechou a porta de casa e Nick me guiou pelo caminho de pedra até a limusine que estava estacionada na calçada. Seria a segunda vez que eu andaria em um daqueles carros longos desde que chegara a Londres, mas dessa vez sabia que a surpresa não era pra mim. O menino devia estar querendo impressionar a namorada, por isso não fiz nenhum comentário engraçadinho. O motorista abriu a porta e me deixou entrar primeiro. Ergui meu vestido até a altura dos joelhos me curvei para poder passar pela porta sem bagunçar meu cabelo. Só os deuses da beleza sabem o quanto eu trabalho reproduzir aquele coque. Assim que consegui me arrastar até o banco mais próximo, notei a mulher sentada mais ao fundo. Holly sim estava de tirar o fôlego. Usava um vestido comprido aveludado com o decote tomara que caia e bem ajustado ao corpo. Se só de vê-la sentada eu já sabia que estava linda, imagine de pé! Nicholas estava certo quando falava que ela era uma mulher e tanto.
  - Oi, professora! – Me sentei ao seu lado, sorrindo.
  - %Tah%! Me chame de Holly, por favor. Aqui não sou sua professora. – Trocamos alguns beijos nas bochechas, como as madames fazem em filmes. – Aqui sou sua amiga.
  - Tudo bem, Holly, desculpe! Você está muito bonita. – Olhei o vestido dela mais uma vez, morrendo de vontade de perguntar quem o desenhara. – Nick devia ter ciúmes!
  - E tenho mesmo! – O menino entrou e foi para o outro lado da professora.
  - Nossa... – Pensei alto, encarando os dois.
  - Algo errado? – Holly pareceu nervosa enquanto o carro começava a andar.
  - Não é isso! É só que... Vocês dois formam um casal lindo. – Falei com sinceridade.
  - Bem, obrigada. – A mulher segurou a mão do namorado e os dois se olharam. – É bom ouvir isso.
  - A %Star% é a nossa fã número um, Ollie. – Nick a chamava de Ollie? Isso é fofo demais!
  - Sou mesmo! Os defendo até a morte. – Ri, cruzando as pernas.
  - Acho que você é a única pessoa que nos entende. – Holly suspirou. – Nicky estava certo em falar que podemos confiar em você.
  - E podem mesmo. Mas não vamos falar sobre isso, ok? Hoje deve ser uma noite feliz! – Comentei animada. – Nós vamos assistir ao Bolshoi!
  - É a sua primeira vez? – Holly entendia a minha animação. – Eu lembro da minha. %Star%, é algo surreal! Você vai amar.
  - Sei disso! Só tenho medo de ficar deprimida. De sentir que nunca vou ser como eles...
  - Não seja boba, %Tah%... – Nick começou. – É claro que você não vai ser tão boa quanto eles. Achei que isso já estava claro.
  - Nicholas! – Holly o repreendeu, mas eu nem liguei.
  - Não se preocupe, Holl. Eu já estou acostumada. – Se ela era minha amiga, eu podia chamá-la de Holl, certo? – Nick é sempre um amor comigo.
  - Sou sincero, o que posso fazer? – Nick deu de ombros, mas seu sorriso era verdadeiro.
  - De qualquer forma, não fique pensando assim. Apenas aproveite o espetáculo!
  Resolvi aceitar o conselho da professora e ignorar os outros insultos de Nicholas. Achei que, por estarmos na presença da namorada dele, o menino tentaria se comportar e ao menos fingir que era maduro para a sua idade. Infelizmente, eu não podia estar mais errada. Ele continuou me alfinetando e delatou todas as minhas dificuldades para Holly. Até mesmo contou sobre os vexames que eu passei quando estávamos repassando os textos de Romeu e Julieta e disse que o diretor precisou voltar a usar antidepressivos quando começou a trabalhar comigo. Eu acabava rindo de todas as coisas que ele falava, assim como Holly. Ninguém o levava a sério, então pelo menos isso me tranquilizou. Eu ainda queria que a professora me visse como uma boa aluna; não só por estar guardando o seu segredo, e sim por causa do talento que eu sabia que tinha.
