Imperfect

Escrito por Miá Silverini | Revisado por Maria

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Capítulo 1

  — Não! Eu vou estudar, me dedicar e tirar nota boa na próxima prova, mas não me mande para um professor particular. Eu imploro! — Eu choramingava para a diretora.
  — Se fosse uma matéria, tudo bem, mas são todas! TODAS! Isso na metade do ano! Recuperação de todas as provas em 5 meses! E, além do mais, um professor particular não é a morte sabia, ? — a Sr. Monroe tentava me fazer mudar de ideia. — Já falei com a srta. e ela topou. A melhor professora que você vai arranjar, ela tem uma paciência...
  Paciência nada. Ela mora com um dos meus melhores amigos, que é irmão gêmeo dela. Quando vamos para a casa dele, ela fica gritando, nos mandando calar a boca. Uma chata. Essas aulas seriam mais uma oportunidade de eu encher o saco dela.
  — Espera um instante — retornei a falar. — Senhorita ? A ? Irmã gêmea do ? A , da minha sala? A nerd? Bom, na verdade ela é bem gostosinha para uma nerd. Tem uma bundinha bem...
  — Senhor ! — A diretora gritou. — Respeito com a sua colega. E sim, é ela. Vá atrás dela para marcar a aula. — levantei e fui em direção a porta. — Ah, lembre-se sempre que se o senhor não estudar, repete o segundo colegial! Bom dia.
  Bom dia na bunda dela, mulherzinha mais escrota! Eu odeio ela e esse colégio estúpido. De qualquer forma, tenho que estudar, porque se eu repetir o ano, meus pais me castram.
  Saí daquela sala e fui para o corredor dos armários pegar meus livros. Coloquei minha senha e abri a porta. Ouvi um espirro e murmurei um “saúde”. Ninguém respondeu, mas ouvi um armário sendo aberto.
  — CARALHO! EU DISSE SAÚDE! DÁ PRA VOCE... Fala aí, nerd! Tudo bom? — Disse para , que nem se deu o trabalho de responder. — Não vai falar comigo, bonitinha? Escuta, temos que marcar nossas aulas. Você tem que me ensinar tudo o que eu não aprendi em um ano! Pensei em começar hoje mesmo. De qualquer forma, vou almoçar na sua casa, porque sabe, hoje é sexta e de sexta eu durmo na sua casa. Enfim, hoje você... — Ela fechou o armário e saiu. — Ei, estou falando com você garota! — Segurei em seu braço. — Dá pra parar e me escutar?
  — Solta meu braço, está doendo muito! Por favor, me solta. — Ela tentava escapar.
  — Eu nem estou apertando! O que tanto está doendo aqui? — Subi a manga do casaco e pude ver uns cortes bem avermelhados. — Você se corta? Por quê? Você tem problema mental?
  Ela se soltou e correu em direção a quadra. Bateu o sinal e então entrei na sala; achei que como uma boa nerd, ela não faltaria à aula, mas errei. Depois de duas aulas sem , fui para a quadra atrás dela. Não vi ninguém. Virei as costas e foi então que ouvi um espirro vindo de baixo da arquibancada. Fui até lá e a encontrei olhando para os cortes, já molhados por conta das lágrimas. Sentei ao seu lado, sem falar nada; ela olhou para mim e eu a abracei pelo lado, fazendo-a encostar a cabeça no meu ombro.
  Passei dois dedos nos cortes sentindo alguns relevos. Ficamos cerca de cinco minutos sem falar nada até que eu decidi iniciar uma conversa.
  — Por quê? — Perguntei e ela levantou a cabeça. — Por que você se corta?
  — Sabe como é legal sofrer bullying? Como é ter as pessoas te chamando de nerd? Ser alvo de bolinhas de papel? Ontem, apanhei de umas garotas por recusar a fazer o dever de casa delas. — Ela levantou a franja, mostrando o olho roxo. — E isso não é o pior. Enquanto eu sou a excluída, meu irmão é o popular, fodão do colégio.
  — Por que elas te batem? Já bateram antes?
  — Muitas vezes. Elas não gostam dos meus jeans e nem do meu cabelo. Não gostam de mim porque eu sou feia e inteligente. — Doía ver ela se chamar de feia, sendo que é muito bonita.
