Between Law & Crime

Escrito por Scar | Revisado por Lyra M.

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Noivado – julho, 12

  — Eu preciso que você me escute, ! — semicerrei os olhos para a minha melhor amiga, que estava mais loira do que na semana passada.
  — Mas eu tenho que...
  — O Derek me pediu em casamento! — soltou a frase num só sopro, mas conseguiu sobrepor a minha voz esganiçada. — Eu sei que você me chamou aqui para contar alguma coisa, mas eu não podia mais guardar essa informação! — seus olhos estavam brilhando. Com certeza ela estava feliz com o noivado.
  — Uau! — foi tudo o que eu consegui dizer. — Quer dizer, )), isso é fantástico! Meus parabéns! — ah, qual é, cérebro? Eu preciso soar mais empolgada!
  — Você poderia demonstrar mais entusiasmo pelo meu casamento...
Inspira, expira. Vamos lá!
  — Me desculpe, eu não queria estar assim, eu estou muito feliz por você! Você sabe que eu estou! É só que...
  — Aconteceu alguma coisa?
  — Não é nada demais, não vamos estragar o seu momento!
  — ! — me repreendeu. — O quê?
  — As coisas estão meio estranhas entre eu e o Jeremy.
  — Estranhas como?
  — Só... Estranhas. — menti.
  — , nós somos melhores amigas, eu sei quando você mente para mim. — ela pendeu a cabeça para o lado. Ela estava certa. Nós nos conhecemos ainda na escola, e desde lá, temos uma amizade há quase treze anos, não posso mentir para ela.
  — O Jerry... Ele... Nós estamos, seja lá o que nós temos, há dois anos nessa coisa que eu chamo de experiência de relacionamento e nada muda. Absolutamente nada. Eu cansei! — suspirei pela décima vez.
  — , você me disse inúmeras vezes que não o ama! Porque quer insistir num relacionamento sério? E com ele?
  — Eu preciso tentar! Eu não quero ficar toda hora nessa coisa com ele. Meu Deus, eu não sei nem explicar pra mim mesma o que nós temos, imagina para os outros... Isso é tão confuso!
  — Você não precisa explicar nada aos outros. É a sua vida, e são as suas escolhas!
  — Mas e se as minhas escolhas não forem as mesmas do Jeremy? — olhei nos olhos verdes e brilhantes da minha amiga. Eu não deveria estragar um momento importante para ela.   — Quer saber? Que o Jeremy se foda! Vamos falar sobre o seu casamento! Deus, que estranho! Minha melhor amiga vai casar! — nós respiramos fundo e tivemos um acesso de riso bem no meio do restaurante.
  — , para! — ela tapou a boca e abafou o riso. — Mas sim, é claro que você vai ser a minha madrinha! E não aceito não como resposta!
  — Você que não tem alternativas... Eu seria sua madrinha, você querendo ou não!

  Estar no seu restaurante favorito, na companhia da sua melhor amiga, comemorando o noivado dela, deveria ser um momento feliz, mas não conseguia me sentir assim.
  Eu preciso ficar feliz por ela!
  Porque é tão difícil quando se trata de mim? Sou eu que complico? Ou são os outros que me complicam?
  Perdi a conta de quantas vezes o meu cérebro repetiu essas perguntas enquanto estava a caminho do meu apartamento, a duas quadras de distância.
  Não é como se eu tivesse uma vida sofrida. Eu não tenho! Trabalho há dois anos em uma das melhores empresas de arquitetura do estado, mesmo tendo que viajar para a capital todos os dias. Isso não é desculpa. São apenas quarenta minutos de uma viagem tranquila, e o trânsito nunca está ruim, o que eu agradeço sempre. A interestadual que liga Lancaster a Streetsville tem apenas mais uma saída, que vai para Ferguson, outra cidade grande, não tanto quanto a capital, mas ainda muito importante por ser a entrada e saída da produção local de alguns produtos orgânicos.
  Tenho um relacionamento, se é que posso chamar assim, com um homem lindo e inteligente, que também é o meu chefe; mas nós não progredimos nada. E eu tenho sentimentos por ele, eu tenho que ter. Nós estamos juntos há dois anos. Então alguma coisa nós sentimos um pelo outro.
  Clareei meus pensamentos quando ouvi o toque do meu celular.
  — Alô! — não olhei no identificador, mas eu não estava com cabeça para isso.
  — Você está aqui na capital ou na sua casa? — a voz de Jeremy soou pelo telefone. — Alô, ? Você está escutando?
  — Oi, estou. Desculpe, minha cabeça está a mil.
  — Então... Está na capital ou no seu interiorzinho?
  — Estou entrando no meu prédio nesse momento, o que foi?
  — Pensei que nós poderíamos sair, mas já que você não ficou aqui, acho melhor esquecer.
  — É, tanto faz, Jerry. — desliguei sem nem ao menos ouvir seu resmungo. — Boa noite, Blake! — sorri para o porteiro.
  Ainda no hall completamente branco e claro demais do prédio, não tive que esperar pelo elevador, o que era um milagre, e logo cheguei ao sétimo andar, na minha porta azul, com o número 702 em dourado. Eu já morava nesse apartamento há pelo menos um ano e meio, quando a disse que não poderia mais dividir a casa comigo e foi morar com o Derek, agora seu noivo, mas eu estava me dando super bem na vida de adulta-que-não-depende-dos-pais. Ele era espaçoso demais para uma pessoa morar sozinha, uma sala conjugada com uma cozinha moderna com balcões de granito, duas suítes com closets enormes, um deles agora convertido em meu escritório, e a sacada com vista para a cidade, a vista privilegiada para toda a cidade. Não que ela fosse muito pequena, mas morando no prédio mais alto, dava para olhar o parque cheio de árvores imponentes e o lago ao centro, ainda conseguia ver as lojinhas e os pubs do centro, assim como algumas propriedades mais afastadas.
  Como de costume para uma sexta-feira, preparei um bom banho de espuma na banheira de ferro fundido, me servi com uma taça do meu melhor vinho branco e me permiti esquecer dos meus pensamentos que estavam cada vez mais me sufocando. Quando senti meus dedos enrugados, saí do banheiro e coloquei a roupa mais confortável que encontrei pelo caminho.
  — Agora somos só nós duas... — murmurei para a minha cama king size, grande demais para uma adulta pequena demais para seus vinte e um anos. Com um sorriso brincando nos lábios, puxei um livro da cabeceira, me afundei em meio aos lençóis e em pouco tempo o sono me venceu.

  — Droga! — meu celular tocava em algum lugar do quarto completamente escuro. — Droga, celular! — acendi a lâmpada do abajur ao lado da cama e achei o aparelho no final da cama. — Quê?
  — Me desculpe ligar a essa hora, , mas seu pai apareceu aqui no hospital e... Você pode vir buscá-lo?
  — Ah... — olhei no visor e li o nome da Denise, minha única prima, enfermeira no hospital geral da capital. — Den... O que ele fez dessa vez?
  — Pelo que ele me disse, a tia Carla brigou com ele por ter bebido... — senti seu sorriso através da ligação. — Mas ele foi trazido pela ambulância.
  — Ele está bem? — despertei do meu estado 50% acordada, 50% dormindo. — Não me diga que ele estava dirigindo alcoolizado!
  — Sim... Desculpe, eu já o mediquei e ele está apenas com um machucado na testa, nada grave, mas precisa que alguém venha buscá-lo e, quando liguei, a tia Carla disse que ele é um velho bundão por continuar bebendo.
  — Não precisa se desculpar, Den... — suspirei e olhei para o relógio, que indicava 2:13 da manhã. — Eu chego aí o mais rápido que puder... Ele está mesmo bem?
  — Sim, não se preocupe. Ele está só meio bêbado ainda... Dirija com cuidado! Vejo você daqui a pouco. — ela desligou e eu corri a procura da minha bolsa.

  Não era a primeira e nem seria a última vez em que meus pais brigavam e minha mãe não o deixava entrar. Era coisa deles: brigar, expulsar meu pai de casa e ele correr para a Denise me chamar. Ele sempre dormia na minha casa quando eles brigavam, então meu pai me obrigava a ligar para a minha mãe aceitá-lo de volta, mas nunca pensaram em se separar. “O amor tem jeitos estranhos de se manifestar! E nem isso você consegue”. Ignorei a vozinha chata que andava me deixando com dor de cabeça. Não pensei em mudar de roupa, peguei as chaves de casa e do carro e fui em direção a Interestadual a caminho de Lancaster.
  Ainda estava com sono e cansada quando vi as luzes e ouvi a sirene do carro da polícia atrás de mim. Ah, você só pode estar brincando comigo! Encostei o carro no acostamento e esperei pacientemente contando até dez.
  — Boa noite! Carteira de motorista e documentos do carro, por favor. — disse uma voz grossa e imponente.
  — Boa noite só se for para você! — sussurrei mais para mim do que para o policial, enquanto pegava os documentos necessários.
  — Sim, está sendo uma boa noite para mim, obrigado. — fui obrigada a olhar em sua direção, e me admirei quando vi um uniforme azul da polícia num cara bonito demais para estar perdendo tempo numa profissão daquelas. Você deveria ser um modelo internacional, oficial! E no mesmo momento senti meu rosto esquentar de vergonha pelos caminhos que meus pensamentos haviam tomado.
  — Desculpe... Não era para você ter... Sabe... Escutado. — chacoalhei as mãos no ar e ele sorriu com o canto dos lábios.
  — Você sabia que estava dirigindo em alta velocidade? — ele mirava uma pequena lanterna pelos documentos e para dentro do carro, dificultando a minha tentativa de ver seu rosto.
  — Me desculpe, policial...
  — Policial
  — Policial , me desculpe, eu só preciso ir até Lancaster buscar meu pai...
  — Ele está bem? — pediu, já devolvendo meus documentos. Meneei a cabeça. — Você está bem?
  — Quê? — guardei os papéis e olhei em sua direção, que apontava a pequena lanterna em meu rosto. — Você pode virar a luz para lá, por favor?
  — Você está em condições de dirigir?
  — Mas... Do que você está falando? É claro que eu estou! — perdi a educação e comecei a falar mais alto do que o necessário. — Estou em perfeitas condições para dirigir na droga dessa estrada e pegar meu pai estúpido o suficiente que brigou com a minha mãe sabe-se lá o porquê! É óbvio que eu estou bem!
  — Se você diz... Tenha uma boa noite Sra. ! — foi aí que pude ver seu sorriso e minhas mãos suaram.
  — Imbecil. — sussurrei já saindo do acostamento com o carro.
  Pelos trinta e oito minutos que se passaram até chegar ao estacionamento do hospital, eu não consegui acompanhar as músicas que tocavam na rádio, não conseguia pensar, só inventando nomes cada vez mais feios para aquele policial estúpido, de sorriso lindo, que havia me parado, e no quanto a sua fisionomia não me era estranha. Eu moro numa cidade pequena, com pouco mais de 7.000 habitantes. Revirei os olhos. É claro que já devo tê-lo visto por lá!

  — Olá, onde está a enfermeira Denise ? — questionei a uma das recepcionistas simpáticas que se encontravam na emergência.
  — Ela está na enfermaria, você quer que eu a chame? — assenti brevemente e a Enfª. Taylor, como pude ver em seu crachá, discou um ramal no telefone a sua frente pedindo para chamar a minha prima. — Ela deve aparecer em alguns minutos... Você acredita que um senhor chegou numa ambulância, chorando e chamando por ela? — ela sorriu, mostrando algumas rugas próximas aos olhos, e eu acompanhei, sabendo muito bem de qual senhor ela estava se referindo. Me sentei em uma das cadeiras da emergência e poucos minutos depois Denise surgiu conversando com o meu pai.
  — ...É claro que ela vai deixar, tio! — revirou os olhos para mim — Olha, a já chegou. Eu preciso trabalhar agora!
  — Você sempre me salvando, huh? Obrigado, Den! — meu pai, ainda com a voz embolada e um curativo na testa se pronunciou. — Eu prometo não voltar a lhe atrapalhar por aqui!
  — Obrigada, Den! — agradeci pelos seus cuidados com meu pai.
  — Não foi nada... Agora durma e de manhã tome estes remédios, caso sinta dor de cabeça. — disse para o meu pai e voltou seu olhar para mim. — Quando ele acordar, limpe a testa dele com um pouco de soro fisiológico e troque o curativo, tudo bem?
  — Tudo. E, de novo, obrigada! — a abracei e segurei nos braços do meu pai. — Tchau!
  Nos despedimos brevemente e seguimos para o meu carro, não muito longe das portas cinzas e sempre agitadas do hospital.
  — Sua mãe está realmente com raiva por eu ter batido a Florinda! — ele murmurou quando sentei no banco do motorista.
  — Você bateu a Florinda? — perguntei alarmada. Florinda era uma Ford F150 de 1982 que a minha mãe havia ganhado há alguns anos num sorteio, mandou aplicar alguns adesivos de flores pela carroceria, e hoje temos a Florinda. — Então foi por isso que a mamãe não deixou você entrar em casa?
  — Não... — ele começou a história quando eu comecei a sair do estacionamento, para seguir para Streetsville. — Eu fui encontrar com os rapazes da Marinha, e nós bebemos apenas umas a mais porque o Paul ganhou seu primeiro netinho hoje...
  — Ainda estou ouvindo, preciso de argumentos quando você me implorar para ligar para a mamãe! — brinquei e ele sorriu para mim.
  — Ela sentiu o cheiro de cerveja assim que entrei pela porta da sala, mas como eu tinha levado a Florinda para fazer uma troca de óleo ela ficou possessa comigo, dizendo que eu era um irresponsável por estar dirigindo a sua preciosa caminhonete bêbado... Aí ela foi me empurrando para fora de casa... Com a vassoura! — tivemos um acesso de riso digno de pai e filha, mas ele fez uma careta de dor e imaginei que fosse a sua cabeça.
  — Ela tem razão de ter ficado possessa, pai. — ele assentiu ainda fazendo a careta de dor. — A Den disse para você tomar os remédios só amanhã, mas se sua cabeça estiver doendo muito tenho certeza que você pode tomar um ainda hoje.
  — Eles me medicaram lá no hospital, acho que com o efeito passando, a dor dos pontos vai surgindo...
  — Você pegou pontos na testa? — ele assentiu. — Uau!
  — É, uma droga. — bufou — Você vai me deixar terminar ou não? — eu sorri brevemente e ele continuou. — Então, por vingança por não querer escutar minhas desculpas, eu peguei a Florinda de volta e fui andar pela cidade, mas de uma hora para outra eu já estava batendo com a cabeça no volante e o carro no poste...
  — Alguém bateu em você?
  — Sim, mas o outro carro só bateu na carroceria da Florinda, e ela bateu no poste.
  — O estrago foi grande?
  — Não tanto, mas peguei dois pontos.
  — O estrago da Florinda, foi grande?
  — Nada que o Bill não conserte!
  — Tudo bem... Amanhã, quando estivermos descansados, eu ligo para a senhora Carla, tudo bem? — ele assentiu. — Sabe, se você quiser, abaixa o banco e dorme um pouquinho, quando chegarmos eu chamo você.

  — Filha... — senti meu pai chacoalhando meus ombros. — Filha, acorda!
— Em cinco minutos eu acordo...
  — Não, , acorda! Você tem visita... — despertei surpresa e acabei caindo do sofá, batendo a cabeça na mesa de centro.
  — Ah! — gemi de dor e segurei minha cabeça. — Droga!
  — Eu poderia ter dormido no sofá e você ficava com a cama...
  — Não pai, está tudo bem.
  — E então... Autorizo a entrada desse tal de ?
  — Eu não conheço nenhum ... Deixa que eu atendo o interfone. — sorri brevemente para ele e me levantei até o interfone na parede da cozinha. — Oi Blake...
  — Oi, dona , desculpe lhe incomodar tão cedo, mas o tá aqui na portaria e disse que precisa lhe entregar algum documento e a senhora precisa assinar...
  — Blake... — esfreguei a testa e suspirei — Já disse que você pode me chamar apenas de , não disse?
  — Sim senhora... Desculpe, . — ele sorriu, e falou fora do telefone: — Ela disse que não conhece você, ... Tá perseguindo a dona, é?
  — Diga que é da polícia! — uma voz mais distante se pronunciou.
  — , é da polícia...
  — Ah, Senhor! Eu mereço! — respirei fundo — Eu desço em dois minutos.
  Dez minutos depois, com os dentes escovados e o cabelo preso num rabo de cavalo eu apareci no hall de entrada do prédio, avistando o policial , avaliando todos os detalhes que deixei passar na noite passada. Ele era absolutamente lindo! Com cabelos castanhos claro, uma barba por fazer que o deixava mais sexy do que eu um dia admitiria, braços fortes e olhos verdes claro que também pareciam me analisar.
  — Você está bem? — o policial de sorriso bonito franziu o cenho ao se levantar em minha direção. — Está usando óculos, legal!
  — Meu Deus, você está me perseguindo? — ele sorriu com o canto dos lábios. — Como sabe onde eu moro?
  — Você esqueceu a sua multa ontem à noite... E eu estava com o seu nome e número do seguro na viatura. Não estou te perseguindo, apenas fazendo o meu serviço.
  — Olha aqui, policial ...
  — Então você se lembra do meu nome? — ele sorriu, me interrompendo e mostrou seus dentes bem alinhados.
  — Apenas me entregue a droga da multa e me deixe em paz! — disse com a voz mais calma que consegui proferir.
  — Você precisa assinar aqui, . — disse apontando para uma prancheta.
  — Não me chame de , para você é senhorita . — assinei o maldito papel e puxei a multa de sua mão. — Não volte a me importunar!
  — O que houve com a sua testa? — ele olhava intrigado para o meu rosto.
  — Isso não te diz respeito. Passar bem! — respondi grosseiramente e fui para o elevador e antes que ele pudesse fechar, escutei a voz de dizendo “Essa aí é dureza!”.

  — Quem era? — meu pai estava na cozinha, fazendo panquecas. — Era seu namorado?
  — Pai! — o repreendi. — Era da polícia. Ontem, quando estava indo lhe buscar, um policial idiota me multou por estar acima da velocidade...
  — E ele é o seu namorado?
  — O quê? Pai, não seja ridículo! É claro que não.
  — E porque ele veio até aqui só para lhe entregar uma multa, quando ele pode muito bem mandar pelo correio?
  — Você quer café? — desconversei, já procurando o pó de café nos armários.
  — Sua mãe vai até voltar a falar comigo depois dessa notícia! — ele sorriu me provocando.
  — Pai, eu nem conheço esse homem. Para de falar besteira e me dê uma panqueca, por favor.

  — Oi mãe! — sorri quando ela me atendeu. Eu estava sentada no sofá com o meu pai, curtindo o final da tarde de sábado, quando ele pediu para ligar e ver se podia voltar para casa.
  — Eu não quero escutar as desculpas que você vai inventar para o Gerard! Você já viu em que estado a minha Florinda está? Isso é inaceitável, ! Eu não acredito que você está do lado dele!
  — Mãe... — respirei fundo. A dor de cabeça que estava me perseguindo desde manhã quando a bati, só parecia aumentar. — Por favor... Você não pode expulsar o papai de casa!
  — Ele. Bateu. A. Minha. Florinda! — disse pausadamente. — Ele que arrume a minha caminhonete ou se mude para a sua casa!
  — Ah, mamãe! — foi tudo muito rápido: meu pai tomando o celular das minhas mãos e soltando a maior mentira do universo.
  — A está namorando! — ele sorriu.
  — O QUÊ? — pude escutar o grito da minha mãe. — Como você não me liga para avisar isso antes, Gerard? Seu incompetente! A minha filha está namorando, finalmente, e nem para me avisar você serve? Onde já se viu uma coisa dessas?
  — Eu não estou namorando, mamãe! — disse mais alto e perto do telefone.
  — Está sim... E ele é policial, veio até aqui hoje de manhã, mas ela não quis que eu o visse e desceu como um raio até a portaria!
  — Chega! — bufei e saí do sofá em direção ao meu escritório improvisado no segundo quarto do apartamento.

  Liguei o laptop e verifiquei a minha caixa de e-mails. Havia um de Jeremy.
   “, se você quiser ficar com os Millers, eu preciso dos seus projetos prontos até segunda-feira!
  BJ.”

   “Estou trabalhando neles Jerry. Mas, por favor, não me pressione. Você sabe que eles vão gostar do que eu apresentar!
  Você está disponível hoje? Eu preciso sair e conversar...”

  Como não esperava uma resposta imediata, comecei a trabalhar para o projeto da casa dos Millers. Uma família mediana, com um casal de gêmeos de 10 anos e mais uma filha a caminho. Eles queriam a casa perfeita! E, como tinha conversado muito com a Sra. Miller, sabia das suas preferências. Não seria difícil agradá-los.
   “E por que quando se resume a você, as coisas complicam?” A mesma vozinha chata soou no meu cérebro. “Você sabe que pode pedir ao Jerry um encontro, vocês conversam e assumem as coisas aos outros... Que dificuldade você vê nisso, , Ferris-?”
  Um bip me avisou da chegada de um novo e-mail. Jerry.

  “Eu sei que vai deixá-los impressionados babe.
  Hoje não dá. Coisas importantes para fazer.”

  O respondi imediatamente.

   “Então eu não sou importante?” — Foda-se se estou sendo dramática!

  “, o que aconteceu? Você está na TPM, é isso? Você fica bem chata assim, e se for isso, eu prefiro que nós não tenhamos um encontro hoje.”

   “Nós nunca tivemos a droga de um ENCONTRO, Jerry! Afinal, o que você quer de mim?”

   “No momento eu não quero ter essa conversa. Estou saindo.”

  — Idiota, imbecil, eu te odeio! — bradei para a tela do meu computador, batendo com os punhos na mesa.
  — Atrapalho? — meu pai pediu pacientemente, adentrando no escritório.
  — Não, pai... Desculpe, você não precisava escutar isso.
  — O idiota, imbecil e tudo mais que você odeia é aquele policial, seu namorado? — ele sentou-se na poltrona, no canto do quarto.
  — Pai, eu não conhecia aquele policial até ontem à noite, então, por favor... — esfreguei a testa novamente para tentar amenizar a dor.
  — Você quer um daquelas minhas pílulas, para sua cabeça? — neguei. — Sua testa está um pouco roxa, . Aquela sua mesa de centro é bem forte... — ele brincou.
  — Está tudo bem, pai... Só não fica colocando essas coisas de namorado na cabeça da mamãe, por favor. Ela fica me estressando porque eu tenho vinte e dois anos e não tenho sequer um namorado, e ela precisa de netos!
  — A sua mãe quer ver você feliz, filha..
  — Eu sou feliz! — Não totalmente. — Não preciso de um namorado, e ainda sou nova demais para ter filhos! Agora que eu sou reconhecida na minha profissão e tenho tantos clientes... Como eu sempre sonhei!
  — Se você já se realizou profissionalmente, porque não sonhar um pouquinho com uma família e essas coisas?
  — Pai... — revirei os olhos e fechei o laptop. — Eu tenho uma pessoa, há um tempinho, mas não quero assustá-lo assim, impondo um relacionamento sério e essas coisas.
  — E porque você nunca fala disso para a sua mãe? Ela pode parar de te importunar com essas coisas.
  — Você se esqueceu que é casado com a dona Carla Ferris-, ou o quê? — sorri. — Se eu mencionar que estou saindo com um cara, ela vai me obrigar a dizer até o tamanho do sapato dele, como nas outras vezes.
  — É... — ele soltou uma gargalhada. — Isso é bem a cara da sua mãe mesmo! Mas, não sei, se ele é um cara importante, acho que nós deveríamos nos conhecer, certo?
  — Talvez... Nós trabalhamos juntos.
  — Ah é? — ele coçou o queixo, levemente coberto pela barba. — Não é o seu chefe, não é?
  — Porque acha que é o meu chefe? — prendi o ar. Eu não tinha falado nada disso com eles. Nunca.
  — Por que vocês saem juntos, às vezes... Eu já vi uma foto de vocês numa festa antes, uma daquelas que saíram no jornal...
  — Pai, aquilo foi apenas um jantar de um dos clientes da empresa. Eu fui com o Jeremy porque nós dois fizemos o projeto para a companhia do cara. E as outras vezes também foram em assuntos da empresa. Isso não é nada demais!
  — Você tem certeza? — assenti. — Que bom, porque não acho que ele é alguém por quem você deva se apaixonar e essas coisas todas que vocês mulheres inventam. — ele sorriu e eu fechei os olhos.
  — Não sei o que é mais estranho... Conversar com você sobre caras, ou conversar sobre você achar que estou saindo com meu chefe!
  — Não é estranho, essas coisas acontecem, filha. Eu conheci a sua mãe quando ainda era marinheiro e ela trabalhava com o meu comandante...
  — Não é a mesma coisa, e você sabe disso. Vocês não tinham nenhum vínculo profissional.
  — É, isso é verdade. Mas deixe isso de lado. Você disse que não está saindo com o Jeremy, então você não está saindo com o Jeremy!
  — Tente meter isso na cabeça daquela sua esposa! Por favor!
  — Não me comprometo com isso, ela é muito cabeça dura... — brincou. — Mas, será que agora você poderia me levar para a casa dessa mulher doida?
  — Você não quer jantar antes?
  — Prometi a sua mãe duas coisas: Que eu iria levar a Florinda amanhã de manhã para o Bill, e que você jantaria conosco hoje!
  — Tudo bem, seu Gerard, tudo bem. — bufei em tom risonho.

  — Porque você está dirigindo assim? — meu pai perguntou, assim que entramos na Interestadual.
  — Assim como?
  — Como se tivessem prendido uma tonelada de pedra ao seu carro.
  — Eu só não quero outra multa, pai... — revirei os olhos.
  — Você quer ver o seu policial? — ele brincou.
  — Primeiro: Não. Segundo: Ele não é meu, pelo amor de Deus!
  — Você tem certeza que não o conhece? Streetsville é tão pequena, minha filha...
  — Eu posso tê-lo visto perto do parque... Eu não sei, pai...
  Então seguimos a curta viagem apenas escutando as músicas que uma rádio qualquer tocava.
  Dobrando na rua em que meus pais moravam, Gerard começou a tamborilar os dedos pela coxa.
  — Está nervoso?
  — Um pouquinho...
  — Não fica com medo da mamãe! — sorri e estacionei o carro no meio fio em frente à casa de uma tonalidade bem clarinha de amarelo. — Ela briga, mas depois esquece. Experiência própria!
  — Mas ela ainda vai ficar umas semanas sem a Florinda, então vai demorar um pouco para passar esse mau humor dela.
  — Vamos logo, eu estou faminta!

  — Até que enfim você resolveu dar as caras! — minha mãe me abraçou assim que passamos pela porta. — Lembre-se de que aqui ainda é a sua casa, ! — me segurou pelos ombros e me analisou de cima a baixo. — O que é isso na sua testa?
  — Eu bati hoje de manhã na mesa, e sim, ainda está doendo. — suspirei. — E eu sempre venho aqui, mamãe!
  — Venha, vamos passar uma pomada para isso. — segui em seu encalço pelo corredor coberto de fotos minhas com meus pais, meus avós e com alguns amigos que eu nem mais falava, até o armário de remédios, no quarto. Me sentei na cama enquanto ela passava o produto. — Uma vez por mês não é sempre. — retrucou.
  — Deixe a menina, Carla, ela está com fome. — meu pai adentrou no quarto.
  — A comida já está na mesa, vamos. — nos direcionou até a mesa de jantar, repleta de comida caseira. — Gerard, espero que você já tenha ligado para o Bill e amanhã mesmo leve a minha Florinda para consertar!
  — Você já viu como ela está, mãe? — sorri. — Um desastre!
  — ! — meu pai me repreendeu e eu sorri ainda mais alto. — É claro que já falei com o Bill, querida. Ele disse que amanhã mesmo já vai começar o serviço.
  — Eu espero! — deu as primeiras garfadas na comida e nós a acompanhamos. — A Den ligou ontem falando das coisas que aprontou...
  — Ora, por favor, vamos deixar isso para lá? — ela assentiu e voltou a comer.
  — Mãe, a comida está tão boa... — disse me deliciando com uma quantidade generosa de risoto ao creme de queijo. — Talvez eu volte a almoçar todos os dias aqui...
  — Mas nem por cima do meu cadáver! — ela se engasgou com a comida, mas voltou a falar quando tomou um pouco do vinho caseiro que a fazenda dos meus avós ainda produzia. — Você acha que eu vou me matar na cozinha só para ter você aqui conosco? — retorceu a boca. — A senhorita está redondamente enganada, mocinha. E ainda por cima me esconde um namorado! Você ainda é a minha filha, e me deve satisfações!
  — Mamãe! Eu não tenho namorado, e eu nunca sei se devo vir visitá-los ou não, porque você sempre fala que eu só venho pela sua comida! — afastei o prato que ainda tinha metade de comida.
  — Eu quero que você venha nos visitar porque está com saudade, não para ficar enchendo a barriga aqui, e eu quero que você se case e tenha filhos, porque depois eu já vou estar velha demais para ficar mimando meus netos!
  — Carla, fica calma... Deixa a respirar do mundo lá de fora um pouco... — meu pai piscou os olhos azuis para mim e sorriu. — Você fica com saudade dela, mas não vai visitá-la quase nunca!
  — Pai... Não. Deixa.
  — Eu não vou visitá-la porque ela deveria morar aqui conosco ou perto de nós! — ela me olhou e franziu o cenho e retorceu os lábios carnudos. — Porque você não mora aqui em Lancaster, ?
  — Eu nasci e cresci aqui na capital, mãe, agora eu preciso de uma folga de toda essa agitação, por isso Streetsville é o meu lugar!
  — Mas... — eu apoiei minha cabeça nas mãos e suspirei, sabendo que mais uma vez nós entraríamos no discurso você-deveria-morar-conosco. — Tudo bem, eu te entendo... Me desculpe, meu amor. — olhei para ela, que remexia os cabelos castanhos e lisos, como se não quisesse ter essa conversa.
  — Agora termine de comer, ! — meu pai pediu. — Você vai dormir aqui?
  — Não, eu preciso terminar um projeto ainda. — voltamos a comer e a conversa voltou para lugares seguros.

O primeiro encontro? - julho, 16

  A semana passou lenta e tediosa, com meus olhos buscando por algum sinal do policial em todas as minhas viagens de Streetsville a Lancaster e na volta, mas não tive sucesso.
  Ainda na quarta-feira, fechamos contrato com os Millers.
  — Você fez um excelente trabalho, babe! — Jerry me parabenizou com um selinho.
  — Não faça isso enquanto estamos dentro da empresa. — arregalei meus olhos para todos os cantos da sala de reunião, à procura de alguém que pudesse ter visto.
  — A empresa é minha, relaxa! — sussurrou em meu ouvido e estremeci. — O que acha de comemoramos hoje?
  — Comemorar como? — beijei seu pescoço e o vi se arrepiar.
  — Você poderia dormir lá em casa...
  — Gosto de como isso está soando. — sorri e ele retribuiu.
  — Pensei que você ainda estava com raiva de mim, sabe, mas aqueles seus e-mails eram muito dramáticos para um final de semana. — ele levou nossas mãos entrelaçadas até os lábios e depositou um beijo terno.
  — Nós podemos conversar hoje à noite?
  — Podemos fazer o que você quiser, .

  — E então, eu e o Derek conversamos hoje sobre uma provável data...
  — Isso é perfeito, ! — murmurei para a minha amiga, que estava na escola onde dava as aulas para turmas de crianças.
  — E você? O que aprontou essa semana? Eu soube do seu pai! — ela sorriu e não pude deixar de olhar para a foto dos meus pais, que ficava na mesa em meu escritório. — Meu Deus! Ele fica mais criativo a cada dia!
  — Nem me fale. — sorri, relembrando das suas armações. — Você acredita que eu precisei sair de casa às duas da manhã para buscá-lo no hospital com a Denise?
  — O Derek estava de plantão, ele viu quando seu pai chegou, mas achou melhor a Denise cuidar pessoalmente dele.
  — Não sei mais o que faço com aqueles dois loucos que eu tenho como pais. — nós sorrimos. — Ah, me esqueci de te contar, assinei mais um projeto hoje!
  — Uau! Você está com tudo, garota! — ela vibrou. — Não se esqueça de que quando for a minha casa com o Derek, quero uma coisa exclusiva dessa sua cabeça!
  — A sua casa está guardada a sete chaves, meu bem!
  — Maravilha! — ouvi umas conversas ao fundo da ligação. — Preciso desligar, meus alunos estão voltando para a sala... Nós nos vemos no domingo?
  — Domingo? — vasculhei meu cérebro, mas não me lembrei de nada.
  — O aniversário do Derek, ! Não se esqueça, por favor! Vamos estar te esperando no pub do Irlandês, aquele de sempre. Preciso desligar, desculpe. Amo você!
  — Estarei lá! Amo você também!
  Desligamos e voltei ao trabalho. Ajustes e mais ajustes nas plantas de outras famílias e de algumas empresas.
  Às 17h00min em ponto, Jeremy veio até a minha sala.
  — Vamos?
  — Ah... Jerry, eu preciso mesmo finalizar isso aqui, chego à sua casa em uma hora, tudo bem?
  — Gosto de ver você toda esforçada no trabalho... — ele sorriu e eu o acompanhei. — Te vejo lá!
  Ele se retirou e voltei aos meus ajustes.
  Às 18h14min, eu estava entrando no meu carro, a caminho da casa de Jerry. Porque você insiste nesse idiota? Ele só está com você pela sua competência profissional!, meu cérebro me alertou, mas não ousei dar ouvidos a ele.