  O trajeto até a Royal Opera House, onde o espetáculo aconteceria, foi razoavelmente rápido. A noite já estava sendo muito divertida e eu estava feliz em estar ali com duas pessoas que gostavam e entendiam tanto de ballet quanto eu. Claro que adoraria dividir esse momento com Zayn, pois ele era meu namorado e eu gostaria de dividir tudo com ele, mas era algo diferente. Nick aproveitaria muito mais que Zayn, porque ele era um verdadeiro bailarino e repartia aquela paixão comigo. Quando a limusine parou na entrada da casa de espetáculos percebi o quanto as minhas mãos estavam suando. O lugar estava absolutamente lotado! Outros carros igualmente chiques paravam por ali para que os passageiros saltassem com todo o luxo possível e caminhassem pelo tapete vermelho até as escadarias que levavam á entrada. Jornalistas e todo o tipo de imprensa também estavam por ali, capturando qualquer coisa que lhes fosse interessante.
  - Estou me sentindo uma celebridade... – Sorri sem poder esperar para sair do carro e deixar os flashes me cegar momentaneamente.
  - Eu não posso descer aqui... – Holly lamentou. – Pelo menos não com vocês dois. Essas filmagens com certeza vão aparecer em algum jornal ou na televisão.
  - Ela está certa. – Nick olhou pra mim com a mesma decepção da namorada e eu me senti mal por eles.
  - Então vem comigo, Holly... Nick pode entrar depois e nos encontrar lá dentro. Toda mulher merece um momento como esse em frente às câmeras. – Tentei.
  - Seus amigos sabem que você veio com Nick. Seria estranho aparecer comigo de repente. Não podemos correr riscos. – Suspirou e olhou para o namorado. – Vá com ela. Eu conheço uma entrada lateral que não vai estar tão cheia assim.
  - Tem certeza? – Acariciou a lateral do rosto de Holly e ela assentiu.
  - Podem ir! Eu vou ficar bem. – Forçou um sorriso. – Lá dentro vai ser melhor...
  - Não demore a nos encontrar, ok? – Os dois se beijaram rapidamente e eu evitei olhar. – Estaremos no salão principal.
  - Aproveitem o tapete vermelho!
  Eu ainda me sentia mal por causa daquela confusão e não sabia se suportaria esconder um relacionamento de todos à nossa volta. Pelo menos Holly e Nick sabiam que não precisariam aguentar aquilo por muito mais tempo, já que Nick se formaria em alguns meses e os dois estariam livres para andar de mãos dadas por aí. Assim que o motorista abriu a porta, esticou a mão para que eu pudesse sair em segurança. Quase no mesmo instante em que pisei no tapete vermelho, vários fotógrafos começaram a disparar flashes na minha direção e aí é que eu me senti como uma estrela de cinema mesmo. Aquele evento era restrito para a nata da sociedade, então era de se esperar que qualquer convidado recebesse aquele tipo de atenção. Sorri da melhor forma que pude e tentei parecer natural. Nick logo me acompanhou e eu passei o braço pelo dele, ganhando segurança para poder enfrentar todas aquelas escadas. Vestido longo + salto alto + degraus + eu = uma combinação nada perfeita.
  Ao menos nenhum repórter tentou falar conosco, então pudemos seguir nosso caminho em paz. Mostramos nossos convites para o funcionário de blazer que nos recebeu na porta e fomos indicados a seguir o caminho para o tal salão principal que Nick falara momentos antes. Pelo visto meu parceiro estivera ali outras vezes e sabia por onde andar, me deixando aproveitar tudo ao meu redor sem ter que me preocupar em ficar perdida. O lado de dentro era esplendoroso, pois essa é a única palavra que consigo usar para descrever. Por um momento me senti dentro do palácio de Buckingham. Nunca havia estado lá, mas imaginava que fosse exatamente assim. Pilastras grossas de mármore branco seguiam altas até o teto. O piso de cerâmica detalhada reluzia com elegância e formava um desenho tão grande que eu não conseguia enxergar o que era. As paredes eram cobertas por um papel de parede bege claro com alguns desenhos e linhas orgânicas douradas. Não me surpreenderia se fosse ouro.
  - %Star%, você vai acabar babando. – Nick cochichou ao meu lado e eu percebi que estava boquiaberta desde que entramos no salão.
  - Não tenho culpa se todos aqui parecem da realeza. – Falei no mesmo tom para não ser ouvida por mais ninguém.