  — Mas você é bonita! — me encarou com deboche. — Eu estou falando sério, você é realmente bonita. E eu gosto do seu cabelo. Mas, por favor, não chora.
  — Obrigada — ela se levantou e colocou um dos fones de ouvido. — Pode deixar que eu não vou contar para o sobre esse momento e eu vou te ajudar com as matérias.
  Ela foi embora da quadra e eu também. O sinal tocou e fomos para a aula. Quando o sinal indicando o fim do dia letivo tocou, joguei tudo na mochila e fui esperar no portão da escola. Ele chegou com os outros meninos e fomos para a casa dele de skate.
  Almoçamos e os caras foram jogar vídeo game. Peguei minha mochila e fui atrás da minha professora particular. Bati na porta do quarto centena de vezes e ninguém abriu. Perguntei para uma das empregadas se estava em casa e ela respondeu que ela estava na sala de cinema. A casa era enorme e a sala de cinema era no porão, com 5 poltronas como as de cinemas, um telão e uma pipoqueira. Desci as escadas e abri a porta lentamente. Lá estava ela, dormindo em uma poltrona com seu MacBook no colo. Tirei o computador de cima dela e a tela do mesmo acendeu. Bati a palma mais forte que consegui e ela saltou assustada.
  — Acorda, professora! Esqueceu que você ia me dar aulas? — Perguntei, me acomodando em outra poltrona.
  — Cara, você é insuportável! Eu devia te deixar na mão e assistir você repetindo o ano, mas como eu sou a pessoa mais legal do mundo, vou fingir que você não foi a causa da minha quase morte!
  — Tanto faz. Liga o ar e começa logo. Você tem que me ensinar um ano inteiro em 2 meses. Los Angeles está, tipo, um deserto do Saara. Eu quero sobremesa; tem Kit-Kat ou M&M’s? Quero chocolate. Que horas os meninos vão pra pista de skate? Se é que a gente vai, né? Porque hoje tem baladinha monstra na Cherry Bomb! Você vai? Eu nunca te vejo nessas coisas; se bem que eu também nem procuro, sem ofensa. Eu acho muito legal o seu cabelo, você tinha mechas coloridas e isso me lembra McFly. Sabe aquela musica deles, 5 colours in her hair? Você gosta dessa banda, né? Você não vai responder nenhuma das minhas perguntas? — Olhei para o lado e vi dormindo de novo. — Acorda! Vamos começar logo! — Ela deu uma espreguiçada. — Geografia primeiro. Lê o primeiro capítulo do livro e faz um resuminho pra mim que eu vou dar uma descansada aqui.
  — Nem pensar! Lê você e me diz o que você entendeu. A cada “eu não sei” ou “eu não entendi nada”, vou te dar uma mordida. E a cada resposta certa, eu te dou uma bala. Pode ser?
  Assenti com a cabeça e abri o livro. Algumas vezes me pegava pensando em coisas aleatórias ou cantando alguma música mentalmente, mas depois voltava a me concentrar. Terminei de ler e entreguei meu resumo para . Ela leu e rasgou a folha em pedacinhos. Puxou meu braço e me deu uma mordida forte. Meu resumo dizia:
  “Cara , eu não compreendo uma sequer palavra nesse livro fornecido pelo colégio. Peço encarecidamente que a senhorita entenda minha suposta dislexia e aceite ler comigo e explicar cada coisa de uma maneira simples e fácil. Desculpe-me tomar seu precioso tempo, pois sei que sua agenda é cheia... De espaços. De qualquer forma, foi uma honra a senhorita ter aceitado a proposta de nossa diretora. Obrigado mais uma vez. Agradecido, Sr. .”
   puxou o livro para seu colo e começou a ler e me explicar tudo. Às vezes me desconcentrava e ela logo me fazia voltar a prestar atenção, me dando uma mordida. Quando acabamos de estudar, não tinha mais espaço para ela morder nos meus dois braços, todos cobertos por marcas de dentes avermelhadas e as primeiras já mostravam algumas partes roxas.