  — Pensei que você tinha desistido de mim... — Jeremy murmurou abrindo a porta escura de sua casa.
  — Porque pensou isso? — perguntei confusa.
  — Não checou seu e-mail antes de sair da empresa? — neguei. — O Greg me ligou e disse que mandou uma proposta para você. Ele quer você na empresa dele, babe, e eu não posso perder você!
  — Jerry... — ele beijou meu pescoço e juntou nossos corpos, fechando a porta atrás de mim.
  — Shhh... — começou a beijar meus lábios com voracidade, gosto e algo a mais que eu não sabia dizer o que era.
  — Jeremy, espera! — coloquei minha cabeça na curvatura do seu pescoço. — Eu preciso saber o que nós temos.
  — O que nós temos? — ele me segurou pelos ombros e nos afastou para olhar em meus olhos.
  — Sim. Essa coisa que nós temos há dois anos. O que é isso?
  — Eu pensei que nós fôssemos um casal... Não? — ele olhou intrigado.
  — Um casal com um relacionamento sério?
  — Não, . Isso é coisa do passado. — desconversou. — Você quer um relacionamento sério?
  — Bem... — desviei o olhar do dele para os meus dedos, agora inquietos. — Talvez nós possamos tentar.
  — , olha para mim. — colocou os dedos abaixo do meu queixo e levantou meu rosto. — Você tem certeza? Assim, do nosso jeito, nós não precisamos nos preocupar com essas coisas de relacionamento. Isso é tão chato. — revirou os olhos.
  — Esse não é o nosso jeito, Jerry, esse é o seu jeito.
  — O que você acha de nós conversamos sobre isso após o jantar? — ele sugeriu. — Eu pedi pizza, a sua favorita!
  — Você tem muita sorte de eu estar faminta! — o empurrei de leve e segui até a sala, querendo ao mesmo tempo conversar e esquecer essa conversa.
  Nós jantamos deitados no sofá de couro confortável da sala de estar, assistindo a essas comédias românticas, que me estressam, na tela plana grande demais para uma pessoa que mora só.
  — Talvez nós não devêssemos ter um relacionamento sério, no final das contas. — quando vi, já tinha falado alto.
  — Por quê? — ele estava agarrado ao meu pescoço. — Não é isso que você quer?
  — É e não é. — sorrimos. — Eu sei que sou confusa, mas não quero me comprometer com alguém se eu mesma não sei se quero isso.
  — Agora estamos falando a mesma língua! — distribuiu beijos pelo meu pescoço, queixo e boca. — Vamos para o quarto?
  — Nós podemos fazer, aqui no seu sofá, as mesmas coisas que podemos fazer na sua cama. — sussurrei em seu ouvido enquanto sentava em seu colo, com uma perna de cada lado do seu corpo.
  — É bom eu anotar isso! — brincou e voltou a me beijar.
  Comecei a desabotoar a sua camisa enquanto ainda estávamos nos beijando, chegando ao último botão eu fui descendo meus beijos pelo seu tronco até a base da sua calça, onde comecei a retirar o cinto e desabotoá-la.
  — Assim eu apaixono, . — ouvi a voz ofegante de Jeremy.
Comecei a massageá-lo ainda por cima da calça, voltando meus lábios pelo caminho de beijos que antes havia distribuído pelo seu corpo.
  — Eu consegui a aprovação de um projeto muito bom para a sua empresa... — sussurrei quando cheguei ao seu ouvido. — Acho que eu mereço um agrado seu. — mordi o lóbulo e ele gemeu quando meus dedos o apertaram, ainda por cima da boxer, um pouco mais forte.
  Ele agarrou meu quadril e me pressionou contra a sua ereção e soltei um gemido ainda em seu ouvido.
  — Eu concordo que você merece um agrado. — ele soltou o ar dos pulmões. — Mas no momento eu preciso muito ser enterrado em você!
  Ele colocou as mãos por dentro da minha saia e apertando as minhas coxas, foi levantando até a cintura. Voltei as minhas mãos até a sua boxer e comecei a abaixá-la. O único pedaço de tecido entre nós era o da minha delicada calcinha de renda preta, mas ao invés dele retirá-la, ele subiu suas mãos para desabotoar a minha camisa, lentamente, para logo em seguida jogá-la para o outro lado do sofá. Distribuiu beijos quentes pelo meu colo e desabotoou meu sutiã, também de renda preta, e abocanhou meu seio e apalpou o outro, ainda se pressionando contra a minha intimidade. Ele estava me estimulando em todos os lugares, eu o sentia em todos os lugares. E cada vez ele me apertava contra ele.
  — Se você acha que isso não é agrado... — sussurrei enquanto ele pressionava sua ereção mais uma vez contra mim.
  — Você merece. — soprou entre os meus seios e eu me arrepiei.
  Suas mãos desceram pelo meu tronco, coberto parcialmente na cintura pela saia, até a minha calcinha e foi retirando-a delicadamente. Seus dedos me investiram de uma só vez, sem aviso prévio e eu gemi mais alto. Uma das minhas mãos voltou a sua ereção e comecei a masturbá-lo também.
  — Eu não vou aguentar muito tempo assim, . — soltou um murmúrio sofrido.
  Ele retirou seus dedos de mim e rapidamente me penetrou. Fundo.
  — Ah! — gemi, alto o suficiente para chegar aos outros cômodos da casa.
  — Parabéns pelos clientes de hoje. — estocou mais uma vez, na mesma intensidade, e para conter meus gemidos, colou sua boca na minha.

  Acordei com a pouca claridade vinda da janela coberta por uma cortina transparente que não servia para nada. Percebi que estávamos no quarto e ele estava deitado de bruços ao meu lado.
  Me levantei e corri ao banheiro do quarto para despertar por completo. Quando voltei, procurei minhas roupas jogadas de qualquer jeito numa poltrona e assim que as achei, vesti.
  — Jerry, eu já estou indo. Vejo você mais tarde! — disse baixinho em seu ouvido e depositei um beijo em sua bochecha.
  Ainda eram cinco da manhã, e eu precisava ir para casa e voltar até as oito para a empresa.
  Corri o quanto pude com o carro, sempre com receio de encontrar . Assim que cheguei em casa, tomei um banho e me arrumei. Tomei um café rapidamente, e já eram quase sete da manhã.
  Estava saindo de casa quando meu celular apitou com a chegada de uma nova mensagem.
   “Odeio quando você me deixa acordar sozinho...”

  Respondi imediatamente.
   “Eu precisava tomar um banho e de roupas novas.”
   “Você sempre pode tomar banho aqui em casa, e quem sabe ter uma roupa ou duas...”
   “O que você está me propondo, Jeremy? Hahah Acho melhor conversamos sobre isso depois.   Estou saindo de casa.”

  Ele não respondeu.

  Quinta-feira passou voando e a tão sonhada sexta-feira chegou.
  — Alô, Den? Hoje você vai trabalhar à noite? — liguei para a minha prima. Estava com saudade de confraternizar com ela.
  — Oi, ! Hoje eu tenho plantão. — murmurou cabisbaixa. — Mas diga, o que está pegando?
  — Pegando, pegando, nada. — brinquei e ouvi sua risada através do telefone. — Eu só estou saindo aqui da empresa e pensei que nós poderíamos ir a algum lugar, colocar a fofoca em dia...
  — Ah, poxa! Hoje não dá. Mas podemos fazer isso no domingo, aniversário do Derek! — ela lembrou. — Que tal?
  — Sim! Nossa, obrigada por me lembrar. — sorri. — Eu preciso mesmo comprar algo para ele.
  — Eu comprei um novo estetoscópio, o que ele anda aqui pelo hospital está mais velho do que o Vovô ! — tivemos um acesso de riso.
  — Vou comprar algum livro, sei que ele gosta, principalmente algum sobre medicina! — alguém chamou meu nome fora do escritório. — Olha, eu preciso ir, mas nos vemos no domingo!
  — Até lá! Se cuide!
  — Até!
  Desliguei. Precisei resolver algumas coisas mínimas e segui até uma livraria no final do quarteirão.
  Procurei um bom tempo por livros interessantes sobre medicina, até que achei um que se encaixava perfeitamente na atual situação de Derek, “Como ser um bom marido e médico ao mesmo tempo?”.

  — Will I ever back down my sword to protect our home? — parei de acompanhar a música do rádio assim que o carro começou a morrer. Fui obrigada a ir para o acostamento. — Droga, droga, droga! O que aconteceu com você? — tentei ligar o carro, mas não acontecia nada. — Ah, mas que ótimo! Vamos lá carrinho, por favor! Não me deixa aqui assim... — senti meus olhos arderem. Eu vou chorar! — Porra! Eu não posso chorar aqui. Não no meio da estrada... — e as lágrimas chegaram.
  Passei uns minutos ou horas chorando, não sei ao certo. O Jerry estava certo, a TPM me deixa uma chata.
  — Você precisa de ajuda? — levantei minha cabeça rapidamente e olhei para a janela, e encontrei .
  — Oi. — disse limpando meus olhos de algumas lágrimas que ainda insistiam em cair. — Desculpe.
  — Por que você está me pedindo desculpa?
  — Não sei. — sorri.
  — Não se preocupe com isso. — ele sorriu de volta. — Então, problemas com o carro?
  — Fiquei sem gasolina.
  — Você quer... Digo, você precisa de um guincho ou já ligou para alguém? — neguei. — Eu posso te levar até a cidade e de lá você chama o Bob.
  — Quem é Bob? — perguntei confusa.
  — Bob é o Roberto, do guincho.
  — Ah...
  — Então, o que vai ser?
  — Você não está de uniforme. — comentei o óbvio quando percebi que ele estava apenas com uma calça jeans qualquer, tênis e uma camisa quadriculada que era engraçada demais.
  — Hoje é meu dia de folga.
  — E o que você está fazendo por aqui? — perguntei, com certa curiosidade.
  — Eu estava em Lancaster, resolvendo uns problemas.
  — Posso te pedir um favor? —ele assentiu. — Você pode me levar para o primeiro lugar que venda bebida alcoólica aqui perto?
  — As coisas estão uma droga mesmo, não? — assenti mais uma vez. — Conheço um lugar muito bom perto da entrada de Streetsville.

  — Você não me disse que o lugar legal era uma loja de conveniência, em um posto de gasolina. — franzi os lábios.
  — Qual o problema de ser em um pos... — ele se interrompeu ao notar a coincidência. — Ok, isso foi estúpido. Você precisando de gasolina e eu trago você ao posto!
  — Está, tudo bem. Obrigada.
  — Eles têm o melhor sanduíche aqui! Você está com fome?
  — Na verdade, eu acabei de comer antes de sair de Lancaster...
  — Tudo bem, eles ainda tem as suas bebidas alcoólicas aqui. — brincou.
  — Você não bebe? — ele assentiu sorrindo. — Então não diga que são as minhas bebidas alcoólicas!
  — Tudo bem, me desculpe, só não sou de beber muito. Coisa da profissão.
  Sentamos no balcão, ocupado por uma pessoa ou outra, cada uma com uma long neck de Budweiser.
  — Sabe, você não me disse o seu nome... — murmurei entre um gole da cerveja.
  — Já disse a você. , esqueceu? — ele me fitava e eu apenas passava os olhos do balcão para a minha long neck.
  — Você não pode se chamar ! É estranho! — sorri, mas ainda não olhei em sua direção.
  — Não é estranho. — nossos olhares se encontraram e sorrimos. — Só não é comum!
  — Se você diz...
  Ficamos na loja de conveniência do posto até umas 03h20min da madrugada, que foi a última vez que olhei meu relógio de pulso.
  — Acho que eu deveria levar você para o seu apartamento. — o policial comentou.
  — Já estou chata o suficiente para você?
  — Eu não disse isso, mas você bebeu um pouquinho além da conta. — arregalei meus olhos para ele. Não acredito que ele disse que estou bêbada! — E eles precisam fechar daqui a pouco.
  — Não acredito que você disse que estou bêbada! Meu Deus! — tive um acesso de riso, chegando a apoiar a cabeça no balcão.
  — , não. Eu não disse isso, mas nós precisamos ir.
  — Não me chame de ! Só os meus amigos e família me chamam de ! — brinquei.
  — Desculpe. — ele deu mais um gole na sua cerveja e olhou para frente.
  — Se você me disser o seu nome, talvez eu deixe você me chamar de ...
  — Eu já lhe disse o meu nome uma vez. — O quê? Do que ele está falando?
  — Como assim? — olhei para ele, intrigada. — Nós já nos conhecíamos? — perguntei mais baixo, com vergonha.
  — Nós já nos esbarramos num pub, perto do seu prédio... Você não se lembra mesmo, não é?
  — , me desculpe... Eu não...
  — Não, não tem problema! — ele sorriu. — Nós não conversamos mais que umas duas palavras. — suspirei aliviada. — Só passamos a noite toda nos olhando, foi bem estranho...
  — Isso foi quando?
  — Mês passado, eu acho... — desconversou.
  — Desculpe.
  — Você tem essa mania de ficar pedindo desculpa quando não tem nada para se desculpar. Isso é engraçado. — ele se levantou do banco e me ofereceu a mão. — Vamos, vou deixar você na sua casa.
  Assenti e saímos de lá. Um caminho rápido e silencioso até o meu prédio.

  — Você quer subir? — ele arregalou os olhos na minha direção. Eu não acredito que acabei de falar isso em voz alta! — Desculpa, eu... Não era isso que eu ia dizer!
  — Pare de pedir desculpas! — nós sorrimos. — Eu levo você até lá.
  Saímos do carro e passamos sem fazer qualquer barulho pela portaria, elevador e, finalmente, a porta do meu apartamento.
  Com a luz do corredor pude perceber como ele estava bonito. A camisa que antes eu achava engraçada, agora o deixava com um ar sexy. Ele estava todo sexy. Ou talvez fosse o álcool circulando pelo meu organismo. Seus olhos eram sempre muito intensos e brilhosos, assim como seus cabelos arrumados e cortado baixinho, mas que pareciam ser macios, e a sua boca era bem desenhada e convidativa, estava levemente vermelha. Imaginei ser do frio que chegava na cidade aos poucos.
  — Boa noite, senhorita . — ele sorriu e eu não parei de olhar para a sua boca.
  — Eu poderia muito beijar você agora. — assim que as palavras saíram, eu tapei minha boca. Nunca mais vou beber e dizer essas coisas! Nunca mais vou beber e dizer essas coisas! Repetia no meu cérebro, enquanto sentia minhas bochechas ficarem rubras.
  — Eu também. — ele se aproximou o quanto pode, ainda sem me tocar, mas transmitindo o calor do seu corpo. Fechei meus olhos e me permiti aproveitar a sensação. — Mas podemos deixar isso para quando você estiver sóbria.
  — Droga. — murmurei sem emitir som algum e abri meus olhos. — Boa noite, .
  Abri a porta de casa e esperei que o elevador chegasse, e, antes de ele entrar, olhou para mim e disse:
  — Aliás, meu nome é . — sorriu e me deixou plantada na minha porta e querendo ser beijada.

  , , ... A droga do nome dele não me deixava dormir. Já havia tomado um bom banho, comido um sanduíche de queijo, tentado ler e agora me revirava na cama tentando dormir.
  Já são quase 05h00min da manhã, você precisa dormir um pouco... Meu cérebro tentava me alertar, mas não surtia muito efeito. Liguei a televisão numa última tentativa de dormir, mas ainda vi uns dois episódios de uma série que estava passando e finalmente senti minhas pálpebras pesando.
  Acordei num sobressalto. Achei estar ouvindo meu celular tocar, mas ele estava ao meu lado, completamente descarregado, até que descobri que o som vinha da porta do apartamento. Só meus pais, Denise e estavam autorizados a subir sem serem avisados. Levantei e minha cabeça latejou. Odeio ficar de ressaca!
  — Droga, ! — murmurei assim que abri a porta.
  — O que você tem? — ela me olhou dos pés à cabeça. — Porque não atendeu minhas ligações?
  — Não ocorreu para você que eu estava dormindo?
  — Não!
  — Bem, pois eu estava. — deitei no sofá e ela me acompanhou, puxando as minhas pernas para o seu colo. — Minha cabeça está quase explodindo e estou com cólica!
  — Por isso trouxe um chocolate quente para você. — ela estendeu um copo na minha direção. — Embora ele esteja só morno agora.
  — Obrigada. — me sentei, mas continuei com as pernas sobre as dela. — Que horas são?
  — Acho que já são 11h30min. Vim te chamar para almoçar!
  — Está sem comida na sua casa e o Derek está de plantão? — ela sorriu e assentiu com a cabeça. — Se não sou eu para salvar a sua vida, o que seria dela?
  — Nadinha de nada. — continuou sorrindo e ligou a televisão. — Fiquei sabendo que você chegou tarde ontem... E acompanhada! — comentou como quem não quer nada.
  — Quem foi o fofoqueiro?
  — Blake. — tomou o chocolate da minha mão e tomou um gole. — Pensei que o Jeremy não viesse muito à cidade...
  — Eu não estava com o Jeremy ontem. — vi minha amiga arregalando os olhos e não pude conter o riso. — Eu encontrei um conhecido, ele apenas me ofereceu uma carona. — lembrei que não havia ligado para o número do guincho que havia me passado. — Droga! Meu carro, ! — dei um pulo só sofá, atrás da minha bolsa.
  — O que tem seu carro? — minha amiga apareceu na porta do meu quarto.
  — Me empresta seu celular, até o meu carregar eu já morri... — ela me passou o aparelho e me olhou confusa. — Meu carro ficou sem gasolina ontem, no meio da estrada!
  — E o seu conhecido apareceu milagrosamente? — revirei os olhos e assenti.
  — Cala essa boca! — brinquei. — Olá, bom dia! Eu gostaria de solicitar o guincho.
  — Bom dia! Onde o veículo se encontra? — uma voz soou do outro lado da linha.
  — Ele está no caminho de Lancaster para Streetsville, é um Hyundai Azera, preto, com a placa SBC-1995.
  — É a senhora que está falando?
  — Ah... Sim.
  — Senhora, o ligou mais cedo e pediu para deixar o seu carro na frente do prédio, aquele alto aqui do centro da cidade.
  — Ele ligou? — encarei minha amiga, que estava boquiaberto me olhando.
  — Sim, o é um velho conhecido... Você o conhece, certo?
  — Sim, sim.. E quanto ficou o serviço?
  — Ele já resolveu isso. — não proferi uma palavra. Estava atônita. — Isso é tudo, senhora?
  — Ah, sim, claro. Muito obrigada!
  — Disponha. O Guincho do Bob agradece! — e desligou.
  — O quê? — abanava as mãos, sem saber o que fazer.
  — O meu carro já está aqui embaixo. — sentei na beirada da cama.
  — Como assim? — ela sentou-se ao meu lado. — Ferris-, trate de me explicar agorinha mesmo!
  — Bem... — respirei fundo. — Aparentemente, o mandou o guincho trazer o meu carro até aqui.
  — Uau! Go cowboy! — gracejou, com direito a um soco no ar. — E você vai agradecê-lo como?
  — ! — a repreendi. — Eu nem tenho o número dele nem nada. Ele não tinha que ter feito isso, não era obrigação dele.
  — Você deveria agradecer... — sussurrou, analisando as unhas.
  — Vamos almoçar ou não? — desconversei e fui ao banheiro para tomar banho.

  — E então...? — perguntou, quando sentamos num restaurante simples no final do quarteirão, com especialidade em massas e comida caseira gordurosa boa demais para ser dispensada.
  — Acho que quero uma macarronada, e você? — folheei o cardápio, ainda em dúvida.
  — Eu estava perguntando do . — ela sorriu.
  — , você pode parar com isso? Eu nem conheço o cara direito!
  — Mas vocês já até saíram para beber juntos...
  — Nós não saímos para beber, ele apenas me ofereceu uma carona. Ele é policial. Policiais fazem isso pelas pessoas!
  — Eu conheço um !
  — Tenho certeza que não é o mesmo. — revirei os olhos e chamei o garçom.
  — Ele é amigo do Derek, pode ser o mesmo...
  — Já estão prontas para pedir? — o garçom perguntou.
  — Quero uma macarronada com molho bolonhesa, por favor.
  — Quero frango empanado com arroz e fritas! — sorriu. — Ah, e nos traga logo um suco de laranja. Obrigada! — o garçom assentiu e se retirou.
  — Você come e não engorda. Tenho inveja de você!
  — Eu sei! — brincou. — Mas, voltando ao assunto... O , amigo do Derek, vai ao aniversário dele amanhã. Talvez, se for o mesmo cara, vocês...
  — Vocês o quê? Eu não estou caçando homem! — sussurrei. — Talvez eu leve o Jerry, tudo bem?
  — Sério? — revirou os olhos. — Quantas vezes, desde que vocês estão juntos, que nós quatro saímos como um casal?
  — Umas quatro vezes?
  — Duas! E uma nem conta, porque era festa da sua empresa e ele era obrigado a estar lá!
  — Isso não quer dizer nada, ... Acho que as coisas estão mudando entre nós.
  — Se estão mesmo mudando, que bom. Já estava mais do que na hora!
  — Nós podemos mudar de assunto? — bufei. — Meu Deus, quando você insiste numa coisa, não larga nunca!
  — Não mesmo! Quero conhecer o seu policial particular! — gracejou.
  — Cala essa boca! — e nós sorrimos.

  — Você vai subir, ? — ela negou. — Você só veio me usar para não ficar sozinha no almoço, não é?
  — Você sabe que sim. — sorrimos. — Eu preciso ir até Lancaster, pegar o presente do Derek e dar um jeito de esconder dele.
  — Você pode deixar aqui em casa na sua volta e amanhã eu levo para o pub.
  — É, parece que assim ele não vai ficar me importunando para saber o que eu comprei.
  — E o quê você comprou?
  — Umas coisinhas que apenas casais precisam saber do que se trata.
  — Sua safada! — tapei meus ouvidos. — Vá embora! Eu não quero saber da sua vida sexual com o seu noivo! Vá!
  Ela sorriu e começou a sair do prédio, mandando beijos pelo ar.

  — Estou esperando um lugar para dormir hoje... — a voz suplicante da minha prima soou pelo telefone.
  — Oi Den! Sim, estou bem, e você? — brinquei e ela sorriu. — Você sabe que pode ficar aqui em casa.
  — Mas não vou ter que dormir naquele seu sofá de pedra, vou?
  — Não. E eu troquei aquele pedaço de rocha por um sofá novinho e confortável, desde a última vez que você veio me visitar
  — Bem, sendo assim, talvez eu não precise dormir na sua cama com você!
  — Talvez não. — sorri.
  — Tudo bem, então daqui a pouco saio de casa e passo no seu apartamento para deixar minhas coisas, e vamos juntas para o pub.
  — Faça isso. Se a chuva passar, podemos ir andando para o pub!
  — Isso é ótimo! Estou indo.
  — Até!

O primeiro beijo - julho, 20

  Desde o almoço de sábado que tive com , não parei de pensar nas suas palavras, “O , amigo do Derek, vai ao aniversário dele amanhã. Talvez, se for o mesmo cara, vocês...”. Ela espera que eu case com o cara só porque ele me deu uma carona? Fala sério!
  Com essa enorme dúvida na cabeça, ainda no sábado eu havia saído para comprar uma roupa especialmente para o aniversário do Derek, porém, no fundo, eu sabia que queria estar bem vestida caso o , amigo de Derek, fosse o mesmo que havia me dado a carona.
  — Uau! — Denise soprou assim que apareci na sala do apartamento. — Você vai sair com alguém ou só vamos ao aniversário do Derek?
  — Só vamos ao aniversário! — E talvez eu acabe saindo com um policial super gato depois! Continuei em pensamento e revirei os olhos. — Você acha que está demais?
  — Só não curti a bota, e não entendi porque não mostra as suas pernas... Você não é alta, e ficar usando sapato sem salto não te leva às alturas! — brincou.
  — Eu até comprei um vestido ontem, mas está frio e chovendo... E não sei se essa calça jeans vai ser suficiente. A bota ao menos esquenta meus pés!
  — Ah, meu Deus! Nós vamos beber, o seu frio vai passar, eventualmente...
  — Eu trabalho amanhã, então não vou beber a mesma quantidade que você, Den! — meu celular tocou. . — Oi, já estamos saindo...
  — Eu sei que o pub do Irlandês fica perto da sua casa, mas já são oito horas da noite e eu queria dar o presente do meu noivo!
  — Eu já estou indo! Você viu que a chuva só passou agora?
  — Só chegue logo, ok?
  — Tchau, ! — desligamos.
  — A sua bunda está fabulosa nesse jeans! — Denise disse ao passar pela porta.
  — Cala a boca, Denise! — disse, trancando o apartamento.

  — Pensei que você tinha se mudado para Lancaster e estava vindo de lá. — ) murmurou assim que chegamos ao pub.
  — Está chovendo, . — Denise lembrou.
  — Nós tivemos que parar no meio do caminho porque a Den está com esse salto enorme. — expliquei e me dirigi ao meu amigo, entregando o presente e lhe dando um abraço apertado. — Feliz aniversário, Derek!
  — Nem acredito que você é mais novo do que eu. — Denise lamentou, mesmo que ele fosse apenas um ano mais novo que ela. — Mas aqui está! Sei que vai ser bem útil!
  — Obrigado, meninas! — ele agradeceu e nos sentamos com o restante do pessoal na mesa.

  — Você parece diferente... — soprou em meu ouvido. — Tudo bem?
  — Sim. Você? — ele assentiu.
  — Não sabia que vocês se conheciam. — Derek comentou, nos observando atentamente com seus olhos verdes que pareciam brilhar.
  — Precisei passar uma multa nela. — eles sorriram.
  — No dia que seu pai sofreu o acidente, ? — Denise perguntou e eu confirmei.
  , pare de me olhar assim! Pensei no modo como minha amiga me olhava, tão compenetrada quanto o noivo, mas mexia furiosamente nos cachos de seu cabelo loiro. Parecia que ia me matar a qualquer momento, mas voltamos a conversar normalmente.
  — Você não me disse que seu pai tinha sofrido um acidente.
  — Eu não disse?
  — Só me lembro que você comentou que estava indo buscá-lo, não?
  — Eu sinceramente não me lembro, .
  — Você quer uma cerveja? — neguei e ele estreitou os olhos.
  — Tenho que trabalhar amanhã de manhã. — expliquei.
  — No que você trabalha?
  — Na House's Arquitetura.
  — Você está de óculos! — franzi a testa sem entender. — Isso que tem de diferente em você.
  — Ah... Às vezes preciso usá-lo, nada demais. E você já me viu de óculos.
  — Você está bem bonita hoje! Você fica bem de verde. — comentou sobre a cor da blusa que usava por baixo da jaqueta.
  — Só hoje? Puxa, obrigada! — brinquei.
  — Você entendeu o que eu quis dizer. — um silêncio incômodo se instalou entre nós.
  Me levantei da mesa quando meu telefone tocou, mas não pude deixar de notar os olhos de sobre mim enquanto me afastava.
  — Oi Jerry!
  — Onde você está? — quis saber.
  — Estou no aniversário de um amigo. Você quer vir? — Que diabos você está fazendo? O está aqui!
  — Em Streetsville? — afirmei. — Ah, , você sabe que eu não falo muito com os seus amigos...
  — E de quem é a culpa? Eu sempre convido você, Jeremy, sempre.
  — Eu sei, só não me sinto muito confortável com eles.
  — Isso é porque você não os conhece.
  — Vamos deixar para uma próxima, está bem? Escute... Amanhã você vai para a empresa?
  — É claro. Algum problema?
  — Nada, não se preocupe, só queria falar com você. — acrescentou. — Pessoalmente.

  — Não me diga que era o Jeremy.
  — Sim, , era. — revirei os olhos, me sentando entre e um dos amigos também médico do Derek e de frente para ela. — Apenas me lembrando de que amanhã preciso ir trabalhar.
  — Você deveria pedir um aumento para ele. — brincou e os demais riram.
  — Seu chefe costuma te ligar aos domingos? — sussurrou.
  — Não exatamente. — desconversei. — Agora eu aceito aquela cerveja que você me ofereceu mais cedo.
  — Você vem? — me ofereceu a mão quando levantou. — Podemos conversar melhor no balcão.
  — Uaaaaau! — quase gritou. Segurei sua mão e levantei revirando os olhos para a minha amiga.

  — Então... O que você faz no seu trabalho? — ele quis saber quando colocou uma cerveja na minha frente.
  — Obrigada. — sorri. — Eu faço plantas para prédios, casas, essas coisas...
  — Você passa o dia todo presa num escritório?
  — Só das 08h00min às 17h00min, depende do dia.
  — Depende do seu chefe?
  — Ah... Não. Por que dependeria do meu chefe?
  — Só estou perguntando. — tomou um gole e eu o acompanhei.
  — Depende, se eu tenho que ir checar alguma construção, visitar um cliente, participar de exposições, apresentar palestras nas exposições. Tem uma gama de “dependes”. — fiz aspas com os dedos.
  — Você parece ser bem importante nessa coisa toda de projetar construções.
  — Eu procuro ser importante. — ele assentiu.
  — Você se lembra do que me disse quando fui te deixar na sua casa, não é? — engasguei com a cerveja e senti meu estômago retorcer. Ele deu batidinhas em minha costa. — Está tudo bem?
  — Sim. — levantei um dedo, como quem pede um minuto e tossi algumas vezes. — Sim, eu me lembro. Não acredito que você está falando sobre isso!
  — Por que não? — ele sorriu. Não conseguia olhar nos olhos dele. — Você só quer me beijar quando está bêbada?
  — Eu não estava bêbada! — falei um pouco mais alto, atraindo atenção alheia e olhando diretamente para ele. — Eu não estava bêbada. — sussurrei.
  — Então nós não precisávamos ter esperado.
  — O quê? Esperado o quê?
  — O beijo. Você ainda quer me beijar, certo?
  — Olha, ... — cocei a nuca. — Eu não sei se isso é uma boa ideia.
  — Você tem namorado? — arregalei meus olhos para ele. — É o seu chefe que liga aos domingos, não é?
  — Não seja ridículo! É claro que não namoro o meu chefe! — isso não é uma mentira, nós não namoramos.
  — Sei... — sorriu com o canto da boca. — Então o quê?
  — Nada. Só não acho uma boa ideia.
  — Por que está nervosa?
  — Não estou.
  — Tá.
  — Tá. — repeti.
  — Eu ainda quero te beijar. — soprou depois de um tempo. — Especialmente hoje.
  — Quê? — virei de frente para ele e o percebi se aproximando. — Nós não podemos fazer isso aqui.
  — Por que não? — ele colocou uma mão nas minhas costas. Ele vai me beijar! — Você quer, não quer? — pediu, encostando nossos lábios levemente.
  Eu o beijei. Isso aí. Assumi o controle.
  A princípio, ele apenas explorava meus limites, mas eu queria sentir seu gosto e fiz nossas línguas se tocaram. Porra, ele sabe beijar! Já estava ofegante quando ele começou a desacelerar.
  — Eu disse, não disse? — falou baixinho, ainda com a testa encostada na minha. —Você queria me beijar.
  — É. — me afastei e saí de seus braços. — Queria.
  — Que bom. — sorriu. — Eu poderia repetir isso, você sabe, a qualquer momento...
  — Vamos com calma, ok? Todos estão olhando. — coloquei as mãos nos bolsos da calça.
  — Não tem problema, . — ele passou as mãos ao meu redor. — Gostei do que aconteceu.
  — ... — falei baixo e sorri olhando envolta. — Ninguém está mais olhando. — sorri e fechei meus olhos enquanto ele encostava seus lábios nos meus.