  - Você também pode ser. – Ao falar isso, Nick nos guiou até um grupo de senhores que conversava em um canto e limpou a garganta para chamar a atenção de todos. – Com licença, senhores. Eu gostaria de lhes apresentar a Duquesa da Dinamarca.
  - Ora, é um prazer enorme! – Um dos senhores beijou a minha mão e sorriu como se acreditasse naquela história. Fuzilei Nick com o olhar e o desgraçado só riu. – Como vai, Duquesa?
  - Muito bem, obrigada... – Sorri amarelo. – É sempre bom estar em Londres.
  - Que belo sotaque a senhorita possui. – Outro homem me reverenciou. Pelo menos ele não conseguiu identificar que meu sotaque era na verdade francês. – Tão nova também, para já ser Duquesa.
  - O segredo está na água! – Arrisquei, querendo sair dali antes que fosse desmascarada. – Vão me dar licença, senhores, estou à procura do Príncipe Harry.
  - Oh, o jovem Windsor! – O terceiro riu. – Aquele ali sempre tem a atenção das moças, não é mesmo?
  - E como! – Nick era mais forte do que eu imaginava e eu não conseguia puxá-lo de jeito nenhum. – Essa daí falou nele a viagem inteira! Se o virem, por favor, digam-no que %Star% está à sua procura.
  - Com certeza, meu jovem! – O primeiro piscou pra mim. – Acho mesmo que o que essa cidade precisa é de uma boa aliança.
  - Ótimo! – Afirmei como se tivesse certeza daquilo.
  Por fim, consegui tirar Nicholas de lá e o arrastei para um lugar longe o bastante de qualquer pessoa. O menino começou a rir como se tivesse ouvido a piada mais engraçada do mundo e eu sentia que era essa piada. Em toda a minha vida nunca havia feito nada parecido e o mais estranho era que Nicholas parecia saber exatamente o que estava fazendo. Admito que me senti bem por uns instantes, fingindo ser a duquesa, entretanto, não seria nada legal se descobrissem que nós éramos apenas dois adolescentes que fingiam ser o que não eram.
  - Você é mais louco do que eu pensava! – Briguei em voz baixa. Seguranças rondavam o salão e eu não queria ser expulsa dali por fazer barraco.
  - Posso até imaginar a manchete de amanhã: Duquesa da Dinamarca é vista procurando o príncipe inglês. – Gargalhou mais uma vez, colocando a mão sob a barriga.
  - Gosto mais dessa: “Assassinato brutal acontece em plena Royal Opera House – Responsável ainda não foi encontrado”. – Imitei a voz de um locutor de rádio e acabei rindo também.
  - O que é tão engraçado? – Holly sorriu ao nos encontrar e entrelaçou a mão à do namorado.
  - A %Star% tem um encontro com o príncipe Harry! – Nick respondeu antes que eu pudesse falar qualquer coisa.
  - Mesmo? – A professora arregalou os olhos em surpresa, mas pareceu gostar daquela noticia.
  - Não! – Desmenti a história. – Seu namorado é maluco, sabia? Boa sorte pra você, sinceramente.
  - Ahh, não faz assim, %Tah%! Eu só quero o melhor pra você. – Tocou o meu ombro e me sacudiu devagar. – Nada seria melhor para essa cidade do que uma boa aliança!
  - Para a sua informação... Estou muito bem com Zayn, ok? – Cruzei os braços. Eu tinha um namorado maravilhoso e não o trocaria por príncipe algum. – Temos até um filho juntos.
  - O pulguento? – Nick riu do espanto de Holly e explicou: - Ela ganhou um cachorro de presente de natal do namorado.
  - Um cachorro? Que gracinha! Qual é a raça? – Pareceu mais comovida com o meu presente do que Nick gostaria.
  - É um Husky Siberiano! Ainda é filhote, então é bem pequeno. – Respondi. – Já estou com saudade dele.
  - Eu imagino que sim! Tive um pastor alemão quando era criança e nós éramos inseparáveis.
  - Eu deveria ter te dado um cachorro de presente de natal também? – Nick abraçou a mulher de lado. Ele conseguia ser maior que ela de salto.