  Subi as escadas e fui para o quarto de . Eles falaram que estavam me esperando para comer. Fomos até a cozinha e estava fazendo macarrão. O cheiro estava muito bom. Perguntei o que ela estava cozinhando para comermos. Ela deu uma gargalhada forçada e disse que as empregadas tinham ido embora e que agora era cada um por si. , outro amigo nosso, pediu para experimentar a comida e ela deu um sorrisinho envergonhado para ele e logo deu-lhe um garfo cheio de macarrão.
   falou que era o melhor macarrão do mundo, fazendo corar. Ela pegou um prato, colocou a comida nele, acrescentou molho de tomate e deu para ele comer. e eu ficamos de boca aberta. se manifestou e disse que também queria comer. pegou um fio de macarrão de seu prato e deu na boca do irmão. Ele deu um tapa na cabeça dela, que entregou um prato para ele.
  Eu disse que também estava com fome e ela bufou, entregando um prato cheio para mim. Depois de jantarmos, comentou — ou melhor, jogou uma indireta — que queria algum doce de sobremesa.
  — O que você quer? Eu faço para você! — falou, colocando o prato na lavadora.
  — Sei lá — respondeu , pensando. — Sabe aquele doce que você faz com KitKat?
  — Eu faço. Não quer esperar na sala? Demora mais ou menos meia hora.
  Nos levantamos e fomos para a sala de TV, que era diferente da sala de cinema.
  — O que foi aquela cena da sua irmã, ? — Perguntei me jogando no sofá.
  — Ela é apaixonadíssima pelo . É capaz de lamber o chão que ele pisa. Faz tudo o que ele quer. Desde que ela voltou do curso de gastronomia, ela cozinha tudo o que ele pede e pode agradecer a ele, porque se ele não estivesse aqui, ninguém ia jantar não!
  — Agradeçam à minha mãe, por me fazer lindo e legal — se gabou. — A gente podia aproveitar que seus pais não estão aqui e as empregadas estão de folga e dar uma festinha amanhã, topam?
  — É, mas a responsável é a minha irmã e ela não vai deixar nem entrar moscas nessa casa.
  — Ela não lambe o chão que o passa? — Perguntei. — Então, só ele pedir para ela que ela deixa na hora. Vai lá, ! — Fomos atrás dele para ouvir.
  — Oi, ! Eu queria te pedir um negócio... — Ele entrou na cozinha e parou ao lado de .
  — Pode falar.
  — Podemos dar uma festa aqui amanhã? — Ele perguntou se aproximando dela.
  — Não sei não. É que esse tipo de festa sempre sai do controle e meus pais me deixaram encarregada e... — Ele foi para cima dela e a beijou. — Não adianta... — Foi aprofundando o beijo, quase a deitando na pia. — Eu falei não! — Mordeu os lábios dela. — OK, PODEM DAR UMA FESTA AQUI!
   agradeceu, levantou e foi para o quarto de .

Capítulo 2

  — VOCÊ PERDEU O JUÍZO? BEIJOU A MINHA IRMÃ! TEM NOÇÃO DISSO? — gritava com no quarto.
  — Fica de boa aí! Sem isso, não ia existir festa nenhuma! — respondeu calmo.
  — Aí, cara, ela beija bem? — Perguntei curioso.
  — NÃO TE INTERESSA SE ELA BEIJA BEM! TÁ INTERESSADINHO NA MINHA IRMÃ TAMBÉM? COMO SE NÃO BASTASSE ESSE IDIOTA AÍ! — gritou comigo e levantei as mãos me rendendo.
  — Opa! Espera um pouco. Eu não estou nem aí pra sua irmã, ok? Beijei ela porque senão não teria festinha nenhuma, entendeu? — se explicou.
  Na hora que falou isso, entrou na sala e colocou o doce na mesa brutamente e saiu chorando. Olhei para e parece que ele já sabia o que a irmã ia fazer. Ele colocou a mão na cabeça e, para ele, isso era sinal de nervosismo. deu uma risada, meio que não se importando. Mas também, ele não sabia que ela se cortava, então não tinha com o que se preocupar.
  Levantei do sofá, respirei fundo e fui até o quarto dela. Bati na porta uma vez e nada. Duas vezes e nenhum um sinal. Abri a porta lentamente e vi a luz do banheiro escapando por debaixo da porta. Abri e encontrei se cortando com um alfinete. Ela assustou e isso fez com que o alfinete se aprofundasse na pele, soltando um pouco de sangue.
  — Se você quer se matar, faça cortes na vertical. No sentido das veias. — Disse como se não ligasse para o que ela estava fazendo.