  — Pensei que vocês não iam parar de se agarrar no balcão... — Denise murmurou quando voltamos à mesa para cantar parabéns.
  — Cala a boca, Den! — pedi e sorriu.
  — Falando em boca... Posso falar bem rápido com você?
  — Claro, Denise, contanto que não seja sobre ele... — apontei para .
  — Vem logo. — pegou meu braço e me puxou. — Não vou mais precisar dormir no seu apartamento, você pode me emprestar a chave para eu pegar a minha bolsa?
  — Espera aí... Por que não?
  — Não é óbvio? — revirou os olhos.
  — Ah... Não.
  — Se você decolasse a cara da boca do , você veria que o Tyler está aqui e que nós vamos para a casa dele daqui a pouco...
  — O quê? O Tyler? — ela assentiu. — Cadê?
  — Ele foi ao banheiro. Mas pare de surtar, nós não estamos voltando!
  — Por quê?
  — Porque nós não estamos voltando. Isso é tudo que você vai conseguir hoje.
  — Você vai trazer a minha chave aqui ou deixar com o porteiro?
  — Porteiro.
  — Só uma coisa. — pedi, tirando o molho de chaves da bolsa. — Usem camisinha!
  — Tchau, ! — revirou seus olhos grandes e castanhos e foi atrás do Tyler.
  Assim que voltei para a mesa, percebi que muitos dos amigos do Derek já haviam ido embora. Comemos bolo, tomamos algumas cervejas e conversamos. Conversamos muito.
  — Eu realmente preciso ir... Já são quase duas, .
  — Ligue para o nosso chefe gato de morrer e diga que não pode ir! — arregalei os olhos. Ela está tão bêbada! — Não é como se ele fosse te negar alguma coisa...
  — Derek... — virei para o meu amigo, buscando apoio. — Eu realmente preciso ir. Feliz aniversário, de novo.
  — Não se preocupa, , o te leva em casa.
  — Eu moro a poucas quadras daqui, não precisa.
  — Claro que precisa. — disse ao voltar para a mesa com outra cerveja e entregá-la ao Derek. — Vamos?
  — Vai, . Eu cuido da ! — meu amigo sorriu e me deu tchau com a mão.
  — Tudo bem. Se cuidem!

  — A chuva poderia estar mais grossa, não reclama!
  — ! Eu poderia pegar uma boa gripe, mesmo que com essas gotas!
  — Claro que não.
  — Está frio demais, até parece o Alasca! — disse quando entramos na portaria do meu prédio. Lá fora a chuva fraca ainda caía.
  — Você já foi ao Alasca para dizer isso?
  — Já, por isso eu disse. — sorrimos. — Blake, acorda! — pedi ao porteiro.
  — Canguru! — chamou por Blake, já quase acordado.
  — Não me chama assim, , ou eu quebro a sua cara! — eu e Blake sorrimos.
  — Você não pode me bater, ou vai preso.
  — Você não está de uniforme. — disse ao me entregar as chaves.
  — Boa noite, Canguru! — ele disse e nos direcionamos ao elevador.
  — Porque Canguru? — sorri.
  — Nós participamos de uma competição de quem pulava mais alto, e o canguru ali conseguiu vencer e ganhar um final de semana de pizza de graça.
  — Isso sim é competição! — sorrimos e saímos do elevador.
  — Nunca tinha comido tanto sabor de pizza diferente.
  — Ah... — paramos na porta do apartamento. — Você vai querer entrar?
  — Você não precisa dormir para ir trabalhar amanhã cedo? — assenti. — Então...
  — Isso não quer dizer que você não pode ficar um pouquinho.
  — Tudo bem. — coçou a nuca. — Só um pouco não vai matar ninguém.
  — Sinta-se em casa. — disse quando entramos na sala e acendi as lâmpadas. — Fique à vontade.
  — Você mora só? — assenti. — Por quê?
  — Ah... Porque sim. — sorri.
  — Nem um cachorro, gato... Nada?
  — Não sei se o prédio permite animais.
  — E seus pais?
  — Se o prédio permite os meus pais? — olhei confusa e ele sorriu.
  — Não, . Onde seus pais moram?
  — Eles continuaram em Lancaster. Na verdade, eu sou de Lancaster.
  — Você é? — franziu o cenho e me puxou para sentar no sofá com ele.
  — Sim. Eles, principalmente a minha mãe, não entendem porque eu vim morar em Streetsville.
  — E porque você veio?
  — Cansei da vida na cidade grande. Por isso, trabalho lá e volto para o conforto da minha casa. Você precisava ver a briga que foi quando a me deixou morando só! — sorri, me lembrando do sermão dos meus pais.
  — E você não tem irmãos?
  — Tenho uma prima, a única que eu conheço, a Denise, que estava no aniversário do Derek...
  — Sei...
  — Você quer alguma coisa? — perguntei depois de um tempo. Ele assentiu. — O quê? Água, café, suco...
  — Poderíamos terminar o que começamos no pub... — ele segurou meus joelhos e foi me puxando para mais perto dele. — O que acha?
  — Acho interessante. — sorri e ele me afundou no sofá.
  Nos beijamos como se fosse a primeira vez. Calmo. Logo suas mãos estavam passeando pelo meu corpo, e as minhas subiam a sua camisa.
  — Quarto... — sussurrei e senti seu sorriso no meu pescoço. — O quê?
  — Eu não sei onde é o seu quarto.
  — Claro que não, desculpe. — levantei e o puxei pela mão até a minha cama, onde nos deitamos e voltamos a nos beijar.
  Suas mãos percorriam meu corpo, seus lábios iam da minha boca até o pescoço e colo e voltavam. Ele já estava sem camisa e com a calça parcialmente aberta, quando me lembrei de um detalhe muito importante.
  — ... — soprei em seu ouvido e apertei seus braços. Ele murmurou alguma coisa que não consegui entender. — Nós precisamos parar. Agora!
  — O quê? — olhou nos meus olhos. — Eu fiz alguma coisa?
  — Não! Me desculpa! Desculpa, desculpa, desculpa... — o empurrei para o lado e levantei da cama, percebi minha camisa aberta na frente.
  — O que foi, ?
  — Eu só... — fui andando para a porta do quarto. — Só espera um minutinho que eu já volto.
  Fui até a cozinha procurar um remédio. Agora definitivamente não é hora para sentir cólica!
  Tomei um remédio e respirei fundo antes de voltar para o quarto.
  Você não diz esse tipo de coisa para um cara que você mal conhece e está parcialmente pelado na sua cama! Droga!
  — Está tudo bem? — ele perguntou quando sentei na beira da cama.
  — Escuta... Você ficaria extremamente bravo se eu dissesse que isso não pode acontecer?
  — Bravo? — ele me olhava confuso. — Você quer dizer que não vai acontecer... Sexo? Que não vamos fazer isso... Nunca?
  — Não! — sorri nervosa. — Só... Hoje. Tem problema isso não acontecer hoje?
  — Claro que não, . — ele se aproximou. — Eu não vou fazer nada que você não queira.
  — Não é que eu não queira... É só que agora, nesse momento... Não é um bom momento.
  — Por quê?
  — É que... — passei a mão na testa. — É coisa de mulher. — Eu definitivamente deveria calar a boca e mandá-lo embora.
  — Ah... Entendi. — ele sorriu. — Você tá naqueles dias, né?
  — ! — quase gritei de tanta vergonha.
  — O quê? Isso é normal!
  — Não é nada normal. A gente nem se conhece direito e você fica falando essas coisas pra mim.
  — Olha, eu tenho que aguentar a minha irmã nessa situação às vezes... — sorriu e me puxou para deitar na cama. —Você tá com cólica?
  — O... O quê? — arregalei meus olhos para ele e depois escondi meu rosto entre as mãos. — Cala a boca! Por favor. Isso é tão estranho!
  — Não é estranho! — ele me abraçou. — Tá doendo ou não?
  — É estranho! — respirei fundo.
  — , tá doendo? — ele retirou uma das mãos do meu rosto e me olhou.
  — Sim, mas eu acabei de tomar remédio. — virei meu rosto para olhar o teto. — Eu não acredito que estamos tendo essa conversa!
  — Nem eu. — sorrimos. — Você quer que eu vá embora?
  — Você quer ir? — virei para ele. — Você pode ficar, se quiser.
  — Tá.
  — Você vai ficar? — arregalei os olhos.
  — Vou. Você acabou de dizer que eu posso, não disse?
  — Mas... Sem fazer nada?
  — Você tem uma televisão bem grande aqui na frente, poderíamos assistir a um filme...
  — Sério?
  — Sério.
  Já estava quase dormindo quando me lembrei:
  — Obrigada pelo guincho.
  — Quê? — disse, sonolento.
  — Meu carro, na semana passada.
  — Aquilo não foi nada, . — ele beijou minha testa, apoiada em seu peito. — Não querendo ser abusado, mas vou dormir com você.
  — Eu deixo você dormir comigo... — sorrimos e fomos induzidos pelo sono.

A segunda-feira do mal - junho, 21

  — ... Acorda. — ouvi uma voz masculina suave perto de mim. . — Anda, , você não precisa ir trabalhar?
  — Que horas são? — pedi ainda de olhos fechados e braços fortes me apertando.
  — Sete e trinta e cinco.
  — Porra! — dei um pulo da cama para o banheiro. — Por que não me acordou antes? — disse tirando a roupa e entrando no boxe.
  — Eu não sei que horas você sai para trabalhar! — ele gritou de fora do banheiro.
  — Ah... Ok. Tem café na cozinha, fique à vontade!
  12 minutos. Eu tomei um banho em 12 minutos! Um recorde!
  Corri para o closet enrolada na toalha e vesti a primeira roupa que apareceu na minha frente: calça jeans, camisa branca de manga longa e sapato alto. Isso tem que servir.
  — Você quer café? — ouvi assim que entrei na cozinha.
  — ... — olhei para os lados. — Você se lembra de onde deixei minha bolsa ontem?
  — Sofá. Quer café?
  — Ah, claro. — fui ao sofá e peguei o celular dentro da bolsa. — Adoçante, três gotas. Obrigada!
  — Você está realmente atrasada?
  — Eu tenho uma... Uma reunião às 8 horas. — chequei os e-mails e mensagens. — Minha bateria vai acabar em uns dois minutos, droga!
  — Olha, seu café. —me entregou uma xícara. — Você não pode dizer que ficou presa no trânsito?
  — Eu vou ligar para o Jerry, mas agora eu realmente preciso ir! — peguei a xícara e derramei o líquido dentro de uma garrafa térmica. — Obrigada pelo café!
  — Jerry? — olhou confuso. — O chefe?
  — Esse. Você viu a chave do carro?
  — Está aqui, . — ele apontou para o balcão da cozinha.
  — Obrigada. Você quer uma carona?
  — Não. Eu... Só vou deixar sua xícara aqui. — colocou na pia e foi em direção à porta.
  — Me desculpe. — respirei fundo quando entramos no elevador. — Por não poder, não sei, conversar? Agora. De manhã. Eu realmente estou atrasada...
  — Está tudo bem, . — ele pegou minha mão livre e apertou seus dedos nos meus.
  — Tá. Eu ligo mais tarde? — franziu o cenho. — Não?
  — Eu dou um jeito de falar com você.
  — Tudo bem... — o elevador abriu e saí como um furacão. — Tchau, ! — acenei e ele ficou parado na portaria do prédio.

  — Atende, Jerry, atende! — tentava ligar para Jeremy pela terceira vez em menos de cinco minutos. — Finalmente!
  — Onde você está?
  — Eu acordei tarde, me desculpe! Já estou a caminho, e em menos de vinte minutos chego. A reunião já começou?
  — Que reunião, ?
  — Você me ligou ontem dizendo que teríamos uma reunião...
  — Não, querida, liguei para avisar que precisamos conversar.
  — Jerry... — revirei os olhos. — Você... Argh! — desliguei. Não se deve irritar uma mulher nesses dias, seu idiota!
  Não muito tempo depois, cheguei à empresa e me isolei em meu escritório para resolver alguns assuntos que não poderiam mais ser adiados.
  A hora do almoço chegou e mesmo assim não saí de lá, mas fui interrompida.
  — Posso entrar? — Jeremy estava com a cabeça para dentro da sala.
  — A empresa é sua. — respondi, mas não me dei ao trabalho de olhar para ele.
  — Está tudo bem? — assenti, ainda sem tirar os olhos dos papéis. — Trouxe nosso almoço!
  — Ah. — nossos olhos se encontraram quando ele sentou na cadeira em frente à mesa. — O que você quer conversar?
  — , vamos aproveitar nossa refeição.
  — O que aconteceu, Jeremy?
  — Desde quarta-feira você anda me evitando...
  — Não estou evitando você, estou trabalhando.
  — Está trabalhando tão bem que querem roubar você de mim. — sorriu fraco quando mudou de assunto.
  — Ninguém quer roubar ninguém de ninguém. O Greg apenas me mandou uma proposta de trabalho.
  — Ele me ligou e disse que tinha tentado falar com você, e que vai continuar tentando.
  — Então essa sua atenção toda comigo é só porque posso deixar a sua empresa?
  — Claro que não, ! Eu me importo com você.
  — Jerry. — apoiei as mãos na testa e respirei fundo. — O que nós temos?
  — De novo você com isso? — resmungou.
  — O quê nós temos? Porque eu estou cansada de tentar explicar para mim mesma essa nossa coisa. — abanei as mãos entre nós.
  — Nós estamos juntos há bastante tempo... Sei quando você está nervosa.
  — Exato, você me conhece. Eu me abri para você e... Eu sinto que não posso mais fazer isso.
  — Só porque não rotulamos a nossa relação? Isso é tão importante para você, ser exclusivo?
  — Não é questão de ser exclusivo, Jerry, é sentimento. — Você não o ama... Que bela mentira, !
  — Sério? Sentimentos? — ele sorriu em deboche. — Cadê aquela garota que chegou aqui querendo ser a dona do mundo? Sem tempo para besteira e toda essa coisa de compromisso?
  — Essa garota ainda é a mesma, só que agora ela quer alguém junto dela... Ela pensou que tinha, mas, pelo visto, meteu os pés pelas mãos. — ele não disse nada por longos segundos. — Eu preciso terminar meu trabalho, Jeremy. Se você não se importa... — apontei para a porta fechada do escritório.
  — Acho que você precisa tirar umas férias. — murmurou antes de sair pisando fundo.
  — Idiota! — bradei, mesmo que apenas para a porta fechada da sala.
  Por volta das 16h23min, o telefone tocou na mesa.
  — O quê?
  — Ah... Desculpe, senhora, eu sei só faltam uns minutos para seu horário acabar, mas a portaria avisou que tem uma pessoa querendo vê-la...
  — Me desculpe, Becca, não queria ter gritado com você. — ela assentiu através da linha. — Você sabe o nome de quem quer me ver?
  — . — parei todos os meus movimentos, deixando cair meu lápis no chão. — Pode mandar subir? Alô? Dona ?
  — Becca... Diga que eu vou até a portaria, peça para o senhor esperar que eu já estou de saída!
  — Tudo bem.
  Deixei os papéis na mesa desarrumada, joguei o celular e a chave dentro da bolsa e saí do escritório.
  — Se alguém perguntar, precisei visitar um cliente e só volto amanhã. — falei apressada enquanto passava pela mesa de Becca e, sem esperar respostas, entrei no elevador.
  — Está saindo cedo... — disse quando adentrei no elevador.
  — Jerry... — limpei a testa e chequei as horas. — Faltam minutos para o meu turno acabar.
  — Me desculpe, sobre a hora do almoço. É claro que nós precisamos nos assumir. — arregalei meus olhos para ele. Esse elevador sempre demorou? — Então... Não acredito que estou fazendo isso. — ele sorriu e pegou minha mão livre. — Você quer namorar comigo?
  Você já ouviu falar de bad timing? Deixa eu tentar explicar: você está com o seu chefe/ficante no elevador, indo ao encontro do cara que você está “provavelmente gostando”, quando, de repente, o seu chefe/ficante te pede em namoro na frente desse mesmo cara. Isso, meus queridos, é bad timing.
  — Então, ... — Jeremy ainda estava me olhando, e não conseguia parar de revezar o olhar entre os dois.
  — Ah... Nós podemos conversar depois, Jerry? — ele me olhou confuso. — Preciso resolver um assunto com um cliente.
  — Tem certeza? — assenti. —Tudo bem. Posso passar hoje na sua casa? — assenti novamente.
  — Podemos, senhorita ? — pediu com a expressão seria. — Olá, sou . — disse ao Jeremy.
  — Você é o cliente? — assentiu e Jeremy sorriu, nos deixando a sós na porta do elevador. — Ligo mais tarde para você.
  — Deixei meu distintivo na sua casa, preciso dele. — disse, ainda sério.
  — Tá.
  — Minha carteira também está lá.
  — Tá. — Cérebro, você é melhor do que isso. — Ah... Você quer tomar um café antes de ir?
  — Esse Jerry que é o seu chefe?
  — , podemos conversar em outro lugar?
  — Não estou muito a fim de ir a lugar nenhum com você.
  — ... — puxei-o pelas mãos até um dos cantos do hall. — Como você sabia que eu trabalho aqui?
  — , eu só preciso da droga do meu distintivo e da minha carteira. Nós realmente não precisamos conversar.
  — Mas eu pensei... Quer dizer, nós dormimos juntos ontem.
  — Diga para o seu chefe não se preocupar, isso não vai acontecer novamente.
  — , o quê?
  — Por que não me disse que estava com alguém?
  — Eu não estou com ninguém.
  — Bem, pareceu que estava.
  — Nós não temos nada sério, e nós dois mal nos conhecemos, .
  — E por que ele pediu você em namoro?
  — Porque nós já tivemos alguma coisa e talvez eu tenha dito alguma coisa sobre relacionamento. — Atingi minha cota de mentiras diária! — Você está mexendo com a minha cabeça...
  — ... — ele respirou fundo. — Eu...
  — Só preciso de um pouco de tempo para tentar interpretar essas coisas que eu ando sentindo. Você entende?
  — Claro. — ele voltou a ficar sério. — Deixe as minhas coisas com o Blake que eu pego com ele depois. — ele ia se afastar, mas segurei seu braço.
  — ... Me desculpe, você não precisava ter visto isso. O Jerry, ele é muito impulsivo.
  — Você não precisa me dizer nada, . Como você disse, nós mal nos conhecemos.
  — . — mas ele já estava andando para fora do prédio.
  Essa semana está uma merda, e ainda é segunda-feira.
  Recebi uma ligação da minha mãe e prometi ir visitá-la logo que saísse da empresa, o que não demorou. Pude aproveitar a companhia deles, não querendo voltar para Streetsville tão cedo e encontrar com Jeremy ou , mas às nove da noite a minha mãe disse que, se eu não fosse dormir na casa dela, era melhor ir enfrentar a estrada.
  No caminho de volta, estava dirigindo tranquilamente e dentro da velocidade permitida, mas quando avistei a viatura no acostamento da rodovia, acelerei um pouco mais com a vontade de ser ali, e de ele me parar para conversarmos. Nada aconteceu. Cheguei em casa por volta das 22:30, coloquei meu celular para carregar e me permiti ter um bom banho de banheira.
  Já pronta para dormir, verifiquei as diversas mensagens, ligações e e-mails de Jeremy, mas eu não queria falar com mais ninguém a não ser . E enfim dormi.
  Na terça-feira, passei o dia com clientes para tentar me afastar de Jeremy. Se ele achou que o estava evitando, agora teria certeza. Mas você pediu para ele um relacionamento sério, por que agora que ele também quer, você desiste?
  — , está tudo bem? — Sra. Millers perguntou.   — Ah, sim. Me desculpe, Donna. — verifiquei meu celular quando um número desconhecido me ligava. — Só preciso atender essa...
  — Tudo bem, querida! — sorriu para mim e me distanciei.
  — Alô?
  — Boa tarde, esse telefone é da senhorita ?
  — Sim, quem deseja?
  — , aqui é o Greg.
  — Ah.
  — A Becca me passou seu número, espero não ser inconveniente...
  — Não, Greg, está tudo bem. Posso ajudá-lo?
  — Queria saber por que você ainda não me respondeu. Eu estou precisando da sua mente brilhante por aqui...
  — Greg... — suspirei pesadamente. — Eu preciso pensar em algumas coisas.
  — Isso é por causa do Jerry? Só porque vocês agora são um casal?
  — O quê? Quem disse isso a você?
  — Bem, não é como se eu e o Jerry fôssemos inimigos fora das nossas empresas, nós conversamos vez ou outra...
  — Greg, não que isso seja da sua conta, mas nós não temos nada. Eu e o Jerry, isso não existe.
  — Ih... Desculpe, . É o que ele me falou. — sorriu.
  — Greg, estou com um cliente, não posso ficar no telefone. Podemos nos ver na sexta? Depois do meu expediente? Você me apresenta direito o contrato e eu vejo o que fica melhor para mim.
  — Sexta às 20h00min? No Grace's?
  — No Grace's.
  — Pense com carinho! — sorriu e me despedi.

  Quarta-feira trancada no escritório, pensando em como tirar o da cabeça. Quinta-feira ainda trancada no escritório, pensando porque o não havia trabalhado na estrada essa semana.
  Sexta-feira deveria ser um dia feliz. O final de semana seria prolongado. Feriados nas segundas são excelentes!
  — Dona ? — Becca pediu com a cabeça na porta da sala. — O senhor House quer vê-la na sala de reunião dois, digo que a senhora já está indo?
  — Diga que preciso sair e conversamos na terça. — pedi e ela continuou parada ao lado da porta. — O que foi, Becca? — sorri e ela pareceu nervosa.
  — O senhor House pediu incessantemente que a senhora fosse agora, nesse momento, não podendo adiar nem mais um segundo. Palavras dele. — acrescentou envergonhada.
  — Ah, meu Deus. — revirei os olhos. — Eu já estou indo lá, Becca, obrigada.
  — Sim senhora. — sorriu agradecida e deixou o escritório.

  — Jeremy... —murmurei ao entrar na sala de reunião. — Queria me ver?
  — Por que está indo conversar com o Greg?
  — Isso não tem nada a ver com você, Jerry.
  — , pensei que nós fôssemos um casal. Um casal compartilha esse tipo de informação, não é?
  — Eu acho que casais fazem essas coisas sim, mas você precisa lembrar que nós não somos um casal!
  — Mas... Nós conversamos no elevador, achei que estava tudo decidido.
  — Jeremy, eu disse que falaria depois com você.
  — Mas você não atendeu minhas ligações, não respondeu minhas mensagens e me evitou a semana toda. Você queria um relacionamento, estou dando ele a você. O que quer agora?
  — Primeiro: eu quero um relacionamento, Jerry, não estou pedindo uma permissão nem nada do tipo para você me “dar”. — fiz aspas no ar. — Segundo: você me acha tão brilhante na sua empresa, mas não me deixa trabalhar, com a quantidade de vezes que me atrapalha; Terceiro: se nós tivéssemos um relacionamento, como você disse ao Greg, talvez eu dissesse a você o que estou indo conversar com ele. Mas nós não temos, então, com licença, estou indo embora.
  — , , ... — murmurou quando estava me preparando para deixar a sala. — Pare com esse seu joguinho com o Greg. Você disse que queria um relacionamento. Pois bem, eu também quero, com você, ou acha que depois de todos esses anos nós não criamos um vínculo? Você me conhece melhor do que ninguém e, se me permite dizer, acho que conheço você muito bem também. Mas se você for trabalhar lá, esse relacionamento que nós queremos não vai acontecer. E vale lembrar que você não é a única arquiteta brilhante nessa cidade...
  — Não me tente a ir embora, Jerry. E você sabe que eu sou a única brilhante para você. — fechei a porta e fui para o meu escritório recolher minhas coisas e sair dali.

  No horário marcado, cheguei ao Grace's. Greg já estava a minha espera.
  — Você realmente veio! — ele sorriu e se levantou quando sentei. Cavalheiro.
  — Eu disse que viria.
  — Então, está tudo bem? — assenti. — Você não quer rodeios, não é?
  — Viemos aqui para conversar sobre trabalho, então vamos direto ao ponto.
  — , nós nos conhecemos quando você ainda estava estagiando, você estagiou para a minha empresa, e me lembro muito bem de como as coisas fluíram por lá...
  — Uma dose de whisky, por favor. — pedi quando o garçom se aproximou. — Você está fazendo rodeios.
  — Preciso que você volte. Estamos com alguns problemas, e sei que só você vai ser capaz de resolvê-los, como já fez antes.
  — Financeiros também? — falei mais baixo quando o garçom deixou minha bebida.
  — Não, financeiros não. Meus funcionários precisam ser motivados para a criação deles fluir melhor. Você tem um belo poder de persuasão nos seus discursos, já assisti suas palestras.
  — Anda me sondando há bastante tempo, Greg? — ele assentiu e sorrimos.
  — Sei que com o seu relacionamento com...
  — Nós não temos nada. — o interrompi. — Se eu quiser mudar de emprego, empresa, cidade ou estado, eu mudo.
  — Entendo.
  — Escute, Greg, você abriu as portas quando eu precisei de um emprego, mas o Jerry fez uma bela proposta na época, e precisei fazer essa mudança, só que ele nunca me ofereceu o que você está me oferecendo...
  — Ele nunca passou a liderança para você? — neguei e ele arregalou os olhos, surpreso.
  — O quê? — sorri.
  — Conheço o Jerry desde sempre, , e sempre que nos vemos, ele é simplesmente um cachorrinho sem dono por você, me admira que ele não dê a você o seu devido valor.
  — É, isso acontece.
  — Mas não estou falando isso por causa do Jerry. Sei que deveria ter lutado um pouquinho mais antes para você continuar na empresa, então entendo se você decidir ficar na House's agora.
  — Eu gostei da sua proposta, bastante...
  — Mas...? Eu sei que tem um “mas” aí. — ele piscou gracejando.
  — Mas eu preciso ver outros rumos que a minha vida está tomando no momento. Agora, meu emprego não pode ser prioridade.
  — Você mudou.
  — Eu não estou bem aqui. — apontei para a cabeça — E, assim, não posso trabalhar direito... É de onde os projetos brilhantes vêm. — brinquei e nós sorrimos.
  — Você sabe que sempre terá um amigo aqui. — ergueu uma das mãos. — Acima de cargos e empregos.
  — Eu sei. Obrigada por isso.
  — E sempre terá um lugar reservado para você na empresa. —assenti e brindamos. — Você quer jantar e conversar sobre isso? — indicou a minha cabeça.
  — Não. Para resolver o de lá, envolve outros problemas nos quais eu ainda eu não estou tão certa.
  — Tudo bem. — se levantou e fomos caminhando até o vallet. — Boa viagem, !
  — Falo com você em breve. — dei dois beijinhos nas suas bochechas quando meu carro chegou. — E vê se me faça uma visita em Streetsville!
  — Eu levo a Ash e as garotas qualquer dia desses! — nos despedimos.
  Entrei no carro, e segui viagem até Streetsville, sempre na expectativa de ver . A viatura estava no lugar de sempre. não.
  — Boa noite, policial. — disse e ele me olhou confuso.
  — Boa noite, senhora, algum problema?
  — Não. Não, obrigada. Hm, você sabe onde o ... O policial está?
  — Ele foi dispensado essa semana. O imbecil esqueceu o distintivo na casa de uma garota, agora ela não devolve para ele e o chefe disse que ele só vai trabalhar quando o pegar de volta! — sorriu e fiz o mesmo. Você é a garota, imbecil!
  — Ah... Por acaso você poderia me passar o endereço dele?
  — E posso saber por que você quer o endereço dele? — desconfiou.
  — Bem, resumindo a história, eu sou a garota que está com o distintivo dele...
  — Ah. — olhou para os lados, envergonhado. — Me desculpe, madame, eu não queria ter falado isso. Me perdoe.
  — Está tudo bem, não se preocupe com isso.
  — Ele mora na rua do parque, ao lado do pub do Irlandês, você conhece? — assenti. — A casa verde e branca.
  — Pensei que o Irlandês morava na casa verde e branca...
  — Ele alugou para o faz uns meses agora.
  — Obrigada.
  — De nada, madame. Só faça o idiota do voltar ao normal!
  — Vou ver o que posso fazer. — ele sorriu e fui em direção ao apartamento.
  Já era tarde, e não adiantaria conversar com ele nessa mesma noite. Já pelo sábado, as coisas estariam mais calmas.

A mulher e o filho - junho, 26

  No sábado pela manhã, acordei mais cedo do que queria, tomei um bom banho e me arrumei rapidamente para ir até a casa dele.
  — Oi! — uma mulher bonita de cabelos negros atendeu a porta da casa do .
  — Oi, o está?
  — Ele deu uma saidinha para ir ao mercado, você quer esperar? — neguei e um menino bem parecido com ele apareceu.
  — Mamãe, cadê o cereal? — Ele é filho do ? — 'Tô com uma fome de jacaré!
  — Brian Murilo ! — ela repreendeu a criança. — Você nem sequer tomou banho, trate já de passar para o banheiro! — a criança entrou e ela voltou para mim. — Desculpe! Crianças, huh?
  — É. Olha, eu não queria incomodar, você só avisa ao que a já deixou o que ele pediu com o Blake, tudo bem?
  — Você é a ? — ela me olhou dos pés a cabeça e retorceu a boca.
  — Você pode avisar? — ela assentiu. — Obrigada!
  Dei as costas para a mulher e fui caminhando para o parque. Havia algumas famílias fazendo piquenique, crianças brincando e a minha cabeça dando voltas. Ele é pai! Pai de um menininho lindo feito ele! Droga! E ele ficou com raiva porque o Jeremy me pediu em namoro. Bufei. Ele dorme na minha casa, nós quase transamos e ele tem uma mulher e um filho! Quão idiota eu poderia ser?
  Sentei próxima ao lago, no centro do parque e percebi meu celular vibrando com um número desconhecido.
  — Alô, ? Aqui é o ...
  — Se você acha que vou falar de novo com você, está redondamente enganado! — disse assim que ele se identificou e desliguei na cara dele.

  ’s POV

  Desde que conheci a , no mês passado, não consegui tirá-la da cabeça. O que é bem estranho, devido ao meu último fracassado relacionamento, mas resolvi tentar.
  Nós nos vimos no pub ao lado da minha nova casa. Ela estava meio bêbada, mas ainda estava toda elegante num vestido cor de vinho longo e o cabelo solto com alguns cachos nas pontas. Passamos mais da metade da noite nos encarando, e ela sorriu em todas as vezes que eu retribuía seus olhares. Quando resolvi ir embora, ela veio até mim e disse que se chamava , também disse meu nome, mas uma outra mulher, que se parecia com ela, a puxou e voltaram para a mesa.
  Streetsville não é grande, mas foram poucas as vezes que a vi pela cidade, e só algum tempo depois descobri que ela era amiga da , noiva do meu amigo Derek.
  Acabamos nos reencontrando quando eu estava na estrada, trabalhando na viatura e ela passou igual um furacão no carro, precisei pará-la e, quando desci para averiguar quem estava dirigindo, era ela, mas é claro que não se lembrava de mim, o que era de se esperar, mas o Derek me ajudou quando precisei entregar a multa no seu apartamento, ajudou principalmente quando teve seu aniversário, quando a e eu acabamos ficando; e, infelizmente, quando fui até a empresa onde ela trabalha, presenciando o chefe dela a pedindo em namoro. E, desde lá, eu não consigo tirar a imagem dela com o chefe no elevador. Na boa, se você está com um cara, deve saber quando ele vai te pedir em namoro e então VOCÊ NÃO FICA COM MAIS NINGUÉM! Mas a estúpida da não fez isso. Eu dormi na casa dela e no outro dia eu a vejo com outro. Que ótimo!

  — , eu estou falando com você! — minha irmã gritou assim que entrei em casa. — Você trouxe o cereal do Brian?
  — Trouxe, Kam.
  — Você teve visita... — murmurou quando se juntou a mim na cozinha. — A é bem bonita...
  — Ela veio aqui? — ela assentiu. — O que ela queria?
  — Só pediu para você passar lá com o Blake e pegar alguma coisa.
  — Ok.
  — , se você quer se arriscar, arrisca, não custa nada!
  — Kamille, agora não, está bem? — fui saindo da cozinha para a sala.
  — Maninho, o que aconteceu entre você e a Jenny não vai se repetir.
  — Eu disse agora não, Kamille!
  — Não quero saber o que você disse.
  — Ela está namorando com o chefe, deixa isso para lá.
  — Você me disse que ela não deu resposta nenhuma para ele. — ela estava parada na minha frente com as mãos na cintura. — Ela pode não ter aceitado!
  — Ela poderia ter me dito que estava quase namorando alguém, antes de alguma coisa acontecer entre nós dois.
  — Vocês homens são idiotas! — revirou os olhos e se sentou ao meu lado no sofá. — Presta atenção, porque eu só vou falar uma vez: Se ela não disse, quer dizer que ela não quer e não sente nada pelo cara, entendeu?
  — Ela disse que eu mexi com a cabeça dela... — sussurrei ao me lembrar da nossa breve conversa depois do pedido de namoro.
  — Por que não me disse isso antes? — estapeou meu braço. — Ela quer você!
  — Quer nada. Agora vê se para de falar da e vai arrumar o Brian, que eu quero sair logo. — ela assentiu e saiu para o quarto.
  Aproveitei que estava sozinho e liguei para . A Kamille pode está certa...
  — Alô, ? Aqui é o ...
  — Se você acha que vou falar de novo com você, está redondamente enganado! — e desligou.
  — Sabia que ia ligar para a ! — Kamille se jogou ao meu lado no sofá.
  — Ela não quer falar comigo. O que eu fiz agora? — olhei para a minha irmã e ela sorriu. — O quê?
  — Eu não sei... Ela é meio doida, por isso vocês dão certo!
  — Nós não demos certo, Kam, para de viajar.
  — Tio , vamos logo! — Brian pediu. — O parque, tio! Vaaaaamos!
  — Vamos, moleque! — me levantei e seguimos para fora de casa.