  - Claro que não, Nicky! Eu adorei a corrente que você me deu. – Sorriu adoravelmente doce e mais uma vez eu olhei para o lado enquanto eles trocavam carícias.
  - Pessoal, acho que devemos ir... Já estão começando a entrar. – Informei assim que o fluxo de pessoas indo em uma direção só aumentou.
  Os dois concordaram comigo e fomos seguindo os outros convidados. De acordo com os nossos convites, nós três deveríamos sentar na área C. Eu sabia que não era um lugar tão privilegiado assim, mas eu já me sentia contente o bastante por estar ali. Mais uma vez minhas mãos começaram a suar quando subi por um novo lance de escadas, mas não por causa do medo de cair. Eu estava prestes a ver uma apresentação que mudaria a minha visão de perfeição para sempre. Não era qualquer companhia de ballet que estaria se apresentando, era a melhor e maior companhia do mundo INTEIRO. Um arrepio tomou conta dos meus braços e o que eu menos sentia naquela hora era frio. Na verdade, estava quase suando de ansiedade.
  Terminamos de subir a escada e desembocamos em um outro salão; bem menor que aquele primeiro. Três portas muito altas estavam lado a lado, com novos funcionários auxiliando cada convidado a chegar ao seu devido segmento. Mais para frente havia outro corredor, mas eu não fazia ideia de onde ele levaria. Nick e Holly foram para a fila da porta que levaria à área C e eu os segui. Todas as pessoas que passavam por mim trajavam vestidos longos como os meus nas mais variadas cores e tecidos, mas na minha opinião a pessoa mais bem vestida ainda era Holly. Seu pretinho básico não tinha nada de básico e esbanjava elegância.
  - Duquesa? O que a senhorita faz aí? – Aquele senhor que beijou a minha mão no salão parou de frente à mim. Eu entendia sua confusão, afinal, o que uma duquesa estaria fazendo na fila para a área C?
  - Ouve uma confusão com o meu convite e me mandaram pra cá... – Soei tão convincente que eu mesma comecei a achar que era uma duquesa.
  - Que infortuno! – Pareceu chocado com a incompetência dos funcionários e eu forcei uma expressão decepcionada. – Gostaria de vir comigo? Tenho um lugar vago na classe A e ninguém seria mais digno de preenche-lo que a senhorita.
  - Eu adoraria! – Aceitei na mesma hora com o meu melhor sorriso. – Se não for causar confusão, é claro...
  - Imagine, será um prazer. – Esticou o braço na minha direção para que eu me juntasse à ele e aos amigos.
  - %Star%, você não vai nos deixar aqui, vai? – Nick soltou um muxoxo antes que eu pudesse me afastar.
  - Sou a duquesa da Dinamarca! – O corrigi. – E só tem um lugar a mais, então...
  - Vá lá, %Tah%. E aproveite! – Holly sorriu para que eu acompanhasse o homem. – Nos encontramos no intervalo.
  - Obrigada. – Acenei para ela e Nick e caminhei até o meu salvador. – Vamos?
  - A minha neta ficará contente ao saber que assisti à apresentação ao lado da duquesa. – Começou a andar em direção ao portão oposto àquele e eu o acompanhei. – Me chamo Kenneth.
  - O prazer será todo meu, Kenneth. E mande minhas lembranças à ela.
  Tudo bem, o que eu estava fazendo poderia ser errado e muito feio, mas eu teria tempo de sentir remorso depois. Só o que me importava ali era poder assistir ao espetáculo de perto. Não sabia como a área C era, mas área A era perfeita. Pra falar a verdade, aquele espaço inteiro de apresentação era perfeito. As cortinas pesadas, o chão de carpete vermelho, o teto alto e o lustre grandioso que pendia dele... Meu pescoço doeu só de olhar pra cima. Segui Kenneth até que encontramos seus dois amigos, aqueles que estavam no salão principal, e fiquei ainda mais surpresa ao descobrir que sentaríamos na primeira fila, quase exatamente ao centro. A única coisa entre mim e o palco seria a orquestra, porém, esta ficava em um nível mais baixo, não atrapalhando a minha visão.
  - Vai nos dar a honra de assistir ao espetáculo em sua doce companhia, duquesa? – Um dos homens falou.
  - Se não for um incomodo...