  — Tá fazendo o que aqui? Veio me iludir também? Não cola mais, ouviu?! Eu estou bem acordada agora. — Voltou a se cortar no sentido horizontal.
  — Cara! Eu falei que se quiser se matar, que corte verticalmente!
  — EU NÃO QUERO ME MATAR, IDOTA! APENAS PROVOCAR A QUANTIDADE DE FERIDAS QUE ESTÃO LÁ DENTRO, AQUI FORA. A DOR EXTERIOR ALIVIA A INTERIOR. E, SE VOCE PUDER SAIR DAQUI PARA EU TOMAR BANHO, EU AGRADEÇO!
  Voltei para a sala e estava com uma expressão assustada. Deduzi que tinha contado sobre se auto-mutilar. Ele perguntou se ela estava bem; respondi que, quando entrei, ela já tinha cortado metade do braço com um alfinete. ligou para um amigo nosso que ia sair conosco, avisando que íamos ficar em casa. Também desistimos da festa.
  Eu já estava ficando com fome, pois eram mais de 3 da manhã. estava quieta; achei que estava dormindo, até que escutei um espirro. Comentei com sobre achar que estava quieta demais, ele concordou e também disse que estava com fome.
  Olhamos juntos para , como se estivéssemos pedindo para ele ir lá pedir algo para comer. Ele negou, falando que ela estava brava com ele e que tinha medo de entrar e encontrar ela se cortando. O tranquilizei dizendo que a série de cortes já tinha passado e que ela devia estar vendo TV ou estudando, para dar uma variada. Não sei se estava com medo ou com preguiça. Eu levantei e fui lá pedir comida. Sempre que eu vou bater na porta do quarto dela, demora mais que entrar pela janela. Dessa vez eu abri sem pedir permissão, só depois passou pela minha cabeça que ela podia estar só de calcinha e sutiã.
  Ainda bem que essa hipótese estava errada. estava tocando violão, sentada em sua cama. Entrei devagar e sentei ao seu lado. Encontrei uma Guitarra LP Nashville vermelha pendurada na parede, junto com um baixo preto. Perguntei se ela tocava guitarra e baixo também. Ela, sem parar de tocar, respondeu que tocava violão e guitarra, mas o baixo era só enfeite. Levantei e tirei o instrumento preto cuidadosamente da parede e voltei a me sentar ao lado dela. Toquei a primeira coisa que veio na minha cabeça. parou de tocar para me observar.
  Perguntei que música ela gostava de tocar e tive como resposta Sweet Child O’Mine. levantou da cama, pegou a guitarra, e começou a tocar as primeiras notas do solo. Parei para recordar a música e comecei a acompanhá-la no baixo.
  — She’s got a smile that it seems to me. Reminds me of childhood memories, where everything was fresh as the bright blue sky. — Comecei a cantar. Ela sorriu. — Now and then, when I see her face, she takes me away to that special place, and if I stare too long, I’ll probably break down and cry.
  — Oh, oh, oh sweet child o’mine! Oh, oh, oh, oh sweet love of mine! — Ela continuou. Fomos interrompidos por gritando.
  — EU PASSANDO FOME E VOCÊS CANTANDO GUNS N’ ROSES? NUNCA MAIS FALO PRA VOCÊ PEDIR COMIDA, CARA! — Revistou a irmã com os olhos e parou no braço. — , você fez isso de novo? Olha como está! Tem noção de que se a mamãe souber, ela vai fazer picadinho de ? Depois inflama e fica igual aquela vez com o vidro; pensa que eu esqueci? E o que eu falei sobre tocar Sweet Child O’Mine sem um acompanhamento de baixo? — Ela apontou para mim. — Sem o MEU acompanhamento no baixo, então! Eu acho que sua introdução tá melhorando a cada dia. Lá do meu quarto eu achei que era o próprio Slash tocando aqui! Sem brincadeira! — falava calmo, fazendo a irmã sorrir.
  — Vou fazer crepes de presunto e queijo — ela saiu sorrindo, depois de jogar a guitarra na cama.
  — Ela está mais animada — comentei, sentando na cama logo depois de .
  — Eu tenho medo de um dia ela acabar morrendo de verdade. A primeira vez que eu vi os cortes no braço dela, me perguntava o porquê de alguém querer sentir dor, mas agora eu acho que até entendo o que passa na cabeça dela. Talvez, se ela tentasse mudar um pouco, nem que seja só as roupas, as pessoas passariam a respeitá-la e ela pare de se cortar e de apanhar.