  Fim - 's POV

  — Estou dizendo, , ele tem um filho!
  — Você acha que o Derek não ia saber se ele tivesse? — ela questionou.
  — Se ele sabe ou não, isso é com ele...
  — Onde você está?
  — No parque, por quê?
  — Ia te convidar para vir para a casa dos pais do Derek...
  — Não estou a fim de viajar.
  — Vai ser uma boa distração, .
  — Não, , eu estou com uma vontade louca de me isolar e ver o que eu tenho que fazer para sair dessa fossa.
  — Uau! — ela quase gritou. — Eu entendo você!   — Como assim me entende? — sorri.
  — Os pais do Derek estão no meu pé, perguntando quando vamos casar para poder pensar nos netinhos! Deus do céu!
  — Você está em apuros, minha querida!
  — Eu seeeei. — bufou. — Eles são uns amores, mas isso está me estressando. — sorrimos. — Você já falou com o Jeremy?
  — Não. — respirei fundo. — Acho que vou sair da House's.
  — POR QUÊ?
  — , calma...
  — COMO CALMA, ? Por que diabos você quer deixar a empresa do Jeremy?
  — Eu não estou conseguindo focar em mim trabalhando lá. Você se lembra do Greg? — ela assentiu. — Ele me ofereceu um bom cargo na empresa dele.
  — Você tem certeza disso?
  — , nós podemos conversar? — uma voz soou ao meu lado e vi com o filho.
  — Ligo para você depois, . — desliguei sem ouvir resposta. — Não quero falar com você, .
  — Eu posso ao menos saber o por quê?
  — Não é óbvio? — ele se sentou ao meu lado e a criança correu até outras mais a frente.
  — O que é óbvio?
  — Isso! — apontei para o menino.
  — O que tem ele?
  — Não se faça de idiota, . Por que não disse que tinha um filho? — ele começou a rir. Audivelmente, o que só aumentou meu estresse. — O quê?
  — O Brian não é meu filho! — disse entre suas risadas.
  — Claro que é, ele é super parecido com você!
  — Ele é meu sobrinho, . — disse, já mais calmo. — Filho da minha irmã, a Kamille, já falei dela para você.
  — Ok. — desconversei e passei a olhar para todos os lados, menos para ele. Onde eu enterro a minha cabeça? Por favor?
  — E qual seria o problema se eu tivesse um filho?
  — Nenhum.
  — , olha para mim.
  — Não quero.
  — ... — olhei para ele, que ainda tinha um sorriso estampado no rosto. — Soube que você foi lá em casa hoje.
  — Ia deixar as suas coisas.
  — Por que não deixou?
  — Porque tinha uma mulher e uma criança na sua casa, que eu jurava serem sua esposa e filho ou sei lá o quê!
  — Entendo.
  — Que droga que você entende, ? — olhei furiosa para ele.
  — Você está com ciúmes.
  — Ah, por favor. Não seja ridículo! — dei uma risada esganiçada.
  — Não estou sendo.
  — Olha, , aqui estão as suas coisas. Passar bem. — puxei a carteira e o distintivo de dentro da bolsa e joguei ao seu lado no banco, me levantando apressadamente, apenas para ele segurar meu braço.
  — Achei que tinha deixado com o Blake... — eu não disse nada, apenas fiquei olhando para a mão dele me segurando pelo braço. — Eu também fiquei com ciúmes de você e do seu namorado.
  — Ele não é meu namorado, é meu chefe.
  — Você não vai dar o braço a torcer, não é?
  — , eu preciso ir.
  — Vai aonde?
  — Isso não é da sua conta.
  — , qual é... Eu vi o cara te pedir em namoro no meio da droga do elevador e você quer negar as coisas para mim?
  — Eu não preciso negar ou admitir nada a você!
  — Boa resposta. — ele largou meu braço e saí o mais rápido que pude de lá.

  Fui andando até o meu apartamento, não importando em me desculpar quando esbarrava em algumas pessoas pelo caminho. Não respondi aos poucos moradores que falavam comigo e nem a Blake.
  Assim que entrei em casa, desliguei meu celular e o telefone fixo e me deitei na cama. Isolada.
  Como era bom um pouco de paz e sossego, sem ninguém querendo saber o que você anda fazendo ou deixando de fazer, sem alguém que, aparentemente, fica próximo a você só por causa do seu sucesso profissional.
  A única coisa ruim de ficar isolada é que, depois de um tempo, você começa a se sentir sozinha, sentir que precisa conversar, sem que ninguém te interrompa enquanto você fala, sorri ou chora. Ninguém que vá te julgar.
  Quando despertei de um sonho agitado demais, estava suada, mas ao mesmo tempo me sentindo fria, talvez por estar enrolada na coberta e com a janela aberta. Uma chuva grossa caía lá fora, e alguns raios iluminavam a noite, e logo depois o barulho dos trovões me assustaram.
  — Eu dormi tudo isso? — falei sozinha quando avistei as horas no relógio de pulso. Eram 03:52 da manhã de domingo.
  Corri para a sala a fim de achar a bolsa e ligar o celular, e depois fui à cozinha ligar o telefone fixo. Voltei para o escritório e comecei a procurar alguma música que me animasse, não consegui nada. Então resolvi desenhar algumas plantas, fazer projeto de casas ou empresas sempre me acalmava, e acabei conseguindo me distrair até meu computador apitar a chegada de um e-mail. .

  "Ainda está se isolando?"
  "O que você está fazendo acordada a essa hora?"
  "É a hora em que a internet funciona no sítio... Me ajude!"
  "Acabei de acordar de um sonho maluco."
  "O que sonhou? Ei, eu não posso te ligar? Será mais fácil..."
  "Tudo bem, vou fazer um café e te ligo."

  Fui para a cozinha e coloquei o pó do café na cafeteira no mesmo momento em que escutei meu celular tocando.
  — Eu não disse que ia te ligar depois, ?
  — Olá ! — a voz de saiu estranha pelo telefone. — Não desliga, por favor. — ele estava bêbado, claro. E estava muito barulho no fundo.
  — O que você quer?
  — Eu já disse que não tenho um filho com a minha irmã, não é? — ele sorriu.
  — Sim. O que você quer, ?
  — Que você me diga por que o seu chefe é melhor do que eu.
  — Onde você está?
  — Não, me responda... — acrescentou longe do telefone. — Me deixa em paz, Kam, ela ao menos está falando comigo!
  — .
  — Porque seu chefe é melhor que eu? Só porque ele tem uma empresa?
  — Como você ousa me perguntar uma coisa dessas? É claro que não, seu idiota!
  — Você está em casa? — falou novamente com Kamille ao longe, mas não entendia sua resposta. — Acha que devo ir até lá? — uns segundos em silêncio, apenas uma música alta de fundo. — Alô, ?
  — Sim. — era, definitivamente, a voz da mulher na casa dele.
  — É a Kam, irmã do . Escuta, não liga para o que ele estava falando não, ele só bebeu um pouquinho demais. Desculpe.
  — Tá.
  — Até.
  — Tchau.

  — Por que não ligou antes? resmungou quando atendeu.
  — O acabou de me ligar. Ele estava bêbado.
  — E o que ele queria?
  — Não sei, ele falou coisas aleatórias. Me esqueci de te dizer que ontem ele me encontrou no parque.
  — E aí, vocês conversaram?
  — Não exatamente, eu estava com tanta raiva dele por achar que ele tinha uma esposa e filho!
  — Eu sabia. Sabia que ele não tinha!
  — Ei, você está de que lado? — resmunguei e ela sorria ao fundo. — Não, ele acabou me explicando que aquela que eu vi na casa dele é a irmã dele e o sobrinho.
  — Ah, claro, a Kamille e o Brian. Ele é a cara do !
  — Eu vi. — murmurei.
  — E por que você não quer falar com ele? Se ele não tem trinta mulheres e oitenta filhos, não tem porque ficar com raiva!
  — , eu fiquei com ciúmes do ! — antes que minha amiga arrancasse os cabelos loiros, acrescentei. — E não vou repetir isso!
  — Você está meeeesmo na dele!
  — Estando ou não, isso não importa. Vou deixá-lo em paz e voltar para a minha vida como se nós nunca tivéssemos nos conhecido.
  — Ontem mesmo você estava falando que ia deixar a empresa do Jeremy. O que aconteceu?
  — Aconteceu que a minha razão voltou ao lugar e agora eu estou pensando direito.
  — Você faz o que achar melhor para você... Estou aqui se precisar.

O namorado - setembro, 30

  Fazia oito semanas exatas que deixei meus devaneios para trás e coloquei a razão para funcionar; oito semanas desde que havia decidido não sair da House's Arquitetura; oito semanas que eu e o Jeremy estávamos namorando oficialmente, e oito semanas que eu não encontrava com . Ouvi ao acaso na casa de Derek e que ele pediu para ser realocado, e agora trabalhava internamente na delegacia principal – e única – de Streetsville. Tinha encontrado mais vezes do que o habitual com Kamille, irmã dele, e que fez o favor de conseguir o máximo de informações para me repassar. Não que eu tivesse pedido. Eu estava com o Jeremy, e estava tudo seguindo o curso como deveria ser desde o início.
  Na sexta-feira, iríamos jantar na casa dos meus pais para eles se conhecerem oficialmente, e no sábado teria um belo churrasco na casa da , para comemorar alguma data importante deles.
  — Babe, precisamos levar alguma coisa amanhã? — Jeremy entrou no meu escritório. — Seu pai não vai me bater, nem nada dessas coisas, não é?
  — Jerry, relaxa! — sorri. — Meu pai não é nenhum psicopata ou louco que bate nos meus namorados.
  — Mas ele foi da Marinha...
  — E daí? — desviei os olhos do computador e o vi apenas de boxer preta, escorado na porta.
  — Vocês têm piscina lá?
  — Você não acha que ele vai afogar você... — ele arregalou os olhos e coçou a nuca. — Ou acha?
  — Ele poderia, se quisesse...
  — Ele não vai te afogar! — ele soltou o ar dos pulmões enquanto ia para a poltrona ao lado da mesa e me puxou para seu colo. — Não se preocupe com meu pai. Agora, a minha mãe...
  — Quando falei com a dona Carla, ela me pareceu simpática. — ele começou a brincar com as pontas do meu cabelo e eu passava as mãos pela sua barba.
  — Ela é, mas vai perguntar as coisas mais inimagináveis que você conseguir pensar.
  — Como o quê? — ele sorriu e beijou meu pescoço.
  — O tamanho do seu sapato. — sorrimos. — É quase que a pergunta oficial para os caras que eu namoro.
  — Então já foram muitos? — ele semicerrou os olhos azuis, mas ainda tinha um tom de brincadeira.   — Na maioria das vezes foi uns colegas que eu costumava beijar. — tive um acesso de riso quando seus olhos se arregalaram. — Estou brincando!
  — Você já ficou com muitos caras?
  — Por que você quer falar disso? — deitei minha cabeça em seu ombro nu.
  — Só estou conhecendo você, ... Não é isso que casais fazem?
  — Você e essa sua coisa de “isso que casais fazem”! — fiz aspas no ar. — Não fiquei com muitos, eu não gosto disso. E você?
  — Ah... — ele sorriu e voltou a dedilhar pela minha costa coberta apenas por uma camiseta dele, grande demais para mim. — Minha mãe dizia que eu daria muito trabalho para quem quer que fosse ter algo sério comigo.
  —Jeremy House Junior! — endureci em seu colo e sentei corretamente.
  — Era só o que ela dizia, não o que acontece... — brincou. — Antes de nós termos uma coisa séria, talvez eu tenha conhecido algumas outras mulheres...
  — Entendo.
  — Qual é, , você não conheceu ninguém nesse tempo todo?
  — Talvez eu tenha conhecido um carinha ou dois... — Na verdade, só conheci o , completei mentalmente e meu sorriso se formou quando vi o dele.
  — Está vendo? É normal. — beijou meus lábios delicadamente e pediu: — Mas voltando ao assunto inicial, o que podemos levar amanhã?
  — Vinho.
  — Cerveja não?
  — Vinho, Jerry, vinho! — levantei de seu colo e voltei para a confortável cadeira. — Agora, se você puder ligar para a pizzaria, seria muito bom, enquanto eu termino de trabalhar!
  — Eu sou visita... — fez manha, o que combinava com a cara de sono que estava.
  — Você não sai do meu apartamento há pelo menos duas semanas! — chiei. — Trate de levantar sua bunda daí e nos arranjar algo para comer!
  Assim que ele saiu pela porta, tive vontade de bater com a cabeça na mesa do computador. O que há de errado comigo? Era um relacionamento sério com o Jeremy o que eu queria, eram essas conversas bobas que todo início de namoro tem, eram as confissões, as palavras carinhosas e as carícias trocadas durante uma tarde de preguiça ou uma noite agitada. Tudo isso eu tinha, e uma parte doce de mim gostava, achava que se eu me concentrasse nisso, a outra parte azeda também gostaria e poderia até amar. Mas tudo que o azedo dizia era que o Jeremy não seria a pessoa a me fazer sentir completa, que eu não o amaria com todos os meus lados e todas as minhas vontades. E aos poucos essa parte azeda começava a contaminar mais e mais o meu lado doce.
  A rotina que acabamos criando ao longo das oito semanas era bem simples. Nos primeiros dias, tentávamos nos esconder nas salas de reunião da empresa e curtir aqueles momentos que seriam só nossos, mas sempre acabávamos sendo surpreendidos por alguém da limpeza ou quem quer que precisasse das salas. Numa das vezes, sugeri ir para a minha sala ou a dele, e a resposta de Jeremy foi: “A sua sala e a minha são revestidas de paredes de vidro... Você por acaso esqueceu?”. E então soltávamos gargalhadas pelos corredores sempre que lembrávamos. Depois de esperar mais alguns dias, ele resolveu que seria bom parar de agir feito criança brincando de esconde-esconde e chegarmos juntos, de mãos dadas e não deixar os olhares maldosos nos atingirem. Foi então que, no mesmo dia, outras três colegas de trabalho me encurralaram num canto e perguntaram se estávamos de fato juntos. “É claro que estamos!”, a resposta foi automática e em minutos os cochichos nos corredores foram ganhando vida, especulando sobre nosso relacionamento e a possibilidade de eu estar apenas interessada em benefícios ali dentro. Quando isso chegou aos ouvidos de Jeremy, ele desistiu de qualquer momento mais íntimo dentro da propriedade, e definimos que chegaríamos juntos e sairíamos juntos, mas apenas para assuntos estritamente profissionais nós nos falaríamos ali dentro. Foi assim que a nossa rotina ficou e está até agora, e assim também ele passou a ficar mais no meu apartamento do que na própria casa; dizia que lá era muito grande e não tinha mais a ver com ele, que agora se sentia bem vindo e feliz no apartamento que antes ele julgava por ser no interior.
  Alguns dias atrás eu o ouvi falando com o pai, dizendo que estava pensando em se mudar de Lancaster, principalmente agora que as coisas entre nós estavam fluindo perfeitamente, como a corrente de um rio. Aquele momento foi onde o meu desespero beirou o limite. Tudo bem que nos conhecíamos há anos e estávamos juntos, de verdade agora, mas em nenhum momento achei que Jeremy era do tipo que queria casar e construir uma família, eu ainda não estava preparada para isso e não sabia se queria isso com ele, porque além dos ares mais do que floridos, eu não conseguia parar de pensar no , não conseguia parar de pensar em como seria se fosse ele ali, e não o Jeremy e todos os seus mínimos defeitos que eu fingia não me incomodar.

  O dia anterior havia sido estranhamente tranquilo. Desde a chegada à empresa, que deveria estar mais agitada para uma sexta-feira, até a saída de lá. Jeremy comentara que a tranquilidade estava lhe assustando, porque talvez o nosso jantar na casa dos meus pais não fosse como ele esperava que fosse. Tentei dizer que não tinha nada errado durante todo o tempo em que ficamos na casa dele, nos arrumando para o jantar. Ele me convencera de que deixar algumas coisas, como roupas, acessórios e mais alguns itens na casa dele era perfeitamente normal, porque assim nós sempre poderíamos escolher em que casa dormir. Fui dirigindo até a casa dos meus pais e conversando futilidades aqui e acolá. As mesmas futilidades continuaram durante todo o jantar que minha mãe havia preparado. Ela não tinha perguntado sobre o tamanho do sapato de Jeremy, não tinha contado nenhuma história completamente desnecessária sobre a minha adolescência e, para coroar a noite como a mais estranhamente tranquila, ela não havia mencionado nada sobre casamento e filhos.
  Depois que voltamos para a casa dele, já próximo da meia-noite, não pude mais conter a pergunta apenas para mim: “Você não achou esse dia e especialmente o jantar estranho?” Ele negou, disse que meus pais eram muito mais adoráveis que os próprios pais, mas eu sabia que aquela descontração toda era apenas porque ele estava lá. O meu pai não conversou muito; foi cordial, claro, mas não se metia muito nas conversas e aquilo só fazia a palavra “estranho” aparecer mais e mais vezes na minha mente, como um alerta para algum evento futuro. E é por causa desse aviso que não queria ter vindo ao churrasco que a havia inventado.
  Estava quente demais, abafado demais e com demais.
  Logo quando chegamos, por volta das 11h00min da manhã, estava tudo novamente tranquilo; estava ajudando a na cozinha, junto com algumas colegas de trabalho dela, e os homens estavam na área externa, cuidando da carne. Foi quando a irmã dele chegou, com o filho. Minhas mãos suaram frio e minha cabeça começou a doer assim que nos cumprimentamos mais uma vez, e o Jeremy entrou na cozinha, acompanhado dele.
  — Querida, olha quem está aqui! — disse apontando para um sério demais, com os olhos transmitindo fúria para todos os lados. — Você nem me disse qual foi o problema com a , , não gostou da planta que ela fez para você?
  — Decidi que não precisava mais da reforma. — aqueles olhos verdes ainda não haviam desgrudado da minha pele vermelha e quente de tanto nervosismo.
  — Ah, , pode me ajudar a pegar aqueles pratos na despensa? — notou o meu desconforto e me tirou daquele cômodo, onde apenas as suas colegas de trabalho e Jeremy não sabiam do meu brevíssimo, porém duradouro na minha mente, envolvimento com .
  — Onde estão os pratos? — perguntei quando contei o oitavo suspiro.
  — Você está vermelha, parece um tomate. Você só fica assim quando está nervosa, .
  — Está muito quente, a quentura está me incomodando, não é nada demais. Onde estão os pratos?
  — Não tem porcaria de prato nenhum. Você ainda gosta do , não é?
  — O quê? — minha voz me traiu, saindo esganiçada demais. — ... Vamos sair daqui e comer. Estou morrendo de fome!
  — Está vendo? — ela apontou para mim. — Está vermelha e não está falando coisa com coisa... Isso é um daqueles seus ataques de nervosismo!
  — Eu não sabia que o Derek ia convidar o !
  — Eles são amigos. — desviou seus olhos dos meus, e seu tom era como se estivesse se desculpando.
  — , não. — ela voltou a me olhar. — Não se desculpe. É claro que ele viria, são amigos. Eu só tenho que deixar o de lado e focar no Jeremy. É com ele que eu estou!
  — ... Você só gosta do , não é?
  — Como assim?
  — Não é nada mais que... — meus olhos se arregalaram e meus lábios se abriram, o que interrompeu sua pergunta. — Ok, vamos comer!

  São nesses momentos que é maravilhoso você ter melhores amigos que entendem quando você não está bem apenas com um olhar, e foi o meu olhar de desespero que fez com que a me mantivesse ocupada e afastada dos outros o máximo que pôde.
  — A sua amiga está te explorando hoje... — Jeremy voltou para a cozinha com um copo de refresco de laranja na mão.
  — Está tudo bem. Lá fora está muito quente, de qualquer jeito.
  — Nós estamos na sala, . — ele olhou com confusão para mim.
  — Eu sei...
  — Você está bem? — seus olhos azuis estavam preocupados comigo, enquanto eu não parava de pensar e desejar que fossem os olhos verdes de , me olhando com tanto carinho e preocupação, mas isso não aconteceria e eu não sabia nem ao menos o porquê.
  — Estou. Me desculpe, eu já vou lá na sala com vocês.
  Ele me deixou mais uma vez sozinha na cozinha da minha amiga, e eu não tinha mais como arranjar desculpas para permanecer ali, até a louça do almoço eu havia lavado.
  E então, a plaquinha com a palavra “estranho” voltou ao meu cérebro, no mesmo momento em que meu celular começou a tocar. Meu pai.
  — Oi pai! — respirei aliviada por poder ficar mais um tempo sozinha.
  — Você me disse que não estava namorando com o seu chefe, .
  — Pai... Do que você está falando? — não queria ter essa conversa agora.
  — Você, uns meses atrás, disse que não estava namorando o seu chefe.
  — O que há de errado com ele?
  — Filha, ele é seu chefe. As pessoas falam, você querendo ou não, você ligando ou não, elas falam.
  — Eu não ligo para elas.
  — ... — eu podia sentir a decepção na sua voz. — Não quero que os outros julguem você.
  — Eu realmente não me importo com isso, você não precisa se preocupar.
  — Mas ele se importa? — eu não tinha pensado nisso antes. — Eu não quero que ele vá pela conversa dos outros e acabe te machucando porque os outros acham que você está apenas querendo usá-lo. Acredite, as pessoas ainda tem esse tipo de mentalidade nos dias de hoje.
  — Ele não acha isso. — Você não tem certeza. Ele mudou com você dentro da empresa... — Nós estamos bem!
  E mais uma vez o maldito bad timing me cercando.
  Não prestei atenção enquanto falava com meu pai, mas estava na cozinha, encostado na mesma bancada que eu e escutando minha conversa.
  — Bem... Me desculpe por ontem, eu estava com isso preso na cabeça.
  — Nós podemos conversar depois? Eu preciso resolver uma coisa.
  — Tudo bem, . Você sabe que eu só quero o melhor para a minha menininha! — senti seu sorriso sincero, diferente do meu.
  — Eu sei. Falo com você depois. — finalizei a ligação, e fui interrompida antes mesmo de saber o que falar.
  — Muito bom saber que vocês estão bem.
  — ... — soltei o ar dos pulmões.
  — Está tudo bem, . — seu sorriso no canto da boca não chegava aos olhos, e aquilo não parecia nada bem.
  — Tenho visto a sua irmã pela cidade... — queria levar a conversa para rumos mais seguros, porém uma dúvida ainda persistia em mim, e acrescentei. — Por que nós não podemos tentar, não sei, ser amigos? Eu não quero você me odiando.
  — Eu não odeio você.
  — Sei. — bufei. — Quando você chegou, não parecia isso.
  — Eu não odeio você. — repetiu. — Só não queria ver você e o seu chefe pelos cantos.
  — Por quê?
  — Porque não é legal. — voltei a olhar para o balcão, onde as mãos grandes dele repousavam. Lembrava-me das mãos dele passeando pelo meu corpo, e aquela memória me fez estremecer.
  — É melhor que seja assim, você sabe, eu e o Jeremy.
  — Eu sei, você não tem que me explicar nada, . O que nós tivemos não foi nada, certo?
  — Nós só nos beijamos, não é como se eu fosse me apaixonar por você. — sorri, mais de nervoso do que achando alguma graça.
  — Certo. — e ali estava, algum sentimento incompreensível atravessando seu rosto. — Só vim me despedir. Nos vemos por aí. — e antes que eu pudesse dizer ou fazer alguma coisa, ele se afastou e saiu da cozinha.
  A verdade é que no momento em que me vi sozinha no cômodo repleto de armários alegremente pintados de azul, senti vontade de chorar, como em muito tempo não acontecia. A última vez que havia chorado de verdade foi quando tinha dezessete anos e a Louise, minha labradora, havia falecido, e agora sentia todo aquele aperto no peito por ter deixado sair sem ao menos dizer um tchau; queria entender porque sentia vontade de chorar por um cara qualquer, que mal conhecia e em quem não parava de pensar. Com medo de acabar desabando no choro, abri a geladeira de uma maneira infantil, que observava tudo que estava ali dentro, esperando uma resposta dos legumes e frutas para uma pergunta que nem mesmo sabia qual era. Sentia a brisa gelada do eletrodoméstico me acalmar, resolvi me servir de um grande copo de água e então sentar nas banquetas do balcão.
  — Você é a , certo? — escutei uma voz levemente conhecida, mas não ousei olhar para a pessoa e apenas assenti com a cabeça. — Olha, eu sei que eu não tenho naaaada a ver com isso, mas eu só queria entender os dois lados antes de ficar com raiva de você.
  — Por que você ficaria com raiva de mim? — fechei os olhos quando encostei o copo na pele quente da testa. — Eu fiz alguma coisa para você?
  — Não. — hesitou. — Mas o é meu irmão, e eu vou sempre querer protegê-lo.
  — O que você quer saber? — coloquei o copo na bancada a minha frente e apoiei a cabeça nas mãos, olhando de lado para ela. — É Kamille, certo?
  — Me chame de Kam. — ela sorriu com os dentes branquinhos e alinhados, iguais ao do irmão. Como não vi isso antes? — Eu só queria saber a história, porque ele não quis me contar muita coisa...
  — História de quê?
  — De vocês.
  — Nós não temos uma história.
  — Ah. — ela franziu os lábios que estavam cobertos com um batom rosa claro e combinava com a armação de seus óculos escuros. — Eu sei que alguma coisa aconteceu.
  — Nós nos beijamos, há bastante tempo atrás, isso foi a única coisa que aconteceu.
  — Mas vocês dormiram juntos, não foi? — meu corpo que já estava quente, conseguiu a proeza de esquentar ainda mais ao se lembrar da única noite que havíamos, de fato, dividido. — Tudo bem, já entendi.
  — Kamille, se você não se importar... eu preciso ir.
  — Me chame de Kam.
  — Kam. — sorri, pela primeira vez sendo sincera no dia.
  — Você pode pedir para o Brian vir até aqui? — pediu quando estava deixando o copo na pia e eu assenti. — Obrigada.
  — Você sabe por que ele me odeia? Eu nunca fiz nada para que ele pudesse nutrir um ódio dentro dele, quer dizer, ele viu o meu namorado me pedindo em namoro, mas nós só tínhamos, literalmente, nos beijado. Só beijo, nada mais, nada menos. — voltei andando da porta da cozinha até parar na sua frente e comecei a falar, sem respirar, para tentar tirar todas aquelas perguntas de dentro de mim e tentar me sentir mais leve. — Ele me ajudou uma vez, nós bebemos e quase nos beijamos, mas foi isso, só, apenas, nada demais. Então... Qual o problema?
  — Eu não sei. — ela acabou dizendo. — Você podia perguntar para ele.
  — Você quer que eu chame o Brian, sim? — pedi, depois de alguns incontáveis segundos enquanto meu cérebro começava a tentar apagar as perguntas e comentários que havia acabado de jogar para uma pessoa que não tinha nada a ver com a minha confusão. Por fim, ela assentiu e pude sair o quanto antes do cômodo e tentar deixar minha confusão para trás.

  — Achei você! — Jeremy beijou o topo da minha cabeça. — Por que se escondeu hoje?
  — Não estou escondida, Jerry, só precisava de ar fresco e uma sombra para me livrar desse calor.
  — É, hoje está quente. — sentou no degrau acima de mim. — Mas olha, talvez chova! — apontou para algumas nuvens mais escuras e um pouco distantes.
  — Eu espero que chova até a segunda-feira. — nós sorrimos e ele me abraçou por trás, apoiando o queixo no topo da minha cabeça.
  — Você está com tanto calor assim?
  — Você não? — ele sorriu e assentiu. — Acho que nós já podemos ir, daqui a pouco o Derek tem que ir trabalhar e a precisa preparar algumas provas, não quero atrapalhar.
  — Então vamos.

  ’s POV

  O bom de se morar sozinho é que você pode passar o dia deitado no sofá de cueca e meias, caso esteja chovendo e fazendo frio. O ruim de morar sozinho é que você precisa arrumar a sua própria bagunça.
  — ! — a voz estridente da minha irmã soou quando ela abriu a porta da sala e o vento gelado tomou conta do cômodo.
  — Maldita hora que deixei uma cópia da chave da minha casa com você. — bufei me sentando no sofá de couro preto, invejado por ela.
  — Eu sou sua irmã, você tem uma cópia da chave da minha casa, eu tenho da sua! — se sentou ao meu lado. — Quando vai aprender a cuidar direito do meu sofá?
  — Esse sofá é meu, Kamille. — olhei ao redor e estranhei uma coisa. — Cadê o Brian?
  — Eu o deixei com uma babá.
  — Posso saber o por quê? Sabe que pode trazê-lo, eu vou cuidar direito dele.
  — Eu deixei ele porque imaginei que gostaria de sair, beber ou comer alguma coisa, mas a chuva começou a cair e tirou toda a minha vontade. — bufou com raiva, revirando os olhos.
  — E por que não voltou para a sua casa? Não imaginou que eu poderia estar acompanhado? — sugeri e ela revirou os olhos mais uma vez.
  — Você já falou com a preciosa ? — semicerrei os olhos e bebi mais um gole da minha cerveja.
  — Golpe baixo. — soprei.
  — , se você se isolar da mulher, como você espera que ela fale com você? Que ela se declare e diga que morre de amores e não aguenta mais para vocês ficarem deitados agarrados de cueca e meias no sofá quando chove?
  — Kam, na boa... Não vou correr atrás dela, ela já fez a escolha.
  — Vocês se beijaram! — desdenhou. — Por Deus, !
  — Isso não quer dizer que não possa se apaixonar por alguém!
  — Ainda mais quando a pessoa some da sua vida sem nem deixar rastros para ela te procurar. — Kamille fez seu bico patenteado de deboche. — Você ao menos falou com ela depois da festa da ? — neguei. — Ela acha que você a odeia.
  — Claro que... Como você sabe disso? — estreitei meus olhos para a minha irmã, que levantou as mãos em rendição. — Kamille, eu não acredito que você falou com ela. Mas que merda.
  — Eu só perguntei o lado dela da história. Estou mais do que farta de te ver choramingando pelos cantos por causa dessa mulher. A vida tá aí, passando ao seu redor e você apenas assistindo, sem fazer nada só porque levou um pé na bunda.
  — Eu não vou falar mais disso com você. — me levantei do sofá e segui para a cozinha, procurando qualquer coisa que pudesse nos desviar dessa conversa. Mas foi inútil, visto que a minha irmã me seguiu. — Sério, Kamille, não vou mais te perturbar com isso.
  — Você não perturba, . — apoiou suas mãos nos meus ombros e me virou, para ficarmos de frente um para o outro. — Só quero ver meu irmãozinho feliz!
  — Eu sou feliz!
  — Mas eu sei que se você estivesse com a senhorita-que-não-posso-mais-falar-o-nome ia estar radiante, com brilho nos olhos, coração batendo forte, mãos suadas e todas essas coisinhas lindas que sentimos quando amamos alguém.
  — Dá para você parar de querer ter conversas cheias de coisas de mulher comigo? — sorri e ela riu abertamente. — Se você quiser uma irmã, compre, alugue ou peça para o papai arrumar uma namorada nova o suficiente para ainda poder ter filhos!
  — Você é um idiota. — nós agora ríamos audivelmente, escorados no balcão de mármore da cozinha. — Se você não quer tentar com a , eu não falo mais.
  — Obrigado. — ela assentiu e começou a olhar em volta.
  — Vamos arrumar a sua casa! — não conhecia outra pessoa no mundo além da Kamille, que ficava feliz ao arrumar e limpar uma casa.