  - É claro que não! – Kenneth falou ao meu lado. – Estes são Marchal e Joel.
  - É um prazer vê-los novamente. – E era só eu continuar falando assim que enganaria a todos.
  - Não teve sorte em encontrar o príncipe? – Joel perguntou em tom educado, mas curioso.
  - Infelizmente nós nos desencontramos. – Menti e sentei onde me foi indicado, ficando entre Kenneth e Marchal. – Talvez na hora do intervalo...
  - Olhe, ele está bem ali. – Olhei na direção em que Joel apontava e quase engasguei. Não era apenas o príncipe Harry que estava em um dos camarotes à minha esquerda, mas a família real inteira. Eu não estava tão perto para ver detalhes, entretanto, tinha certeza que a rainha sorria. – Devemos acenar para mostrar que você está aqui?
  - Oh, não, não... Não quero que o nosso encontro seja assim, se é que me entendem. – Forcei uma risadinha e eles concordaram.
  - Vai começar... – Kenneth informou e quase instantaneamente as luzes diminuíram de intensidade.

+++

  A primeira parte da apresentação durou três horas, mas pareceu que foi apenas meia hora. Eu mal pisquei e me mantive imóvel durante o show inteiro. Claro, excluindo ocasionais aplausos, sorrisos, risadas, “ohhh”s e pulinhos sem sair do lugar. Emocionada é pouco para o que eu fiquei. Todos os bailarinos, exatamente TODOS eram mais perfeitos do que eu imaginava. Eles possuíam uma técnica perfeita e eu tive que segurar o choro pra não acabar borrando a minha maquiagem. Ao contrário do que eu temia, não me senti mal por mim mesma. Na verdade, ver aqueles bailarinos que eram tão melhores que eu me fizeram querer melhorar, me esforçar mais até alcançar um nível que eu julgava ser impossível.
  Usando a desculpa de que ia ao banheiro para retocar a maquiagem e aproveitando que estávamos no intervalo, me despedi de Joel, Marchal e Kenneth e voltei para o salão principal. As entradas que davam para a rua agora estavam fechadas e em um canto do cômodo foram postas mesas com comes e bebes sofisticados. Alguns garçons de roupas brancas também circulavam e foi com um deles que consegui uma taça de champanhe. Espumante não era muito a minha bebida preferida, mas presumi que uma duquesa estaria acostumada. Para todos os casos, eu era uma e não podia fazer feio.
  Dei um pequeno gole no líquido, apenas para molhar os lábios, e comecei a minha procura por Nick e Holly; não necessariamente nessa ordem. Rodeei o salão, me esquivando de pessoas que arriscavam alguns passos de dança embalados pela música que preenchia o cômodo e eu não fazia ideia de onde vinha, também não dando muita importância. Fui avistar Nicholas conversando com um homem e uma mulher que eu nunca vira na vida e experiências de mais cedo me faziam crer que ele também não. Sem querer interromper qualquer que fosse o assunto, me aproximei e não fiz questão de anunciar a minha chegada, apenas ficando por perto para escutar o que falavam sem parecer mal educada.
  - É um prazer finalmente conhecer a sua esposa, Dr. Tully. – Nick falou com toda sua educação. – Eu estou aqui com a minha namorada.
  - E onde ela esta? – A esposa do Dr. Tully tinha uma voz um tanto esguichada, mas não foi isso que me assustou. Há poucos metros de nós uma senhora de idade observava o meu amigo com atenção, claramente escutando cada uma de suas palavras.
  - Eu também adoraria conhecer a namorada de um dos meus melhores alunos! – A diretora Agnes desistiu de espiar ao longe e se aproximou.
  - Oh, querido, eu demorei? – Tive que agir rápido, segurando a mão de Nick e sorrindo para os três. – Diretora, como é bom vê-la aqui!
  - O que você está fazendo? – Nicholas sussurrou no meu ouvido ao fingir dar um beijo no meu rosto.
  - Salvando a sua pele. – Usei o mesmo tom e depois me virei para os outros. – A fila do banheiro estava enorme, então terei que retocar a maquiagem depois.
  - Com licença. – O Sr. e Sra. Tully se despediram e nos deixaram à sós com Agnes.
  - Até depois, doutor. – Nicholas passou o braço em volta dos meus ombros para que parecêssemos mais íntimos. – Mas então, diretora, que surpresa! Não sabia que você viria.