  Comemos e fomos dormir.
  Acordei primeiro que os meninos; achei que estava dormindo, mas, para variar, ouvi um espirro vindo do quarto dela. Decidi ir lá encher o saco. Abri a porta; ela estava sentada na frente do espelho, chorando.
  — E aí? Por que choras? — Perguntei sentando ao seu lado.
  — Minha vida é uma merda — riu. — Se é que posso chamar isso de vida! Está mais para inferno. Todo dia eu acordo pensando em um motivo para continuar viva. A cada lágrima, um pouco da minha vida vai embora. Eu sempre gosto da pessoa errada! Por que aquele idiota? Por que não qualquer outro?
  — Por que você não esquece ele? — Sugeri. — Acho que você devia olhar para a frente! — Nunca joguei uma indireta tão direta na minha vida; ela nem percebeu. — Existem melhores que o e você sabe muito bem disso. Outros caras por aí gostam de você.
  — Eu os odeio. Por que seria diferente agora?
  — Por quê?
  — Eu odeio gente perfeita demais, sorridente demais. Odeio quem elogia só pra ganhar alguma coisa em troca, odeio quem acaba de me conhecer e já diz que me ama. Odeio que força simpática, quem finge que gosta, quem diz ser só amigo, mas no fundo quer algo mais. Quem chega abraçando. Odeio quem faz drama para chamar atenção, quem se faz de coitado e odeio mais ainda quem dá atenção a isso. Odeio o preconceito, odeio quem diz que não se importa com a aparência, mas não fica com fulano porque acha feio. Odeio esse lance de “ficar”, odeio as pessoas que tem a capacidade de beijar mesmo não sentindo nada pela outra. Odeio que tenham peninha de mim, odeio sentimentalismo, por mais sentimental que eu seja. Odeio, acima de tudo, quem me odeia simplesmente por eu odiar tudo isso. — Falou, parando de chorar.
  — Eu nunca pensei que eu ia falar isso, mas... Vamos estudar agora de manhã? Segunda tem prova de Biologia e eu não posso ir mal. — Ela concordou. — Se troca, a gente come alguma coisa e depois estudamos.
  Eu estava me apaixonando pela mais improvável pessoa no mundo. A nerd. Ou pior, a irmã gêmea de um dois meus melhores amigos. Ela era linda por dentro e por fora, só que não via isso. Percebi que ela estava tentando mudar, deixar de ser a nerd. Concluí isso pelas roupas que estavam no chão, a caixinha da lente em cima da mesa, a bolsa nova e pela unha pintada de vermelho. Isso tudo, eu vi em 10 minutos dentro do quarto dela. Desci as escadas de 2 em 2 degraus. Abri a geladeira, peguei o leite e coloquei em um copo. Ouvi passos de alguém descendo, olhei para trás e vi de shorts jeans curto, blusa justa rosa, cabelo solto, num corte repicado, e sem óculos.
  Seja lá quem fosse aquela no corpo de , eu estava gostando da mudança. Ela fez 2 panquecas e colocou um prato com uma delas e bastante mel na minha frente. Comeu a outra em silêncio. Colocou os dois pratos na pia cantarolando alguma coisa que eu tentava decifrar o que era.
  — VOCÊ ESTÁ CANTANDO KATY PERRY?
  — Sim, por quê?
  — DEUS, O QUE FIZERAM COM ESSA INGÊNUA MENINA? PRIMEIRO, AS ROUPAS; DEPOIS, O CABELO; AÍ VEM AS LENTES E AGORA AS MÚSICAS? QUAL SERÁ A PRÓXIMA MUDANÇA? VOCÊ VAI FAZER UMA MUDANÇA DE SEXO, MUDAR SEU NOME PARA KEVIN E VIRAR GAY?
  — Qual a lógica do que você disse?
  — Foda-se a lógica! Você está gata e eu quero estudar. Duas coisas que eu nunca pensei que ia falar!