  Fim - ’s POV

Vida de casados - x, 23

  Olhava para o meu closet e notava que tinha algo diferente. Nas últimas três semanas, eu perdia ao menos uns cinco minutos todas as manhãs, parada apenas de toalha e tentava decifrar a charada.
  — Você não vai se arrumar, babe? — Jeremy passou, com a toalha presa ao quadril, e adentrou o closet para pegar um conjunto de camisa e calça social. — ! Você está me ouvindo?
  — Desde quando as suas coisas estão aqui? — olhava ao redor e finalmente a charada se desvendava no meu cérebro. As roupas, peças íntimas, perfumes e alguns de seus acessórios estavam dividindo o espaço do closet com as minhas coisas.
  — Tem problema? — olhos azuis finalmente encontraram meus olhos verdes.
  — Não, não. — despertei da espécie de transe em que me encontrava. — Claro que não, Jerry.
  — Achei que seria bom treinar, você sabe...
  — Treinar o quê? — minha voz saiu alta e esganiçada, fazendo Jeremy me olhar mais atentamente enquanto colocava a calça.
  — Treinar uma vida de casados, , você não pensa nessas coisas?
  — Casados? — ele parou de colocar o cinto e postou as mãos na cintura.
  — , eu não estou tentando apressar as coisas entre nós, nem nada assim. Sei que cada um tem o seu tempo, eu já percebi isso entre nós dois, mas achei que se nós tentássemos um pouquinho, seria bom...
  — Eu sei que você não quer apressar nada, mas quando você fala treinar a vida de casado, a primeira coisa que me vem à cabeça é que você vai me pedir em casamento a qualquer minuto! — apertei a nuca para tentar aliviar o princípio de estresse se firmando em mim. — Você não vai, não é?
  — Eu estou vendo na sua expressão que a minha resposta deve ser não. — ele brincou e passou seus braços ao meu redor, deixando nossos narizes encostados. — , eu gosto do que nós temos, gosto muito, e eu não quero afastar você de mim te assustando desse jeito. Se você preferir, eu levo as minhas coisas de volta para a minha casa.
  — Não, está tudo bem. — sorri e depositei um rápido beijo em seus lábios, que estampavam um sorriso. — Eu gosto de ter você aqui.
  — Também gosto de estar aqui com você. — ele estava começando a intensificar nosso beijo quando seu celular tocou no quarto atrás de nós. — Estamos atrasados.
  Em dois meses e meio de namoro, ele está querendo se mudar definitivamente para a minha casa. Que ótimo! Sei que nos conhecemos há mais de dois anos, sei que por vezes eu fiquei na casa dele e ele na minha, mas agora é definitivamente diferente. Ele quer algo a mais, algo que eu não posso dar a ele, não sem antes tentar outras coisas.
  — , você vai hoje? — ele voltou à porta do closet, onde ainda estava enrolada na toalha felpuda e branca.
  — Você se importaria se eu não fosse?
  — Está tudo bem?
  — Só estou com um pouco de dor de cabeça. — menti. — E meu trabalho está todo na minha mesa, adiantado, você não vai ter nenhum problema com ele.
  — Tudo bem. — abriu seu sorriso. — Eu trago o jantar.
  — Não, eu cozinho!
  — Uau! E você não quer que eu apresse as coisas... — disse saindo do quarto e rindo.
  Só voltei a mover um músculo quando ouvi a porta do apartamento ser fechada, e respirei aliviada. Eu precisava sair, andar, correr, conversar com qualquer estranho disposto a ouvir minhas lamúrias sem dizer uma palavra de volta. Foi então que me vi vestida em um colado short preto e uma camiseta branca que costumava usar para exercícios. Saí do prédio e recebi o ar parcialmente gelado, característico de outubro, no rosto. Uau! Eu estava precisando disso. Comecei a caminhar um pouco lento demais em direção ao parque, duas quadras à frente, esbarrando em uma pessoa ou outra pelo caminho e, quando pisei na grama verde escura e um pouco úmida pela chuva da noite, corri. Fazia bem correr e deixar o vento gelado bater contra meu corpo, fazia bem correr e sentir como se eu estivesse deixando o Jeremy e as coisas de casais para trás. Fazia bem e parecia certo. Corri tão rápido que não vi quando estava do outro lado do parque, em uma parte que não era frequentada por corredores e pessoas querendo fazer algum tipo exercício físico. Essa parte do parque era frequentada por pessoas que só queriam deitar na grama e dormir, pensar, beber alguma coisa, aproveitar a menor quantidade de árvores para ver o céu, e alguns mais abusados gostavam de ir para um canto qualquer e transar, ou pelo menos era o que os outros diziam.
  — ? — avistei cabelos castanhos contrastando com a grama verde e reconheci aquele rosto que não parava de me perseguir em pensamento vinte e quatro horas por dia. Resolvi deitar ao seu lado.
  — O que você quer? — ele perguntou depois de um tempo, em que só se ouvia a minha respiração ofegante por causa da corrida.
  — Oi. — não saberia responder a sua pergunta, e decidi começar uma conversa normal.
  — Oi.
  — Oi, . — sorri sem saber ao menos o porquê.
  — O que você quer aqui, ?
  — Nada...
  — E o que você está fazendo aqui no Parque a essa hora da manhã? — ele checou o relógio. Nem eu sabia que horas eram.
  — Eu vim correr.
  — Por quê? — ele não havia olhado para mim uma vez sequer. Estava deitado sobre a grama com os olhos fechados, vez ou outra abrindo, mas não olhando diretamente para mim.
  — Como você sabia que era eu?
  — Que era você?
  — Agora. Como sabia que era eu?
  — Eu só sabia que era você.
  — Como?
  — Sabendo, . — ele sorriu, mostrando seus dentes branquinhos e alinhados. — Senti seu perfume.
  — Eu estou suada e não me lembro de passar perfume para correr.
  — Bem, é a , não é? — brincou e nós sorrimos.
  — Sim, claro que sou eu.
  — Então pronto. Eu sei que é você. Fim da história.
  — Você anda sumido... — soprei depois de certo tempo.
  — Tenho trabalhado bastante.
  — Eu vejo a sua irmã pela cidade, com o seu sobrinho.
  — Ela voltou para Streetsville, faz quase um mês.
  — Está morando com você?
  — Não. Lá é pequeno demais para o Brian descarregar as energias.
  — Sei...
  — Ela está trabalhando com a , na escola.
  — Eu sei, a me disse...
  — É...
  — Por que você não fala comigo?
  — Quê? — ele virou seu rosto na minha direção e nossos olhares finalmente se encontraram. — Eu estou falando com você.
  — Por que não vai mais nas festas e as reuniões que o Derek dá?
  — Já disse que estou trabalhando demais.
  — , você não trabalha à noite!
  — Não quero encontrar você e seu namorado. — confidenciou baixinho e voltou a olhar para o céu, depois de alguns minutos que passamos em silêncio, apenas com os olhos fixos um no outro. — Eu gosto de você, , de verdade, e não é meu esporte favorito ver vocês dois juntos.
  — Lembra quando eu disse que você mexeu com a minha cabeça? — ele sorriu e assentiu. — Você ainda mexe. Todos os dias.
  — Me desculpe. — ele voltou a sorrir.
  — Não é sua culpa. — meus olhos arderam. Não chore, por favor! Funguei.
  — , você está chorando? — ele me olhou rapidamente e senti algumas lágrimas solitárias rolarem pelo meu rosto. — Não chora, ! — ele me puxou para seu abraço de lado, e eu apoiei minha cabeça em seu peito quando seus braços passaram ao meu redor. Permanecemos deitados e abraçados. — Por que você está chorando?
  — Me desculpa. — ele apertou seus braços ao meu redor. — Eu gosto do Jeremy, mas aí tem você, ... As coisas estão... confusas.
  — Está tudo bem, .
  — Não, , não está nada bem! — falei um pouco mais alto, entre uma lágrima e outra. — Eu estou com o Jeremy, mesmo que ele me sufoque às vezes, e então você fica martelando na minha cabeça... Já perdi a conta de quantas vezes eu quase chamei o Jeremy de ! — ele gargalhou por algum tempo, até que eu também estivesse rindo.
  — Você não chamou ele de quando estavam transando, não é?
  — ! —o repreendi.
  — O quê? É engraçado! Daria mil pratas para a primeira pessoa que passasse na minha frente se fosse verdade! — voltou a gargalhar.
  — Você é o rei das conversas estranhas. — estapeei seu peito e me deixei levar pela sua risada. — E não, não chamei ele de enquanto estávamos transando. Eu disse que isso quase aconteceu.
  — Seria a melhor cena do mundo.
  — Você é bem idiota.
  — Mas você gosta de mim. — ele brincou e beijou o alto da minha cabeça.
  — Não se esconda mais de mim, por favor.
  — Não quero ver você com ele.
  — Finja que eu não estou, só não se esconda.
  — Não estou me escondendo...
  — Está sim. Por favor, .
  — Vocês estão morando juntos?
  — Acho que ele vai me pedir em casamento. — me aninhei mais em seus braços quando eles me apertaram.
  — Se eu não me esconder, como você diz, as coisas vão mudar?
  — Mudar como?
  — Ele. Ele vai mudar para fora do seu apartamento?
  — Você quer que eu termine com ele? — levantei minha cabeça e apoiei em seu peito para olhar nos olhos dele.
  — Eu quero você, . Só você. E, se terminar com ele, não tem que ser por mim, tem que ser por você. — seus olhos brilhavam por causa da claridade, e os meus voltaram a arder por causa de algumas lágrimas que estavam se formando. — , que droga! Não chora!
  — Eu estou na TPM, eu fico sentimental! — enterrei minha cabeça na curvatura do pescoço dele e deixei algumas lágrimas caírem. — Você não escutou o que eu acabei de falar!
  — Tudo bem... — ele sorriu.
  — Eu também quero você, . — soprei perto do seu ouvido, e no minuto seguinte ele me beijou. Beijou como se a sua vida dependesse disso, e não me neguei um minuto sequer ao beijo.
  Ficamos apenas abraçados, nos beijando e sorrindo, até quando o celular dele tocou e ele atendeu.
  — Oi, pai. Estou no parque, você já chegou? Estou indo! — e desligou.
  — Você precisa ir...
  — Meu pai acabou de chegar, preciso abrir a casa. — ele se levantou e foi só então que reparei que ele estava apenas de bermuda e camiseta de um time de futebol.
  — Você corre aqui no parque?
  — Há uns bons anos. — sorriu e estendeu as mãos para mim. — Vamos, você não deveria estar no trabalho?
  — Obrigada. — me levantei com a sua ajuda. — Tirei o dia de folga.
  — Você pode almoçar comigo hoje? Como amigo.
  — Posso.
  — Pego você às 11h00min? — assenti. — Até lá, ! — ele beijou meus lábios num selinho e correu na direção oposta a minha.

  — COMO ASSIM VOCÊS SE BEIJARAM? berrava ao telefone.
  — Fay, pare de gritar! — repreendi. — Sinto que o que aconteceu foi certo...
  — Mas , e o Jeremy?
  — Eu não sei. O disse que me quer, e é óbvio que eu quero isso mais que tudo...
  — Não sei, não.
  — Pensei que a senhorita era a favor do ... — murmurei contrariada.
  — Eu sou a favor do que é melhor para você, , seja com o Jeremy, ou qualquer outro cara desse planeta.
  — ... — respirei fundo. — Eu preciso me vestir.
  — E eu preciso voltar para a minha sala de aula, mas essa conversa não acabou aqui, mocinha!
  Eram 10h43min e eu ainda estava só de toalha, olhando para o closet, como havia feito essa e outras manhãs. Não sabia onde nós almoçaríamos, logo, não sabia que roupa usar. Ousei ligar para o e perguntar, mas decidi que seria besteira demais. Adentrei no cômodo relativamente grande e procurei por peças confortáveis. Calça jeans, camisa, jaqueta e sapatilha são sempre peças-chave. Não queria ser exagerada, afinal, não era nada demais, apenas um almoço. Com ele, mas apenas um almoço. Não passei muita maquiagem e fui obrigada a colocar os óculos de grau, por não saber onde estavam as lentes de contato.
  Às 11h00min horas em ponto, o interfone tocou.
  — Oi, Blake!
  — , o está aqui, pode subir?
  — Pode sim, obrigada.
  “Ele está chegando, se controle!”
  Corri para o quarto, borrifei um pouco de perfume e a campainha tocou.
  — Oi! — ele não respondeu, mas sorriu, o que só fez melhorar a sua aparência, de jeans escuro, camisa xadrez em tons de cinza e preto, jaqueta de couro e um tênis. Ele estava realmente bonito. — Quer entrar?
  — Seu noivo não vai achar ruim? — bufei e revirei os olhos.
  — Ele não é meu noivo, e a casa é minha.
  — Se você insiste, eu entro. — brincou e me seguiu até a sala.
  — Quer alguma coisa para beber? — ele negou e se escorou no sofá. — Aonde nós vamos almoçar?
  — Você se lembra do Bob? — sorri e neguei. — O do guincho... — murmurei um Ah! E ele continuou. — A esposa dele tem um restaurante muito bom, só comida caseira, que eles mesmos criam e plantam, mas fica um pouco afastado daqui. Você quer ir?
  — Claro, parece ótimo, ! — ele sorriu e pegou minha mão, me puxando para ele. — Por isso você passou tão cedo para me pegar?
  — Quase isso. O restaurante fica há uns vinte minutos daqui, na estrada para Ferguson.
  — Você sabia que eu nunca fui a Ferguson a passeio? — ele arregalou minimamente seus olhos.
  — Você está brincando, não é? — neguei e sorri. — Então você não conhece o melhor boliche da região!
  — Tem um muito, muito bom em Lancaster...
  — Não, , você não entendeu... — ele me puxou para ainda mais perto. — O melhor boliche da região fica em Ferguson.
  — E por que você diz isso?
  — Se você está disponível, posso te mostrar, mas precisa prometer que não vai surtar nem nada dessas coisas.
  — Por que eu surtaria? — minha curiosidade atingiu seu limite.
  — Você promete ou não?
  — Veja bem aonde você vai me levar!
  — Não vou te meter em nenhuma gangue de criminosos, eu sou policial!
  — Isso não quer dizer nada. — disse com petulância.
  — Tudo bem, não vou levar mais.
  — Não... Eu quero ir. — sussurrei com manha e ele aproximou nossos lábios antes de pronunciar.
  — Só não fique com raiva de mim.
  Apenas assenti e ele segurou minha mão para sairmos de casa, seguindo direto para o carro dele, na frente do prédio. Ouvi Blake comentar algo com ele, mas não me dei ao trabalho de prestar atenção.
  Sua picape era um modelo antigo da Chevrolet, uma Silverado dos anos 90, mas ainda assim era um carro bem cuidado, brilhoso e limpo.
  — Mandei limpar o carro ontem mesmo, então não se acostume com ele assim. — piscou e sorriu ao colocar o cinto de segurança.
  — Minha mãe tem uma caminhonete também, a Florinda.
  — Sua mãe deu nome para o carro dela? — franziu os lábios de um jeito que parecia diversão.
  — Sim, a Florinda é quase patrimônio da família! — brinquei.
  — Sua mãe deve ser uma ótima pessoa. — deu partida no carro e seguiu em direção a Interestadual que ligava Streetsville à Ferguson.
  — Por que ótima pessoa? — perguntei curiosa.
  — Só por ela dar um nome ao carro, quer dizer que ela dá valor às coisas bobas e legais da vida. Isso é bem bacana.
  — Sua caminhonete tem nome? — ele negou. — Por quê? Você também é uma pessoa bacana...
  — Não revelo o nome da minha picape para qualquer um. — ele fez pose quando paramos na ligação da saída da cidade com a estrada.
  — Não sabia que eu era qualquer uma... — murmurei mais para mim do que para ele e olhei para a janela, que mostrava o campo verde e úmido que todo outubro nos proporcionava, antecedendo a neve.
  — , você não é qualquer uma. Eu estava brincando. — acrescentou e colocou uma das mãos sob a minha, que estava apoiada na coxa. — Definitivamente não é qualquer uma.
  — Bem, eu pareço... Você não fala nada de você para mim, nem o nome da sua caminhonete... — sorri, mas não era verdadeiro. Eu queria ser alguém para ele.
  — O que você vai querer almoçar? — desviou o assunto e voltou a mão para o volante, acelerando um pouco mais quando os carros também corriam ao nosso redor.
  — Quê?
  — Almoço, nós estamos indo almoçar. O que vai querer?
  — Não sei o que eles preparam lá.
  — Eu recomendo a torta de espinafre. Você gosta de espinafre? — neguei. — Tem também uma carne recheada, que eu não sei como a mulher do Bob prepara, mas é muito boa...
  Não prestava mais atenção ao que falava. Ele tinha mudado a droga do assunto só porque queria conhecê-lo melhor? Que mal tem isso?
  Eu gostava dele, e o sentimento era recíproco. Ele havia dito no parque, não muitas horas atrás, que gostava, mas por algum motivo que meu cérebro não conseguia definir direito, ele não estava disposto a deixar esse sentimento se apoderar dele.
  — , está me ouvindo? — ele apertou minha mão, ainda sob a coxa e olhei para os olhos verde-claros dele. — Nós chegamos. — sorriu e desceu do carro.

  's POV

  — Desculpe, eu só estava desligada. — ela sorriu e também desceu da picape. Ela estava linda de cabelo solto e óculos de grau.
  — Por que você não usa seus óculos sempre? — acabei perguntando, porque ela ficava muito mais bonita com eles.
  — Eu odeio usar óculos. Odeio! — nós entrelaçamos nossos dedos e caminhamos até a entrada da Comida Caseira da Kezia, mulher do Bob.
  — Você fica mais bonita com eles. — soprei ao abrir a porta e a vi sorrindo.
  O Comida Caseira da Kezia era rústico, desde a localização no sítio da família até a estética do lugar, sempre fiel às raízes da dona. As portas eram em forma de porteiras, com direito a algumas cercas ao redor da construção e, ao adentrar, a primeira coisa que se via era o bar cheio de bancos altos e uma parede de bebidas alcoólicas, que também eram feitas na propriedade. Via-se a cozinha através do vidro acoplado em parte da parede de frente para a porta, e então vinham as mesas de madeira crua, cobertas por toalhas quadriculadas e bancos feitos com resto de troncos; nada de cadeiras chiques e acolchoadas. tinha os olhos curiosos por todo o ambiente, ainda com poucos clientes, mas que em pouco tempo lotaria, como todas as outras vezes que estive ali. Continuei nos levando até uma mesa no canto direito do salão, ficava na direção da janela com vista para a horta própria do lugar.
  — Aqui é lindo! — ela sussurrou quando viu que um garçom se aproximava. Assenti e sorri.
  — Bom dia, vocês vão querer algo para beber antes de fazer o pedido? — Junior, filho de Bob e Kezia, veio nos atender. — , quase não reconheço você!
  — Junior. — meneei a cabeça como um aceno. — Só por que não estou com meu uniforme?
  — Algo assim. — ele sorriu e virou-se para . — A senhora quer o cardápio?
  — Senhora não... — ela lamentou em brincadeira. — Por favor. — ele se retirou e ela voltou a olhar para mim. — Você conhece muita gente.
  — Nasci e cresci em Streetsville, praticamente vi o Junior nascer.
  — Seu pai e sua mãe também são de Streetsville? — acenei que sim com a cabeça, sem mencionar a parte de que minha mãe havia falecido há uns bons anos atrás. — Você já pode me falar mais de você ou vou precisar te embebedar? — ela brincou e nós sorrimos.
  — Por que quer saber de mim? Não é uma história interessante...
  — Pensei que nós fôssemos amigos. Amigos sabem da vida dos outros.
  — Num outro momento nós conversamos sobre isso, está bem? — Junior deixou os cardápios e se retirou. — Você quer beber alguma coisa? As suas cervejas...
  — Não são minhas, . Não é como se você não bebesse. — ela acenou para Junior. — Quero um suco de maçã, vocês têm aqui? — o menino assentiu. — Traga um para mim, por favor.
  — Um para mim também, Junior. Obrigado. — ele foi para a cozinha. — Eu bebo sim, , mas você que fica bêbada por aí... — brinquei e vi os olhos verdes dela se arregalando.
  — ! — sua voz saiu alta e alguns outros clientes olharam para nós. — Eu não fico bêbada por aí!
  — , eu estou brincando. — levei minha mão ao encontro da dela na mesa e apertei. — O que foi?
  — Nada, . — sorriu e voltou a olhar para o cardápio.
  Acabamos escolhendo a carne recheada, característica do restaurante, acompanhada com suco de maçã para nós dois.
  Enquanto almoçávamos, conversávamos sobre assuntos aleatórios e sem importância, e a verdade era que eu estava conversando sobre qualquer assunto banal. Ela queria me conhecer, mas não queria falar mais do que o necessário. O que acontece é que é difícil ser amigo de alguém de quem nós gostamos, ainda mais quando os segredos são expostos, e ela me queria como amigo, mas eu não queria só isso dela. Porra, essa mulher me deixa louco da vida e quer que sejamos apenas amigos? Ela mesma já disse que o que sinto por ela é recíproco, que mal há em deixar aquele palerma do chefe?
  Chamei Junior para pedir a conta, e travou uma batalha, dizendo que deveria pagar metade da conta.
  — Eu convidei você, pagar a conta é o mínimo que eu posso fazer, .
  — Isso não tem nada a ver, , deixa de besteira e me deixa ver esse papel. — ela sorria e tentava arrancar a conta impressa da minha mão.
  — Já disse que não, e se ficar me importunando, prendo você por desacato! — brinquei e tivemos um acesso de riso em meio ao restaurante, agora lotado.
  — Você não se atreveria! — semicerrou os olhos para mim.
  — Não me provoque. — pisquei para ela.
  — Então eu pago o que quer que formos consumir no boliche! — ela disse, petulante, e não consegui conter o riso. — O quê?
  — O boliche só funciona à noite.
  — Ah. — ela desviou o olhar do meu e seu sorriso desapareceu. — Hoje não dá.
  — Seu noivo não vai deixar você sair? — provoquei.
  — Prometi que faria o janta. E ele não é meu noivo, !
  — Não é ainda... — ela me olhou confusa. — Quando um cara passa a morar com a namorada, isso é praticamente um treino para a vida de casados. Ele vai te pedir em casamento, mais cedo ou mais tarde. — respirei fundo e deixei o dinheiro ao lado da conta, para me levantar e esperar por ela.
  — E como é que você sabe disso? Por acaso já morou com alguma mulher antes? — perguntou ao passar por mim, em direção à saída do restaurante.
  — Não fique com raiva de mim... É coisa de homem fazer isso. — garanti quando cheguei ao seu lado e a vi sorrindo, e fomos caminhando até a caminhonete. — Posso perguntar algo?
  — Claro. — ela disse ainda escondendo o riso.
  — Você acha que um dia você vai me dar uma oportunidade? — ela parou bruscamente e arregalou os olhos verdes em minha direção. — Não quero pressionar você, é só como uma pergunta normal…
  —
  — Porque não vou ficar com você assim. — continuei. — Entenda, , já disse uma vez e vou repetir: Eu quero você! Mas não assim, não você estando com outra pessoa.
  — Você está me dando um ultimato, é isso?
  — Só estou perguntando se algum dia você vai querer algo comigo, não disse para deixar o Jeremy e correr para os meus braços. Acredite, eu sei como é estar sendo traído e não desejo isso nem ao seu namorado.
  — Isso parece um ultimato para mim. — ela voltou a andar até a porta do carro. — Nós podemos ir agora?
  Não trocamos mais nenhuma palavra durante os minutos que ainda passamos dentro do meu carro na volta para o centro de Streetsville. Vez ou outra eu olhava para o lado, e ela não tirava a cabeça do vidro, admirando a paisagem ou apenas me ignorando. Tentei sintonizar alguma rádio para tentar quebrar o gelo que eu mesmo havia formado entre nós dois e, preciso confessar, foi estupidez ter trazido essa coisa de ela deixar o Jeremy para nós tentarmos um relacionamento, mas eu simplesmente não poderia aceitar ser o booty call da . Em meu último relacionamento, havia uma terceira pessoa, e eu acabei sendo o último a saber, deixando a confiança no sexo feminino distante por tempo demais, para a chegar agora e querer fazer a mesma coisa, dessa vez, comigo sendo o intruso.
  — … — quando estávamos chegando próximo ao prédio em que ela morava, resolvi tentar a sorte de uma conversa. — Eu disse hoje de manhã que você tinha que decidir ficar com o Jeremy por você, não por mim. Mas, se eu fosse escolher, nós estaríamos juntos desde que conheci você.
  — , eu não entendo você. Num momento você está falando que quer ficar comigo, me beija, me leva para almoçar, e tudo isso sabendo que eu quero ficar com você, mas então diz para eu ficar com o Jeremy. Afinal, que diabos você quer mesmo? — nossos olhares voltaram a se encarar quando estacionei em frente ao prédio.
  — Eu não disse para você ficar com ele. Eu disse para fazer o que quiser, que fosse a sua decisão, sem interferência minha, mas agora você deixou as coisas bem claras. Você quer o chefe!
  — Nós estamos juntos há bastante tempo, eu e o Jeremy. Eu não posso deixá-lo assim, sem mais nem menos, .
  — Entendi, . Você está entregue. — a raiva estava voltando a tomar conta de mim.
  — Nós podemos ao menos tentar ser adultos o suficiente para sermos amigos? — ela uniu as mãos no colo e desviou os olhos para lá. Respirei fundo e assenti. — Não quero que você se esconda de mim, não quero que você volte a sumir.
  — Já conversamos sobre isso.
  — Tudo bem. — ela soprou num sussurro e ainda olhava para as próprias mãos. — Obrigada pelo almoço. — e saiu do carro sem olhar para trás.

  Fim - 's POV

  Assim que saí da caminhonete do , mais cedo, não me dei ao trabalho de olhar para trás. Subi para meu apartamento como uma bala, e preparei a banheira para um longo e relaxante banho, precisava pensar sobre o que havíamos conversado. Ele não quis falar nada pessoal, e fiquei me perguntando o porquê, já que toda vez que eu tentava, ele desconversava, por isso ficamos ligados aos assuntos mais banais ou divertidos durante o almoço. Porém, eu não deixava de pensar em porque ele não queria ao menos tentar ser apenas meu amigo, apesar de que nem eu queria isso. Mas nós poderíamos, se tentássemos, e seríamos bons amigos. Ele é uma pessoa muito boa, alegre, que faz você se sentir bem, e de quem eu gostava muito, por isso queria tanto algum tipo de contato com ele antes de resolver toda a minha situação com o Jeremy. Eu precisava conhecê-lo, mas ele nunca havia me dado a oportunidade. Queria saber por que entrou para a polícia, porque escolheu morar em Streetsville quando podia morar em Lancaster, porque era tão fechado comigo. Sentia meus dedos enrugando e meus olhos pesando quando resolvi deixar a banheira e deitar na cama, ainda pensando nele. Tentei guiar meu cérebro para outros lugares antes de cair no sono. Nada feito.

  Despertei assustada e com frio. Estava enrolada na toalha, como havia deitado, e chovia forte lá fora, fazendo com que um vento frio entrasse pelas janelas. Segui até o closet e coloquei meu moletom mais quentinho e confortável, fui para a sala de estar e acabei assistindo a um filme qualquer que passava na televisão, quando olhei para o relógio da parede e vi que já passava das oito horas da noite. O Jeremy já deveria ter chegado. Resolvi ligar para ver se algo de errado havia acontecido.
  — Oi Jerry. — ele atendeu no quarto toque.
  — Oi, babe. — sua voz saiu rouca pelo telefone. — Não vou poder ir hoje...
  — Por que não? Aconteceu alguma coisa?
  — Não, nada muito importante. — desconversou e acrescentou. — Sabe... É. Os meus pais. Sim, os meus pais queriam conversar comigo.
  — Ah. Está tudo bem? — pedi, desconfiada.
  — Sim, não se preocupe. Você vem à empresa amanhã, certo?
  — Claro, Jeremy. — não pude deixar de revirar os olhos.
  — Amanhã falo com você, então. — desligou.
  Odiava quando as pessoas desligavam na minha cara, principalmente quando elas eram vagas e estranhas durante a ligação. Jeremy às vezes tinha esse péssimo hábito de me deixar de fora de vários assuntos da sua vida pessoal – não que eu fosse obcecada por saber tudo o que ele fazia ou deixava de fazer, mas eu era insegura, como qualquer outro ser humano normal, e a cada vez que as ligações eram vagas e estranhas, imaginava todos os piores cenários. Traição era o pior deles. Já tinha sentido na pele o que era ser traída, e foi uma fase... difícil. “Você beijou o algumas vezes hoje.”, a voz incessante na minha cabeça se fez ouvir, mas resolvi não dar atenção a ela, conseguindo me distrair ao ouvir a campainha do meu apartamento tocar.
  — Anda, ! Eu estou congelando aqui! — escutei a voz da Denise assim que cheguei até a porta, e a vi entrar como um furacão. — Deus! Eu preciso taaaanto da sua ajuda. — ela pediu juntando as mãos em súplica e revirando os olhos.
  — O que foi?
  — Assim... — ela sentou-se num dos bancos da cozinha. — Você se lembra do aniversário do Derek? — assenti. — Lembra que saí de lá com o Tyler?
  — Denise, direto ao ponto da questão. — pedi, também sentando, mas no sofá, e ela se juntou a mim.
  — Ele quer voltar, . — disse num sussurro. — Nós não podemos voltar!
  — Você nunca me disse o por quê de vocês terem terminado... O Tyler já era praticamente da família, Den.
  — Vocês o consideravam da família, ele não. — olhei confusa em sua direção e ela bufou, revirando os olhos. — O Tyler sempre foi um idiota comigo. Sempre, . Nós só ficávamos, nunca foi sério.
  — Mas... Ele chegou a pedir você em namoro ao titio!
  — E, uma semana depois, ele disse que namorar não ia nos levar a lugar algum.
  — E por que ele mudou de opinião? Assim, do nada?
  — Ele admitiu que me fez sofrer demais antes, e ele sofria por me ver assim... — ela suspirou e eu quis soltar um sonoro “Ahhhh!”, mas a minha adorável e complicada prima não gostaria. — Ele disse que me ama. E isso foi uma revelação. Ele nunca tinha dito que me amava.
  — Ahhhhh! — ela estreitou seus olhos para mim. — Den, eu sempre percebi o Tyler na dele, sabia de alguns problemas que vocês tinham, e tudo, mas você não acha que deve dar uma segunda chance para ele? Uma nova chance para vocês dois?
  — Eu só tenho medo. — seu corpo amoleceu e sua cabeça veio parar em meu colo. — Você sabe como a minha vida é complicada e corrida por causa do hospital.
  — Ele não aceita isso? — franzi o cenho e ela abanou as mãos em negativa.
  — Ele aceita, e super apoia. Sempre achou maravilhoso o trabalho de alguém ser salvar a vida dos outros, mas eu sei que ele vai acabar enjoando, vai ficar com raiva de todos os plantões que eu acabo fazendo e ele vai arranjar outras... — ela estremeceu.
  — Hmm. — murmurei. Insegurança é mesmo um mal do ser humano, ainda mais se ele tiver um par de X's nos cromossomos e pertencer à minha família. — Também tenho esse medo.
  — Ô-ou! — ela disse se levantando rapidamente do meu colo e me olhando seria. — Você e o Jeremy estão com problemas?
  — Não. — revirei os olhos. — Eu nem sei se temos problemas.
  — Como não?
  — Ele é muito aéreo algumas vezes... — ela me olhava como se não entendesse o que era 1+1. — Aéreo, vago, estranho, distante... A quantidade de sinônimos que eu poderia descrevê-lo é infinita.
  — Vocês não conversam? — meneei a cabeça para os lados. — , você precisa conversar com ele, sobre ele ser assim.
  — Claro que não! Onde já se viu, eu falar para o Jeremy o quanto ele é vago? — sorri, mas era de nervoso. — Eu não vou ser a mulher louca e obcecada que não deixa o homem respirar.
  — Você é tão exagerada! — revirou os olhos pela décima vez, pelas minhas contas. — , uma única vez que você converse com ele não faz mal, e ele não vai achar que você é uma louca perseguidora da vida dele.
  — E você deveria dar uma segunda chance ao Tyler. — sorri, tentando ajudá-la a solucionar o seu problema também. — Você o ama, Den! Deus e o mundo sabem disso.
  — É claro que eu amo aquele deus grego pedaço de mal caminho... — ela olhou para as mãos, postas sobre a coxa. — Posso dormir aqui?
  — Achei que você fosse se acertar com o Tyler.
  — O Jeremy está vindo e vocês vão transar loucamente, não é? — ela riu e tentei com todas as minhas forças não cair na gargalhada, mas foi inevitável.
  — Não, ele não vem. Ele está resolvendo alguma coisa com os pais, pelo menos foi o que ele me disse...
  — Então vamos dormir, porque eu estou morta de sono. — revirou, mais uma vez, os olhos.
  — Qualquer dia desses, seus olhos não vão parar de revirar, e todas as suas palavras vão sair arrastadas. — brinquei e ela retrucou.
  — Ao menos vou ter você para me aturar!
  — Vamos dormir, Denise! — e dessa vez quem revirou os olhos fui eu.
  Estávamos deitadas na minha cama, com um balde de pipoca e a televisão ligada em uma série dramática demais.
  — Den... — sussurrei. — Você ainda tá acordada?
  — Claro que tô. — ela sentou-se e se apoiou na cabeceira da cama. — Não estou conseguindo nem fechar os olhos.
  — Ainda é bem cedo... — olhei para o relógio no criado-mudo, que ainda marcava nove horas.
  — Acho que eu deveria ligar para o Tyler.
  — Acho que você deveria ligar para o Tyler. — sorri e ela deu um pulo da cama, em direção à sala.
  Voltei a comer pipoca e assistir o filme.
  — Você fica uma gracinha assim. — Jeremy estava escorado na porta do meu quarto.
  — Co-como...? — perguntei confusa.
  — A Denise me deixou entrar, apesar de que eu tenho a chave... Ela estava saindo e foi pura coincidência.
  — Ah. — voltei a olhar para a televisão, sem realmente prestar muita atenção nela. — E os seus pais, está tudo bem?
  — Não. — ele murmurou olhando para a janela, e foi em direção ao closet, voltando um tempo depois apenas com a calça do pijama e deitando ao meu lado na cama. — Eles vão se separar.
  — Jerry...
  — Não fique com pena de mim, . Eles são adultos e sabem o que estão fazendo.
  — Não estou com pena... Só queria saber como você está com tudo isso.
  — Briguei feio com meu pai. — coloquei o pote de pipoca no chão e ele aconchegou a cabeça em meu peito. — Talvez ele me afaste da empresa.
  — Mas, Jeremy, ele não pode tirar você de lá!
  — Claro que pode, , a empresa é dele. — suspirou.
  — E a sua mãe? — minhas mãos começaram a mexer no cabelo dele.
  — Podemos só dormir?
  — Você não quer conversar? — ele negou. — Comer? — negou de novo. — Jeremy...
  — Porra, ! — se livrou dos meus braços e levantou da cama em direção ao closet — Não quero essas merdas, não posso simplesmente dormir?
  — Faça o que quiser, Jeremy, mas na sua casa. — a raiva expressa em cada palavra proferida. — Não sou obrigada a aturar os seus surtos!
  — Que se foda, ! — ele disse, já andando para fora do quarto.
  — Idiota! — murmurei, sabendo que ele não escutaria.