  - Uma surpresa e tanto! – Comentei um tanto tensa, olhando para os lados e checando constantemente se Holly estava em qualquer lugar que pudesse ser vista pela diretora.
  - Meu convite se perdeu no correio e eu quase não pude vir hoje! – Ela comentou, séria como sempre.
  - Fico feliz que tenha vindo. – Menti descaradamente.
  - Vamos aproveitar que vocês estão aqui e tirar uma foto? – A mulher sorriu pela primeira vez na vida, o que provava que ela não desistiria daquela ideia.
  - Ahn, claro... – Nick me olhou como se pedisse ajuda, mas eu não sabia mais o que fazer.
  Acabamos concordando em tirar a foto. O que havia de mal nisso? Nada. Era o que eu dizia para mim mesma, mas não tinha tanta certeza assim. Agnes não demorou nada em achar um fotógrafo que pudesse tirar a nossa foto e me surpreendeu ainda mais quando disse que apenas de Nick e eu apareceríamos nela. A mulher gostava de mandar até fora da Academy, pois exigiu que nossa foto fosse tirada nas escadas e que Nicholas deveria ficar em alguns degraus abaixo do meu para que tivéssemos a mesma altura. Qual a finalidade disso? Também não sei. Entreguei meu copo para um garçom que passava e me ajeitei. Também fui obrigada a abraçar Nick para que parecêssemos realmente um casal.
  “Que ótima ideia que você teve, %Star%, falando que é a namorada dele!” Briguei comigo mesma. Eu podia ter dito que era amiga da namorada dele e que a menina estava passando mal, então teve que ir embora. Ou qualquer outra coisa! Mas tudo bem, o que estava feito, estava feito. O importante é que eu fiz o certo para proteger os meus amigos e ninguém nunca ficaria sabendo disso. Sorri o mais verdadeiramente que consegui e Nick fez o mesmo. Não precisei ver a foto para saber que realmente parecíamos namorados.
  - A foto ficou ótima! – Lá vinha Agnes com aquele sorrisinho horripilante mais uma vez.
  - Tenho certeza que sim! – Ironizei, mas consegui disfarçar. Senti a minha clutch vibrar a abri para pegar o meu celular. O nome “Holly” que aparecia na tela me fez congelar. – Com licença, eu tenho que atender...
  - Tudo bem, querida, eu vou com você. – Nick devia ter entendido do que se tratava, então tratou de nos afastar de Agnes.
  - O que faremos agora? – Perguntei pra ele antes de levar o telefone à orelha e poder atender. – Holly, onde você está?
  - Eu estou vendo vocês, mas não olhe agora! – Advertiu-me com um sussurro. – Não posso ficar aqui, %Star%, Agnes não pode me ver!
  - Eu sei disso, mas como vamos sair? – Olhei em volta preocupada, mas Nick estava na minha frente, então impedia a diretora de me ver. – A entrada por onde você veio?
  - Está fechada, eu já chequei. – Pela sua voz eu notei que ela estava assustada, mas também não era pra menos. – Estou perdida! Vou perder o meu emprego e nunca mais conseguirei nenhum! Minha carreira acabou.
  - Holly, mantenha a calma! Não se desespere, nós vamos dar um jeito nisso! – Eu sentia a adrenalina percorrendo as minhas veias e sabia que precisava arranjar de um jeito de sair dali. E rápido.
  - %Tah%, sei que não é hora pra isso, mas seus amigos estão vindo pra cá. – Nick apontou discretamente com a cabeça por cima do ombro e avistei Joel, Marchal e Kenneth andando na nossa direção. – Quer que eu os mande embora?
  - Não, eu tive uma ideia! – Respondi à Nick, podendo sentir as engenhocas do meu cérebro formulando um plano e em seguida falei com Holly pelo telefone. – Vou tirar a gente daqui, ok? Siga os meus movimentos.
  - O que você vai fazer, %Star%?! Espera, não me diga. Eu confio em você. – Ela respirou fundo como se tomasse coragem. – Eu te sigo.
  - Duquesa? – Kenneth foi o primeiro a chegar. – Está fugindo de nós?