  Fomos para a sala; não consegui tirar o olho da bunda dela por nem um segundo enquanto andávamos. O que estava acontecendo comigo? Ela sentada ao meu lado explicando sei lá o que de sei lá qual matéria; eu não ouvia nada, meus olhos estavam grudados em seus lábios mexendo, falando coisas inúteis que eu não vou usar na minha vida e apagar da minha memória 2 segundos depois da prova. Ela perguntou alguma coisa e eu, sem ouvir, respondi que não sabia. Lógico que ela me mordeu. Tentei prestar atenção nela, mas sempre que eu ouvia algo, maliciava ou fazia alguma piadinha e depois levava uma mordida.

Capítulo 3

  — Você só atrapalha a minha vida! Incrível ! — Ela disse séria.
  — Eu sei — respondi rindo.
  — Para de rir. Não é uma coisa boa de se fazer, muito menos engraçada.
  — Eu sei disso também. E sabe do que mais? Sei que você adora!
  — Cala a sua boca!
  — Vem calar! — Cantarolei.
  — Santo Deus! Quantos anos você tem mesmo?
  — Um a mais que você.
  — Nem parece. Parece que você não cresceu nadinha, sabe?
  — Eu cresci e MUITO! Posso te mostrar o quanto, se é que você entende o que quero dizer...
  — PARA DE MALICIAR TUDO, MENINO!
  — Não dá! Não com você. É mais forte que eu.
  — Cala a boca... E não repete aquela piada idiota do “cala a boca”!
  — Não ia repetir mesmo! Ia falar que tem função muito melhor pra minha boca e eu teria todo o prazer em te mostrar. Você ia gostar muito. Gostar é pouco, ia adorar.
  — Por que ainda tento te ensinar alguma coisa?
  — Porque você me ama.
  — Essa foi a melhor piada! — Forçou uma risada. — Tá de parabéns, ótima mesmo!
  — Não nega não, gatinha. Eu te enlouqueço.
  — Convencido! Quer saber a verdade? EU TE ODEIO, GAROTO! Larga a mão de se iludir.
  — Você quase me convenceu. Tenta mais uma vez, quem sabe nessa vai...
  — Você é impossível! Vamos voltar a estudar.
  — Antes eu posso falar uma coisinha, estressadinha?
  — Não tem como eu impedir, não é? — Disse massageando as têmporas.
  — Ainda bem que você já sabe. Enfim, eu ia falar que você fica super sexy quando está nervosinha. Sério mesmo, eu não consigo me controlar quando se trata de te irritar!
  — Como é chata essa criancinha!
  — Ouviu só o que eu disse? Sexy.
  — Vou falar mais uma vez só, por isso presta bastante atenção: CALA A SUA BOCA!
  — Eu calo. Mas só se for com a sua na minha.
  — Só tem esse jeito? — Ela perguntou, se aproximando lentamente, mordendo os lábios. Apenas assenti para ela continuar. — ENTÃO VAI FICAR AÍ FALANDO SOZINHO, IDIOTA! — Ela se levantou e fez menção em sair da sala. Segurei seu braço para impedir.
  — Eu paro se você se acalmar. Você bravinha só me dá mais vontade de encher a paciência!
  — JÁ ME ACALMEI, CARAMBA! Desculpa, me descontrolei. Eu vou começar a matéria de novo; presta um pouquinho da sua magnífica atenção, oh, lorde da chatice!
  — Eu vou prestar, juro, oh, princesa sexy!
  — Af, não começa tudo de novo, !
  Eu adorava usar nossas brigar para dar em cima dela. Sempre dizia o quão sexy a achava por meio de gracinhas e brigas como essa. Eu não conseguia pensar em outra coisa senão no quanto queria aqueles lábios mordendo os meus ou como era necessário eu colocar uma aliança no dedo anelar dela e a chamar de namorada.
  Eu prestava o máximo de atenção para não desapontá-la e, também, sabia que se eu não fosse bem nas provas, ela não iria mais me ensinar nadinha.
  Eu estava entendendo, até ter a ideia idiota de olhar para ela. Até sentia falta dos óculos de nerd. Não perdia uma oportunidade de provocá-la, maliciava as coisas, toda palavra eu lembrava de uma piadinha idiota, fazia perguntas estúpidas... Mas funcionava um pouco; ela ria de algumas coisas e, com outras, me batia.
   falava como se fosse a coisa mais simples e fácil do mundo; eu só vejo coisas inúteis, que não servem para absolutamente nada de bom na vida. Estávamos estudando o sistema nervoso, e nem lembrava que tinha visto isso na minha vida.