  Acordei assustada e com calor. Muito calor. Estava enrolada em lençóis e, olhando pela janela do apartamento, o sol brilhava, sem nuvens atrapalhando. Corri para fazer a higiene matinal e tomar um banho bem gelado. Streetsville não era uma cidade quente, em todos os anos que eu morei aqui nunca havia feito uma manhã tão bonita e tão quente. Quando voltei ao quarto, olhei o relógio, que passava das nove. Não ia trabalhar. Estava precisando não fazer nada, ainda mais depois do ataque sem o menor sentido do Jeremy. Se ele achava que eu aguentaria isso, ele estava bem enganado.
  Não havia nada comestível na cozinha. Precisava fazer compras, mas, antes de qualquer coisa, precisava comer.
  Depois de passar numa confeitaria, me dirigi ao mercado, para reabastecer a despensa.
  — ! — uma voz me chamou e, quando olhei na direção, vi Kamille e o filho.
  — Oi. — sorri. Não queria parecer rude nem nada. — Tudo bem?
  — Tudo ótimo! Você vai hoje?
  —Vou aonde?
  — A não te ligou? — neguei. — Bem, ela deve estar doida com todas aquelas provas... Então, hoje é o aniversário do Brian, vou fazer uma festinha para uns amigos. Gostaria que você fosse.
  — Ah. — olhei incerta para o garotinho, que era uma cópia do . — Você tem certeza?
  — Mas é claro, ! Você é amiga da , do Derek, do , você é amiga da família! — ela sorriu, parecendo satisfeita. — Olha, eu tenho mesmo que ir, preciso fazer o bolo e mil e uma coisas. Às oito. Peço para o te enviar o endereço. — disse já indo para o caixa, e abanou um tchau na minha direção.
  Será que ela não sabia do desastre que foi a tentativa de ser amiga do ? Quer dizer, não foi um desastre, mas nós com certeza não somos os melhores amigos do mundo. Desisti de pensar nele e voltei às compras, passando rapidamente numa loja de brinquedos depois do mercado. Se eu fosse a esse aniversário, precisaria de um presente.

  

Almoço pronto, casa limpa e arrumada e meu estado estava um caus. Me livrei de toda energia negativa enquanto passava o aspirador pelos cantos e dançava as músicas tocadas na rádio local. Eram umas três e quarenta da tarde quando o interfone tocou.
  — Oi Blake! — disse ofegante.
  — quer subir.
  — Por quê?
  — Eu não sei, dona .
  — Não sou dona, Blake. — sorri nervosa. — Tudo bem, ele pode subir. — bati o interfone, destranquei a porta e deixei entreaberta, e me olhei no espelho do banheiro do corredor. Eu estava horrível. Bem, se nós somos amigos, ele pode me aguentar assim, pensei.
  — ? — apareceu magicamente na entrada do corredor. — Aí está você.
  — Oi, desculpa, estou colocando a casa em ordem... — olhei ao redor e ele repetiu meu gesto.
  — Estou vendo. — sorriu e voltou a olhar para mim. — Bonito traje, aliás. — eu estava com uma camisa do Jeremy e, com certeza, a boca retorcida dele indicava que ele sabia. — Seu noivo está?
  — Duas coisas, . Primeiro — enumerei nos dedos. — Jeremy não é meu noivo. Segundo, ele não está.
  — Claro. — revirou os olhos. — Queria saber se você vai hoje à noite. A Kamille insistiu muito para que eu viesse aqui te entregar o convite. — ele estendeu um envelope azul em minha direção. Era decorado com cartolas, coelhos e pombos de desenho. — É estranho. Eu disse que ninguém ia entender que era uma festa “mágica” — ele fez aspas com as mãos.
  — Mágico? Vai ter mágico na festa? — droga!
  — Vai, algum problema? — neguei, não conseguindo tirar os olhos do convite. — Então, você vai?
  — Não sei se é uma boa ideia... Eu não conheço muito a sua irmã. Ela acha que nós somos amigos. — sorri em descrença.
  — E nós não somos? Achei que era isso que você queria.
  — É. — olhei para ele, que estava com aquele par de olhos verdes grudado em mim. — Desculpe.
  — Você não precisa ir, se não quiser.
  — Não, tudo bem. Eu vou. — ele sorriu.
  — Pode levar seu namorado. Vai ser divertido.
  — Ah. — mude de assunto. — Você quer almoçar? — ele olhou o relógio de pulso.
  — Já são quase quatro da tarde... Você ainda não almoçou?
  — Não, fiquei distraída com a casa.
  — Tudo bem, mas fica para uma próxima vez. Preciso ajudar a Kamille, ou ela me mata. — ele estalou os dedos e pendeu a cabeça para um lado. — Eu vou indo, , vejo você hoje à noite. — caminhou até onde eu estava e depositou um beijo na minha testa suada.
  — Até, .

O mágico - Outubro, 24

  Me olhava no espelho e não estava contente com o que via. Ainda estava bem quente, como o dia todo, então optei por usar uma saia florida que há anos não saía do armário, uma camisa branca com um tecido leve e sapatilhas vermelhas, na mesma cor das flores.
  — Essa não sou eu. — resmunguei comigo mesma.
  Tirei as sapatilhas e joguei-as longe, procurando qualquer outro sapato. Era festa de criança, então nada de saltos enormes que só iriam fazer meus pés doerem e afundar na grama do quintal. All star! Achei meus tênis brancos no fundo de uma pilha de sapatos que eu nem lembrava que ainda existiam. Preciso fazer doações. Relembrava todas as vezes que precisava mexer nessa parte do armário. Calcei os tênis e voltei a me olhar no espelho. Perfeito! Tênis são úteis quando você não sabe mais o que calçar. Dica.
  Peguei a bolsa de cima da cama e corri até a sala, à procura do presente, já embrulhado.
  — Eu estou muuuuito atrasada! — disse arrastado e sorri ao me lembrar da mania da minha prima.
  Cheguei ao carro e olhei mais uma vez no relógio do celular, 21h13min. Liguei o carro e procurei pelo convite com o endereço, nada.
  — Ah, meu Deus, hoje não é o meu dia! — bufei saindo do carro de volta ao apartamento à procura do envelope azul, ainda sobre a bancada da cozinha.
  Acelerei o máximo possível até a casa da Kamille, conseguindo chegar às 21h38min. A famosa e antiga música de parabéns pra você vinha de algum lugar de trás da casa, e resolvi andar pelo caminho da garagem até lá. O quintal estava lotado de crianças com seus pais, e alguns conhecidos. Kamille estava com Brian no colo, ao lado direito e um senhor que, definitivamente, era o pai deles ao lado esquerdo. era a cópia mais nova do senhor elegante que estava atrás do bolo com eles, e o Brian era a cópia em miniatura dos dois. Avistei e Derek próximo a uma mesa e segui até eles quando a música já estava acabando.
  — Oi! Você tem que parar de sumir... — sussurrei para minha melhor amiga e lhe dei um abraço. — Oi Derek!
  — ! — ele acenou com a cabeça e voltou a sentar, como os outros convidados.
  — Estou atolada na escola, desculpa. — sorriu em desculpa. — Época de revisão, e depois são as provas.
  — Tudo bem, , só não desaparece por completo.
  — Ah... — ela sorriu de orelha a orelha e sussurrou: — Pensamos numa data. Nada certo ainda, mas estamos chegando lá! — apertou os dedos em uma figa.
  — , você veio! — escutei a voz da Kamille atrás de nós. — Dá oi para a tia , Brian!
  — Oi, tia ! — o menininho disse e sorriu ao ver o presente em minhas mãos.
  — Oi, lindo! — sorri como ele e voltei a olhar para Kamille. — Pois é, cheguei um pouco atrasada, mas estou aqui.
  — Não tem problema. Espera só um pouco que eu vou pegar uma cadeira.
  — Não, não precisa, eu me arranjo por aqui com a e o Derek!
  — Nada disso, ! — ela sorriu e colocou a criança no meu colo. — Segura ele que eu já volto, ok? — e saiu.
  — Esse presente é meu? — ele se agarrou ao meu pescoço para não cair e perguntou, apontando para o presente na minha mão vaga.
  — É sim... Eu não sabia muito bem de que tipo de brinquedo você gostava, espero que eu tenha acertado! — sorri para ele que tinha os olhos brilhantes. — Você quer abrir?
  — Sim! — ele quase gritou. — Vamos até lá na sala, onde os outros brinquedos estão! — disse apontando para uma porta branca.
  Fui caminhando com Brian em meu colo, ele guiava meu caminho com os dedos e dizia o quanto estava esperando pelo mágico, me fazendo estremecer ao me lembrar disso. Chegamos à sala e fomos até a pilha de presentes que estavam amontoados ao lado de uma poltrona de couro preto, colocando o pequeno no chão e me sentando junto a ele. Só então percebi que ele estava vestido a caráter para o aniversário.
  — Você está muito bonito! — elogiei e olhei mais uma vez para a sua roupa all Black, com direito a capa com um desenho de cartola.
  — A mamãe não quis que eu usasse o chapéu do mágico! — ele murmurou tristonho e fazendo bico.
  — Por que não?
  — Ela disse que eu ia estragar. — revirou os olhos e eu sorri. — Você sabia que o chapéu que o mágico usa tem outro nome?
  — Outro nome? — fingi surpresa e ele sorriu. — Mas todo chapéu se chama chapéu!
  — Não, tia! — ele bateu com a mãozinha na testa e riu. — Tem o chapéu do mágico, que é a cartola, tem o chapéu com uma coisa para frente que é boné — disse, usando as mãos para ilustrar a aba — e tem o chapéu de cowboy, que é bem grande e sempre tem uma fita ao redor.
  — Uau! Eu não sabia disso tudo! — sorrimos. — Quais são os outros nomes dos chapéus?
  — Ah, eu não sei... — deu de ombros e olhou para os presentes, como se lembrasse de alguma coisa. — Posso abrir meu presente?
  — Pode, mas não deixa sua mãe saber que eu deixei. — ele afirmou e sorriu.
  Brian começou a rasgar o papel de embrulho que eu levei o maior tempão para deixar apresentável, mas isso não me deixou triste nem nada. O sorriso que acendeu no rosto dele ao ver o brinquedo superou todas as expectativas.
  — Obrigado, tia! — ele se jogou nos meus braços e me deu um beijo na bochecha.
  — Você gostou mesmo? — perguntei receosa.
  — Muito mesmo! — ele tirou o carro da embalagem em dois tempos. — Eu sempre quis um carro de polícia, igual o do tio , mas a mamãe nunca me deu, e o tio nunca me deixou andar no que ele trabalha...
  — Agora você tem o seu próprio carro de polícia! — sorri e passei a mãos nos cabelinhos dele. — Ele tem controle remoto. Aqui, oh.
  Começamos a desembalar o carrinho e o controle remoto, que por sorte estava com pilhas, e Brian começou a brincar imediatamente.
  — Posso abrir outro presente, tia?
  — Acho melhor não, Brian... Você tem que pedir para a sua mãe.
  — Mas ela não vai deixar... — fez bico e me vi imitando o gesto.
  — Que tal se nós voltarmos lá para o jardim e você brincar com seus amiguinhos?
  — Mas eu queria abrir meus presentes.
  — Eu prometo que vou perguntar a sua mãe se podemos abrir os presentes daqui a pouco, tudo bem?
  — Promete mesmo? — ele olhou desconfiado e assenti. — Então tá bom.
  Ele saiu correndo feito um furacão até a porta traseira da casa, que dava para o jardim, e fui me levantando aos poucos do chão, quando meu celular avisou que tinha uma mensagem do Greg.
  “Por favor, , estamos precisando de você por aqui. Estamos perdendo clientes, e só você pode nos salvar.”

  Respondi imediatamente:

  “Sabe que sempre pode contar comigo. Vou fechar minhas contas com o Jeremy na segunda pela manhã.”

  Não esperei por resposta e coloquei o celular de volta na bolsa, enquanto voltava para a festa. Sentei junto de e Derek, e de vez em vez o Brian aparecia e me perguntava se já tinha falado com a Kamille, mas ela havia sumido e eu não sabia mais o que responder.
  Até que a grande atração chegou, e minhas mãos começaram a suar. O mágico.
  — E então, eu estou sumida e você está calada... O que foi? — minha amiga perguntou assim que ficamos sozinhas na mesa.
  — Ah... Nada. — respirei fundo e desviei os olhos do mágico. — Você sabe onde é o banheiro?
  — , qual é, conheço você quase minha vida toda. O que aconteceu?
  — Depois conversamos, preciso ir ao banheiro.
  Corri para dentro da casa e fui me sentar no mesmo lugar de antes, perto dos presentes, na intenção de me esconder.

  [Flashback on]

  A festa de seis anos era a mais esperada pela pequena . Ela já estava com seu vestidinho cor de rosa, seus sapatos estavam brilhando e seu cabelo já estava arrumado quando seus amiguinhos começaram a chegar.
  O tema que ela escolheu era O Circo da , com direito a carrinho de pipoca, uma tenda, palhaço, alguns malabaristas e até a um mágico. Não que ela gostasse de mágicos. Na verdade, eles assustavam até o último fio de cabelo da garotinha, mas enquanto ela se mantivesse afastada dele, tudo estaria bem.
  Logo a festa já estava lotada com todos os seus amigos da escola, sua prima e alguns vizinhos, e todos estavam cantando e desejando um feliz aniversário para ela. Mas estava preocupada com o depois do parabéns, com medo do mágico, apesar de ainda ser muito pequena para tal sentimento.
  Começou a brincar com seus amigos e sua prima, e então o palhaço os chamou para o show. se divertia com as brincadeiras que o homem fazia e adorava quando ele a chamava para ajudá-lo, mas logo em seguida o mágico entrou para fazer o show, e ela voltou a ficar sentada com os demais. Sentia que ia chorar, mas lutava ao máximo para não fazer isso ali, no meio da festa.
  O mágico começou com seus truques, e até então não havia chegado perto da garotinha. Então ele pediu sua ajuda. Ela precisaria entrar numa porta, e ele a faria desaparecer. foi até o palco, temerosa, e obedeceu as ordens que ele lhe dava, mas quando ele fechou a porta, ela se viu num ambiente escuro, que fedia a cigarro e sentia-se claustrofóbica. Começou a chorar e soluçar, batendo diversas vezes na porta pedindo para sair, até que a mãe apareceu e a tirou de lá.
  — Mamãe, eu não quero desaparecer! — ela chorava para a mãe, que estava com um olhar confuso.
  — Mas meu amor, você pediu um circo... Você lembra que os circos sempre têm um mágico?
  — Mas eu tenho medo de mágicos!
  — Por quê? — Carla acariciava os cabelinhos da filha, tentando acalmá-la.
  — Não sei, mamãe. Tenho medo! — ela se jogou nos braços da mãe e soluçou mais uma vez.
  A festa continuou sem o mesmo ânimo, e chorava, com medo do homem que fazia magias. Não entendia por que tinha medo dele, mas tinha. Muito. E toda vez que cruzava com um pelo caminho, fazia questão de ignorá-los, como se eles não fizessem parte do mundo em que ela estava.

  [Flashback off]

  — Aí está você! — ouvi a conhecida voz do me livrar da lembrança da minha festa de seis anos. — Não falei com você a noite toda.
  — Oi. — sorri fraco.
  — Por que você está sozinha aqui dentro?
  — Não gosto de mágicos.
  — Sério? — ele sorriu e sentou ao meu lado no sofá, passando os braços pelo encosto atrás de mim. — Por que, exatamente?
  — Não sei. Acho que é por causa das coisas sem sentido que eles fazem. Sabe, fazer você desaparecer quando, supostamente, é impossível.
  — , é um truque.
  — Eu sei, mas não gosto. — cruzei os braços na frente do corpo.
  — O Brian estava te procurando.
  — Droga! Me esqueci de perguntar à sua irmã se ele podia abrir os presentes.
  — Não sabia que você era amiga do meu sobrinho.
  — Bem... Ele é muito fofo, não tem como não gostar dele. — sorrimos e ele concordou.
  — Ele me disse que você deu um carro de polícia para ele.
  — Ele me disse que você não deixa ele andar no seu...
  — Não mesmo. Aquele carro é de trabalho, nem eu gosto de andar nas viaturas, elas são desconfortáveis.
  — Mas imagina que legal seria andar numa dessas? Ele chegando à escola numa viatura e todos olhando o cara super descolado. — sorri e pisquei para ele, que soltou uma gargalhada.
  — Cara super descolado! — ele tentou imitar minha voz fina, mas não deu certo. — Ele é uma criança ainda... Talvez quando ele crescer eu faça isso. E fique você sabendo que não é tão legal chegar de viatura na escola. Todos pensam que você é um delinquente.
  — Como você sabe?
  — Meu pai era policial, e me levava para a escola na viatura todo santo dia. As pessoas enjoam.
  — Ah, cala essa boca. É porque você não tem cara de super descolado. — gracejei e ele sorriu.
  — Talvez. — ficamos algum tempo em silêncio, ouvindo o barulho da festa que havia diminuído consideravelmente. — Você está bem?
  — Quê? — olhei em sua direção, e ele estava com a boca vermelha e meio inchada. Estranho. — Estou, claro. E você?
  — Tudo na mais perfeita ordem.
  — Sua boca está bem vermelha. — seus olhos não saíam de mim e voltei a olhar para a televisão desligada.
  — Droga. — resmungou baixinho e passou a manga da camisa pela boca. — Acho que foi do bolo.
  — Sei. — Droga!
  — Você quer comer? — neguei com a cabeça. — Você já comeu alguma coisa na festa?
  — Não estou com tanta fome.
  — Quer uma cerveja?
  — Sim, por favor.
  A primeira cerveja oferecida pelo foi rapidamente ingerida, assim como as muitas outras que vieram. Não me lembrava de quantas já havia tomado, e estava tendo um pouco de dificuldade de andar em linha reta. O álcool estava, definitivamente, numa proporção bem maior do que o recomendado quando me dirigi até onde a Kamille estava, conversando no jardim com alguns convidados, entre eles uma loira peituda agarrada no pescoço dele. Puta merda! Pedi uma bebida mais forte e ela disse gentilmente que eu poderia encontrar alguns licores e vinhos na cozinha. Sem cerimônia alguma, agradeci e peguei a primeira garrafa de bebida alcoólica que encontrei, voltando a sentar no sofá da casa dela. Não sei bem ao certo quando eu deixei de tomar o licor do copo; o gargalo da garrafa estava mais atrativo, e logo arranjei uma companhia.
  — Tia, você pediu para a mamãe? — Brian sentou um tanto sonolento ao meu lado.
  — Não pedi, não. Me desculpe, meu amor. — minhas palavras saíram arrastadas em decorrência de todo o álcool. Ele fez um bico enorme e uma cara de choro. — Mas não chora. Vem cá no colo da tia.
  Me sentei no chão, com as costas para o sofá e o coloquei no meu colo, deixando um pouco de lado a garrafa de licor já quase no final.
  — Pode escolher o presente que você quer abrir. A tia deixa!
  — Sério, tia? — assenti e seu sorriso abriu quando ele se jogou nos meus braços. — Obrigado!
  Começamos a abrir os presentes. Vários brinquedos, uma fantasia de super-herói que, no meu estado, não sabia mais definir quem era. Ficamos um bom tempo desempacotando tudo, não tendo cuidado algum em deixar as embalagens organizadas. Quando ele abriu o último presente, ficou exatamente feliz. Era um rádio comunicador, igual aos que usam na polícia.
  — Esse foi o tio que me deu! — ele disse sorrindo e me entregando um para começarmos logo a brincar.
  Meus olhos estavam pesados e minha cabeça estava começando a ficar num borrão, mas não parei de brincar nem um segundo com Brian.
  — Tia... — senti as mãos pequenas e quentes do Brian no meu rosto. — Tia, acorda! Vamos brincar!
  — Vamos brincar de que agora? — abri levemente meus olhos e sorri para o pequeno, que estava paralisado e com os olhinhos arregalados em direção à porta.
  — Brian Murilo ! Eu não acredito que você abriu todos os seus presentes! — a voz da Kamille vibrava de tão alto que ela falou, fazendo minha cabeça começar a latejar.
  — Mas mamãe... — ele tentou protestar, mas o interrompi.
  — Não, meu amor, eu falo com a sua mãe... — sorri para ele e olhei novamente para ela. — Eu disse que ele podia abrir, a culpa é minha. Ele me pediu desde o momento em que entreguei o presente dele. — minha voz saia rouca e mais arrastada que antes.
  — Ah, droga! — ela murmurou e saiu da sala, voltando alguns segundos depois com um pálido. — Eu disse...
  — . — a voz dele saiu num sussurro exasperado e ele se abaixou na minha altura. — Você está com cheiro de licor.
  — Eu tomei licor, estranho seria se eu não estivesse. — disse petulante.
  — Brian, vem com a mamãe. — ela pediu e ele se levantou do meu colo. — Já passou da hora de você dormir, dá tchau para a tia .
  — Tchau, tia . — e deu dois beijinhos no meu rosto. — Dorme com os anjinhos. — acenei com a cabeça.
  — , por que você bebeu isso tudo? — perguntou assim que os dois se distanciaram.
  — Ih. — comecei a me levantar e me apoiar no sofá, à medida que tudo começava a girar. — Tchau, . Diz para a Kamille que o aniversário do Brian estava ótimo! — sorri de canto quando consegui levantar por completo e me manter reta.
  — Você não vai dirigir assim. Ainda sou um policial, e não posso deixar você fazer isso. — disse me segurando pelos braços.
  — Pode me multar, não me importo.
  — ... — ele me puxou pelo antebraço, me desequilibrando até bater no peitoral dele. — Eu deixo você em casa.
  — Não precisa, , mas que droga! — bufei tentando me livrar dos braços dele ao meu redor. Quando tudo apagou.

O Hospital - Outubro, 25

  Minha cabeça doía, meu corpo estava pesado, meus olhos se recusavam a abrir e o cheiro forte dos produtos de limpeza invadiam meus sentidos.
  ... — ouvi uma voz forte, ao longe, ficando mais próxima quando repetia meu nome. — . Acorda !
  Eu poderia fingir que estava sonhando, tendo um pesadelo ou que estava em um universo paralelo, mas era apenas a realidade atingindo meus olhos. estava segurando a minha mão, seus cabelos estavam desgrenhados e as olheiras estavam quase consumindo seu rosto.
  — Finalmente você acordou! — ele sorriu, mas ainda parecia muito cansado.
  Olhei para a janela e avistei os primeiros raios de sol nascendo. Ou se pondo? Eu não saberia dizer.
  — Por que estou num hospital? — minha voz saiu rouca, fazendo minha garganta arder.
  — Você desmaiou, lembra? No aniversário do Brian... Eu trouxe você até aqui.
  — Eu desmaiei? — sorri nervosa.
  — Sim, depois de beber uma garrafa inteira de licor e muitas outras de cerveja. Que diabos você estava pensando? — agora ele falava sério, ainda segurando minha mão.
  — Em nada. — mentira. — Estava apenas me divertindo. — mentira de novo. — Estou me sentindo muito bem. Obrigada. — quando vou parar de mentir? — Você sabe que horas eu vou poder ir embora?
  — Não, o médico disse que você tinha que ficar umas horas em observação. Você quase teve um coma alcoólico!
  — Bem... Acontece. — não conseguia olhar nos olhos dele. Estava coberta de vergonha.
  — Por que você bebeu daquele jeito, ?
  — As pessoas bebem, isso às vezes acontece.
  — Já tinha acontecido com você? — neguei. — , olha pra mim. — ele segurou meu queixo. — O que aconteceu? Você estava com tanto medo assim do mágico?
  — O quê? — minha voz saiu fina e meus olhos se arregalaram minimamente. — Claro que não, ! Não seja ridículo!
  — Bem, já que não quer me dizer, eu vou chamar a . Ela também está preocupada com você.
  — Estou aqui desde quando? — perguntei quando ele se levantou em direção à porta.
  — Pouco depois da uma da manhã. Você não se lembra de nada, não é? — ele sorriu, mas eu sabia que não achava graça nenhuma na situação. Neguei. — Amanhã eu passo na sua casa, ou hoje. Tudo bem? — assenti e ele deixou o quarto.
  Não muito tempo depois, minha melhor amiga entrou, e tivemos uma boa conversa, um tanto demorada e cheia de olhares desconfiados dela. Falei da briga com o Jeremy, o modo como ele estava distante, falei que iria deixar a House’s e trabalhar com o Greg, também disse o quanto morri de ciúmes do na festa do Brian e por isso tomei o maior porre da história. Ela ouviu cada palavra que eu disse sem emitir nenhum som, o que me assustou um pouco, pois ela não costumava ser muito paciente; vez ou outra franzia a testa ou os lábios, mas me esperou terminar. Quando ela resolveu abrir a boca, disse tudo que eu esperava que ela dissesse, embora não nas mesmas palavras, e um pouco mais estressada do que o normal. Ela brigou por eu não ter ligado antes, e por não ter procurado por ela nesse meio tempo, mas o maior sermão, até maior que o da minha mãe daria se soubesse na situação que estava, foi sobre ter bebido estupidamente por ciúmes. Nessa eu concordo com você, . Mas sempre que ela acabava seus sermões, nós nos abraçávamos e nos entendíamos e tudo ficava bem. Ela precisou ir para casa, mas disse que era para ligar se qualquer coisa acontecesse, e disse que o seria meu acompanhante.
  — Você não precisa ficar aqui, . — murmurei quando ele tentou sentar em uma posição confortável na cadeira de acompanhante.
  — Eu trouxe você, eu levo você para a sua casa. — ele levantou e colocou a cadeira bem próxima da cama, para que pudesse repousar a cabeça perto das minhas pernas. — O médico disse que você vai ser liberada antes das dez.
  — Que bom. Estou morrendo de fome. — sorri e ele também, mas de um jeito mais sonolento. — Você, claramente, está com sono, . Você pode ir dormir, eu fico aqui e depois pego um táxi até em casa.
  — Não, , quero me certificar de que você vai chegar na sua casa e me convidar para almoçar por dois motivos. Um: também estou morrendo de fome; e dois: precisamos conversar. Agora descanse mais um pouco.
  Não que eu não estivesse com o corpo e a mente cansados, eu estava. Mas depois dos motivos do , eu fiquei nervosa. Que diabos ele queria conversar? Será que eu falei alguma coisa enquanto estava desmaiada? Isso era possível? Eu achava que não, afinal, estava inconsciente, e tudo que saísse da minha boca deveria ser desconsiderado.
  Não sei ao certo quanto tempo havia se passado. estava ressonando baixinho, e eu não queria acordá-lo, mas sabia que a qualquer momento uma enfermeira apareceria.
  — ... — chamei-o baixinho. — , acorda.
  — O que foi, ? — ele perguntou ainda com os olhos fechados.
  — A enfermeira chega daqui a pouco, e meu soro acabou.
  — Então a deixe chegar.
  Não respondi. Ele estava sério e suas palavras saíam num tom rude, como se estivesse me repreendendo por alguma coisa. Não demorou muito para a enfermeira adentrar no quarto e retirar o acesso do meu braço, levando o recipiente do soro ao sair para chamar o médico em seguida, logo assinando a minha alta para que pudéssemos sair daquele hospital. Poucas palavras foram trocadas, entre o médico e e menos ainda comigo, mesmo quando deixamos o local na caminhonete dele, em direção à minha casa.
  — Você vai querer subir?
  — Sim, eu disse que estava com fome. — ele sorriu e desceu do carro.
  Passamos pela portaria do prédio cumprimentando brevemente um Blake aparentemente ocupado com o telefone, seguindo até a porta do elevador e tendo que esperar uns minutos até a sua descida, com alguns moradores que eu não falava muito. Subimos em silêncio até meu apartamento, quando o convidei para entrar. O apartamento estava arrumado e limpo, graças ao trabalho que fiz nele no dia anterior. Segui até meu quarto para trocar de roupa, mas no caminho até lá resolvi que deveria tomar um banho breve, murmurando um “Volto em cinco minutos” para o , que resolveu se sentar numa das banquetas do balcão da cozinha.
  Tratei logo de tirar minha roupa no caminho para o banheiro, estava com cheiro de hospital e com dor de cabeça, não me importando em manter o quarto arrumado. Adentrei nua no banheiro, na esperança de tomar um banho quente e relaxante, mesmo não podendo usufruir da banheira. Assim que as primeiras gotas da água morna caíram pelo meu corpo, senti meus músculos relaxando, e a dor na minha cabeça se dissipando. Já não querendo mais ser rápida no banho, fiquei parada, apenas deixando que a água quente fizesse o favor de me relaxar. Uma brisa gelada entrou no banheiro, um tempo depois, me arrepiando enquanto colocava um pouco de shampoo nas mãos, com a intenção de lavar meus cabelos, mas não dei atenção a ela. Estávamos chegando perto de dezembro, e logo menos as chuvas, e em seguida a neve, tomariam conta de Streetsville. Durante a massagem que fazia em meus cabelos, o frio começou a contrapor o clima quente e abafado que o banheiro tinha, então olhei em direção a porta do cômodo, e entre o vapor no vidro do box, reconheci uma silhueta masculina no batente da porta, e me encolhi, assustada, num dos cantos do boxe.
  — Eu só sei que você está aí, mas não posso ver nenhum detalhe... — ele disse num tom brincalhão e completou — Por isso não gosto de banhos quentes, esse vapor todo nos priva desse tipo de visão...
  — Você nem deveria estar aí me observando enquanto tomo banho.
  — Estava esperando que você me convidasse...
  — Não vou convidar você para tomar banho comigo! — minha voz saiu uma oitava mais alta.
  — Você que sabe. — sua imagem começou a sair do banheiro, mas parou e se voltou para mais perto do vidro. — Aliás, coloquei sua roupa na sua cama. Não fica bem sua calcinha ficar espalhada pelo chão do seu quarto...
  — Por que se deu ao trabalho? — minha voz soou irritada. Droga! Eu estou irritada. — Não poderia esperar um pouco na sala?
  — Achei que tivesse dormido, já que estava demorando tanto, resolvi dar uma olhada...
  — Bem, eu não estou, você já pode ir, .
  — Não. Nós ainda precisamos conversar.
  — E você quer fazer isso agora? — engoli em seco — Eu estou tomando banho.
  — Eu posso ver que está...
  — Por que você quer tanto conversar? Sai fora daqui e me espera fora desse cômodo! — gritei.
  — Como por que, ? Talvez seja pelo seu comportamento ontem... O que você acha?
  — , eu não devo nenhum tipo de explicação para você!
  — Eu quero saber como seu amigo, ! — agora nós dois estávamos gritando feito duas crianças. — Não é a minha amizade que você quer? Bem, estou tentando ser a porra do seu amigo!
  — Eu não obriguei você a tentar nada!
  Rapidamente a porta de vidro do boxe foi aberta, e o ar frio tomou conta do espaço, seguido por e toda a sua expressão de ódio. O verde dos seus olhos estava mais escuro e não desgrudava dos meus, como se estivessem conversando entre si.
  — Eu estou tentando porque não quero ter que me afastar de você mais uma vez. Você me pediu para eu não me afastar, se lembra? Eu estou tentando não me afastar de você e manter uma amizade saudável. Mas você, melhor do que ninguém, sabe que isso não vai dar muito certo.
  — Por que não? — minha voz estava mais baixa e trêmula.
  — ... — ele soltou o ar dos pulmões e desviou os olhos para o meu corpo, me fazendo estremecer e tentar me cobrir de alguma forma, como se estivesse notando, só agora, a minha falta de roupa.
  — ! — gritei e seus olhos voltaram aos meus. — Sai daqui!
  — Não, até você me dizer por que tomou um porre ontem. — cruzou os braços na frente do corpo.
  — Quem era aquela mulher?
  — Que mulher?
  — Aquela que estava pendurada em você ontem.
  — É por causa da Jenny que você bebeu? — ele sorriu. — Você está brincando, não é? — como não respondi, ele prosseguiu. — Agora eu posso dizer que eu não devo nenhuma explicação a você.
  — Estou perguntando como uma amiga, não é isso que nós somos? — perguntei com o maior nível de sarcasmo na voz.
  — Então, minha amiga, a Jenny é a minha ex-noiva. Feliz?
  Mas o quê? Como diabos ele tinha uma noiva?
  Aos poucos, minha expressão deixou o sarcasmo de lado e foi adotando um semblante triste. Eu gostava do e odiava imaginar que ele tinha alguém. Hipocrisia, eu sei.
  — Entendi.
  — ... — ele pareceu arrependido da escolha de palavras e andou até ficar quase encostado em mim, que ainda tentava me cobrir. — A Jenny é passado.
  — Entendi. Posso terminar de tomar meu banho agora? — ele olhou fundo nos meus olhos.
  — Por que você bebeu tanto ontem à noite?
  — Eu estava com ciúmes de ver você com a sua noiva. — disse soltando o ar que eu nem sabia que havia prendido, logo sendo surpreendida pelas mãos quentes do segurando o meu rosto. Ele estava sorrindo. Lindo! Não me deixando pensar, ele colou os lábios nos meus e começou um beijo casto, apenas um selinho calmo e lento, mas assim que meus braços tomaram um rumo próprio, passando pelo seu pescoço, ele entendeu que eu não queria nada casto. O beijo se tornou mais rápido e recheado de luxúria. Suas mãos começaram a passear pelo meu corpo e me apertar contra ele, me fazendo sentir a sua ereção contra a calça jeans. Descendo meus beijos pelo pescoço dele, comecei a desabotoar a camisa e empurrá-la para longe do seu corpo, conseguindo explorar cada centímetro de pele descoberta quando ela atingiu o chão molhado do boxe.
  — Você tem certeza disso? — ele soprou ao pé do meu ouvido, me fazendo reprimir um gemido e assentir com a cabeça.
  Ele mesmo desabotoou a calça e tirou os sapatos, enquanto eu o observava tirar peça por peça que nos separava. Os dois, nus e suados, num boxe de banheiro que voltava a ficar coberto de vapor. Fomos rápidos ao retomar os beijos e carícias. Minhas mãos revezavam entre a sua nuca e seu tronco, vez ou outra indo até abaixo, perto da linha da boxer, que já não estava mais em seu corpo; já as suas mãos seguravam meus cabelos e continuavam a me apertar na cintura, bunda, seios e contra ele, nos aproximando cada vez mais. Sua boca investia na minha e cada vez mais a temperatura aumentava. Suas mãos, que já seguravam minhas coxas, me impulsionaram para cima, automaticamente fazendo minhas pernas se fecharem ao seu redor, e senti-lo pressionando cada vez mais o meu sexo, e de vez me penetrando, fazendo-me soltar o ar num gemido baixo e rouco que entendeu como incentivo para continuar os movimentos de nossos corpos. Em seguida, ele começou a andar para fora do boxe em direção ao quarto e nos deitou na cama, movimentando-se de forma lenta e profunda.