  - Claro que não! Na verdade, eu preciso muito da sua ajuda. – Meu tom era sério, diferente do que eu usara com eles anteriormente. – Vocês seriam capazes de me ajudar sem fazer perguntas?
  - Posso fazer só uma pergunta? – Joel sorriu. – É um segredo de estado? Porque se for, eu estou dentro!
  - É sim, claro que é! – Afirmei e os três fizeram um semicírculo em volta de mim para poder escutar o que eu tinha a dizer. – Ok. Joel, está vendo aquela senhora de roxo? Eu preciso que a distraia. Ela não pode me ver aqui. Kenneth, preciso que você me ajude a sair. E Marchal... Consegue ver uma mulher de preto atrás de mim? Ela também tem que sair daqui, mas não pode ser vista. Por ninguém.
  - Mulher de roxo? Entendi. – Joel assentiu com a cabeça e foi na direção de Agnes.
  - Eu sei por onde você pode sair. – Kenneth firmou para mim e depois se virou para Marchal. – Ala Oeste. Te encontro lá com a dama de preto em três minutos.
  - Estarei lá em dois!
  E com isso, todos se separaram. Minha noite de celebridade se transformou em um filme do James Bond. Joel levou a distração muito à sério, pois eu consegui enxergá-lo falando com alguns seguranças e depois dois deles andaram em direção à Agnes, levando-a para um canto mais afastado. Eu não sabia ao certo o que tinha acontecido, mas não pude ficar pra assistir. Tudo que eu tinha certeza era que ela permaneceria distraída por alguns minutos e era só o que eu precisava. Nick seguiu quando Kenneth nos indicou um caminho e eu praticamente tive que correr para alcançá-los. Marchal não estava mais no meu campo de visão, mas eu tinha certeza que Holly estaria segura em suas mãos.
  Passamos por um corredor estreito que levava até uma escada escura. No fim dela eu conseguia ver uma porta de vidro semelhante às da entrada e luzes que piscavam indicavam que por ali conseguiríamos chegar ao lado de fora. Os homens foram os primeiros a descer e eu ergui o vestido a uma altura um tanto boa para conseguir fazer o mesmo que eles. Agarrei no corrimão para ter mais segurança e todos paramos na porta, esperando que Holly aparecesse. Àquela era uma fuga perfeita e eu estaria me divertindo se não fosse algo tão sério.
  - Holly! – Nick exclamou ao vê-la no topo da escada.
  - Vão, vão, vão! – Marchal exclamou lá de cima, vigiando pra ver se ninguém os seguira.
  - Ela não me viu, eu tenho certeza disso! – Holly passou como um furacão por mim e agarrou a mão estendida de Nick.
  - Pode ir tranquila, duquesa. – Kenneth segurou a porta aberta pra mim depois que Nick e a outra mulher passaram. – Foi uma honra poder ajudá-la.
  - Muito obrigada, Kenneth! E agradeça aos outros também. – Passei pela porta, mas me virei para fitá-lo mais uma vez. – Caso vá à Dinamarca algum dia, me procure!
  - Não me esquecerei desse convite! – Ele sorriu e acenou. – Agora vá!
  O obedeci e corri em direção à Holly e Nick, que já estavam bem mais adiantados do que eu. Já não havia mais tanta necessidade de correr, pois estávamos do lado de fora, porém, a animação era grande demais. Além do que, eu sabia que Holly só se sentiria segura mesmo quando estivéssemos dentro de um carro e indo pra casa. Não ficamos para assistir a segunda metade do espetáculo e isso me deixava um tanto triste, claro, mas tinha coisas mais sérias pra me preocupar. Reprimido uma risada, tentei correr mais rápido.
  - Táxi! – Nick chegou à calçada e esticou o braço, fazendo o carro preto dar uma parada brusca. – Vem, %Star%!
  - Já vou! – Gargalhei mais uma vez, tornando a minha respiração ainda mais ofegante.
  - Por que você está rindo? – Nick segurou a porta para que Holly entrasse primeiro e depois a seguiu.
  - Porque essa fuga foi incrível! – Respondi assim que também me joguei no banco de trás e fechei a porta ao meu lado.
  - Alguém vai me explicar essa história de duquesa? – Holly nos questionou e Nicholas e eu apenas nos entreolhamos.

Capítulo LVI
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