  — Quando algo inesperado acontece, as pupilas dilatam, o coração dispara, a bexiga relaxa... Isso pode acontecer quando algo que desejamos muito, finalmente acontece. Vamos usar um exemplo que gente idiota como você conhece bem: quando beijamos.
  — Não entendi, acho melhor na prática. — Falei, pegando em seu cabelo.
  — Quer parar com isso? — Ela falou, tirando minha mão.
  — Isso o quê? Mexer no seu cabelo?
  — Não, isso... Me provocar.
  — Meu Deus — falei, meio gemendo. — Fala provocar de novo! Na sua boca isso fica muito... Sei lá... Provocante.
  — Para de me zoar! Isso não tem graça! Odeio quando fazem isso.
  — Isso o quê? Te provocar?
  — Não, se vestir de Papai Noel e cantar Sexy And I Know It! Claro que é me provocar! Podemos voltar?
  — Chata!
  — Burro.
  — Nerd!
  — Vai se foder!
  — Posso te foder?
  — Não começa!
  — Você começou, !
  — Agora eu quero que você pare, !
  — Pois eu não quero parar, !
  — E por que não, ?
  — Porque eu quero você, !
  — Eu pedi pra parar, !
  — Eu pedi você, !
  — Coisas impossíveis: você me ter e você parar!
  — Por que você resiste? Assume logo, !
  — Você quer teu fígado arrancado pelo seu cu? Pois é isso que meu irmão vai fazer se você falar que “gosta” de mim.
  — Por que fez aspas com o dedo no gosta?
  — Porque você não gosta de mim; você gosta de me irritar.
  — É assim que eu demonstro amor, caso você não saiba! — 5 minutos no silêncio. — Me dá um beijo?
  — Como... Como é?
  — Um beijo. Me dá um beijo que eu paro de te encher. Pelo menos por hoje, porque para sempre é muito tempo.
  — Você ouve o que você fala?
  — Ouço, e se quiser eu repito. Não tenho medo do seu irmão, eu gosto de você e posso provar.
  — Prova então! — Ela falou, cruzando os braços.
  — Eu estava esperando você falar isso, ansiosamente. — A puxei pela cintura e selei nossos lábios.
  — Tudo bem — falou sem fôlego. — Você gosta de mim. Eu... Preciso pensar.
  — Não, você não precisa! Você gosta de mim, eu gosto de você e agora nós vamos ficar juntos, porque é assim que as coisas funcionam.
  — Não, definitivamente as coisas não funcionam assim! — Ela respirou fundo. — Você acha que é o certo?
  — O certo o quê?
  — Eu e você.
  — Ah, de jeito nenhum! É a coisa mais errada do universo!
  — Então eu quero. — Veio para cima de mim e me beijou.
  Cara, como aquilo era maravilhoso! Meu sangue corria a mil, pensando na hipótese de entrar na sala e nos ver aos beijos, mas aquilo era tão bom! Minha mão explorava seu corpo e as dela acariciavam minha cabeça. Sorri entre o beijo e ela se separou de mim.
  — Sabe o quanto eu estava esperando por isso? — Perguntei.
  — Não. Muito tempo?
  — Na verdade, faz uns 2 dias. — Ela saiu do meu colo. — Não, continua. Foi por que eu disse isso?
  — Não. Foi porque eu não sou perfeita. Eu me corto, sou nerd, anti-social, tímida...
  — Jura que você não é perfeita? Achei que você andasse sobre a água e tal. Brincadeira. Eu também não sou perfeito; sou burro, metido, esnobe... Já disse que eu sou burro? Porque eu sou realmente burro, mas tipo, burro mesmo! Mas, olha, eu te quero e te amo mesmo assim. Eu estou disposto a aceitar seus defeitos e te ajudar com o lance do corte. Ninguém é perfeito.
  — Tá, mas eu sou o contrario de perfeito! Eu sou A imperfeita!
  — Corrigindo, minha imperfeita!
  — Sua, só sua.

FIM



Comentários da autora


Fiz para minha prima linda! Usei o nome dela e do carinha que ela gosta, ou gostava. Escrevi em uma noite de castigo; estava no tédio e aí pensei em escrever. Eu realmente espero que vocês gostem e que comentem bastante! Obrigada por ler.
Beijinhos. Miih.