Pós-sexo - Outubro, 25

  Estávamos deitados em minha cama, envoltos em lençóis meio úmidos, por causa do meu cabelo, e ele percorria os dedos em movimentos aleatórios pela minha coluna.
  — Me desculpe. — a voz dele estava baixa e soava como se estivesse com sono. — Não era a minha intenção deixá-la com ciúme.
  — Sério? — olhei para cima, procurando seus olhos, mas estavam fechados.
  — Talvez... Quando eu vi a Jenny ontem, eu não sabia o que ela estava fazendo na cidade, mas ela pediu para conversar e eu meio que aceitei. Depois, talvez, eu queria que você me visse com ela e ficasse com ciúmes.
  — Você é um idiota.
  — Eu sei, me desculpe.
  — Você disse que ela era a sua ex-noiva... Por que não casaram?
  — Um dia, quando eu ainda estava em treinamento na polícia, eu cheguei em casa mais cedo e peguei a Jenny na cama com outro cara.
  — Ouch!
  — Eu saí da casa e cancelamos o casamento... Depois ela sumiu com o cara, me disse que ele era um antigo namorado, cantor, que tinha feito uma música para ela e estava quase assinando contrato com uma gravadora.
  — E quem é esse cantor?
  — Ele não chegou a fazer sucesso. — ele sorriu e me apertou mais um pouco. — A Jenny tem essa coisa com querer ser famosa. Talvez, se ela não tivesse dormido com ele e nós tivéssemos casado, ainda assim não teria dado certo...
  — Você ainda gosta dela? — ele não respondeu. Merda. — Sabe, acho que você gosta, e isso explicaria o porquê de vocês estarem tão juntos ontem.
  — Ela me beijou, só isso, . — ele depositou um beijinho no topo da minha cabeça. — Eu não queria mudar assim de assunto, e muito menos mencionar esse cara, mas... E o seu namorado?
  — Nós não vamos dar certo.
  — O que aconteceu?
  — Vamos dizer que ele passa dos limites algumas vezes...
  — Passa de qual limite, ?
  — Ele é... Às vezes nós brigamos, e ele fica estranho. Eu não vou tolerar esse tipo de comportamento. Já aguentei tempo demais, dentro e fora da empresa, por isso não quero ter mais nada haver com ele, e estou deixando os dois para trás.
  — Você vai se demitir?
  — Um amigo me ofereceu um bom cargo na empresa dele, além dele estar precisando de uma mãozinha...
  — Entendi. Espero que tudo dê certo.
  — Vai dar.
  — Posso dormir com você? — dessa vez, quando procurei pelos seus olhos, eles estavam me encarando.
  — Você não estava com fome?
  — Podemos comer depois... — ele se abaixou, deixou nossos lábios encostados e fechou os olhos.
  — Boa noite. — disse, roçando nossos lábios a cada palavra proferida.
  — Ainda deve ser umas duas da tarde, mas boa noite. — me deu um selinho e sorriu.

  Meu corpo estava trêmulo e arrepiado. Frio. Eu me lembrava de todos os detalhes de horas mais cedo, mas tudo parecia um sonho do qual eu não gostaria de acordar e, por isso, não queria abrir os olhos, mas o frio estava forte e úmido, como se uma barragem tivesse sido rompida e a água estivesse sendo derramada pelos cantos. Abri os olhos e descobri que estava caindo um temporal, e a porta da sacada do quarto estava completamente aberta, fazendo com que o vento trouxesse a chuva para dentro e molhasse todo o ambiente, agora revolto, que antes era organizado.
  Corri para fechar a porta, quando notei que estava nua e sozinha no quarto. Das duas uma: ou eu tirei minhas roupas e transei com um fantasma do , ou ele tinha saído debaixo daquela chuva e me deixado sozinha. Depois de controlar o estrago da água pelo chão do cômodo, segui para o closet a fim de colocar qualquer roupa que pudesse me manter aquecida, visto que nenhum braço forte e quentinho estava presente. Voltando para a cama e ligando a televisão, notei um papel preso abaixo do travesseiro que ainda continha o cheiro do perfume dele.
  , o delegado acabou de ligar e precisei ir até a delegacia. Esses criminosos não me deixam mais em paz…
  .”

  Sabia que ele havia sorrido escrevendo aquele bilhete. Fiquei mais aliviada de saber que era trabalho, mesmo que em um domingo chuvoso, do que a maldita da ex-noiva Jenny. Só de pensar na possibilidade de cruzar com ela novamente meu rosto se retorcia, e um gosto amargo surgia na minha boca. Resolvi que meu domingo seria preguiçoso, afinal, no dia seguinte eu precisaria ir até Lancaster e pedir minha demissão ao RH da empresa, e quando o pedido chegasse às mãos de Jeremy, ele faria um escândalo. Precisava relaxar para o dia que viria, mas meu estômago reclamou da falta de alimento e tive que ir para a cozinha preparar algo para comer. A campainha tocou.
  — Já estou sabendo de tuuuudo! — Denise disse assim que abri a porta. E completou. — Sua mãe está querendo a sua cabeça!
  — Por quê?
  — A ligou para casa dela para conversar… não sei bem o quê. Mas quando a tia Carla desligou, disse que você tomou aquele porre e que vai sair do trabalho.
  — Ela não disse por que a ligou? — ela negou. — A é uma fofoqueira. Por Deus!
  — O que ela não contou foi o por quê do porre…
  — Alguns problemas... Podemos sair da porta? — ela assentiu e seguimos até a cozinha. — Vou deixar o emprego.
  — Assim, sem mais nem menos?
  — Não é sem mais nem menos, Den. Eu e o Jerry… não estava dando certo. — franzi os lábios.
  — Como assim não dá certo com o deus nórdico? — revirei os olhos.
  — Nós só somos incompatíveis.
  — Ele ou você tem outro? — desviei os olhos do dela e voltei a preparar o sanduíche. — Já entendi. É o ?
  — Você quer um sanduíche? — tentei mudar de assunto.
  — Meu Deus! É o ! — ela saltou do banquinho e correu para me abraçar. — Eu ganhei vinte pratas!
  — Como é?
  — Apostei vinte pratas com a que vocês iam ficar juntos. — ela sorriu e me soltou.
  — Acho mais do que certo eu ficar com metade.
  — Ah, cala essa boca, . — resmungou sorrindo.

  ’s POV – algumas horas antes.

  Finalmente eu e a estávamos nos entendendo, e que se dane o namorado, ou ex. Nem acreditei que ela não me expulsou por ter entrado no banho dela, fiquei impressionado de não ter apanhado e ter tido a melhor transa dos últimos tempos. Soou bem gay, mas foda-se! Não me importo mais com o que os outros falam faz muito tempo, e tudo que importava no momento era que estava deitado, meio dormindo, com ela abraçada ao meu torso. Mas como tudo que é bom dura pouco, ouvi meu celular tocando em algum lugar não muito longe de onde estava. Me desvencilhei dela e fui à procura do aparelho celular, recolhendo minhas roupas úmidas do chão do banheiro. O delegado não costumava me ligar num domingo de folga, apenas para casos isolados que fazíamos cobertura ao DP de Lancaster ou Ferguson.
  O caso era sério, e envolvia pessoas próximas a mim, mesmo ele não sabendo. Aceitei o caso.
  — O pessoal de Lancaster disse que ele tem passado mais tempo em Streetsville do que lá, você acha que ele seria besta de ficar numa cidade tão perto? Eu não acredito que o cara seja idiota a esse ponto. — o delegado resmunga.
  — Ele pode ter algum laranja* por aqui, não pode?
  — Sim, claro… Não tinha nem pensado nisso. Você pode vir? Vou reunir a equipe daqui e vamos terminar de montar o caso quando a de Lancaster chegar.
  Confirmei com o delegado e comecei a colocar minhas roupas ainda úmidas mesmo, passaria em casa e tomaria um banho. Eu sabia que o maldito acusado não tinha risco de fugir. Antes de sair, abri a porta da sacada e deixei um bilhete para que a não pensasse que eu simplesmente sumi.

  — Detetive Grissom, esse aqui é o Detetive . Confie em mim, confie nele. — o delegado nos apresentou. Nos conhecíamos há bastante tempo, mesmo antes de eu ter entrado para a força, e desde sempre ele queria que eu fizesse parte da inteligência.
  — O Voight sabe fazer uma apresentação. — Grissom murmurou assim que o delegado se afastou para conversar com Armani, chefe do DPL*. — Então, você leu esse caso? — assenti. — Não acredito que o cara esteja roubando do próprio pai…
  — Não duvido de nada do que ele faça.
  Fomos chamados para a reunião, e logo o chefe do DPL apresentou o caso. O suspeito trabalhava como presidente na empresa da família há alguns anos, e estava desviando quantidades relativamente baixas de dinheiro, fazendo com que a bola virasse uma montanha com o decorrer dos anos. Então, o dono da empresa, seu pai, notou que as contas não batiam, e resolveu deixar que a polícia investigasse. Uma apresentação em slide passava na sala de reunião, mostrando os dados da conta da empresa e dados da conta do sujeito e de vários outros laranjas.
  — Cara, aquele ali é o namorado da sua mulher, não é? — Dusset, um amigo de dentro do DPS*, cochichou próximo a mim, e assenti com a cabeça. — Você acha que ela pode estar envolvida?
  — Espero que não.
  Então, o próximo slide apareceu com a foto da carteira de motorista dele. Lia-se Jeremy House Junior em letras garrafais e vermelhas. O desgraçado estava roubando o próprio pai.



  (DPL é a sigla para Departamento de Polícia de Lancaster)
   (DPS é a sigla para Departamento de Polícia de Streetsville)
   (O termo “laranja” é usado para um agente intermediário que efetua, em seu nome, por ordem de terceiros, transações comerciais ou financeiras, ocultando a identidade do real agente ou beneficiário. Em alguns casos, o “laranja” tem ciência de que está sendo utilizado e é, inclusive, remunerado pela “prestação de serviços”. Em outros casos, pessoas inocentes, na maioria das vezes com pouca instrução e baixo poder aquisitivo, são utilizados como “laranjas”, sem saber (“emprestam” seu nome para cobrir contas, emitem procurações para abrir empresas de fachada, por exemplo). Documentos perdidos ou roubados são também instrumentos utilizados por criminosos para a criação de “laranjas”. – significado retirado do site do Banco do Brasil.)

O Suspeito – Outubro, 26

  Ainda estávamos na delegacia, com a cafeína explodindo pelas nossas veias depois de tantos copos de café preto, na intenção de nos deixar acordados esperando a resposta do Juiz enquanto as provas eram avaliadas para que o mandado fosse expedido e eles pudessem recolher os computadores de Jeremy para averiguação.
  Todo o processo ainda estava correndo em sigilo, já que a família tinha um grande poder aquisitivo e muitos conhecidos importantes dentro dos departamentos da polícia de todo o Estado.
  — Você deveria ir tentar dormir um pouco. — Dusset sugeriu assim que adentrei a sala de reunião com mais um copo de café em mãos. Neguei. — Não é certo que o juiz vá liberar esse mandado de buscas hoje. Ontem foi sua folga e você trabalhou, o Voight vai te liberar, .
  — Ele tem que liberar essa droga de papel que permite a nossa entrada na casa daquele imbecil. Ainda hoje.
  — , visita para você. — uma voz anunciou da porta e me dirigi até a entrada do prédio.
  — Pensei que você tivesse morrido! — estava jogando os braços ao redor do meu pescoço e chegando bem perto para me beijar.
  — Meu celular descarregou.
  — Está tudo bem? — só assenti com a cabeça e ela se retraiu. – Bem, eu ia te chamar para jantar, mas vejo que você está ocupado.
  — , desculpa. Só estou muito cansado. — passei um de meus braços ao redor de sua cintura e a senti relaxar. Beijei seu cabelo. — Posso passar na sua casa mais tarde?
  — Claro. Quer que eu prepare uma lasanha? — ela sorriu e não pude me conter, sorrindo junto com ela. — Bem, como você está no modo calado, vou aceitar isso como um sim.
  — Uma lasanha vai ser ótimo, . — Dusset apareceu na porta do prédio e acenou com a cabeça na minha direção. — Espere uns cinco minutos, e podemos ir juntos.
  Separei-me dela e caminhei até onde Dusset me esperava, com péssimas notícias. Nos poucos minutos em que estava fora da sala de reunião, Voight recebeu uma mensagem do Juiz, pedindo desculpas e dizendo que não teria tempo naquela segunda e expediria o mandado na terça-feira pela manhã, e por isso todos estávamos dispensados até às oito horas do dia seguinte.
  Antes de chegarmos a casa dela, passamos na minha, onde tomei um banho e troquei de roupa. Ainda eram três e quarenta da tarde, e eu não havia comido nada mais do que uns donuts.
  — Você não acha que seria melhor ir a um restaurante? — perguntei assim que ela voltou para a sala de seu apartamento.
  — Você não quer lasanha? — neguei. — Ah...
  — Estou morto de fome. Só comi uns doces e me enchi de café.
  — Tem um restaurante no final da rua, sempre vou lá com a .
  — Parece ótimo! — sorri sem mostrar os dentes.
  A verdade é que eu não estava tão feliz assim. O ex, ou ainda atual, namorado dela estava encabeçando um esquema complexo demais sobre desvio e lavagem de dinheiro. Dinheiro esse que, com certeza, seria dele quando o pai falecesse. Jeremy era conhecido na mídia, desde cedo. O sobrenome House era da família pioneira em arquitetura no estado de Ontário, e desde sempre eles estavam envoltos em eventos caríssimos e amizades influentes, nunca deixando de exibir o império e fortuna que conquistaram.
  O que não entrava de forma clara na minha cabeça era o porquê de ele roubar do próprio pai. E saber se a fazia parte do esquema. Em todas as folhas do caso, seu nome não foi citado, nem como mandante, nem como laranja, mas isso não quer dizer que ela não tenha participação. O que muitos não sabem é que, se você tem conhecimento sobre um crime desse nível, você acaba sendo cúmplice. Meu medo era a ser cúmplice do chefe.
  Provavelmente, quando Voight descobrisse que eu tinha algum tipo de relacionamento com ela, seria retirado do caso. A polícia sabia que a se relacionava com ele, só não sabia que ela estava comigo agora. Ao menos era o que eu esperava.
  — , que diabos você tem? — ela perguntou estalando os dedos na minha frente. — Estou tentando conversar com você desde que deixamos o restaurante.
  — Desculpe. Um caso bem complicado foi aberto e precisamos nos concentrar para ele ter solução mais rapidamente. — ela fez um bico adorável e voltou a olhar para a televisão da sua sala de estar. — , me desculpe. Sou todo ouvidos.
  — Fui até Lancaster hoje e pedi minha demissão… também fui visitar o Greg e meus pais. Minha mãe quase arrancou a minha cabeça fora. — ela sorriu, lembrando-se de alguma coisa.
  — Ainda por causa do porre?
  — Sim. A não tinha nada que ter falado sobre isso com a minha mãe!
  — Ela estava preocupada com você, deixe de ser cabeça dura.
  — Você acredita que a minha mãe ficou possessa por eu ter deixado a empresa? Disse que quer netos. — ela revirou os olhos bufando.
  — E o que uma coisa tem a ver com a outra?
  — Ahn. O Jeremy. Ela gostava dele.
  — Podemos providenciar isso, se você quiser… e aí a sua mãe vai gostar de mim. — sorri. Seria muito bom ter filhos com ela.
  — Vo-vo.. você está falando sério? — saiu do meu abraço e sentou no outro extremo do sofá. —
  — ...
  — Eu não acho que seja uma boa hora para filhos. Quer dizer… nós estamos juntos há pouco tempo, você trabalha na polícia e não teria muito tempo.
  — Mas você quer, não quer?
  A campainha tocou. Salva pelo gongo, . Jantamos em silêncio e depois decidi que não dormiria lá, mesmo que ela tenha insistido muito nisso. Seria melhor assim, e não precisaria acordá-la tão cedo.

Antecedentes Criminais – Outubro, 27

  — Bem… — Voight passou as mãos pelos cabelos grisalhos e bufou. — Aparentemente o filhinho de papai cometeu mais delitos do que imaginávamos. O imbecil do pai dele usou o prestigiado nome para livrar a cara do…
  — O que o Delegado Voight quer dizer — Grissom, um detetive de Lancaster, o interrompeu — é que o sr. Jeremy House Junior possui antecedentes. Passagens por posse de drogas, detenção por dirigir embriagado e estelionato.
  — E por que esse idiota não ficou ao menos listado? — alguém atrás de nós quis saber. Eu sabia que o cara não prestava, só não sabia que teria mais delitos.
  — O dinheiro consegue comprar muitas pessoas… — disse por alto, fazendo alguns olhares se voltarem para mim. — Qual é, não vamos ver se ele ainda está cometendo esses outros crimes?
  — A ordem judicial chegará em algum tempo, porque precisamos pedir que acrescentem a busca na casa toda, e então poderemos seguir até a capital.
  — E por que a equipe de Streetsville está no caso? — a mesma pessoa perguntou.
  — Ele tem uma namorada aqui. Queremos saber se ela está ligada a alguma coisa.
  Me retirei da sala enquanto eles ainda estavam fazendo os últimos ajustes para a viagem até Lancaster. Precisava ligar para a e tirar algumas dúvidas. Só chamava.
  — Vamos logo, .
— Dusset chamou, mas fui parado pelo delegado.
  Fui chamado para a sala do delegado com o detetive-chefe de Lancaster, Armani. Eles pediram privacidade e uma longa conversa foi iniciada. Primeiramente, eles perguntaram qual era a minha relação com Ferris-. Não poderia simplesmente mentir. Disse que nós éramos amigos.
  — Com benefícios? — Armani perguntou em certo momento, fazendo com que eu e Voight nos entreolhássemos. Nós éramos amigos, contava tudo para ele, inclusive sobre . Ele sabia que entre a e eu havia alguns benefícios. Ele também sabia que eu estava de saco cheio de estar nesse caso, mas não gostaria de ser deixado de lado por estar envolvido com uma possível testemunha. Voight e meu pai eram amigos de longa data, por isso fui tratado como um filho por ele, principalmente quando Alan foi assassinado por ter um pai policial. Voight ficou preocupado comigo e pediu que eu fosse passar uma temporada em Lancaster, até as investigações de uma gangue acabarem.
  — Isso é relevante em algum momento? — Voight não esperou uma resposta de Armani. — participará deste e de todos os casos que eu quiser. Podemos ir ou você ainda tem questionamento?
  Armani saiu bufando da sala, e agradeci a confiança de Voight, recebendo apenas um aceno de cabeça.

  Chegamos à casa de Jeremy cerca de uma hora mais tarde, e havia um sedan preto parado na porta. Não era possível! No mesmo momento meu celular tocou. Era ela.
  — O que você quer?
  — , o que foi? — a voz dela parecia magoada, mas não estava dando a mínima. Ela estava na casa do cara. — Você me ligou mais cedo.
  — Precisava de algumas respostas, mas estou recebendo-as nesse momento.
  — Do que você está falando?
  — O que você está fazendo na casa do Jeremy?
  — Ele me… — ela pausou por alguns segundos e continuou — Como sabe que estou aqui? Você não está me seguindo, não é? Porque isso seria ridículo!
  — É claro que não estou seguindo você! Nos vemos em alguns segundos. — desliguei, sabendo que em alguns minutos nós nos encontraríamos com ou sem o consentimento dela.
  A busca foi iniciada sem problemas. Voight, Armani e Grissom bateram na porta como se estivessem indo visitar velhos amigos, e o desgraçado apareceu apenas com a calça do moletom na porta. Não quiseram esperar as palavras dele e entregaram a ordem judicial, já adentrando a casa. Entrei em seguida, encontrando com os olhos arregalados e uma mochila em mãos. Senti que ela começaria a me perguntar as coisas, mas a olhei transmitindo que não era hora para isso, estava ali a trabalho, e não havia nada que ela pudesse fazer para me impedir. As buscas continuaram por mais uma hora e meia, achando maconha, em pouca quantidade, alguns cartões com nomes desconhecidos e malotes de dinheiro. Cada vez que os pertences achados eram trazidos até a sala, abria a boca e olhava com raiva para mim e depois para o Jeremy. Raiva de mim? Sério? Meus olhos rolaram só de pensar. E, para fechar com chave de ouro a nossa busca, achamos uma Glock G42*. Terminando a busca e a apreensão dos computadores e os objetos, Jeremy foi algemado e levado para a viatura. estava paralisada no sofá, branca como um fantasma e sendo levada para a outra viatura, com uma policial de Lancaster.



  (Uma Glock G42, de acordo com o site 1911armasdefogo.com, é uma pistola super compacta chamada de pocket gun, ou arma de bolso, mas que conserva seu sistema Safe Action, mesmo no modelo mais compacto da linha.)


  Fim ’s POV.

Delegacia – Outubro, 27

  Fazia cerca de quinze minutos que eu estava numa sala, sendo interrogada, depois de presenciar uma apreensão policial na casa do meu ex-namorado. Quão bom isso pode ser? A policial feminina, que pediu gentilmente que eu a chamasse de Kate, fazia as perguntas de forma calma e lenta, e eu não sabia por que diabos estava ali!
  — Você se lembra o dia exato em que conheceu o senhor House? — ela perguntou mais uma vez.
  — Kate… — suspirei. Ainda estava incerta quanto a chamá-la pelo nome. — Conheço o Jeremy há pelo menos três anos, quando ele me ofereceu um emprego na empresa do pai dele, o senhor Jeremy, e que o Jeremy… Jerry, o Junior… o filho, presidia.
  — Quando ele lhe ofereceu a vaga, vocês já tinham algum tipo de relacionamento? — neguei. — Vocês começaram a se relacionar em que período?
  — Há dois anos, mas só começamos a namorar alguns meses atrás, e nós não estamos mais juntos.
  De repente, um barulho foi escutado, e a porta foi aberta com pressa. estava mais uma vez parado a minha frente, com cara de quem queria matar um e um copo de café na mão.
  — Podem continuar. — ele disse simplesmente e sentou-se na ponta da mesa, me olhando de lado.
  — . Agora não. — Kate disse com propriedade, mas não se mexeu um centímetro do seu corpo. Ela revirou os olhos, soltou o ar e esfregou as têmporas. — Você se importa se ele ficar enquanto presta depoimento?
  — Eu deveria? — perguntei irritada. O cretino estava distante há dias, com certeza por causa desse caso, e não havia me falado nada. Kate negou com a cabeça. — Então o detetive pode ficar.
  Não ousei olhar para ele enquanto estava sendo interrogada. Nem mesmo quando as perguntas eram sobre a minha intimidade com o Jeremy, ou se eu sabia dos antecedentes dele, dos cartões, da arma e da droga. Neguei tudo, o que era verdade em parte, pois sabia que Jeremy usava alguma droga, mas ele nunca havia feito isso perto de mim; ele sabia que eu não gostava de me envolver com isso, e ele respeitava. No final das contas, eu estava mais do que assustada ao saber que ele havia sido preso outras vezes, e estava tentando dar um golpe no próprio pai. Kate deixou a sala meia hora depois, dando a desculpa de que precisava conversar brevemente com o delegado e depois traria um café para mim.
   ainda estava sentado e me olhando incessantemente, vez ou outra tomando seu café, até que decidi olhá-lo, e seus olhos estavam vermelhos. Deveria ser resultado de tanta cafeína ingerida.
  — Você não chamou um advogado até agora? Impressionante, senhorita . — deu um sorriso recheado de sarcasmo.
  — Diferentemente do que você está pensando, eu não tenho nada a ver com a merda em que o Jeremy se envolveu.
  — Você está mesmo confiante.
  — O que foi, ? Você nunca se envolveu com alguém que não sabe seguir as regras?
  — Não. — mais um gole. Esse café não vai acabar nunca? Ele completou baixinho: — Até me envolver com você.
  — Você não disse isso! — meu queixo caiu. Quão idiota os homens podem ser? Me levantei e andei até a ponta da mesa em que ele estava, peguei seu copo, ainda com metade do líquido quente, e joguei na sua cabeça. — Jamais ouse achar que eu tenho algo a ver com isso! Você é idiota ou quê? — minha voz estava alta e clara. Eu estava ardendo de raiva, e sentia meu rosto esquentado. — É claro que eu não tenho nada a ver com essa coisa toda! Por que eu teria? Você acha que eu quero o dinheiro dele? Bem, você está muito enganado!
  Dei as costas para ele e me dirigi ao espelho que tem em salas como essa, bati e gritei a plenos pulmões que eu não o queria ali dentro. Menos de um minuto depois, Kate retornou com um homem mais velho, fazendo deixar a sala bufando. Ao menos ele não gritou de volta. Estava com tanta raiva que queria chorar, mas não ia me permitir isso, não sabendo que ele estava no corredor, me esperando sair.
  — Escute bem, mocinha… — o homem começou a falar. Ele tinha a voz baixa e rouca que conseguiu me arrepiar até o ultimo fio de cabelo.
  — Voight… —a detetive tentou intervir, mas ele não deu ouvidos e prosseguiu:
  — Se você tiver um problema com o meu detetive, você terá um problema feio!
  — Você foi liberada, mas nós pedimos para que você não deixe a cidade… — Kate começou a falar, depois de ter limpado a garganta para quebrar o clima.
  — Mas eu moro em Streetsville, você deveria saber disso, não?
  — Você não tem nenhum lugar para ficar em Lancaster? — ela perguntou gentilmente, e não quis tratá-la com ignorância. Assenti. — Em nome do departamento de polícia de Lancaster, pedimos desculpas pelo incômodo, mas talvez precisemos que você volte, e por isso gostaríamos que a senhorita ficasse na cidade.
  — Tudo bem. — me dirigi a porta, mas me lembrei de algo muito importante. — Ah… O meu carro?
  — Ele ainda está do jeito que a senhorita deixou, na casa do senhor Jeremy Junior. Você… Ah… — ela sorriu se desculpando e ofereceu — O detetive disse que levaria a senhorita para a casa de seus pais.
  — Nem por cima do meu cadáver! — bufei e saí batendo a porta em direção à saída da delegacia. Já havia alguns repórteres por ali, mas me escondi atrás de um par de óculos escuros, à procura de um táxi.
  Caminhei até a esquina da rua, quando senti um forte cheiro de café e mãos segurando meu braço esquerdo. Eu quis rir pela cena, mas me contive, ainda estava com raiva dele.
  — Eu disse que levaria você até a casa dos seus pais, então, eu vou levar você até lá.
  — Você não vai me obrigar a porra nenhuma. Você perdeu qualquer direito sobre mim e qualquer chance que eu daria a você quando achou que eu estava envolvida nas falcatruas dele.
  — , agora eu sei que você não tem nada a ver com as merdas dele…
  — Agora você acredita em mim? Agora, ? — sorri sem mostrar os dentes. — Foda-se o seu agora! Me deixa em paz e me esquece!
  — Eu não quero saber se você está puta de raiva comigo. Eu vou te levar embora daqui. — ele mal terminou de falar e foi me puxando pelos pulsos até uma viatura do outro lado da rua.
  — , já chega! — pedi um pouco mais baixo, já sentindo um nó se formar em minha garganta e lágrimas em meus olhos.
  Ele pediu que eu entrasse na viatura, e não demorei a fazer isso, já que estava cansada, com dor de cabeça e quase chorando no meio da rua. Passei o endereço da casa dos meus pais e ele começou o percurso. Estávamos calados demais, e o silêncio não era nem um pouco confortante.
  — … — ele começou, não sabendo o que dizer. — Me desculpe. Estou falando sério.
  — Só… só deixa isso pra lá, . — pedi com a voz embargada, sentindo as primeiras lágrimas caindo, enxugando-as rapidamente.
  — , não chora. — ele parou o carro no acostamento e repousou a mão direita em minha coxa, apertando vez ou outra — Por favor. Eu sei que errei ao desconfiar de você… Eu fiquei possesso com o que aquele imbecil fez e… eu descontei em você.
  — Você não deveria ter me escondido uma coisa como essa. — olhei para ele pela primeira vez, ainda com resquícios de café, e mais algumas lágrimas desceram pelo meu rosto, fazendo com que ele as enxugasse com os dedos. — Ele tinha uma arma na casa dele, !
  — Ele não faria nada contra você.
  — Como você tem tanta certeza? — peguei suas mãos e segurei em meu colo, apertando-as na esperança de extravasar o que estava sentindo. — Ele me ligou transtornado…
  — Por que você não me disse nada?
  — Porque você desligou na porra da minha cara quando eu ia tentar falar alguma coisa! — funguei e ele apertou minhas mãos. — Se você não puder atender, não atenda.
  — Desculpe.
  Com a mão livre, ele ligou o carro, beijou minha mão e voltou a dirigir. Não demoramos muito, apenas alguns semáforos vermelhos e congestionamentos normais do horário. Chegando em casa, meus pais estavam terminando de almoçar. Quando minha mãe viu coberto de café, obrigou-o a entrar, tomar um banho e aceitar uma camisa do meu pai.
  — Aqui, você pode tomar banho no banheiro da ! — meu pai disse sorridente, entregando uma toalha e uma camisa para ele enquanto adentravam meu antigo quarto, em direção ao banheiro da suíte.
  Permaneci sentada no sofá da sala, tentando explicar para minha mãe sobre tudo que estava acontecendo.
  — Mas… o Jeremy não parecia ser uma pessoa má. — ela disse coçando o queixo.
  — Eu também não achava, mãe, até ver a polícia entrando e começando a revirar as coisas e colocar tudo bem na minha frente! — ouvimos meu pai sorrindo ao voltar para a sala.
  — Esse que é o seu policial? — ele perguntou, fazendo minha mãe franzir o cenho e eu revirar os olhos. — Ele é engraçado e me disse que você que jogou o café nele.
  — E por acaso ele disse o porquê de eu jogar? — ele negou sorrindo. — Ele achava que eu estava ajudando o Jeremy a desviar dinheiro da empresa.
  — Ah. — seu sorriso se fechou e ele olhou para a porta fechada do quarto. — Talvez vocês só precisem conversar. Certo, Carla? — ele semicerrou os olhos para mamãe, que pigarreou.
  — Claro. — ela levantou de súbito do sofá. — Precisamos ir ao mercado. Comportem-se! — disse sorrindo.
  — Pai, você é o único que me deixaria sozinha numa casa com um homem nu.
  — Já tivemos uma conversa sobre isso quando você era mais nova… E o spray de pimenta ainda está na primeira gaveta ao lado da sua cama. — ele sorriu e beijou o topo da minha cabeça. — Se cuide! Ainda sou muito novo para ser avô. — brincou.
  — Nada disso! — minha mãe falou bem mais alto. — Eu não quero ser uma avó que não consegue brincar com o próprio neto. Trate de me arranjar ao menos um!
  — Mãe, você é única! — sorri quando ela veio me abraçar e se despedir.
  Aproveitei o silêncio da casa e deitei-me no sofá, fechando os olhos e tentando ter qualquer mínimo de descanso antes do sair do banheiro. Minha cabeça ainda latejava, e resolvi que não conseguiria descansar sem antes tomar um remédio. Busquei um Advil no armário da cozinha e, quando voltei à sala, o estava sentado no sofá, com o cabelo ainda molhado e a camisa de alce que havia comprador para meu pai.
  — Bela camisa. — brinquei ao me sentar na poltrona ao lado do sofá em que ele estava.
  — Puxa, obrigado. — nós sorrimos e recostei minha cabeça no móvel. — Posso tirar uma dúvida com você? — assenti ainda com os olhos fechados. — Por que você foi à casa dele?
  — Ah… — agora você tem a minha atenção! — Ele me ligou, pedindo que eu levasse as coisas dele que estavam na minha casa.
  — Você tem certeza que é só por isso?
  — Sim, mas eu acho que você poderia ter me falado sobre as coisas que estavam acontecendo e talvez eu não tivesse ido.
  — Você acha?
  Ele estava com ciúmes? Sério?
  — Apesar de estar chocada com o que tive que presenciar hoje, o Jeremy é meu amigo. Na hora eu fiquei apavorada… só preciso de um tempinho para associar as coisas.
  — Isso quer dizer que você vai voltar a vê-lo?
  — Eventualmente…
  — , eu não quero você perto dele. — disse com propriedade, mas senti vontade de sorrir.
  — … — suspirei. — Isso é errado. Você falar com quem eu posso ou não ter algum tipo de relacionamento.
  — Você ainda gosta dele? — dei de ombros e ele arregalou os olhos, ficando com uma expressão engraçada.
  Caí na gargalhada. Tinha como ele ficar com mais ciúmes? Ele me olhou inexpressivo e levantou, indo em direção à porta e saindo. Meus olhos se arregalaram para a porta fechada e senti meu queixo caindo aos poucos. Ok, agora eu sei onde errei.

Reconciliação – Outubro, 30

’s POV. – três dias depois.

  Fazia exatamente trinta e seis horas que havia deixado a casa dos pais da . Eram três e vinte e dois da tarde, e minha irmã havia invadido a minha casa.
  — , deixa de ser idiota, pelo amor de Deus! — ela bufou e meu sobrinho gargalhou. — Brian Murilo, você que não ouse repetir o que eu acabei de dizer!
  — Você não pode deixar o menino em contradição… ele ouve você falando, vai querer falar também.
  — Não mude de assunto, senhor! — ela apontou o dedo em riste na minha direção. — Que idiota você é por ter deixado a assim, do nada, enquanto a vida dela tá de cabeça para baixo!
  — A vida do ex-namorado dela está, não vejo que dificuldade ela esteja passando. — Kamille bufou e revirou os olhos.
  — , ela acabou de sair do emprego, o ex-namorado e ainda amigo foi preso por mil e um motivos, o futuro namorado deixou ela plantada sozinha, e ela acabou de vender o apartamento para comprar uma casa. Uma casa de família! É óbvio que a garota está passando por problemas!
  — Quem disse que ela vendeu o apartamento? — ela revirou os olhos, como se fosse a pergunta mais besta que eu já fiz na vida — Foi a ?
  — Também. — como assim “também”, Kamille? — Encontrei com a no mercado, ela comprou uma casa na rua atrás da minha… Ela disse que depois que o DPL a liberou para sair da cidade, ela estava com o cérebro fervilhando para se mudar e mudar de vida. Aí eu perguntei “mudar como?”, e ela disse que brigou com a mãe, mas admitiu que a mãe estava certa e resolveu dar um jeito na vida, você sabe, essa coisa de achar o cara certo, casar, ter filhos… ela disse que pensou em voltar a morar em Lancaster.
  — Ela não pode ter feito tudo isso em três dias. — minha irmã deu de ombros.
  — Bem, nós ficamos umas duas horas conversando e não parecia estar mentindo. Aliás, ainda acho que ela está atrás de você, mas como você está enfurnado dentro dessa casa…
  — Por que ela estaria me procurando? — pense, seu babaca.
  — Isso você vai ter que perguntar a ela. Eu preciso ir, o Brian tem aula de futebol.
  — Amanhã passo por lá para falar com o papai, peça para ele não se preocupar comigo. — minha irmã revirou os olhos — O quê?
  — Vocês, homens… são tão inocentes. — ela sorriu e chamou meu sobrinho par ir para sua aula de futebol. Ele me deu um beijo na bochecha, mas não deixou de perguntar:
  — Cadê a tia , tio ? — eu e minha irmã nos entreolhamos.
  — Eu não sei, Brian.
  — Ah, poxa! Ela me prometeu um passeio no meu aniversário…
  — Tchau, . — e assim fiquei sozinho.
  Então ela estava me procurando? Bem, ela sabia onde eu morava. Por que não apareceu? O que ela queria? Achei que estávamos mais do que resolvidos. Ela ainda gostava do chefe, ao menos foi isso que a sua risada transmitiu para mim naquele dia, na casa dos pais dela, em Lancaster.
  Se ela estava mesmo me procurando, daria uma chance para isso. Aproveitaria a noite no pub do Irlandês, e se ela não aparecesse… que se dane também. Cansei desse chove e não molha entre nós.

  Estava me olhando no espelho do banheiro. Sim, sou bem idiota. Estava com minhas roupas de praxe: calça jeans, tênis, camiseta branca e uma camisa quadriculada de mangas por cima. Não me dei o trabalho de tirar a barba, já crescida, a não estava merecendo essa mordomia.
  Saí de casa por volta das oito da noite, já que morava, literalmente, ao lado do pub.
  Ok, , você terá duas horas.
  Primeira rodada de chopp.
  Segunda rodada de chopp. Os caras do DPS chegaram.
  Terceira rodada de chopp, acompanhado dos policiais da cidade e algumas mulheres que conhecemos por lá. Jenny aparece.
  — O que está fazendo aqui, Jenny?
  — Precisava sair um pouco, aproveitei que hoje não choveu. — ela deu de ombros.
  Depois de muito tempo conversando e bebendo com o pessoal da delegacia, as mulheres e Jenny, não estava tão sóbrio e, por isso, não parava de olhar para a entrada do bar.
  — A sua garota não vem, , desista! — Dusset gritou. Ele era o mais alterado de todos.
  — Acho que você está certo. — sorri, tentando encobrir meu desapontamento.
  As duas horas que eu disse que esperaria já haviam passado há muito, e Jenny estava se aproveitando do meu estado; quando ela está perto demais, o sino da porta toca, com uma pálida me encarando. Droga! Não é o melhor momento. Estou bêbado, com várias mulheres à minha volta e minha ex-noiva pendurada no meu pescoço.
   passa direto pela mesa em que estamos e segue para o balcão. Ela pede alguma coisa para beber, e quando o Irlandês coloca uma dose de uísque em sua frente, sei que a coisa não está boa. Levanto cambaleando e sob os protestos de Jenny. Me sento ao seu lado no balcão.
  — Não se dê ao trabalho de deixar sua ex-noiva esperando… — ela toma a dose e respira fundo. Não quer olhar em meus olhos.
  — Oi! — estou bêbado para formar alguma coisa melhor. — Tudo bem? — ela dá de ombros. — Kamille disse que você esteve me procurando. Vim aqui na esperança de você me encontrar. — ela me olha boquiaberta e com os olhos vermelhos. — Droga, ! — sussurro e ela se dirige para fora do bar. Deixo uma nota de dez dólares no balcão e a sigo. Quando chego à frente do pub, ela está encolhida, tentando se proteger da chuva. Que horas a chuva começou? Agarro seu pulso e a puxo até a minha casa. Já na sala, ela fica parada, olhando ao redor. Seus olhos continuam vermelhos.
  — Você quer sentar? — pergunto. Não sei como agir quando ela está chorando.
  — Por que você estava com ela? — ela muda de assunto e dou de ombros. — Você parece seguir em frente muito rápido.
  — Eu não estava seguindo em frente. A Jenny é minha ex, então seria dar um passo para trás. — tento brincar, mas acabo percebendo tarde demais que não é hora para isso. — … não chora!
  — Você estava agarrado na puta da sua ex-noiva e quer que eu faça o quê? — ela está gritando. — Não sei como eu fui idiota o suficiente para escutar a Kamille!
  — O que a Kamille te disse?
  — A sua irmã me disse que você estava me esperando na droga daquele bar, porque ela havia conversado com você e você tinha aceitado falar comigo. — a Kamille poderia ter me avisado sobre isso., por que você estava com aquela mulher? Com todas aquelas mulheres? Nós não vamos mais tentar nada, é isso? — os olhos dela estavam brilhosos com tantas lágrimas não derramadas. Me aproximei o máximo que pude, abraçando-a.
  — Você está com ciúmes? — sussurrei na base do ouvido dela, que assentiu com a cabeça. — Eu só estava passando o tempo ali…
  — Isso quer dizer que você não tem nenhum tipo de sentimento por mim, seu idiota! — ela começou a estapear meus braços.
  — , eu não quero amar você se você não está disposta a tentar também. — soprei baixinho e ela se arrepiou.
  — Eu não preciso tentar. — ela estava sorrindo e chorando. Isso era bom de alguma forma, não é? Ela jogou os braços ao redor do meu pescoço e sussurrou. — Eu amo você.
  Apertei sua cintura e a puxei num abraço apertado. Seus lábios pressionaram os meus num início de beijo apressado e lento ao mesmo tempo. Nos guiei até a primeira parede da casa, e levei minha boca até seu pescoço, ouvindo um gemido fraco em resposta, que me impulsionou a fechar as mãos em torno da cintura dela.

Epílogo

  2 anos depois.

  Assim que entrei em casa, me senti aliviada por vê-lo ali. estava dormindo no sofá da sala como em muitos outros dias. Depois que foi promovido à Inteligência do 21° Distrito de Lancaster, ele estava trabalhando dobrado e, para que eu não ficasse muito tempo sozinha em casa, visitava meus pais ao menos duas vezes na semana.
  Nós dois agora trabalhávamos em Lancaster, e ele havia até sugerido que procurássemos uma casa por lá, deixando Streetsville para trás. De início, a ideia não me pareceu nada boa. Não queria deixar a nossa casa para trás. Nós dois tínhamos uma vida lá, e mesmo que fosse cansativo ter de ir e voltar à capital, eu poderia continuar fazendo o esforço. Mas, agora, vê-lo totalmente cansado ali no sofá me deixava com um sentimento de culpa por não ter aceitado a sua ideia. Ele era quem mais sofria com tudo isso, tendo até que dormir na delegacia em algumas vezes.
   — ... — o chamei baixinho. Estava abaixada na sua frente. — , vamos para o quarto. Vem. — afaguei seus cabelos. Já havia tomado banho e feito um breve lanche antes de lhe chamar.
  —- Deita aqui comigo. — ele pronunciou sem nem ao menos abrir os olhos.
  — Não, vamos para cama. Você deve estar muito cansado. — ele enfim abriu os olhos, sorrindo imediatamente ao me ver ali. Sorri de volta e ele se aproximou para deixar um beijo muito delicado nos meus lábios.

  — Estava com saudade de você. — havíamos acabado de usar sua última carga de energia e estávamos suados e abraçados na cama.
  — Não gosto quando você dorme fora de casa. — confidenciei e ele me apertou mais em seu abraço. Aquele assunto estava se tornando uma pedrinha no nosso sapato. — Não gosto que você passe tanto tempo trabalhando.
  — , nós já conversamos sobre isso... Você disse que não queria se mudar daqui.
  — E eu continuo não querendo. — suspirei e beijei a curvatura do seu pescoço. — Me desculpe por trazer isso sempre à tona, mas... eu odeio você longe de casa!
  — Me desculpe. — segurou meu queixo para que pudesse me beijar uma outra vez. — Sei que as coisas não têm sido fáceis nos últimos meses, que essa promoção acabou pedindo mais de mim do que eu realmente queria dar. Sei que isso tem posto o nosso relacionamento em um nível de estresse bem alto e as nossas brigas acabaram sendo constantes, mas você sabe que eu te amo, e que isso não vai mudar. — ele se afastou brevemente de mim para pegar algo na gaveta do criado-mudo. Olhou fundo em meus olhos e continuou: — , eu quero você em todos os momentos da minha vida. — abriu uma caixinha de veludo preto, de onde brilhava um lindo anel. — E eu espero muito que você diga sim!
  O momento que ele escolheu para fazer o pedido foi tão aleatório que eu fiquei sem reação. Meus olhos ficaram cheios de lágrimas não derramadas, e eu tremia da cabeça aos pés, mas não conseguia proferir uma palavra sequer. Sentei-me rapidamente na cama, sendo seguida por ele. Eu não sabia o que responder, e vi quando fechou o sorriso diante da minha demora.
  — Vo-v-você... Ah meu Deus! — minha voz estava saindo num sussurro. — Você tem certeza disso?
   ficou me olhando por segundos incontáveis e com uma expressão confusa até, por fim continuou:
  — Você não? — mais uma vez eu não soube o que responder, então apenas fiquei observando a aliança ainda na caixinha. Ele se levantou e rapidamente depositou o objeto de volta no móvel onde estava antes, vestiu-se tão rapidamente e saiu do quarto resmungando um sonoro “Incrível!”
  Ele não poderia me culpar por estar em choque. Poderia? Estava completamente sem reação quando ouvi a porta da cozinha batendo. Corri para me vestir com o pijama o mais rápido que pude, e fui atrás dele no quintal. Ele estava sentado no último degrau da escada que dava acesso da varanda para o gramado.
  — , eu... me desculpa. — ele fez um sinal com a mão de quem não queria conversar. — Por favor, entra. Aqui fora está um gelo.
  — Não estou com a mínima vontade de entrar em casa no momento. — disse tão friamente quanto o clima ali fora.
  — , por favor... — me abaixei atrás dele, não sabendo se tocava ou não em seu corpo. — Por favor.
  — O que eu não entendo é como você pôde simplesmente não dizer nada, ...
  — Eu estou em choque! Eu não esperava que você fosse me pedir em casamento agora, nesse momento!
  — Me desculpe por não ter dado um aviso prévio.
  — Eu não disse isso.
  — Eu realmente não quero falar com você agora. — se levantou e caminhou para a lateral da casa, onde o vi continuar andando pela rua para longe dali.

  Dois dias depois.

  — E eu aqui pensando que isso não aconteceria com você tão cedo... — disse pulando de um pé ao outro.
  — Cala essa boca! — bradei e me encolhi ainda mais no sofá. — O vai querer a minha cabeça quando souber!
  — , claro que não! Imagina que lindo um mini- correndo na sua casa!?
  — Você diz isso porque está bem casada e com uma princesinha linda sendo cuidada pelo seu marido!
  — Ei, foi você que não aceitou o pedido dele! — ela me repreendeu. — E faça o favor de falar baixo, porque a Heaven está dormindo sob os meus cuidados, não os do meu marido.
  — Pensei que o Derek estava em casa...
  — Plantão. — deu de ombros e sentou mais próximo de mim. — E então... O que vamos fazer?
  — Não sei. — respirei fundo — Acho que eu ainda não deveria falar sobre esse assunto com ele.
  — Por quê?
  — Ele está se mordendo de raiva de mim, você sabe... O pedido...
  — Ah! Aliás, por que não aceitou?
  — Eu fiquei confusa... Ele me pegou desprevenida.
  — Desprevenida? — ela sorriu — Se depois de dois anos com o mesmo cara você ficar confusa sobre o pedido de casamento dele... — deixou a frase inacabada.
  — , eu vim aqui esperando o seu apoio sentimental, porra! Eu acabei de fazer dois testes de gravidez e eles simplesmente deram positivo!
  — , relaxa, pelo amor de Deus! — ela puxou as minhas mãos e as segurou em seu colo. — Vocês moram juntos há o quê? Quase três anos? — assenti — Vocês têm empregos capazes de sustentar uma criança, se amam e terão meu total apoio nas primeiras horas!
  — Horas? — gargalhei — E eu aqui pensando que você me daria apoio por anos...
  — Quando seu filho estiver com dois anos e meio, você me entenderá.
  — Deus! Desisto de conversar com você! — sorrimos. — Amanhã nos vemos no aniversário do Brian?
  — Claro. Quero conhecer o namorado da Kamille!

  Eu e estávamos apenas conversando sobre as banalidades da vida quando me vi quase chorando com tamanha novidade. Não que fosse algo esperado, porque não era. Foi um tremendo choque quando as duas listras rosa apareceram nos testes de farmácia.
  Tudo começou no mês passado, quando não menstruei, o que já me deixou alarmada, mas acreditei ser por causa de todo o estresse que estava vivendo naquela semana de palestras que estava tendo. Logo esqueci daquilo tudo e continuei meu mês perfeitamente bem, até que na semana passada nada aconteceu – de novo –, e então me lembrei de quando a havia engravidado, e passei a me notar. Não estava tendo enjoos e nem passando mal, só a ausência do “período fértil”.
  Para não ficar com mais aquele nó no cérebro, corri até uma farmácia de Lancaster e comprei dois testes de gravidez. Não me contentaria com apenas uma resposta! Continuei com o meu dia de trabalho, mas sempre olhava com o canto dos olhos para a minha bolsa, sabendo muito bem o que estava guardado ali dentro.
  Quando finalmente cheguei em casa, meus olhos saltaram das órbitas no momento em que vi sentado no sofá. Perguntei o que ele estava fazendo em casa tão cedo, já que tinha marcado uma viagem de dois dias para um pequeno curso da polícia, e ele simplesmente disse que havia sido cancelado. O nervosismo pareceu aflorar dentro de mim e apenas assenti com a cabeça, indo direto tomar um banho. Quando já passava das duas da manhã, depois de tanto virar na cama, levantei e fui enfim realizar os testes.
  Me vi trancada no banheiro da nossa casa, com medo e alegria ao mesmo tempo. Andei de um lado para outro do cômodo, sentindo minhas mãos trêmulas e o choro preso na garganta, pensando em como aqueles cinco minutos estavam demorando tanto para passar.
  Quando finalmente meu celular apitou, indicando o tempo, minhas mãos pegaram os tubinhos e fechei meus olhos antes que pudesse, de fato, ver o resultado. Respirei fundo algumas vezes antes de ver as duas faixas cor-de-rosa estampadas nos dois testes. Positivo. Eu estava esperando um bebê. ia adorar a novidade, se não fosse pela nossa briga por causa do pedido de casamento.

  Me despedi de e voltei para casa. O recesso de fim de ano da empresa era a melhor coisa que poderia acontecer naquela época. Não estava com cabeça para lidar com tantas coisas importantes ao mesmo tempo. ainda estava chateado por eu não ter dito absolutamente nada sobre o pedido de casamento, e agora havia um bom motivo para que nós voltássemos a ser o que éramos, mas não sabia como abordar um assunto tão delicado.
  Ainda estava dentro do carro, parada na garagem de casa, quando tomei a decisão de ir até o hospital no qual Denise trabalhava. Não me importava de ter que ir e voltar até Lancaster para que ela ou Derek pudessem me ajudar. Precisava de um exame com cem por cento de verdade para que eu tivesse a coragem de contar ao . Sabia que ele estava em casa, provavelmente com Dusset e Voight, então estaria bem até que eu voltasse.
  Derek se surpreendeu quando me viu sentada na recepção do hospital, à sua espera. E sua cara de susto chegou ao máximo quando pedi que ele me indicasse algum médico ali que pudesse realizar um teste mais preciso.
  — Por que você não vai ao seu ginecologista? — ele perguntou assim que adentramos a ala obstétrica do hospital.
  — Ela está viajando, e eu não tinha planejado e nem conversado com ela sobre gravidez. Eu ia começar a tomar um novo remédio porque o antigo me deu uma reação alérgica, mas tudo isso só depois das festividades de final de ano.
  — O já sabe? — dessa vez ele me olhava sorrindo.
  — Não. — respondi, mas agora eu também tinha um sorriso idiota estampado no rosto.
  — Bem, a dr. Hills irá lhe atender em alguns minutos, e o resultado sairá em mais uns dez, mas eu já vou lhe dar os parabéns!
  — Muito obrigada, Derek! — o abracei e senti mais uma vez a garganta apertada com o choro preso.
  — Eu preciso ir, mas, se precisar de algo, não hesite em me ligar, tudo bem? — assenti e o vi saindo dali a passos rápidos, de volta aos consultórios.
  Fui a próxima da fila para ser atendida, e em menos de meia hora eu já estava recebendo vitaminas e vários folhetos sobre amamentação, cuidados e dicas sobre gestação. A dr. Hills havia sido muito simpática em todo o atendimento, me alertando sobre tudo o que eu poderia ter dúvida e explicando sobre datas.
  Ela havia previsto que eu estava com pouco mais de dois meses, ou sete semanas, expressão que ela mesma usou. Disse também que o bebê parecia muito bem, e que eu precisaria voltar nos próximos dias para fazer um primeiro ultrassom até que eu pudesse me consultar com a minha própria médica.
  Agradeci imensamente à senhora por todas as explicações, e mais uma vez quando ela me parabenizou. Agora estava dirigindo de volta para casa com um sorriso que não deixava o meu rosto de jeito nenhum.
  Não estava mais me importando com briga nenhuma com o , porque eu sabia que a minha notícia seria mais do que feliz para nós dois.
  Estacionei o carro e entrei em casa, vendo ele e outros colegas de trabalho assistindo a um jogo de futebol que passava na televisão. Ele olhou para trás e sorri quando nossos olhos se encontraram. Ele pareceu confuso, mas o chamei brevemente à cozinha.
  — O jogo ainda vai demorar? — ele negou com a cabeça e permanecia com o olhar confuso. — Quando o jogo acabar e seus amigos forem embora, nós podemos conversar?
  — Aconteceu alguma coisa? — agora seu olhar estava alarmado.
  — Sim. — vi seus olhos arregalando-se minimamente enquanto eu abria um sorriso.
  — Se você quiser eu falo para eles irem embora...
  — Não. Não faça isso! Quando acabar o jogo é melhor. — não me contive e o abracei, como há alguns dias eu não fazia, por não ter coragem. Ainda estávamos brigados, mesmo que só um pouco. — Eu amo muito você! — dei um beijinho em seus lábios e segui para o quarto, deixando-o totalmente sem reação.
  Deitei na cama e liguei a televisão, coloquei num dos muitos programas que eu gostava e me flagrei com as mãos protetoras sobre a barriga. Ri comigo mesma e sussurrei:
  — Você não sabe como a mamãe está nervosa em contar sobre você para o seu pai.
  Continuei com uma carícia bem de leve em meu ventre, sabendo muito bem que em breve ele ficaria maior. Terminado o programa e mais um início de filme, entrou no quarto, deitando a meu lado.
  — Então... o jogo acabou e todo mundo já foi embora. O que quer conversar?
  Fiquei observando no quanto ele ficava engraçado quando estava curioso, olhando para todos os lados e abrindo a boca vez ou outra, como se quisesse falar algo. Peguei sua mão e entrelacei nossos dedos.
  — Eu queria conversar sobre o que você me propôs... — ele semicerrou os olhos e murmurou. — Porque, se a proposta ainda estiver de pé, nós vamos precisar fazer alguns ajustes. — sorri ao ver que ele não estava entendendo nada.
  — Do que você está falando?
  — Hoje eu fui até Lancaster, até falei com o Derek, que me ajudou bastante... — ele murmurou mais uma vez para que eu continuasse. — Eu já sei disso há alguns dias, mas eu simplesmente não sabia como te falar uma coisa dessas. Eu fiquei que nem uma louca hoje depois de me encontrar com a doutora Hills.
  — , quem é doutora Hills?

  's P.O.V.

   estava falando um bocado de coisas sem sentido desde que havia chegado da casa da , e isso estava me deixando cada vez mais nervoso.
  — , quem é doutora Hills? — perguntei, já querendo que ela acabasse com o suspense.
  — Eu preciso saber se você ainda quer se casar comigo, . — aquilo que já não estava fazendo muito sentido, ficou ainda mais enrolado quando ela perguntou aquilo.
  — É claro que sim, . — suspirei cansado.
  — Então tá. — ela sorriu, apertando ainda mais os dedos ao redor dos meus. — Nós vamos precisar acrescentar uma pessoinha muito, mas muuuuito especial na festa, tudo bem?
  — Do que você está falando? Por Deus!
  — É que eu estou grávida! — ela sussurrou, com lágrimas nos olhos e um sorriso enorme no rosto.
  Não sei qual foi a minha primeira reação, se foi arregalar os olhos, sorrir ou abraçá-la, mas acredito ter feito tudo ao mesmo tempo.
  — Você tem certeza disso? — eu perguntei para me certificar do que estava ouvindo naquele momento.
  — Eu fiz três testes, . — ela revirou os olhos, limpando algumas lágrimas que escorregavam pelo seu rosto. — Me desculpe por não ter aceitado o seu pedido antes... mas alguma coisa me dizia para esperar um pouquinho, e agora eu acho que foi o bebê, e eu não sei se estou fazendo sentido agora.
  — , está tudo bem! Não vamos ficar lembrando disso, ok? Eu acho que agora é o momento perfeito para eu fazer o pedido mais uma vez. — estava tão nervoso que só conseguia ficar rindo. Minhas mãos estavam quase tão trêmulas quanto as dela, mas peguei mais uma vez o embrulho de veludo preto. — Ferris-, você aceita se casar comigo?
  — É claro que sim! — ela se jogou nos meus braços. Aproveitei para beijar várias vezes os seus lábios.

  Algumas – muitas – semanas depois...

  Precisava estar no trabalho em dez minutos. Apesar de ter insistido por uma folga naquele dia, faríamos uma apreensão de drogas em Lancaster. Mas não podia perder o dia em que eu descobriria qual seria o sexo do meu primeiro filho. Estava torcendo muito para que fosse um menino, por mais que o Derek tivesse apostado que seria uma menina.
  Ele não era o médico da , mas sempre nos acompanhava ou nos aconselhava em tudo, principalmente quando conseguiu que ela fizesse todo o pré-natal no hospital em que ele trabalhava.
  Quando decidimos contar sobre o bebê aos pais da , achei que a mãe dela desmaiaria a qualquer momento, enquanto o pai dela nos abraçou até não poder mais.
  — , você pode ir, depois eu conto o resultado. — me livrou das lembranças dizendo aquilo.
  — Depois eu me endireito na delegacia, não vou perder mais ess ultrassom! — Estava decidido. Já havia perdido a primeira, e depois mais duas. Me recusava a perder essa.
  Ainda demoramos até sermos chamados, e meu telefone não parava de tocar. Sabia que poderia ser punido, mesmo que não tão gravemente, mas ainda assim não sairia do lado da minha noiva por nada.

  — Está ansiosa, ? — A médica perguntou enquanto despejava uma boa quantidade de gel na barriga dela. assentiu, sorrindo. — Vocês têm alguma preferência? — Dessa vez ela perguntou olhando para nós dois.
  — Menino! — Acabamos respondendo ao mesmo tempo, fazendo todos nós rirmos.
  — Então vamos ver se temos um menininho por aqui...
  A médica começou todos os procedimentos que eram necessários; ouvimos o coração, vimos os bracinhos – não entendia quase nada do que via, mas ela disse que estava ali. Já não estava mais aguentando, de tão ansioso.
  — , você pode, por favor, atender o seu celular? — me olhava furiosa, e eu nem estava mais ligando para o barulho dele.
  — Mas eu não quero perder! — Resmunguei, fazendo-a prender os lábios em uma linha fina. — Eu vou atender aqui fora e já volto.
  Saí do consultório enfurecido e atendi a ligação. Era Voight perguntando por que eu não tinha aparecido, e gritando em meu ouvido sobre eu estar dispensado da operação. Expliquei que estava acompanhando , e mesmo assim ele desligou na minha cara, sem dizer muita coisa.
  Voltei o mais rápido que pude à sala, e vi com os olhos cheios d'água. Imaginei que havia alguma coisa errada, mas a doutora Hills apenas disse:
  — Não deu para ver o sexo hoje, sinto muito.

  Depois de voltarmos para casa e eu ter explicado a que estava dispensado da operação, então teria alguns dias de folga, ela resolveu desabafar sobre os poucos minutos que passei fora do consultório.
  A médica havia dito que o bebê estava com a perninha fechada, então não dava para identificar. logo quis chorar, e começou a mexer na barriga para ver se o bebê se mexia e elas pudessem descobrir se teríamos um menino ou menina, mas aparentemente ele – ou ela –, estava dormindo na hora.
  Sem ter muito que fazer, fomos visitar , e eu aproveitei para ficar um pouquinho com a Heaven, já treinando mais um pouco as minhas habilidades com bebês.

  Fim 's P.O.V.

  Quando se está grávida, você fica com os hormônios numa loucura, e isso faz com que você num minuto chore, depois já está rindo feito uma criança. E, nesse momento, eu sentia vontade de rir e chorar ao mesmo tempo. ficou ao meu lado, e eu não reclamei, mesmo sabendo que ele precisava trabalhar, e eu também.
  — Eu pego um táxi, , você pode ir trabalhar… — Comentei assim que a médica nos deixou sozinhos.
  — Você está quase tendo o nosso filho, e ainda assim vai ao almoço com o Greg.
  — Agora nós somos sócios, eu não posso simplesmente para de trabalhar!
  — Você. está. nas. últimas. semanas. de .gestação! — disse pausadamente.
  — Tudo bem! — Me levantei da cama e finalmente pudemos sair do consultório.

  A última semana…

  Não queria fazer muito alarde, mas estava doendo demais para uma pessoa não gritar.
  As luzes brancas do hospital passavam como um borrão enquanto a dr. Hill e sua equipe médica me conduziam até o centro cirúrgico. Quando chegamos ao hospital e a médica disse que eu já deveria estar sentindo as contrações, me assustei e minha pressão aumentou rapidamente, fazendo com que o bebê corresse riscos.
  — Cuida do meu bebê! — Lembro de ter dito isso assim que entramos em uma sala grande.
  Quando acordei, estava sentado perto de mim, e falava algo bem baixinho, mas ainda estávamos no centro cirúrgico. Queria perguntar se estava tudo bem, mas não tinha forças para nada.
  — Ela acordou! — agora olhava para mim e sorria.
  E então tudo aconteceu muito rápido: uma enfermeira vindo falar comigo e um choro pôde ser ouvido bem alto.
  Eu já sentia meus olhos cheios de lágrimas e os beijos que distribuía pelo meu rosto.
  O bebê foi levado pelas enfermeiras, e logo menos voltou e foi colocado em meu colo. Não sabia se o beijava ou chorava.
  — É uma menina!

*

  Estávamos em casa, e chamamos a , Derek e a Heaven; Kamille, Brian e o novo namorado; meus pais e Denise e o pai do .
  Decidimos que comemoraríamos todos os meses que a Eloise fizesse, e já era a décima primeira vez que o fazíamos.
  Minha mãe sempre trazia comida para uma população inteira, e todo mundo conversava até tarde da noite.
  — Não vamos nos lembrar disso! — Pedi assim que minha mãe lembrou os momentos que antecederam a chegada da minha filha.
  — Eu não sabia o que fazer. — , que estava com a Elo no colo, negou com a cabeça e beijou o topo da cabecinha dela. — E quando a desmaiou, eu quase desmaiei junto.
  — Vamos mudar de assunto, por favor. — Pedi mais uma vez.
  Então começamos a conversar sobre assuntos banais que envolviam toda a normalidade do dia-a-dia.
  — Você acha que daqui um tempo vocês vão ter outro? — perguntou assim que todos já começavam a se despedir.
  — Eu não faço a mínima ideia! Mas gosto e quero aproveitar o máximo da Eloise por agora, o depois a gente pensa! — Dei um beijo na bochecha da Heaven e um abraço na minha amiga.

*

  — Depois de onze meses tendo que conviver com esses dois, eu entendi a verdadeira felicidade em ser chamada de “mama”, ou então poder ver o sorriso do ao ser chamado de “papa”. Nós estamos tão felizes que vocês não conseguem imaginar!
  — E, claro, muito obrigado por estarem presentes na festinha da Eloise e em toda a nossa trajetória! E, se ela estivesse acordada, certeza que sorriria para todos vocês!

FIM



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